cenário por Carla Nascimento O Fundap e a Economia do Espírito Santo O fim do Fundo de Fomento às Atividades Portuárias (Fundap) é dado como certo, se depender da proposta do Governo Federal de mudar a forma de cobrança do ICMS recolhido nos Estados. A medida pode afetar diretamente as operações de comércio exterior no Espírito Santo e, consequentemente, as indústrias que dependem de matérias-primas importadas. Enquanto o governo estadual propõe uma redução gradual e um prazo de adaptação maior, as empresas “fundapeanas” têm o desafio de aumentar sua eficiência para continuarem competitivas, ao mesmo tempo em que o poder público precisa promover melhorias tanto na infraestrutura quanto em questões tributárias, dizem os especialistas. O fim do fundo significa uma perda de R$ 1,8 bilhão por ano, o que força uma reflexão sobre os rumos da economia capixaba. Para o economista Arlindo Villaschi, com a extinção do Fundap, teremos que competir em igualdade de condições com outros estados exportadores, o que vai exigir investimento dos cofres públicos. “Para isso, o governo 12 Indústria Capixaba – FINDES estadual deve mobilizar a estrutura de armazéns e logística para que as empresas continuem operando por aqui. É preciso melhorar muito as condições dos portos, torná-los mais atrativos. Além disso, grandes empresas precisam operar com carga geral (carga embarcada e transportada com acondicionamento, com marca de identificação e contagem de unidades). Tem que haver mobilização política para que a infraestrutura já existente ou a ser criada trabalhe também a serviço das importações e exportações de carga geral”, opina Villaschi. O economista ressalta que os empresários terão igualmente que se mobilizar. “A maioria dos empresários que operam por meio do Fundap operam há muito tempo. Caso o fundo seja extinto, eles terão que operar em igualdade de condições com outros estados. Minha sugestão é que o Espírito Santo passe a ser exportador de carga geral também”, aponta. O Sistema FINDES trabalha para que o Fundap seja mantido ou pelo menos prorrogado, com o objetivo de resguardar o processo de evolução da indústria. Mai/Jun/2011 – nº 295 “O Fundap não é um fundo casuístico nem oportunista. Ele surgiu para dinamizar as atividades dos portos do Espírito Santo” Maurício Cézar Duque, secretário de Estado da Fazenda “O Fundap é um sistema diferenciado dos demais incentivos em termos de Brasil, pois trata-se de um estímulo financeiro, e não de cunho fiscal. Logo, ele deve ser avaliado com outros olhos. Por fim, é fundamental ressaltar que o Fundap é muito importante porque determinadas matériasprimas e equipamentos industriais não existentes no Brasil são importados via essa modalidade de fomento, e isso melhora sensivelmente a competitividade das indústrias capixabas”, informa a FINDES, por meio de nota oficial. O tema é tão importante que levou o secretário de Estado da Fazenda, Maurício Cézar Duque, à Comissão de Assuntos Econômicos do Senado e, no último dia 4 de maio, o governador Renato Casagrande à Casa Civil, onde se reuniu com o ministro Antônio Palocci. O governo estadual também pede um prazo maior de adaptação a essas mudanças. A reforma tributária tem como objetivo unificar a cobrança de impostos entre os Estados. A proposta é reduzir a alíquota do ICMS sobre as importações de 12% Mai/Jun/2011 – nº 295 para 8%, em 2012; de 8% para 4% em 2013; e de 4% para 2% em 2014. Ela passaria a ser cobrada no destino do produto, e não na sua origem (ponto de entrada no país), o que vai atingir o Fundap. E esse não é o único risco que corre o fundo. Um projeto apresentado pelo líder do governo, Romero Jucá (PMDB-PR), defende que a alíquota do ICMS nas operações interestaduais com mercadorias importadas seja reduzida a zero.A União estaria disposta a elevar a alíquota para 4% e incluir os produtos nacionais, mas, ainda assim, teria grande impacto no Fundap. A justificativa é acabar com a guerra fiscal entre os Estados. “O Espírito Santo sugere 12 anos e uma redução gradativa da alíquota nas importações até 6%, mas o Ministério da Fazenda está apontando para um prazo de três anos, com alíquota de 2%. Estamos conversando para convencer o Governo Federal, senadores e deputados de que isso pode ser muito ruim para o Espírito Santo e lembrar que enfrentamos uma situação muito diferente daquela que ocorre nos demais estados. Precisamos conversar muito nos próximos dias,para que consigamos chegar a um meio termo que é fundamental para o Espírito Santo”, afirma o secretário de