UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO
DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS
PROJETO A VEZ DO MESTTRE
ANÍSIO TEIXEIRA E A REVOLUÇÃO EDUCACIONAL DO
ESCOLANOVISMO
POR: FRANCISCO JUCEILDO LEAL
ORIENTADOR: PROF. ANTONIO FERNANDO VIEIRA NEY
RIO DE JANEIRO, MARÇO / 2004.
1
PÓS-GRADUAÇÃO ‘LATU SENSU’
PROJETO A VEZ DO MESTRE
ANÍSIO TEIXEIRA E A REVOLUÇÃO DO ESCOLANOVISMO
Apresentação de monografia à Universidade
Cândido Mendes como condição prévia para
a conclusão do Curso de Pós-Gradução
“Latu Sensu” em Docência do Ensino
Superior.
Por: Francisco Juceildo Leal
2
RESUMO
A presente monografia faz um percurso sobre a vida e o pensamento de Anísio
Teixeira,
apontando-o
como
um
grande
administrador,
um
educador
revolucionário e o maior filósofo da educação brasileira. Enfocamos
principalmente sua participação no Movimento Renovador da Educação
brasileira no início do século passado, a chamada ESCOLA NOVA.
RIO DE JANEIRO, MARÇO / 2004.
3
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
2
CAPITULO I –
TRAÇOS BIOGRÁFICOS
CAPITULO II –
O PENSAMENTO DE Anísio TEIXEIRA
CAPÍTULO III –
O MANIFESTO DOS PIONEIROS DA EDUCAÇÃO
E O MOVIMENTO ESCOLANOVISTA.
4
10
18
CONCLUSÃO
24
BIBLIOGRAFIA
27
4
INTRODUÇÃO
Anísio Spínola Teixeira é considerado por todos os que se
propuseram a analisar suas idéias e sua ação no campo educacional um dos
autores de maior importância no cenário educacional brasileiro. Portanto, falar
sobre um educador de tamanho prestígio não é, de fato tarefa simples, mas
bastante complexa.
Anísio, além de professor, foi filósofo da educação, político e
administrador, fundador de escolas e universidades, e participou ativamente da
política educacional do país, sendo um de seus formuladores.
5
Em nosso estudo, tentaremos traçar sua trajetória destacando seus
pensamentos sobre filosofia e política educacionais, que a nação deveria seguir
para alcançar o desenvolvimento, a igualdade de todos cidadãos e, assim,
formar uma sociedade humanitária e desenvolvida.
Suas principais idéias sobre a educação eram promover a escola
pública gratuita e universal, e tornar o ensino algo prático, com o
desenvolvimento de experiências práticas em sala de aula. Ele era um grande
defensor das idéias deweyanas de que todo conhecimento autêntico vem da
experiência, essa foi uma das bases do movimento da Escola Nova.
Nosso trabalho está dividido em três capítulos. No primeiro capítulo,
traçaremos o perfil de Anísio Teixeira para mostrar quem foi esse grande
educador e como foi sua trajetória em busca de seu maior sonho: a educação
pública e gratuita para todos.
No segundo capítulo, apresentaremos o pensamento anisiano sobre
a educação, considerada o único bem capaz de tornar a sociedade mais justa,
com oportunidade para todos viverem bem.
Finalmente, no terceiro e último capítulo, buscaremos analisar sua
participação no maior movimento já acontecido neste país em defesa da
educação pública o Manifesto dos Pioneiros da Educação de 1932, e sua luta
para implantar no país os ideais da Escola Nova, uma verdadeira revolução
educacional.
6
CAPÍTULO I
TRAÇOS BIOGRÁFICOS
Anísio Spínola Teixeira nasceu em 12 de julho de 1900, na cidade
de Caiteté, Bahia, filho de Deocleciano Pires Teixeira e Anna Spínola Teixeira.
As famílias Teixeira e Spínola eram possuidoras de grandes extensões de terra,
portanto, eram senhores pertencentes à burguesia rural e eram detentoras de
prestígio e poder. Foi neste ambiente aristocrático que nasceu Anísio Teixeira.
Aos sete anos iniciou seus estudos na própria cidade, no Instituto Jesuíta São
Luís de Gonzaga. Em 1914, foi para Salvador para concluir o secundário no
Colégio Antonio Vieira, também dirigido por padres da Companhia de Jesus. A
formação religiosa, moral e intelectual que recebeu dos jesuítas serviu de
arrimo para toda a vida, pautou sua trajetória de homem íntegro, e ajudou a
conquistar a elevada consideração de que sempre gozou entre os que o
conheceram e com ele conviveram. Na juventude, quis ingressar na Companhia
de Jesus e tornar-se sacerdote, o lhe que foi impedido pelo pai, que o queria
político e o mandou para o Rio de Janeiro, onde ingressou na Faculdade de
Direito da Universidade do Rio de Janeiro e concluiu o curso, com brilhantismo
em 1922.
Anísio Teixeira iniciou-se na vida pública em 1924, quando recebeu
o convite do Governador da Bahia, Francisco Marques de Góes Calmon, para
ocupar o cargo de Inspetor-Geral do Ensino da Bahia, — cargo equivalente ao
de secretário de Estado. Naquela oportunidade, realizou a Reforma da
Instrução Pública do Estado da Bahia, que se inscreve entre as grandes
reformas estaduais de ensino ocorridas na década de 1920, outra importante
reforma foi a do Ceará, feita por Lourenço Filho, e juntas funcionaram como
7
forças propulsoras de todo o movimento de renovação educacional ocorrido no
país logo a seguir.
