AS INTER-RELAÇÕES ENTRE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E DESENVOLVIMENTO. SILVA, Cleverson Ramom Carvalho Silva1 Resumo: O ensino profissional é uma ferramenta estratégica para a promoção e manutenção do desenvolvimento socioeconômico de um país. Nesse sentido, os impactos da expansão da educação profissional ganham notoriedade diante da sua capacidade de promover mudanças sociais e econômicas, manifestando-se como uma das prioridades estatais em vários países desenvolvidos nas últimas décadas do século XX e mais recentemente, em países em vias de desenvolvimento. O presente artigo procura investigar as inter-relações existentes entre educação profissional, ou seja, aquela voltada para o mundo do trabalho, e o desenvolvimento socioeconômico. Em termos metodológicos o estudo destaca a importância da capacitação profissional para o desenvolvimento, para tal fim, aborda-se a teoria do capital humano e as relações entre ciência, tecnologia e desenvolvimento, temas estes tratados por autores Neoclássicos como Solow e Romer. Após compreender essas relações, reporta-se aos impactos da educação profissional para o desenvolvimento regional. Nas considerações finais são retomadas as principais contribuições teóricas acerca do assunto. Palavras – Chave: Educação profissional, Desenvolvimento, Ciência e Tecnologia. 1 - Introdução O presente artigo visa destacar as inter-relações existentes entre educação profissional e desenvolvimento socioeconômico. Procura-se entender primeiramente como, em termos teóricos, a educação pode contribuir para o desenvolvimento regional. Para construir a relação entre educação profissional e desenvolvimento utiliza-se a Teoria do Capital Humano em seu sentido mais amplo, abrangendo assim teorias que atribuem às qualidades individuais como determinantes de melhores cargos e acréscimos de renda. Tais qualidades individuais são adquiridas quando determinado indivíduo recebe capacitação para desempenhar suas atividades, de forma que a Educação profissional manifesta-se como um elo de ligação entre o empregador e o candidato à vaga. O estudo recorre a autores como Theodore W. Schultz, formulador da teoria do capital humano e autores que desenvolveram 1 Graduado em Ciências Econômicas – UNIMONTES, Email: [email protected] trabalhos que ressaltaram a importância da educação profissional para o desenvolvimento como: Branco (1979), Sen (2000), Langoni (2005), entre outros. Além desses autores, a presente pesquisa utiliza como referência os trabalhos de Solow e Romer que evidenciam a importância do progresso tecnológico para explicar os diferentes níveis de desenvolvimento das nações, chegando à conclusão que muitos países são ricos por que grande parte da população despende um tempo maior acumulando habilidades. Após analisar aspectos macroeconômicos, consideram-se as características locais que compõem o processo de desenvolvimento, autores como Diniz, Santos e Crocco (2004) apresentam as condicionantes do desenvolvimento regional, de forma que a educação profissional se apresenta como um aspecto relevante. 2.1 - Teoria do capital humano A evolução do capitalismo é marcada por mudanças que possibilitaram melhorias nos métodos de produção e na organização das empresas. Essas melhorias são caracterizadas por avanços tecnológicos que se traduziram em ganhos de produtividade. De forma que pequenas firmas abrem espaço para grandes organizações inovadoras que investem no conhecimento necessário para se destacar em um mercado altamente competitivo, habitado por consumidores que exigem produtos diferenciados, e por empresas que se especializam e se modernizam constantemente. As principais mudanças tem sido o deslocamento das vantagens competitivas, antes na produção em escala, à agregação de valor, bem como a necessidade de personalização de produtos e serviços para atender às questões específicas dos clientes. (SILVA, 2005, p. 40) Nesse contexto, o investimento em recursos humanos torna-se peça chave para criar ou viabilizar a implantação de novos produtos ou métodos de produção, sendo as escolas, universidades e centros de pesquisa, protagonistas no processo de inovação. A teoria do capital humano foi formalizada por Theodore W. Schultz, professor e pesquisador da Universidade de Chicago. Em sua Teoria, Schultz relaciona ganhos de produtividade com investimentos em capital humano, de