Estado da Fazenda. Importância O presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior (Concex) do Sistema FINDES, Andreas Schilte, ressalta que indústrias de diferentes portes e atividades são beneficiadas com os mecanismos do Fundap. “Desde padarias, que compram trigo e outros insumos importados, até o mercado de rochas, que utiliza lâminas e abrasivos de outros países, muitos sentirão impacto nos negócios, se o Fundap acabar”, afirma. Ele ressalta que o fundo é importante por três motivos: primeiro, porque estimula as operações de comércio exterior, e as indústrias precisam de matérias-primas importadas; segundo, porque a cadeia do comércio exterior movimenta despachantes, bancos e toda uma estrutura Indústria Capixaba – FINDES 13 cenário logística que seria diretamente afetada com o fim do Fundap; e, também, porque parte dos recursos é diretamente repassada aos municípios. Atualmente, o Fundap corresponde a 25% da receita de ICMS capixaba, cujo total foi de R$ 7,1 bilhões em 2010. De acordo com o Sindicato do Comércio de Exportação e Importação do Estado do Espírito Santo (Sindiex), de 1994 a março de 2011 foram arrecadados R$ 18,1 bilhões de ICMS pelo Estado, sendo R$ 4,5 bilhões repassados aos cofres municipais por meio do fundo. O presidente do Sindiex, Severiano Alvarenga Imperial, também enumera as vantagens do Fundap. “O Fundo de Desenvolvimento das Atividades Portuárias é, na realidade, um fundo de fomento, com dotação orçamentária prevista na Lei de Orçamento Anual do Estado, que atua como instrumento de desenvolvimento estadual há 40 anos. Trata-se de um sistema inteligente, que contribui para a geração de emprego e renda para o capixaba, imprescindível na composição das finanças municipais”, diz. 1,7 bilhões 2010 1,7 bilhões 2009 2008 1,9 bilhões 2007 1,6 bilhões 2006 1,4 bilhões 2005 1,2 bilhões 2004 795 milhões 2003 2002 687 milhões 890 milhões 2001 695 milhões 2000 600 milhões 1998 1999 705 milhões 1997 545 milhões 485 milhões 1996 440 milhões 1995 160 milhões 1994 2,2 bilhões EM R$ Evolução da arrecadação do ICMS Fundap Evolução da participação do ICMS Fundap no ICMS Total 43% 37% 27% Fonte: Sindiex 14 Indústria Capixaba – FINDES 32% 32% 27% 24% 2011 2010 2009 2008 24% 2003 2001 2000 1999 1998 1997 1996 1995 1994 21% 2002 29% 33% 31% 33% 2007 35% 2006 35% 2005 40% 2004 35% 35% “Tem que haver mobilização política para que a infraestrutura já existente ou a ser criada trabalhe também a serviço das importações e exportações de carga geral” Arlindo Villaschi, economista O Fundap atende a uma cadeia prestadora de serviços que inclui 320 empresas ativas: agências marítimas, despachantes aduaneiros, corretoras e operadoras de câmbio, portos secos e empresas de consultoria, entre outras. Ao todo, são gerados e mantidos cerca de 128 mil postos de trabalho. Severiano também destaca que, por meio do Fundapsocial – o braço social do Fundap, cuja finalidade é a de fomentar o desenvolvimento social do Espírito Santo -, mais de 29 mil empreendedores capixabas de micro e pequenos negócios foram beneficiados. “E as empresas operadoras do Fundap já repassaram mais de R$ 52 milhões ao Fundapsocial, que já gerou R$ 165,7 milhões em operações de crédito, distribuídas por todos os municípios capixabas. Em média, são mais de R$ 2,12 milhões aplicados em cada cidade capixaba”, enfatiza. Desde que foi criado o fundo, as empresas “fundapeanas” investiram mais de R$ 1,2 bilhão de recursos em projetos de infraestrutura, distribuídos pelas microrregiões do Estado. Diante desse quadro, Imperial ressalta a preocupação com o fim do Fundap. “Sem o seu fundo de fomento, o Espírito Santo perderá um quarto da arrecadação de ICMS, deixando, consequentemente, de repassar 25% dessa parcela aos municípios. Com isso, a maior parte das prefeituras terá perdido, completamente, sua capacidade de investimento. Os investimentos em projetos de infraestrutura cessarão, bem como os recursos destinados ao Fundapsocial. Pelo menos cerca de 500 empresas serão extintas, gerando desemprego em massa”, afirma o presidente do Sindiex. O secretário de Estado da Fazenda, Maurício Cézar Duque, também acredita que o Fundap seja vital para o Espírito Santo.