Ainda no exercício deste cargo, ele viajou em 1927 para os Estados
Unidos, onde observou o Sistema de Ensino Americano, publicando logo após
seu retorno o livro “Aspectos Americanos da Educação”. No ano seguinte voltou
aos EUA e matriculou-se no Teachers College da Universidade da Colúmbia
onde obteve o título Master of Art´s com especialização em Educação. Naquela
ocasião, Anísio Teixeira manteve contato com o grande filósofo americano John
Dewey, que marcou decisivamente sua trajetória intelectual. Tornou-se
discípulo e amigo de Dewey e propagador de sua obra e ideologia no Brasil —
inclusive traduzindo para o português toda a sua obra. De volta ao Brasil,
demitiu-se do cargo de Inspetor por incompatibilidade com Batista Soares, o
novo governador da Bahia. Foi então nomeado docente da Escola Normal de
Salvador para lecionar Filosofia e História da Educação. (FÁVERO: 2002:71)
Em 1930, publicou a primeira tradução de dois ensaios de Dewey,
que, reunidos, receberam o título de Vida e Educação. Em 1931, transferiu-se
para o Rio de Janeiro como funcionário do recém-criado Ministério da Educação
e Saúde, e participou da comissão que tinha por finalidade a reorganização do
ensino secundário no Brasil. Em seguida, a convite do prefeito Pedro Ernesto
Batista, assumiu o cargo de diretor-geral do Departamento de Educação e
Cultura do Distrito Federal, substituindo o educador paulista Fernando Azevedo.
Neste cargo, de 1931 a 1935, deu início a um conjunto de medidas
organizacionais para estruturar o ensino em vários níveis — do primário ao
superior —, reforma educacional que o projetou nacionalmente. Em março de
1932, fundou o Instituto de Educação. No mesmo ano, na cidade de Salvador,
casou-se com Emília Telles Ferreira, e juntos tiveram quatro filhos.
Em 1935 criou a Universidade do Distrito Federal, que se constituía
das seguintes escolas: Faculdades de Filosofia e Letras; Faculdades de
8
Ciências, de Economia Política e de Direito; Instituto de Artes Escola de
Educação. Porém, não assumiu a Reitoria e nomeou para o cargo Afrânio
Peixoto, por considerá-lo de maior peso político. Em 1º de dezembro de 1935,
demitiu-se do cargo no Departamento de Educação por motivos políticos,
refugiando-se na fazenda de sua família em Caetité, Bahia. Permaneceu lá
durante
todo o período do Estado Novo (1937 a 1945), momento que
representou uma fase difícil para o educador Anísio Teixeira, quando afastou-se
das atividades educacionais e dedicou-se à exploração e exportação de
manganês, calcário, cimento e à comercialização de automóveis. Também
traduziu livros e manteve uma intensa correspondência com amigos
educadores. (FERRO: 1984: 4).
Em 1946, a convite de Julian Huxley viajou para Londres onde
assumiu a função de Conselheiro para o Ensino Superior da Unesco. No ano
seguinte, regressou ao Brasil voltando ao cenário da educação e assumiu a
Secretaria de Educação e Saúde do Estado da Bahia. Fundou, então, o Centro
Educacional Carneiro Ribeiro, com uma nova filosofia de ensino que visava
oferecer aos jovens uma educação integral. Esse sistema de ensino serviu de
modelo educacional e foi implantado em Brasília e nos CIEPS de Darcy Ribeiro.
Em 1950, foi agraciado com o título de Oficial da Legião de Honra da
França, mais um reconhecimento de âmbito internacional do valor deste
educador brasileiro. No ano seguinte retornou à ação no plano federal,
assumindo o cargo de Secretário-Geral da Campanha de Aperfeiçoamento do
Pessoal do Ensino Superior (CAPES)1. Nesse período também exerceu o cargo
de Diretor do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos, época de intenso
trabalho em prol da Educação Nacional. Impulsionou também os cursos de pósgraduação, dinamizou o Inep orientando-o para a pesquisa e criou o Centro
Brasileiro de Pesquisas Educacionais, que se desdobrou em Centros Regionais
1
Hoje, Coordenação do Pessoal do Ensino Superior (CAPES).
9
como os de São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Bahia e Pernambuco.
Foi importante que esses dois órgãos ficassem simultaneamente sob a direção
de Anísio Teixeira, pois isso facilitou grandemente a articulação de suas ações,
que se apresentaram de modo integrado beneficiando a pesquisa educacional.
Em 1956 foi lançado o livro: A educação e a crise brasileira, e a vida
intelectual de Anísio Teixeira se intensificou com mais participações em
inúmeros eventos
educacionais no Brasil e no exterior, entre os quais se
destacaram: Conferência Regional sobre Educação Primaria Gratuita e
Obrigatória na América Latina; 2ª reunião Internacional de Ministros da
Educação, em Lima , no Peru; e 1ª Conferência de Pesquisa Educacional,
realizada nos Estados Unidos. Naquele ano, proferiu a conferência Escola
Pública Universal e Gratuita, tema pelo qual tinha verdadeira obsessão e que é
considerado pelo seus críticos um de seus trabalhos mais brilhantes. No ano
seguinte publicou a famosa obra Educação não é privilégio, e passou a lecionar
Administração Escolar e Educação Comparada na Faculdade Nacional de
Filosofia da Universidade do Brasil. Durante esse período continuou com uma
atividade intelectual muito intensa, participando de vários eventos na América
Latina, Estados Unidos e Europa.
Em 1961, participou, no Líbano, da Comissão de Peritos para o
Estudo Internacional da Admissão à Universidade, e no mesmo ano integrou o
Comitê Internacional para o desenvolvimento da Educação de Adultos, em
Paris. Também participou ativamente da Reunião anual do Conselho de
Educação Superior nas Repúblicas Americanas, nos Estados Unidos.