forma que os rendimentos pessoais crescem à medida que aumenta o grau de instrução de determinado indivíduo. Sua pesquisa demonstra como países destruídos pela Segunda Guerra Mundial, como o Japão, conseguiram se reerguer e experimentar um rápido crescimento econômico. As conclusões refletem a importância do capital humano como um fator essencial ao desenvolvimento de um país. Schultz (1973, p.63) apresenta o conceito de Capital Humano, argumentando que “É humano porquanto se acha configurado no homem, e é capital porque é uma fonte de satisfações futuras, ou de futuros rendimentos ou ambas as coisas”. Para que possa apresentar algum retorno é necessário realizar investimentos no próprio indivíduo, visto que não possível dissociar a pessoa do capital humano que possui. Para Reis (2012) as teorias que atribuem as qualidades individuais como determinantes de melhores cargos e acréscimos de renda, são consideradas como Teorias do Capital Humano. Segundo a Autora: os principais fatores que afetam a mobilidade dos trabalhadores se relacionam à sua produtividade. Estes fatores incluem a escolaridade formal, treinamentos profissionais, experiência, conhecimento, motivação, atitudes, talento, e, acima de tudo, habilidades. Assim, espera-se que trabalhadores mais produtivos tenham maior potencial para ocupar os melhores empregos no mercado de trabalho, enquanto os trabalhadores menos produtivos assumiriam as piores ocupações. (REIS, 2012, p.26) Outros pensadores como Gregory Mankiw, David Romer e David Weil desenvolveram modelos que contemplavam a variável capital humano na compreensão dos diferenciais de crescimento econômico de diversos países – isto é “reconhecer que mão de obra de diferentes economias tem diferentes níveis de instrução e qualificação.” (Jones, 2000, p. 44). As contribuições dos modelos mostram que muitos países são ricos por que grande parte da população despende um tempo maior acumulando habilidades. Essa nova reformulação constrói análises que relacionam cada ano adicional de escolaridade com carreiras mais promissoras e consequente obtenção de melhores salários, conforme QUADRO 1: Quadro 1: Nível de escolaridade, taxa de ocupação e rendimento financeiro do trabalho. Fonte: IBGE (2004), Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios 1996/2002 Conforme Stewart (1998) as empresas se diferenciam baseadas no que sabem fazer melhor que seus concorrentes, consequentemente o valor do profissional está em sua capacidade de inovar e se diferenciar. O conhecimento é tido como um bem de grande valor para qualquer organização, visto que seus recursos não se restringem apenas a estrutura da empresa, maquinário ou a mão de obra, e sim o desenvolvimento de novos métodos e processos. Para melhor compreensão do assunto conhecimento pode ser definido como: uma mistura fluida de experiência condensada, valores, informação contextual e insght experimentado, a qual proporciona uma estrutura para a avaliação e incorporação de novas experiências e informações (…) Nas organizações ele costuma estar embutido não só em documentos ou repositórios, mas também em rotinas, processos, praticas e normas organizacionais. (Davemport e Prusak , 1998 p.6) De acordo com Dias (2003) os trabalhadores necessitam se renovar constantemente, visto que o trabalhador que não se qualifica torna-se inútil na execução de novas atividades incorporadas com o progresso tecnológico: A exigências é um trabalhador versátil, flexível e adaptável que possua a capacidade de modificar rapidamente o desenvolvimento de suas atividades. Como resultado das novas tecnologias, novas profissões surgem constantemente, e diversos cargos tradicionais estão sendo transformados, substituídos e até mesmo extintos, como por exemplo, o Datilógrafo e o Telegrafista que com a informatização foram substituídos por profissionais da informática. (DIAS, 2003, p.27) Branco (1979) procura compreender os desequilíbrios do mercado de trabalho brasileiro, quanto aos diferenciais de salários relativos. Para explicar a desigualdade salarial o autor analisa o período conhecido como o “Milagre Econômico Brasileiro”, compreendido entre o final da década de 60 e início da década de 70. Sua análise se utiliza da teoria do capital humano, ao passo que procura vincular as condicionantes que explicam melhores salários aos anos de estudo “a capacidade para desempenhar funções