“Esse fundo foi criado em 1970 para corrigir algumas desigualdades no processo de desenvolvimento ocorrido em nosso País. O Fundap foi criado com um objetivo diferente de qualquer intenção, de qualquer legislação recente que seja objeto da chamada guerra fiscal. Não é um fundo casuístico nem oportunista. Ele surgiu para dinamizar as atividades dos portos do Espírito Santo. Basicamente, seu objetivo é estimular a movimentação de mercadorias Mai/Jun/2011 – nº 295 mais sobre o fundap O que é o Fundap: é um fundo de fomento, criado pelos portos capixabas, aumentar a renda dos diversos setores da economia e induzir a geração de emprego e de renda. Pela localização do Estado,por suas características geográficas, por seu complexo portuário, por sua pequena população e, consequentemente, por seu pequeno mercado interno, a atividade de comércio exterior, notadamente a importação, é extremamente importante para o Espírito Santo”. Ele enfatiza que o ICMS na importação já representou 43% do ICMS total do Estado; em 2010, significava em torno de 24%; em 2011, cerca de 26%. “O que a gente pode observar é que, nesse período em que houve acirramento da guerra fiscal, principalmente com os incentivos à importação de produtos, o peso do ICMS da importação no total do ICMS do Estado caiu significativamente”, diz o secretário. Duque lembra que o percentual de aproximadamente 25% do ICMS do Fundap devido aos municípios é creditado integralmente para eles. Hoje, o ICMS do Fundap representa até 35% da receita de todos os municípios capixabas. Os outros 75% de ICMS são financiados às empresas, que depois pagam esse valor de volta ao Estado. Parte do valor financiado é destinada, compulsoriamente, a projetos próprios da empresa no Estado, a projetos de terceiros ou, ainda, ao Nossocrédito, que é um programa de microcrédito que já fez operações no total de R$ 176 milhões. Ele calcula que as perdas do Espírito Santo com a unificação do ICMS e o fim das operações via Fundap fiquem em torno de R$ 1,8 bilhão por ano. “Nós perderíamos praticamente todas as importações via Fundap. Os grandes atingidos seriam os municípios capixabas,que sofreriam prejuízos em seus projetos das áreas de educação e saúde, além de outros investimentos. “Sem o seu fundo de fomento, o Espírito Santo perderá um quarto da arrecadação de ICMS, deixando de repassar 25% dessa parcela aos municípios ” Severiano Alvarenga Imperial, presidente do Sindiex Mai/Jun/2011 – nº 295 em 1970, que beneficia empresas com sede no Espírito Santo que realizam operações de comércio exterior tributadas com ICMS no Estado. Empresas industriais com sede no Estado que utilizam insumos importados também podem se habilitar aos financiamentos. Para receber o financiamento com recursos do fundo, as empresas devem comprovar a regularidade fiscal e tributária. O Bandes atua como gestor na contratação dos financiamentos. Como funciona: a alíquota de ICMS Fundap é de 12%. O recolhimento do ICMS acontece no dia 26 do mês seguinte ao da emissão da nota fiscal de venda. O juro pago pelo financiamento é de 1% ao ano. Dos 12% da alíquota do ICMS, 8% são destinados aos financiamentos, 3% vão para os municípios e 1% fica com o Governo do Estado. Investimento: as empresas “fundapeanas” devem investir 9% do valor financiado em projetos que irão gerar desenvolvimento, renda e emprego no Espírito Santo. Condições para o financiamento: as operações devem ser realizadas por empresas que tenham sede no território do Espírito Santo; o recolhimento do ICMS Fundap deve ser efetuado para o Estado do Espírito Santo; o desembaraço aduaneiro tem que ser realizado no Espírito Santo. Principais objetivos: • Estimular a movimentação de mercadorias pelos portos capixabas. • Aumentar a renda do setor terciário do Estado, por meio do incremento e diversificação do intercâmbio comercial com o exterior. • Aumentar a renda dos setores primário e secundário do Estado, por meio da promoção de novos investimentos estabelecidos em lei. • Induzir a geração de emprego e renda. São recursos muito significativos e não seria possível manter os investimentos nesses municípios sem os recursos do Fundap. Também são muito representativos para serem substituídos por outras fontes. Para os municípios, haveria um impacto muito forte em suas finanças, comprometendo o equilíbrio fiscal”, admite o secretário. Como agravante, Duque destaca que o Estado corre o risco de que seja derrubado o veto do ex-presidente Lula às emendas do deputado Ibsen Pinheiro e do senador Pedro Simon, que dividem igualmente os royalties de petróleo do pré-sal entre os estados e municípios brasileiros. Nesse caso, pode haver ainda alteração nos critérios de distribuição do Fundo de Participação dos Estados (FPE). No total, as perdas para o Espírito Santo poderiam ficar entre R$ 3 bilhões e R$ 3,5 bilhões. Indústria Capixaba – FINDES 15