A partir de 1962, tornou-se membro o Conselho Federal de
Educação e , no mesmo ano, a Universidade da Bahia lhe conferiu o título de
“Doutor Honoris Causa”. Em 1963 foi convidado para ministrar cursos na
Universidade
de
Colúmbia,
nos
Estados
Unidos.
Pelo
seu
brilhante
desempenho e como reconhecimento pela sua obra de educador, foi agraciado
10
com a “Medalha de Honra por Serviços Relevantes do Teachers College da
mesma universidade. Em seguida foi nomeado Reitor da Universidade de
Brasília, de cuja fundação participou juntamente com Darcy Ribeiro, e nesta
função permaneceu até 1964.
Em 1964 eclodiu um golpe de estado com a tomada do poder pelos
militares que implantaram uma das mais longas e cruéis ditaduras no Brasil.
Como intelectuais “não interessam à revolução”, o professor foi afastado de
suas funções e aposentado compulsoriamente. Com autorização especial do
presidente Castello Branco, embarcou para o Estados Unidos para lecionar em
diversas universidades americanas como a Universidade de Colúmbia e da
Califórnia entre outras.
Voltou ao Brasil em 1966 e prestou serviços de consultoria à
Fundação Getúlio Vargas e Cia. Editora Nacional, atividades que exerceu até o
final de sua vida. Lançou em 1967 mais duas obras fundamentais voltadas para
Educação: A Educação é um Direito e Pequena Introdução à Filosofia da
Educação. Em 1969 publicou os seus últimos trabalhos: Educação e Mundo
Moderno e Educação no Brasil. A Universidade Federal do Rio de Janeiro, em
1970, conferiu- lhe a última homenagem em vida, agraciando-o com o título de
Professor Emérito. (FÁVERO: 2002: 77).
Anísio Teixeira faleceu em 11 de março de 1971, em circunstâncias
pouco esclarecidas, no fosso de um elevador do prédio onde morava Aurélio
Buarque de Holanda, pois havia ido até sua residência fazer-lhe uma visita. A
polícia considerou sua morte acidental, mas a família do educador suspeita que
ele possa ter sido vítima da repressão do governo militar — sabe-se que aquela
época representou um dos períodos mais violentos da ditadura militar,
comandada pelo general Médici.
11
Quando faleceu aos 70 anos, Anísio estava em pleno vigor e
capacidade de trabalho, produzindo, incentivando e indicando rumos para a
solução dos problemas educacionais do país. Sua morte foi chocante — não
apenas pela maneira inexplicável e brutal como aconteceu, mas por retirar do
cenário nacional um
filho que
tão
decididamente contribuiu
para o
engrandecimento de seu povo e que lutou bravamente por estender a educação
a todos os brasileiros. Por toda esta brilhante trajetória de vida, Anísio Teixeira
pode ser considerado o grande democrata da educação brasileira. (FERRO:
1984 : 6).
12
CAPÍTULO II
O PENSAMENTO DE ANÍSIO TEIXEIRA
Para compreender o pensamento de Anísio Teixeira, devemos situálo no movimento educacional renovador brasileiro, cujas bases encontram-se
no escolanovismo surgido em fins do século XIX na Europa e nos Estados
Unidos. Este movimento opunha-se às práticas pedagógicas tidas como
tradicionais, visando uma educação que pudesse integrar o indivíduo na
sociedade e, ao mesmo tempo, ampliar o acesso de todos à escola.
"O escolanovismo desenvolveu-se no Brasil no momento em que o país
sofria importantes mudanças econômicas, políticas e sociais. O acelerado processo de
urbanização e a expansão da cultura cafeeira trouxeram o progresso industrial e
econômico para o país, porém, com eles surgiram graves conflitos de ordem política e
social, acarretando assim uma transformação significativa da mentalidade intelectual
brasileira. No cerne da expansão do pensamento liberal no Brasil, propagou-se o ideário
escolanovista. (Gallo:2003:1)
O escolanovismo brasileiro está ligado a certas concepções de John
Dewey, que acredita ser a educação o único meio realmente efetivo para a
construção de uma sociedade democrática, que respeite as características
individuais de cada individuo, inserindo-o em seu grupo social com respeito à
sua
unicidade,
mas,
como
parte
integrante
e
participativa
de
um
todo.(Dewey:1959:18). Anísio Teixeira, o mais importante seguidor das idéias
deweyanas no Brasil, vê a sociedade em constante transformação, tanto social
como econômica e politicamente. A escola, por sua vez, deveria formar
indivíduos aptos a refletir e inserir-se nessa sociedade, considerando sua
liberdade individual e sua responsabilidade diante do coletivo. Logo, o resultado
da educação escolarizada deveria ser o indivíduo integrado à democracia, ou
seja, o cidadão democrático. Teixeira vê a sociedade como dinâmica e em
13
pleno curso de transformação. Ciente do momento propício para a consolidação
de uma sociedade mais justa e igualitária — a sociedade democrática —,
Teixeira propõe não só a transformação dos conceitos educacionais, mas a
reestruturação moral e social da sociedade.