complexas, adquirida pela educação, é um dos fatores mais relevantes na determinação da renda individual”. (BRANCO, 1979, p. 102) Em seu trabalho constata-se que os setores econômicos crescem de maneira desigual, de forma que as chamadas indústrias tradicionais (têxtil, alimentos, couros, madeira, calçados, vestuários, etc.) tendem a diminuir sua participação no produto da economia, enquanto subsetores que absorvem mais intensamente inovações técnicas crescem mais rapidamente. Diante da constatação é de se esperar que com o tempo a tendência seja que a demanda por mão de obra qualificada venha a se expandir, enquanto o inverso ocorra com a mão de obra não qualificada. Outro aspecto que Branco (1979) apresenta é o fato que as indústrias mais tradicionais são mais intensivas no uso de capital físico e consequentemente possuem um número grande de funcionários, entretanto, quando se analisa o nível educacional as indústrias mais dinâmicas são mais intensivas em capital humano, visto que demandam um profissional com maior nível de conhecimento. Para o autor a existência de inelasticidade da oferta de mão de obra qualificada no curto prazo, definida por anos de educação formal e de experiência, é que explicam os diferenciais de salário em períodos de crescimento econômico. Ou seja, em um cenário de expansão do setor produtivo aliado a rigidez na oferta de indivíduos mais qualificados, resulta em ganhos proporcionalmente mais elevados. Para validar sua teoria, Branco (1979) dividiu o mercado de trabalho urbano em três setores: Setor 1: Compreendido por subsetores dinâmicos, mais concentrados e que trabalham com tecnologia razoavelmente sofisticada. Setor 2: Constituído por setores que utilizam tecnologia moderna mas são menos concentrados. Setor 3: Composto por indústrias tradicionais que empregam tecnologias menos desenvolvidas Quando se analisa os anos de estudo, os integrantes do setor 1 possuem, em média, cerca de sete anos de educação formal, enquanto os do setor 3 tinham apenas quatro anos. Consequentemente quando se analisa o comportamento dos salários reais verifica-se uma expansão mais elevada no setor 1. Quadro 2: Características dos setores: salário real mensal Setor 1969 1973 1 3,53 4,84 2 2,44 3,13 3 1,64 2,08 Fonte: Adaptado de Branco (1979) 73 a 69 em % 37,11 28,28 28,83 Quanto ao crescimento do emprego foi menos intenso no setor 1, o que mais uma vez valida a tese que “entre as variáveis explicativas do modelo a escolaridade é, em todos os três setores, a mais importante, tendo em vista as magnitudes de seu coeficiente estimado e do valor da sua contribuição marginal” (BRANCO, 1979, p.89) As críticas à teoria do capital humano baseiam-se nos problemas de avaliação da educação como propulsor do desenvolvimento, visto que a “educação” de um indivíduo é formada por demais elementos sociais e culturais, como capacidades inatas, estrutura familiar, etnia, entre outros elementos. Para eles a teoria do capital humano contempla apenas aspectos econômicos em sua abordagem. Já para os marxistas o aumento da produtividade se dá não pelo aumento da escolaridade e sim pela estrutura tecnológica disponível e pela organização do processo de produção. 2.2 - Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento. A relação entre educação e desenvolvimento está sempre presente nos discursos oficiais, bem como na teoria econômica. É comum ao governo que elege o desenvolvimento como meta, elaborar políticas públicas voltadas para educação, já que variáveis importantes ao bom andamento da economia como o nível salarial, desemprego e avanço tecnológico, estão intimamente relacionadas ao nível de capacitação da população. Desenvolvimento é um termo amplo, pode-se descrevê-lo como uma situação em que o país vivencia um crescimento econômico, geralmente associado ao aumento do Produto Nacional Bruto per capita, acompanhado pela melhoria do padrão de vida da população e por alterações fundamentais na estrutura de sua economia. O investimento em educação é um traço marcante das nações desenvolvidas, visto que oportunidades sociais são elementares para o desenvolvimento. Um caso bem sucedido dessas ações é o Japão, segundo Sen (2000) ainda na era Meiji do século XIX, o país já apresentava índices superiores aos da Europa com relação à educação básica. Nessa época o Japão ainda não havia passado pelo processo de industrialização que já