Percurso Narrativo Literatura, Sociedade e Propaganda Noções Preliminares Narratividade: processos de transformação do ser (disjunções e conjunções) no mundo. Disjunção: separação do objeto. Conjunção: união com o objeto. Categorias Manipuladas: Dever fazer Querer fazer Saber fazer Poder fazer TEXTO A – Pobre João A história de um homem que não sabe se impor e da garota não está nem aí para a própria vida. TEXTO B – Ford Focus “Eu faço parte de um grupo de pessoas que não faz escolhas óbvias.... Enquanto a maioria quer o que é modinha, nós queremos o que dá vontade.... Enquanto a maioria vai aonde todo mundo vai, nós vamos aonde é mais bacana... Se você também tem uma cabeça diferente, deve dirigir o mesmo carro que eu. Ford Focus, nada nele é óbvio”. (Promocional Ford – 2008) 1. A Manipulação Quatro tipos: a) Tentação (você quer fazer) b) Sedução (você sabe fazer) c) Provocação (você não sabe fazer) d) Intimidação (você deve fazer) 1.a. Tentação O manipulador oferece ao manipulado um objeto de valor abstrato ou material: Texto A: “Ela passava fingindo desatenção, deixando cair o espanador bem próximo dele, abaixava-se para pegar tomando o cuidado de esbarrar seu quadril no dele...” Texto B: Você quer ser diferente. Você quer o novo Focus (TENTAÇÃO IMPLÍCITA). Foco na Tentação Eu vi o meu semblante numa fonte: dos anos inda não está cortado; os Pastores que habitam este monte respeitam o poder do meu cajado. Com tal destreza toco a sanfoninha, que inveja até me tem o próprio Alceste: ao som dela concerto a voz celeste nem canto letra, que não seja minha. Graças, Marília bela. graças à minha Estrela! (Marília de Dirceu – Tomás A. Gonzaga) O eu-lírico se apresenta como um homem bonito, respeitado, poderoso e com dons artístico, na tentativa de convencer a amada através dos múltiplos predicados que ele possui. 1.b. Sedução O manipulador elogia uma competência do manipulado Texto A: “Depois, vieram os comentários, “nossa, o senhor deve se exercitar bastante, né seu João?”, “gostei do novo corte de cabelo, seu João”. Texto B: Você é diferente dos outros Alguém com sua autonomia merece um Focus (SEDUÇÃO IMPLÍCITA) Foco na Sedução Fonte de mel Nos olhos de gueixa Cabocla e máscara Choque entre o azul E o cacho de acácias Luz das acácias Você é mãe do sol A sua coisa É toda tão certa Beleza esperta Você me deixa a rua deserta Quando atravessa E não olha pra trás Linda, e sabe viver Você me faz feliz Esta canção é só pra dizer e diz Você é linda, mais que demais Você é linda sim. (Você é Linda - Caetano Veloso) Nesse caso, o eu-lírico apresenta uma série de elogios à amada, na tentativa de convencê-la através da exploração dos predicados dela mesma. Foco na Sedução “Ao longo dos últimos anos, a mulher passou a acumular diferentes tarefas na sociedade. Hoje, ela trabalha fora, cuida do filho, do marido, da casa e ainda consegue tempo para cuidar da beleza. Com o objetivo de gerar uma experiência diferente com a marca, a Bombril quer homenagear e valorizar a mulher brasileira que sempre reconheceu a marca e a qualidade dos produtos de forma espontânea”. (adnews.com – 03/03/2010) 1.c. Provocação O manipulador questiona ou incita uma competência do manipulado; é, pois, o oposto da sedução. Texto A: “Daí ao flerte despudorado, foram dois ou três olhares desejosos, ‘duvido o senhor me dá um beijo aqui e agora, o senhor não tem coragem’”. Texto B: “Se você também tem uma cabeça diferente...” Foco na Provocação Algumas vezes na vida, sentimos que temos alguma coisa importante que devemos fazer. Parece impossível! Parece grande demais para mim! A voz da “crítica” ecoa como trovões nos seus ouvidos: “Você não é capaz! Você nunca conseguirá fazer isso! Você vai se arrepender!” Porém, lá no fundo, existe uma voz tênue que diz: “Eu acredito em você! Você é a pessoa mais qualificada para isso! Acredite em você!” (Crítica - Marcos Pontes) O autor lança mão de uma voz social repleta de provocação como forma de provar seus argumentos. Nota-se que a provocação externa é rebatida por um processo de autossedução. Foco na Provocação V.I.D.A. (Veículo de intervenção pelo direito do animal) 1.d. Intimidação O manipulador ameaça tirar do manipulado algo que ele deseja ou algo que ele possui. Texto A: “se o senhor não me dá um beijo eu digo pra sua mulher que o senhor anda se engraçando comigo, ela vai ficar puta”. Texto B: “... Você deve dirigir o mesmo carro que eu”. Se não quiser viver sem autonomia, seguindo modismos (INTIMIDAÇÃO IMPLÍCITA). Foco na Intimidação “Sem alegria nem cuidado, nosso pai encalcou o chapéu e decidiu um adeus para a gente. Nem falou outras palavras, não pegou matula e trouxa, não fez alguma recomendação. Nossa mãe, a gente achou que ela ia esbravejar, mas persistiu somente alva de pálida, mascou o beiço e bramou: — ‘Cê vai, ocê fique, você nunca volte!’ Nosso pai suspendeu a resposta. Espiou manso para mim, me acenando de vir também, por uns passos. Temi a ira de nossa mãe, mas obedeci, de vez de jeito”. (Guimarães Rosa - A terceira margem do rio) A personagem tenta convencer o marido a não ir embora, intimidando-o através da ameaça de não mais poder voltar a ver a família. Foco na Intimidação PRECISA MESMO EXPLICAR? 2. A Competência Supõe um poder e um saber necessários para a realização da ação. Texto A: PODER – “O casamento que fosse para os diabos, agora era com ele, ‘vou virar joguete de mulherzinha de vila? O caralho!’”. SABER – “‘Será que eu dou conta de uma moça assim? Será que eu deixo aquela vaca louca? Será?’”. Texto B: CONSUMIDOR – “Será que eu posso comprar? Será que eu ajo com autonomia?” Foco na Competência Toda pedra do caminho Você pode retirar Numa flor que tem espinhos Você pode se arranhar Se o bem e o mau existem Você pode escolher É preciso saber viver... É preciso saber viver! É preciso saber viver! Saber viver! Saber viver! (Roberto Carlos – É preciso saber viver) O eu-lírico mantém o foco na capacidade de realizar, não na realização em si. Foco na Competência YES, WE CAN (“sim, nós podemos”) foi tema propaganda política do candidato a presidência dos EUA Barack Obama na eleição de 2009. Esse tema sacudiu o País e trouxe esperança na capacidade do povo norte-americano, que queria mudança. O então presidente, George W. Bush, tinha baixa tolerância do público por causa de sua política externa e, principalmente, pela situação econômica na época. 3. Performance Ação do sujeito em busca do objeto de valor. Possibilita a mudança de estado (conjunção disjunção) Texto A: “A coisa toda se programou de telefonemas e bilhetes escondidos. Quinta. Ele sairia mais cedo. Ela não iria trabalhar, combinaram um bar afastado, que se freqüentava de gente pouco observadora. E então, o motel mais afastado. E assim foi”. Texto B: CONSUMIDOR – “Vou comprar este carro!” Foco na Performance “Era uma galinha de domingo. Ainda viva porque não passava de nove horas da manhã. (...) Foi pois uma surpresa quando a viram abrir as asas de curto vôo, inchar o peito e, em dois ou três lances, alcançar a murada do terraço. Um instante ainda vacilou — o tempo da cozinheira dar um grito — e em breve estava no terraço do vizinho, de onde, em outro vôo desajeitado, alcançou um telhado. (...) E então parecia tão livre”. (Clarice Lispector – Uma Galinha) Nesse trecho, o foco é a realização do inusitado pela personagem, o que a permite subverter seu destino trágico (conjunção com a liberdade, disjunção com a morte). Foco na Performance Criada especialmente para a Copa do Mundo da Alemanha,a campanha JOGA BONITO queria propunha mostrar que o mundo do futebol deveria sempre jogar com beleza, com plástica e lealdade, fazendo com que o esporte fique mais alegre, bonito, justo e com menos racismo e violência. 4. Sanção É a recompensa ou castigo que a sociedade (ou um ser) impõe ao sujeito da performance. Texto A: Os clientes começaram a rarear. Mas esse era problema menor. Com o tempo a fofoca desaquece. O problema foi em casa mesmo. Terminou quando a esposa insistiu na assinatura do divórcio”. Texto B: VIZINHO DO CONSUMIDOR – “Nossa que carrão, hein! Tá podendo, cara!” MULHER DELE – “Como você pensa em pagar isso, idiota! Acha que dinheiro dá em árvore?” Foco na Sanção Você que inventou a tristeza Ora tenha a fineza de “desinventar”. Você vai pagar, e é dobrado, Cada lágrima rolada Nesse meu penar. Apesar de você Amanhã há de ser outro dia. Ainda pago pra ver O jardim florescer Qual você não queria. Você vai se amargar Vendo o dia raiar Sem lhe pedir licença. E eu vou morrer de rir E esse dia há de vir antes do que você pensa. Apesar de você... (Chico Buarque - Apesar de Você) O eu-lírico comenta a resposta social aos desmandos da ditadura, em um tom agressivo e ameaçador, marcando o descontentamento coletivo diante da situação política da época. Foco na Sanção É comum, nas propagandas de perfumes e desodorantes, a associação entre o uso do produto e o sucesso com o sexo oposto. Nesse caso, foca-se a resposta social pela conjunção com o produto, ou seja, a sanção, ou o prêmio pela performance.