“Segundo Anísio, a escola é local propício para a construção desta
consciência social. Nela o indivíduo adquire valores; nela há condições para formar o ser
social. Como a escola visa formar o homem para o modo de vida democrático, toda ela
deve procurar, desde o início mostrar que indivíduo, em si e por si, é somente
necessidades e impotências; que só existe em função dos outros e por causa dos
outros; que a sua ação é sempre uma trans-ação com as coisas e pessoas e que o saber
é um conjunto de conceitos e operações destinados a atender àquelas necessidades,
pela manipulação acertada e adequada das coisas e pela cooperação com os outros no
trabalho que, hoje, é sempre de grupos, cada um dependendo de todos e todos
dependendo de cada um. A escola deve ser agente da contínua transformação e
reconstruções sociais, colaboradoras da constante reflexão e revisão social frente à
dinâmica e mobilidade de uma sociedade democrática: o conceito social de educação
significa que,
cuide a escola de interesses vocacionais ou interesses especiais de
qualquer sorte, ela não será educativa se não utilizar esses interesses como meios para
a participação em todos os interesses da sociedade... Cultura ou utilitarismo serão ideais
educativos quando constituírem processo para uma plena e generosa participação na
vida social” (TEIXEIRA: 1930: 88-89).
A concepção filosófica de educação e de sociedade que sustentou o
ideário escolanovista e, em grande parte, a filosofia da educação de Teixeira, é
caracterizada por um humanismo-tecnológico que marcou uma ruptura com a
tradição filosófica humanista-cristã. A fundamentação pragmática da educação
e dos valores que deveriam ser apresentados e vivenciados na escola foi feita a
partir da filosofia de Dewey e da sociologia de Durkheim. As idéias destes dois
autores possibilitaram aos intelectuais e educadores renovadores compreender
o processo de modernização da sociedade brasileira e, conseqüentemente, a
necessidade de um novo ensino e de uma nova escola. À democracia, à
liberdade e à ciência como valores da sociedade moderna correspondia um
14
estudo científico dos problemas educacionais brasileiros, abandonados até
então, à sua própria sorte.
A educação brasileira, para Teixeira, refletia, ainda nos anos 60, os
modelos dos quais se originou.
"Em linhas gerais, a filosofia da educação dominante é a mesma que nos
veio da Europa e que ali começa agora a modificar-se sob o impacto das novas
condições científicas e sociais e das formulações mais recentes da filosofia geral
contemporânea. Também aqui, na medida em que nos fizermos autenticamente nacionais
e tomarmos plena consciência de nossa experiência, iremos elaborando a mentalidade
brasileira e com ela a nossa filosofia e a nossa educação" (TEIXEIRA: 1998:20).
Teixeira acreditava ser possível a reconstrução da educação
brasileira em bases científicas, rompendo com o ensaísmo e o empirismo
grosseiros que durante muito tempo dominou a reflexão sobre as questões
educacionais. Somente com um conhecimento das diferentes realidades
escolares, em todas as dimensões, seria possível uma mudança significativa na
formação dos professores. No entanto, a expressão do conhecimento da
realidade escolar, como tantas outras do discurso educacional renovador, foi
aos poucos transformando-se apenas em um slogan educacional para a maioria
dos profissionais da educação brasileira.
No papel de filósofo da educação, Anísio Teixeira compreendeu
criticamente o contexto econômico, social e cultural de seu tempo. Referiu-se
às transformações materiais que já estavam ocorrendo no Brasil — e que ainda
viriam a ocorrer —, às mudanças de valores e às novas perspectivas que se
colocavam para a sociedade brasileira. Seu otimismo para com a ciência, com o
método científico e com suas aplicações técnicas conduziram a um otimismo,
também, em relação à uma nova escola. Se a sociedade passava por
mudanças, era preciso que a escola preparasse o novo homem, o homem
moderno, para integrar-se à nova sociedade que deveria ser essencialmente
democrática. Por isso, afirmava que seria “fácil demonstrar como todos os
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pressupostos em que a escola se baseava foram alterados pela nova ordem de
coisas e pelo novo espírito de nossa civilização” (TEIXEIRA:1998:17).
O pensamento de Anísio Teixeira, como sabemos, desenvolveu-se
dentro das idéias do movimento educacional renovador brasileiro, conhecido
como Escola Nova, cuja filosofia visava a implantação de uma política nacional
de educação na qual todos tivessem acesso à escola, pois somente a
Educação é o meio de transformação social. A educação deveria ser vinculada
ao meio social e deveria utilizar-se de conhecimentos científicos e aplicá-los
nos campos teórico e prático.
Todo o pensamento anisiano está estruturado no desejo de
construção de um modo de vida mais justo para todos os cidadãos. Visava a
instauração de uma sociedade democrática como solução para o Brasil, que
passava por transformações significativas desde o final do século XIX, como a
urbanização acelerada, o processo de industrialização, a formação da classe
média urbana, a organização de trabalhadores em sindicatos e os conflitos
entre patrões e operários, entre outras. Ao mesmo tempo que tais mudanças
ensejavam idéias de crise e conflito, traziam em seu bojo a idéia de progresso,
e a transformação material do mundo fruto do desenvolvimento científico. Essas
transformações eram acompanhadas também por profundas mudanças no
campo da moral, da ética, da política e da ordem social. “A valorização e a
utilização sistematizada da ciência trouxeram a ruptura de paradigmas
inflexíveis e a busca da adequação de mentalidade à nova ordem de valores,
ou seja, o que era estático tornou-se flexível e dinâmico” (Adas: 2003:3). Esse
novo ambiente influenciado pela ciência desencadeou uma nova relação entre o
ser humano e os mundos físico, moral e social, acabando com as verdades
absolutas e estabelecendo a idéia de que toda a verdade é provisória, pois
estará sempre sujeita à comprovação.