havia sido iniciado na Europa. Com grandes investimentos em educação, o desenvolvimento do Japão foi, em sua maior parte, subsidiado pelo capital humano. O mesmo que ocorreu em outros países próximos a ele, o chamado milagre do Leste Asiático. O relatado vai contra a ideia que só os países ricos possuem capital suficiente para manterem alto padrão de desenvolvimento humano, já que muitos países do leste asiático realizaram esses investimentos antes de conhecer a prosperidade econômica. Outro exemplo é a China, dentre os principais fatores que explicam seu crescimento gigantesco destaca-se a presença de grandes investimentos em educação, além da abertura econômica e uma indústria forte voltada para o mercado. O caso da China é semelhante a do Japão, a população chinesa era em grande parte alfabetizada antes de experimentar a aceleração econômica, ou seja, havia um preparo social quando em 1972 voltaram-se para o mercado. O mesmo se percebeu em países como Coréia do Sul e Taiwan. Em contraposição, Sen (2000) apresenta casos como o da Índia e do Brasil. A Índia não possuía o preparo social necessário para aproveitar todos os benefícios da economia voltada para o mercado. O mesmo ocorre com o Brasil, “onde a criação de oportunidades sociais tem sido mais lenta, agindo assim como uma barreira para o desenvolvimento econômico” (SEN, 2000, p. 61). Apesar de apresentar um aumento expressivo do PNB per capita quase comparável a outros países de crescimento elevado, o Brasil “tem uma longa história de grave desigualdade social, desemprego e descaso com o serviço público de saúde” (SEN, 2000, p. 62). A necessidade de políticas públicas que priorizam a qualificação profissional é evidente diante da “premissa de que mais educação pode proporcionar melhores oportunidades de emprego, rendimento e ascendência na carreira” (REIS, 2012, p.18). Destaca-se, ainda, que os postos de trabalho são cada vez mais caracterizados por procedimentos tecnológicos e baseados em informação, demandando colaboradores altamente qualificados. Um país é competitivo quando sua população possui um alto nível de capacitação. Como afirma Evangelista (2009, p.19) “a educação e a qualificação profissional são fatores fundamentais para o desenvolvimento das nações pobres e a manutenção da hegemonia econômica e política dos países industrializados”. Kliksberg (apud EVANGELISTA, 2001, p. 31) ressalta que “a taxa de retorno em educação é uma das mais altas possíveis para uma sociedade”. O cenário mundial corrobora para o exposto acima, conforme o GRÁF. 1 a média de anos de estudo por nível educacional (15 anos de estudo ou mais) é crescente, tanto para os países em desenvolvimento quanto para os desenvolvidos. Gráfico 1: Média de Anos de Estudo, por Nível Educacional (15 anos de idade ou mais) Fonte: Barro e Lee (2010) Apud Reis (2012) É importante lembrar que os retornos do investimento em educação vão além de melhores salários ou elevação da empregabilidade. Uma boa formação possibilita a expansão das liberdades, fazendo com o indivíduo assuma uma posição de agente e não de paciente. Segundo Sen (2000), há uma clara distinção entre “paciente” e “agente”, na qual paciente é visto de forma mais passiva aos acontecimentos ao seu redor, enquanto o agente interfere ou tem a liberdade de interferir de forma crítica nos acontecimentos. Para a visão do desenvolvimento como liberdade é necessário promover a condição de agente, de forma que: com oportunidades sociais adequadas, os indivíduos podem efetivamente moldar seu próprio destino a ajudar uns aos outros. Não precisam ser vistos sobretudo como beneficiários passivos de engenhosos programas de desenvolvimento (SEN, 2000, p. 26) Dentro do mesmo pensamento Alfred Marshall demonstra que os indivíduos que receberam educação abandonam o caráter alienador, de forma que passam a dar mais valor ao lazer do que acréscimos de renda. Nesse sentido, percebemos como a educação é decisiva na formação de cidadãos capazes de promover mudanças, além de ser um importante meio para se combater à exclusão social. 