Faculdades EST Culto Eucarístico 12 de Setembro de 2012 Mc 7.24-30 Pastora Mestra Marcia Blasi Cara comunidade aqui reunida. Das muitas histórias contadas nos evangelhos, esta que ouvimos hoje tem algo de estranho aos nossos ouvidos. O que Jesus estava fazendo tão longe da sua conhecida Galiléia? De quem era a casa? O que ele queria lá? O plano de Jesus de se esconder na casa de alguém não deu certo novamente. Imagino que lá estava ele, provavelmente descansando, saboreando uma gostosa refeição, quando chega uma mulher. A mulher é não é conhecida. Ela não é chamada pelo nome. Ela não participa da refeição, mas ela é uma mulher determinada. Ela vem até Jesus com um objetivo, com uma missão: ela busca cura para sua filha doente. Ela pede ajuda. Jesus, numa atitude surpreendente, parece brincar com o sentimento dela. Jesus parece não a levar a sério, e diz: “Deixem que os filhos comam primeiro. Não é certo tirar o pão dos filhos e jogá-lo para os cachorros.” Palavras horríveis. Palavras que rebaixam a pessoa. Nem parece o mesmo Jesus que acolhe e aceita. Mas ela não desiste. Ela sabe o seu lugar, ela não abre mão da sua cultura, ela não quer nada para si, ela quer ajuda para sua filha. Não veio até os pés de Jesus para desistir fácil. Ela pensa rápido. “Sim, Senhor, mas os cachorrinhos comem as migalhas que caem da mesa.” Ela sabe que a graça que vem com Jesus é abundante. Ela sabe que em algum lugar, mesmo que seja embaixo da mesa, há migalhas da graça e ela está disposta a ir até lá, se for preciso. Num momento de ousadia ela pega Jesus desprevenido. Por essa resposta ele não esperava. E por um momento parece que é possível ouvir o silêncio. ....................... Interessante pensar como esta história é contemporânea, é real em 2012. Quantas e quantas mulheres são obrigadas diariamente a procurar as migalhas que caem das mesas fartas: migalhas de saúde, migalhas de cultura, migalhas de educação, migalhas de comida. Se, por um lado, na América Latina há menos pessoas que passam fome, por outro há muito mais pessoas comendo aquilo que o corpo não precisa: açúcares, gorduras e tudo temperado com muito agrotóxicos e conservantes. São os espíritos maus dos nossos tempos... ....... Muitas mulheres siro-fenícias, chilenas, brasileiras, hondurenhas, mexicanas, indianas, sul africanas, somalianas continuam procurando migalhas embaixo das mesas. Se a história tivesse terminado aqui teria mudado algo? Acredito que não. A mulher siro-fenícia amaciou Jesus. Ela tocou o coração dele. Ela provocou uma mudança. Com sua audácia ela colaborou para construção de uma nova história. Através da ousadia dela, Jesus entende que a hora de revelar o amor de Deus a todas as pessoas chegou. Não é possível escolher, nem deixar para depois. A hora é agora. A hora é agora também para nós. O pastor e professor Rodolfo Gaede Neto afirma que é embaixo da mesa que acontece o lugar teológico da diaconia. É embaixo da mesa que a diaconia latino americana acontece. É embaixo da mesa, com os excluídos e as excluídas que a diaconia e a teologia vão procurando transformação. O lugar debaixo da mesa passa a ser o lugar da subversão, da criatividade, dos sonhos. Refletindo com Rodolfo eu arrisco dizer que o lugar embaixo da mesa já é conhecido por nós. Já estivemos lá. Algumas pessoas até querem que a gente continue economicamente, socialmente, culturalmente e até teologicamente lá. Mas já chega de migalhas. Chega de nos satisfazermos com as migalhas que deixam cair para nós (ou que não conseguem segurar por entre os dedos). Por causa do encontro de Jesus com a mulher siro-fenícia, há lugar ao redor da mesa para cada pessoa que se achega. Por causa desse encontro há lugar para cada uma e cada um de nós, com nossas dúvidas, nossas perguntas, nossas impurezas, nossos dons, nossos conhecimentos, nossa fé. Jesus reconheceu o pedido da mulher e curou sua filha. Curou a filha não numa atitude de superioridade. “Sim, pode ir. Vou te dar uma migalha” Isso não. “Por causa do que você falou a sua filha foi curada,” disse Jesus para a mulher. Ele não tirou dela sua autonomia. Jesus colocou a mulher ao redor da mesa, e não embaixo dela.E nesse momento e movimento a vida se transforma. A vida se transforma para a mulher e sua filha. Ela recebe a cura que tanto deseja. Acredito também que a vida se transforma para Jesus também. A vida se transforma para o povo de Deus. O lugar do povo de Deus é ao redor da mesa. É partilhando. É ousando. É enchendo o coração de esperança e construindo mesas inclusivas e abertas, mesas onde ninguém precisa comer migalhas embaixo da mesa. Mesas onde há comida saudável e orgânica suficiente para que todas as pessoas comam o suficiente. Mesas que celebrem a diversidade cultural, étnica e religiosa. Mesas onde mulheres, homens e crianças são respeitadas como filhas e filhos de Deus, sem hierarquia, violência ou discriminação. Mesas de cooperação e solidariedade. Nesta noite nos achegamos ao redor da mesa da comunhão. Chegamos de muitos lugares, assim como somos, para partilhar o pão e a vida, nossas histórias e dores, nossas aventuras e descobertas, nossos silêncios e nossos cantos. Ao redor desta mesa Jesus vai nos alimentar com coragem para sonhar o mundo e deixá-lo menos chato, como nos convidou a fazer o professor Vitor Westhelle, na palestra de abertura deste congresso. Ao redor desta mesa Jesus vai nos alimentar com ousadia para tentar novas maneiras de celebrar. Ao redor desta mesa Jesus vai nos alimentar com perdão e dizer, “agora vão em frente, tenham coragem!” Jesus vai nos alimentar com sabedoria para construir novas mesas. Assim seja. Amém