Como a velha ordem de verdades absolutas dos séculos passados já
não atendia mais à dinâmica e à flexibilidade da nova sociedade moderna e
16
industrializada, geradora de verdades questionáveis e provisórias, Teixeira
sugeriu que o homem reavaliasse seus valores e estabelecesse uma nova
relação com a ordem social. Para isso era necessário que houvesse maior
igualdade social e que o homem evoluísse do estado pré-científico, tornando-se
um indivíduo identificado com a nova ordem de valores. Diante da nova direção
a ser tomada pela sociedade, Anísio defendeu que se lutasse pela implantação
de um modo de vida no qual todos os homens se sentissem responsáveis pelo
bem-estar social e desenvolvesse suas capacidades individuais suas aptidões
e também seu crescimento econômico para colocar-se no mundo de forma
digna materialmente, no qual todos pudessem desfrutar de suas conquistas e
benefícios. Teixeira considerava que democracia não é apenas um modo de
governo e sim um modo de vida, no qual cada indivíduo tem oportunidade de
expressão máxima de seus valores, bem como respeitar os valores dos outros.
O modo de vida democrático constitui-se em modo de vida compartilhada,
estruturado na ética, uma vez que cada indivíduo tem importância fundamental
no processo de reconstrução de valores sociais. Os princípios fundamentais na
noção de democracia anisiana são a igualdade entre os indivíduos e o aspecto
coletivo de modo de vida. Cada ser humano tem um papel a ser
desempenhado,
com
responsabilidade
e
eficiência,
em
seu
grupo,
independentemente de sua origem social. (Teixeira: 2002:27).
Anísio Teixeira desenvolveu seu pensamento baseado na crença de
que só a educação é o único meio eficaz, harmonioso para a construção de
uma sociedade democrática. Acreditava ser a Escola o lugar ideal
para o
desenvolvimento da capacidade de o indivíduo estar e atuar no seu grupo
social, ou seja para o desenvolvimento da capacidade de construção de uma
sociedade
estruturada na vida compartilhada. Cabe, portanto, à escola
desenvolver uma educação que respeite as características individuais de cada
cidadão, inserindo-o no seu grupo social como ser único, porém, também como
parte integrante e participativa de um todo a ser construído — a sociedade
democrática.
17
A escola tradicional não oferecia espaço para esse novo modo de
ver a educação, pois limitava-se a conservação dos valores existentes por meio
da transmissão do conhecimento sistematizado e normas disciplinadoras,
impedindo ao educando o desenvolvimento de suas próprias capacidades e
impossibilitando, assim, a busca do aprimoramento da sociedade. Afirma
Anísio:
“Nessa nova ordem de mudança constante e de permanente revisão, duas
coisas ressaltam, que alteram profundamente o conceito da velha escola tradicional: a)
precisamos preparar o homem para indagar e resolver por si só os seus problemas; b)
temos de construir a nossa escola, não como preparação para o futuro conhecido, mas
para um futuro rigorosamente imprevisível.” (TEIXEIRA: 2002:29)...
Estas propostas de Anísio foram escritas no ano de 34 do século
passado, continuam absolutamente atuais: a escola deve formar cidadãos para
enfrentar um “futuro rigorosamente imprevisível, e resolver por si só os seus
problemas”. É neste simples conceito que reside a essência da Escola Nova, a
preparação do cidadão para enfrentar um ambiente novo que se altera a cada
momento movido pelo progresso da ciência. Podemos dizer que naquele
momento essa era uma visão inteiramente nova de encarar a educação como
fator gerador de progresso. Anísio pensou a educação brasileira como meio
possível e único colocar o Brasil nas trilhas do progresso e, principalmente, da
democracia. Na época, a intenção foi denunciar a ordem política e social então
vigente e apontar caminhos para superá-las. O único caminho viável seria a
transformação da mentalidade elitista dos fins do século XIX e início do século
XX, buscando a implantação de uma sociedade democrática por meio da
instauração de uma educação também democrática e abrangente.
Estas idéias são realmente revolucionárias e muito atuais, já que se
aplicam na nossa época, na qual as transformações são rápidas e profundas e
as incertezas são enormes. Vivemos em um mundo em constante ebulição, e
18
apesar de Anísio ter vivido a realidade do início do século passado, descreve
com nitidez o drama da sociedade dos dias de hoje, e para enfrentarmos tantas
mudanças prega uma revolução profunda na escola.
“Como a escola deve ser uma réplica da sociedade a que ela serve, urge
reformar a escola para que ela possa acompanhar o avanço
‘material’ de nossa
civilização e preparar uma mentalidade que moral e espiritualmente se ajuste a
presente ordem das coisas. Enormes são as novas responsabilidades da escola:
educar em vez de instruir, formar homens livres em vez de homens dóceis: preparar
para um futuro incerto e desconhecido em vez de transmitir um passado fixo e claro,
ensinar a viver com mais inteligência, com mais tolerância, mais finamente e com maior
felicidade, em vez de simplesmente ensinar dois ou três instrumentos de cultura e
alguns manuaizinhos escolares... Para essa finalidade, só um novo programa, um novo
método, um novo professor e uma nova escola - podem bastar. (TEIXEIRA: 2002:42).
Anísio Teixeira lutou em toda a sua vida para transformar de fato a
escola brasileira. Em toda sua imensa obra que nos legou esse é seu tema
preferido, pois tinha verdadeira paixão pela ciência e afirmava que era ela a
verdadeira causa de toda a evolução do homem. Somente a educação daria ao
novo homem armas para enfrentar toda essa transformação da sociedade e se
integrar na comunidade e ter uma vida feliz. Afirma ele:
“A finalidade da educação se confunde com a finalidade da vida. No fundo
de todo este estudo paira a convicção de que a vida é boa e que pode ser tornada
melhor. É essa a filosofia que nos ensina o momento que vivemos. Educação é o
processo de assegurar a continuidade do lado bom da vida e de enriquecê-lo, alargá-lo
e ampliá-lo cada vez mais.