2.3 - Modelos neoclássicos de desenvolvimento. Quando falamos de educação profissional, envolvemos conceitos relacionados aos efeitos que a capacitação profissional gera na sociedade e no desenvolvimento do país. Se o governo objetiva o crescimento econômico é importante compreender a necessidade e importância do investimento em educação técnica e tecnológica. O modelo neoclássico de desenvolvimento é importante para entendermos a dinâmica do crescimento, pois suas hipóteses consideram que o crescimento se dá pelo aprendizado e pela utilização eficaz de tecnologias existentes de maneira exógena2. O modelo procura explicar por que alguns países adotam padrões tecnológicos mais avançados que outros, e como ocorre essa difusão. O modelo parte do princípio que um trabalhador com mais qualificação tem mais habilidades e pode utilizar mais bens de capital que aquele pouco qualificado, considerando essa diferenciação na função de produção (Y), a qualificação de um indivíduo (h) está presente como um potencializador da mão de obra (L): Y = Kª (hL)¹-ª Para os neoclássicos a qualificação se define como “o conjunto de bens intermediários que uma pessoa aprendeu a utilizar” (JONES, 2000, p. 107). Outras variáveis presentes no modelo referem-se ao tempo que a pessoa destina à acumulação de qualificações para se aproximar cada vez mais da fronteira tecnológica mundial, que é o mesmo que bens de capitais inventados até o presente momento. Diante de algumas manipulações matemáticas e considerações o modelo chega a importantes conclusões ao relacionar as variáveis apresentadas: i) Demonstra que quanto mais tempo as pessoas se dedicam a qualificação, mais se aproximam da fronteira tecnológica, o que significa dizer que serão mais ricas e desenvolvidas. ii) O produto por trabalhador cresce à medida que aumenta seu nível de qualificação, essa conclusão ajuda a explicar por que a agricultura do EUA é mais desenvolvida que da África subsaariana, onde prevalecem a métodos intensivos de mão de obra. Essa diferenciação tem relação com a qualificação da mão de obra e assimilação de novos processos, a mão de obra estadunidense é muito mais qualificada, o que permite utilizar 2 Variáveis exógenas são aquelas que são determinadas fora do modelo, ou seja, para o Modelo Neoclássico a Tecnologia é dada externamente, e os países que assimilam melhor essa tecnologia “dada” apresentam maiores taxas de crescimento. forma mais eficiente novas máquinas ou fertilizantes. A situação é consequência do tempo que a pessoa destina a acumulação de qualificações (h), países em desenvolvimento apresentam menos tempo no aprendizado de novas tecnologias e consequente atraso ou afastamento da fronteira tecnológica. Pode-se perceber que a qualificação profissional ganha notoriedade no modelo. Exemplos empíricos são observados quando se procura compreender os fatores de crescimento de economias como Bélgica, Cingapura, Coreia do Sul ou China. Esses países assimilaram muito bem as inovações tecnológicas disponíveis e apresentaram um crescimento superior a países com tradição na formulação de novas ideias. Vários outros fatores nos ajudam a entender a dinâmica do crescimento de alguns países asiáticos, como reformas políticas e econômicas, entretanto, o modelo apresentado ilustra bem como a qualificação é importante ao crescimento de qualquer país. Quanto ao Brasil o trabalho de Barros e Mendonça (1995) levanta questões importantes com relação à participação da variável educação para explicar a desigualdade social. Segundo os autores: No Brasil, cada ano de escolaridade adicional tende a elevar o nível salarial de um trabalhador em aproximadamente 15% (...) No entanto o valor de um ano adicional de educação varia com o nível educacional. Para um trabalhador com apenas os quatro primeiros anos do primeiro grau (antigo primário), um ano adicional de estudo tende a elevar o salário em menos de 15%, enquanto para um trabalhador com nível secundário e superior um ano adicional de estudo leva a aumentos de salário superiores a 15% (BARROS e MENDONÇA, 1995, p. 51) Langoni (2005) também procura compreender os altos níveis de desigualdade de renda no Brasil. Para tal fim, o autor aplica métodos econométricos3 as variáveis: nível educacional, idade, sexo, atividade e região. Diante de suas conclusões, percebe-se a importância da educação como uma importante variável para se explicar os diferenciais de renda entre os trabalhadores brasileiros, sugerindo a redução dos desníveis educacionais como forma de atenuar desníveis salarias. Na teoria econômica, é recorrente a afirmativa que só há crescimento na presença de inovações tecnológicas. Pensadores como Solow e Romer defendem a necessidade estratégica de se investir na educação para o desenvolvimento de novas tecnologias ou ideias. Mesmo quando o país não é pioneiro na formulação de novos processos ou inovações, é 3 Compreende-se como métodos econométricos a aplicação de ferramentas estatísticas com o objetivo de entender a relação entre variáveis econômicas através da aplicação de um modelo matemático. importante investir na educação profissional e tecnológica pública, visto que para se tirar proveito dessas ideias é necessário primeiro saber utilizá-las. Ou seja, é necessário elevar o nível de qualificação da mão de obra, a fim de se utilizar os progressos tecnológicos disponíveis de forma eficiente. 2.4 - Educação profissional e os modelos de Solow e Romer Em 1987 Robert Solow recebeu o prêmio Nobel de economia pelas suas contribuições à compreensão do crescimento econômico. O modelo de Solow diz que para um país crescer é necessário acumulação de capital, progresso tecnológico e aumento da força de trabalho. Sua teoria surge em resposta ao que Harold a Domar havia anteriormente apresentado. Para Solow no longo prazo havia uma trajetória relativamente estável de crescimento dos mercados sem que necessariamente haja uma intervenção constante do estado, como recomendado por Harold e Domar. Dessa forma, Solow é importante para pesquisa em questão já que destaca a importância do progresso técnico como motor do crescimento econômico. Solow aponta como fontes de crescimento o trabalho, o capital e o progresso tecnológico. Conforme as hipóteses do modelo, o conhecimento tecnológico está à disposição de todos os países. Em relação ao trabalho, novos conhecimentos técnicos maximizam o insumo mão de obra, fazendo com que um mesmo trabalhador produza mais e melhor em virtude de aperfeiçoamentos na realização da tarefa ou em virtude da capacitação de trabalhadores. A função de produção (Y) engloba o progresso tecnológico (T) como uma variável que maximiza o trabalho (L), ou seja, quando o país investe em educação profissional ele consequentemente eleva a produtividade da mão de obra empregada. Y = ƒ (K, TL) O trabalho cresce estimulado por dois fatores; além do crescimento populacional, a maior produtividade do trabalhador é incentivada pelo progresso técnico, sendo assim, a “alteração tecnológica aumenta a taxa de crescimento do estado estável da economia, pois aumenta a taxa de crescimento da força de trabalho em unidades efetivas” (Sachs e Larrain, 1995, p. 641). Jones (2000, p.23) também apresenta uma importante contribuição das alterações tecnológicas ao modelo quando reforça que “o modelo com tecnologia revela que o progresso tecnológico é a fonte do crescimento” Diante das formulações de Solow podemos chegar a conclusões importantes como: países que possuem altas razões entre investimento per capita ou por trabalhador tendem a ser mais ricos, tudo o mais se mantendo constante. Percebemos que o aumento de capital por trabalhador possibilita auferir maiores ganhos, já que aumenta também o produto por trabalhador. É importante notar que em economias pobres há uma grande necessidade de alargamento do capital por trabalhador, face ao grande aumento populacional e a manutenção da relação capital produto. Conforme Jones (2000), o estudo de Solow tem grande importância prática. em geral, as previsões do modelo de Solow são sustentadas por dados empíricos. Países com alta taxas de investimento tendem a ser, em média, mais ricos que os países que registram taxas de investimento menores, e os países com altas taxa de crescimento populacional são mais pobres, em média. (p. 62) Os dados empíricos utilizados por Charles L. Jones em seu livro “Introdução à teoria do crescimento econômico” relacionam PIB por trabalhador versus taxa de investimento e PIB por trabalhador versus taxas de crescimento populacional. Nas duas comparações percebe-se a confirmação da teoria por dados empíricos, já que países desenvolvidos ficam claramente separados dos países mais pobres. A questão central dos modelos de crescimento é tentar entender por que há essa diferenciação, e por que alguns países tão ricos e outros tão pobres. Segundo Jones (2000, p.30), os Estados Unidos têm grande poderio econômico “por que investe mais e tem menores taxas de crescimento populacional, o que permite acumular mais capital por trabalhador e, assim, aumentar a produtividade por trabalhador”. A grande