Na escola progressiva não se busca outra coisa senão a permanente
reconstrução da vida para maior riqueza, maior harmonia e maior liberdade, dentro do
ambiente de transformação e de progresso que a era industrial inaugurou.” (TEIXEIRA:
2002:54)
A educação para Teixeira tem como finalidade última formar o
homem
democrático.
Como
sabemos
19
a
democracia
não
nasce
espontaneamente numa sociedade, é tarefa da escola a construção do espírito
democrático; e tornando o ambiente escolar um convívio democrático o
indivíduo tem condições de desenvolver sua capacidade de convivência em
grupo de forma harmônica e responsável.
Teixeira pensou a educação brasileira como único meio possível para
colocar o Brasil no caminho do progresso e da democracia. Seu objetivo maior
foi denunciar a ordem política e social vigente em sua época e mostrar o
caminho para superá-la, ou seja, a transformação da mentalidade elitista e
inflexível do início do século XX, buscando a construção de uma sociedade
democrática baseada numa educação também democrática e acessível a
todos.
20
CAPÍTULO III
O MANIFESTO DOS PIONEIROS DA EDUCAÇÃO E MOVIMENTO
ESCOLANOVISTA.
A década de 1920, se caracterizou por profundas transformações no
campo cultural, principalmente após a Semana de Arte Moderna de 1922. Um
processo de grandes mudanças no campo educacional entrou em curso e as
formas antigas e persistentes do modelo até então vigente começaram a ser
negadas. Propõem-se uma modernização radical da administração, dos
conteúdos e dos métodos escolares, da disciplina, do relacionamento
aluno/professor, enfim foi contestado seguindo os passos de um movimento de
modernização geral da sociedade.
Durante as décadas de 1920 e 1930 buscou-se pela primeira vez um
projeto educacional para nação. Este processo de modernização mobilizou
profundamente os educadores que em 1924 fundaram a ABE (Associação
Brasileira de Educação), e a partir de 1927, a associação passou a realizar
Conferências Nacionais de Educação em todo o País. Esse esforço de
modernização da educação se punha a serviço do processo de industrialização
e urbanização vivido pela sociedade, bem como ao desenvolvimento das
ciências. É neste ambiente de mudança e mesmo de euforia nacionalista que
entra em pauta pela primeira vez no Brasil o debate sobre a escola pública.
Anísio Teixeira estava entre os primeiros e principais autores a abraçar e
defender a causa da escola pública e discutia a educação a partir de uma visão
de inserção da escola na comunidade. (Teixeira: 1999:20) Afirma ele:
“É por excelência a escola da comunidade, a escola mais sensível a todas
as necessidades dos grupos sociais e mais capazes de cooperar para a coesão e a
integração da comunidade, como um todo. As suas relações com a família não são algo
21
acidentais, mas relações intrínsecas, pois são mais do que tudo, suas representantes em
tudo que tenham em comum e de mais essencial” (Teixeira: 1999: 3).
A concepção de educação de Anísio Teixeira é uma simbiose
entre a comunidade e a família. Para ele a escola representa a família e não se
caracteriza por ser uma instância de natureza diferente com outro tipo de lógica.
A escola comunitária, aquela próxima da vida do aluno, é capaz de ser mais
sensível aos seus anseios. Nada deve levar a se pensar uma escola pública a
partir de um espaço diferenciado, distante da família e da comunidade. A obra
de Anísio é marcada por esta procura da escola que seja capaz de integrar e
realizar a coesão da grande comunidade. Assim, associando a escola pública e
a formação da grande comunidade, define a escola pública:
“Comum a todos, não seria instrumento de benevolência de uma classe
dominante, tomada de generosidade ou de medo, mas um direito do povo, sobretudo das
classes trabalhadora, para que, na ordem capitalista, o trabalho não se conservasse
servil, submetido e degrado, mas igual ao capital na consciência de suas reivindicações e
dos direitos” ( TEIXEIRA:1999: 36).
A idéia de escola pública de Anísio se insere em uma
conceituação de educação que traduz a característica da educação como
direito individual assegurado pelo Estado, isto é, como interesse público. Por
isso, ela é um direito de cada indivíduo e um dever da sociedade politicamente
organizada, que é o estado.
Anísio foi um dos formuladores de uma educação como um
processo de cultivo e amadurecimento individual, crescimento orgânico,
humano. Seguindo normas científicas e técnicas, ele procurou fazer da escola
um instrumento para promover a educação comum, para todos. Estabeleceu
que essa educação fosse dominantemente pública como condição para
assegurar-lhe a universalidade.
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Professando um liberalismo igualitarista, acreditava que a partir da
“nova pedagogia” se poderiam alterar as relações de subordinação impostas
pelo mundo capitalista ao homem. Afirmava ainda que a escola pública deveria
ser como um exército, em batalha, na qual as diferenças desapareceriam e
todos os brasileiros se encontrariam para uma formação comum, igualitária e
unificadora, destruindo preconceitos e prevenções. O que faz a escola pública
não é um programa, um currículo, mas simplesmente ser financiada pelo
Estado. O fundamento da escola pública não é o desenvolvimento de uma
razão publica popular, mas capacitar o indivíduo a se tornar melhor em tudo.