contribuição do progresso tecnológico para o modelo reside no fato que, segundo Solow, a tendência é ocorrer retornos decrescentes de escala. Alterações tecnológicas acabam compensando essa tendência, e no longo prazo, os países crescem a taxa do progresso tecnológico. As críticas ao modelo de Solow argumentam que o autor não explica o porquê dos diferentes níveis de investimentos entre os países. Outra pergunta sem resposta para alguns críticos é por que a produtividade ou nível de tecnologia de alguns países são mais elevados em relação a outros. Paul Romer parte da seguinte ideia “à medida que os indivíduos progridem do uso de enxadas e bois para o uso de agrotóxico e tratores, a economia cresce” (JONES, 2000, p.32). Sabemos que a origem das inovações tecnológicas são as ideias. A economia das ideias de Romer oferece importantes elementos ao entendimento dessa dinâmica e suas implicações ao crescimento econômico. Quando uma boa ideia é lançada logo se transforma em um processo que contribui para a elaboração de um produto melhor. O campo das ideias não é limitado apenas por processos industriais como novas máquinas e produtos, podemos aplicar esse raciocínio de variadas formas, como a criação de uma nova abordagem varejista empreendida pela rede Wal-Mart, ou mesmo o lançamento de refrigerantes dietéticos que dinamizam o mercado consumidor. A grande contribuição de Romer é tornar o processo tecnológico como endógeno ao processo de crescimento econômico, pois para ele o motor do desenvolvimento da economia está na pesquisa e desenvolvimento (P&D) de novas ideias. O modelo de Romer em muito se assemelha ao de Solow, entretanto, para Romer capital e trabalho se combinam utilizando um estoque de ideias, a grande diferenciação está nas considerações referentes ao progresso tecnológico. Para ele, grande parte do conhecimento criado é subsidiado por conhecimentos disponíveis (estoque de ideias) que originaram de outros pensadores, da mesma forma que os pensadores atuais não conseguem mensurar muito bem suas contribuições futuras, é o que o autor chama de “transbordamento das ideias”. Neste modelo, assim como nos demais modelos neoclássicos, o progresso tecnológico desempenha um papel fundamental no crescimento econômico. Se não houver progresso tecnológico ou novas ideias não há crescimento. O progresso tecnológico recebe uma grande notoriedade dentro das teorias neoclássicas de desenvolvimento. Como vimos anteriormente, não há crescimento na ausência de progresso tecnológico. Tecnologia pode ser conceituada como uma teoria técnica que auxilia o homem a atingir determinados fins, o que resulta em melhoras no processo produtivo (SANDRONI, 1999, p.54). Jones (2000) também define tecnologia como “a maneira como os insumos são transformados em produtos no processo produtivo”. Percebe-se que não se fala em progresso tecnológico desvinculado da educação já que “o uso de conhecimentos tecnológicos na produção pressupõe uma adequação da mão de obra nela empregada (escolaridade, treinamento, experiência)” (SANDRONI, 2000, p. 594). 2.5 - Formação profissional e desenvolvimento regional. Uma cidade ou região que apresenta um elevando nível de capacitação da sua população possui maior capacidade de se interagir e gerar novas ideias entre seus habitantes (JONES, 2000, p.48). Como discutido anteriormente, o crescimento do estoque de capital humano é uma importante ferramenta na promoção do crescimento e desenvolvimento a nível local. Nesse sentido, é necessário considerar determinantes locais quanto se fala de educação profissional; essas considerações implicam em contextualizar as demandas regionais com a oferta de cursos profissionalizantes. Quando tentamos entender o desenvolvimento regional, englobamos algumas variáveis políticas, econômicas e sociais. Como nosso enfoque é contribuição potencial do ensino profissional para o desenvolvimento, vamos enfocar a variável educação como uma importante determinante do desenvolvimento local. Na atual conjuntura econômica as explicações baseadas na teoria das vantagens comparativas e estáticas perdem a força e abrem espaço para formulações mais dinâmicas, baseadas em vantagens adquiridas, na qual se destacam economias que possuem a capacidade de inovar e gerar conhecimento. Na economia industrial, os empreendimentos tinham como premissa a economia de escala. Hoje, por outro lado, o modelo