(Teixeira: 1999-A: 54-56)
A partir dos anos de 1930 com a ascensão de Vargas, novas
perspectivas se abriram e a educação adquiriu uma visibilidade pública que até
então não havia alcançado. Cria-se o Ministério da Educação e Saúde, em
1930, e em 1932 foi lançado o Manifesto dos Pioneiros da Educação,
considerado o marco para renovação da educação brasileira no século XX. Foi
assinado por toda a intelectualidade do eixo Rio-São Paulo, inclusive por Anísio
Teixeira, um dos líderes do movimento.
O Manifesto foi resultado das discussões desses intelectuais ligados
à educação que participavam das reuniões da ABE, e onde, na época, os
protagonistas do campo intelectual se reuniam, independentemente de
ideologias, como fascista, católica, liberais , marxistas, funcionalista, etc.
O Manifesto resultou das conclusões da IV Conferência Nacional de
Educação, que se realizou em São Paulo, em 1931, sob os auspícios da ABE e
foi proposta a reconstrução da educação nacional, e o documento tornou-se
peça importante para evolução da educação no Brasil. Foram apresentadas a
teoria pedagógica que fundamentava a chamada Escola Nova e a idéias
políticas necessárias para a concretização das propostas de renovação.
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Enumeramos a seguir as linhas básicas do programa educacional
contido no Manifesto de acordo com o estudo de Maria Luiza Santos Ribeiro:
1. Estabelecimento de um sistema educacional completo, para atender as
necessidades brasileiras, as novas diretrizes econômicas sociais da civilização atual, e
os princípios gerais da educação como função social, e a estatização do ensino, a
educação integral gratuita e obrigatória dos 7 a 12 anos.
2. Organização da escola secundária para alunos de 12 a 18 anos em tipo
flexível de nítida finalidade social como escola para o povo.
3. Desenvolvimento da escola técnica profissional de nível secundário e
superior para suprir as necessidades da nova sociedade industrial.
4. Organização de instituições e de orientação profissional.
5. Criação de Universidades públicas e gratuitas.
6. Criação de fundos escolares destinados à manutenção da educação em
todos os níveis e graus.
7. Fiscalização de todas as instituições particulares de ensino que deverão
cooperar com o estado na obra de Educação e Cultura.
8. Reorganização da administração escolar e dos serviços técnicos de
ensino em todos departamentos de ensino, visando rapidez, eficiência, controle e
aperfeiçoamento.
9. Reconstrução do sistema educacional em bases que possam contribuir
para o atendimento a todas as classes sociais e formação de uma sociedade humana
mais justa e que tenha como objeto a organização da escola unificada, desde o Jardim
da Infância à Universidade. (Ribeiro:1982:101-3).
As mudanças propostas pelo “Manifesto” foram realmente
radicais, pois o sistema educacional até então vigente era de estrutura dual,
pois se dividia em dois subsistemas: o ensino primário e profissional para os
pobres, e o ensino secundário e superior para os ricos. Ao proclamar a
educação como um direito individual que deve ser assegurado a todos, sem
distinção de classes e situação econômica; ao afirmar ser dever do Estado
assegurá-la, Teixeira prega uma verdadeira revolução na educação brasileira.
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O Manifesto pregava o fim deste sistema discriminador e a
implantação de um novo conceito de educação que abrangesse todas as
classes sociais, acabando com todos os privilégios e estabelecendo uma escola
pública e gratuita para todos. as classes privilegiadas não concordaram com
isso, e se iniciou uma cruzada contra essas idéias tidas como “comunistas”.
Primeiro acusaram os renovadores de quererem americanizar a educação
brasileira, já que todos os fundamentos da escola nova vinham das idéias
pregadas por Dewey, e finalmente de comunistas.
Grande parte dos educadores, principalmente católicos mais
conservadores e reacionários lideraram um posicionamento contra as
mudanças apresentadas e fizeram oposição cerrada contra a estatização e
laicidade do ensino. Essa oposição foi canalizada principalmente para Anísio
Teixeira e sua teoria, por ser o responsável pela divulgação da teorias
revolucionárias de John Dewey, no Brasil. Anísio passou a ser considerado o
inimigo ideológico que se deveria combater por representar um perigo para a
doutrina cristã.
Essa anisimosidade perdurou praticamente durante toda a sua vida.
Como prova disso em 196 — portanto quase meio século depois do lançamento
do Manifesto—, educadores católicos ainda lançavam artigos panfletários
contra Teixeira, sendo a “Educação segundo Anísio Teixeira, a Filosofia e a
Igreja” (1968:39). o mais virulento entre todos. Contudo, Teixeira nunca
desanimou e continuou sua luta em prol da educação brasileira, criando novos
métodos de administração escolar, fundando instituição educacionais mais
sólidas,
enriquecendo
os conteúdos básicos do
programa escolar e
incentivando a especialização dos professores. Além disso, empenhava-se em
muitas outras ações, como por exemplo a articulação entre o ensino técnicoprofissional secundário e o ensino secundário acadêmico, garantindo a
equivalência de estudos. Para a mentalidade da época isso foi uma verdadeira
revolução educacional, pois as elites viam ameaçada a dualidade do ensino.
25
Segundo Gilberto Amado isso foi uma verdadeira “proeza”, Anísio antecipavase, com esta providência, aos planos que, naquela época mal se esboçavam
nas idéias de reduzidos grupos de educadores europeus no sentido de uma
maior aproximação dos ensinos geral e profissionais, de uma escola média
menos
diferenciada
em
ramos
independentes
e
inconfundíveis”
(Amado:1973:16).