de produção na sociedade do conhecimento é a flexibilidade, criatividade, a capacidade e a iniciativa, são atributos essenciais do novo profissional, para atender consumidores que exigem baixos custos, qualidade e real necessidade em um único produto. (SILVA, 2005, p. 42) Dessa forma, o potencial produtivo é mensurado diante da capacidade efetiva de criar essas vantagens. Um exemplo é a Coreia do Sul ou Japão, países que não possuíam muitos recursos naturais, mas alcançaram um elevado nível de desenvolvimento apoiados na indústria, serviços e processos inovadores. Esse processo de inovação é ainda mais acelerado com o advento da globalização e aumento da concorrência, na qual as empresas não conseguem a exclusividade do conhecimento técnico por um período muito longo, é a chamada “destruição criadora” elaborada por Schumpeter, na qual as economias realimentam o ciclo inovativo para que possam se reestabelecer no mercado. Diante da importância das inovações tecnológicas para o desenvolvimento das economias, a capacitação profissional torna-se um pré-requisito para se alcançar o sucesso produtivo e comercial. Essas vantagens criadas ou bem assimiladas tornam-se cada vez mais localizadas e determinadas por variáveis regionais, como bem apresenta Porter (1990) apud Diniz (2004, p.16) “Diferenças nas estruturas econômicas, valores, culturas, instituições e histórias nacionais contribuem profundamente para o sucesso competitivo”. Dessa forma, para que a empresa possa manter-se centrada no processo inovativo deve-se considerar a capacidade de se criar novos produtos ou processos, além da capacidade local de aprendizado, no intuito de criar coletivamente um processo constante de transformação. A capacidade local de competição é definida quando determinada cidade ou região apresenta um estoque considerável de capital humano, interações entre as firmas, escolas, universidades e centros de treinamento; integração entre vendedores e compradores; presença de instituições inovadoras e atuação eficiente de entidades públicas e privadas nas áreas de educação, inovação e suporte empresarial. (ASHEIM e COOKE, 1997, apud DINIZ, 2004, p.10) Para ilustrar a discussão o GRÁF. 2 apresenta como a educação contribui para o crescimento local. Gráfico 2: Anos de estudo e crescimento local – 1991-2000 Fonte: Chomitz. (2005) apud Ipea (2010) O eixo horizontal demonstra à média dos anos de estudos dos municípios brasileiros, e o eixo vertical a evolução dos salários nesses municípios durante a década de 1990. Conforme os anos de estudo aumentam os salários acompanham o crescimento, de forma que há uma clara relação positiva entre nível educacional e aumento dos rendimentos locais no período analisado. O desenvolvimento regional é em grande parte influenciado pelo processo de conhecimento e inovação, de forma que dentro de um contexto local, as escolas, universidades e centros de pesquisa, ganham grande importância como instituições que incorporam mudanças, subsidiando novos processos e produtos, além da formação de profissionais necessários ao sucesso de qualquer empresa. 2.6 - Considerações Finais O presente trabalho buscou compreender a relação existente entre a educação profissional e o desenvolvimento. Tal relação foi validada por meio de teóricos que apresentaram evidências observadas e comprovadas da teoria do capital humano. Também ressaltou-se a importância da educação profissional para atender às mudanças no mercado de trabalho advindas da adoção de novos processos gerados por inovações tecnológicas. A grande motivação de todos os modelos apresentados anteriormente baseia-se em compreender por que alguns países são mais ricos que os outros, em todos eles, apesar de suas particularidades, o desenvolvimento ou assimilação de novas tecnologias se manifestaram como um motor do crescimento econômico. O que nos conduz a conclusão de que um país que objetiva crescer necessita primeiramente incentivar novas ideias, capacitar a mão de obra disponível e investir em pesquisa e desenvolvimento (P&D). Os modelos evidenciam que é essencial para um país possuir uma população que produz conhecimento ou sabe se utilizar e maximizar aqueles já existentes, de forma que a qualificação através da educação se torne uma importante ferramenta na promoção do desenvolvimento socioeconômico sustentado. 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