No Brasil, na vigência da velha ordem oligárquica, imperava em todos
os ramos da administração pública, os mesmos princípios imperantes na
política comandada pelo coronelismo — o partidarismo e o nepotismo—. Era
condição “sine qua non” de sobrevivência da nova filosofia pregada pelo
Manifesto a liquidação desse sistema política antiquado, daí a forte oposição ao
ideário dos renovadores. É evidente que os reacionários jamais iriam aceitar as
transformações defendidas pelo Manifesto, principalmente porque um dos
principais arautos deste novo sistema era Anísio, que afirma que só a Educação
é capaz de fazer a Revolução... Além disso, as reivindicações de mudanças
eram profundas na estrutura do ensino brasileiro, pois o país já apresentava
mudanças em sua estrutura político-ecônomica e precisava se livrar
urgentemente das velhas forças oligárquicas que impediam o desenvolvimento.
Urgia que o sistema educacional se adequasse às novas necessidades de
desenvolvimento e ao tipo de sociedade que estava surgindo. O movimento
renovador desencadeado pelo o Manifesto representou uma nova ordem e
oposição à velha educação tradicional, sendo, portanto, um movimento de
vanguarda. Não contestava o estado burguês, que estava se implantando, mas
lutava contra a escola tradicional e todos seus métodos ultrapassados que não
atendiam mais às novas exigências da sociedade.
O Manifesto, hoje praticamente esquecido, produziu mudanças de
mentalidade na classe dominante. Basta dizer que seus reflexos são profundos
na Nova Constituição de 1934, a educação que nas constituições anteriores era
tratada em segundo plano, ganhou um artigo fundamental para o seu
26
desenvolvimento no país. O Art. 148 reza “A educação é direito de todos ( o
grifo é nosso) é dever dos poderes públicos proporcioná-la concomitantemente
com a família”. Além desse há vários outros artigos com influência nítida do
Manifesto, como a fixação do Plano Nacional de Educação.
Portanto, a luta dos renovadores não foi inglória, alcançando algumas vitórias,
serviu sobretudo para uma tomada de consciência do problema educacional,
que não podia continuar atrelado às idéias e métodos medievais.
O Manifesto representa um pensamento de vanguarda e a partir dele
as Constituições e Legislações de Ensino sempre procuraram incorporar suas
idéias, apesar do poder das forças retrógradas que sempre tentou impor suas
velhas concepções.
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CONCLUSÃO
Anísio Teixeira foi um educador que contribuiu de maneira decisiva para
o desenvolvimento da educação brasileira. Sua ação extrapolou as fronteiras do
Brasil e estendeu-se por várias nações latino-americanas, projetando o Brasil
internacionalmente.
Dedicou sua vida inteira à causa educacional e exerceu uma influência
renovadora em todos os níveis de ensino e diversas áreas do campo
educacional através de uma ação modernizadora de todo o processo
educacional
para torná-la compatível com a nova e moderna sociedade
industrial que despontava no início do século XX.
Foi o primeiro educador a propor um sistema articulado de ensino,
através da organização integral do sistema educacional como um todo. Anísio
Teixeira já no início do século XX defendia uma escola integrada à comunidade,
e foi também pioneiro na criação de escolas full time, como a Escola Parque,
idéia muito tempo depois adotada por Darcy Ribeiro nos famosos CIEPS do Rio
de Janeiro — que, aliás, nunca funcionaram. Teixeira foi também um grande
incentivador da Pesquisa e deixou-nos um legado teórico de idéias que por sua
atualidade ainda estão presentes nos grandes debates sobre a educação.
Sua maior luta foi pela escola pública de qualidade na qual todos, ricos e
pobres, tivessem acesso a cada um dos os níveis de ensino. (na época os
pobres só tinham acesso ao chamado ensino primário). Apesar de ter origem na
classe burguesa, preocupou-se com a classe dos menos favorecidos e
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projetou-se como o grande defensor da Escola pública, tornando-se um
batalhador da educação democrática, tese amplamente defendida nos clássicos
Educação não é Privilégio e Educação é um Direito. Essas idéias foram
recebidas pelos setores mais reacionários da sociedade, principalmente da
Igreja Católica, como idéias marxistas, que deviam ser banidas com todo rigor,
por isso teve que pagar até com o exílio, quando estourou a ditadura militar.
Mas Anísio Teixeira nunca abandou suas idéias, e quando voltou ao país, após
a redemocratização, continuou sua luta em prol da educação para todos.
Anísio Teixeira, pelo grande educador que foi, pode ser considerado
como uma grande figura histórica pois sua obra foi decisiva para melhoria do
ensino brasileiro. Junto com Fernando Azevedo e outros educadores lançou
em 1932 o famoso Manifesto dos Pioneiros da Educação, que foi um marco
decisivo para renovação do ensino no nosso país.
A obra pedagógica de Anísio Teixeira começa a ser esquecida, apesar
do esforço da Fundação que leva seu nome, que zela para que suas idéias e
seu trabalho não sejam apagados da memória dos brasileiros. Pouco se divulga
nas escolas seu pensamento; basta dizer, que ao comentar que fazeria minha
Monografia sobre Anísio Teixeira, vários colegas professores, me asseguraram
que nunca tinham ouvido falar de tal figura, o que é lastimável.
Tal desinteresse não passa de sintoma do esquecimento a que são
relegados autores como Anísio Teixeira, Fernando Azevedo, Lourenço Filho e
tantos outros autores nacionais ou estrangeiros como, John Dewey, que foram
os pioneiros na renovação da Educação. Muitos dos métodos de trabalho como
“A pedagogia de Projetos” ou mesmo conceitos como pensamento reflexivo,
hoje tão estudados, atribuídos a autores atuais, mas nenhuma alusão é feita
aos verdadeiros fundadores teóricos destes métodos. Nossos Escolanovistas
estão hoje completamente esquecidos, e é preciso resgatar sua memória e
seus ensinamentos.
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