Análise da estabilidade nas falésias entre Tibau do Sul
e Pipa - RN
Santos Jr, O. F.
UFRN/Natal, RN, Brasil, [email protected]
Severo, R. N. F.
CEFET/Natal, RN, Brasil, [email protected]
Freitas Neto,O.
UFRN/Natal, RN, Brasil, [email protected]
França, F.A.N.
UFRN/Natal, RN, Brasil, [email protected]
Resumo: Este trabalho apresenta um estudo sobre as condições de estabilidade das falésias no
litoral leste do Rio Grande do Norte. Foram analisados três perfis típicos presentes na área em
estudo. Os perfis Tipo 1 e 2 são verticais (diferem entre si pela presença de incisão basal provocada
pelas ondas do mar no Tipo 2). O perfil Tipo 3 apresenta inclinação de 45° com a horizontal. As
falésias são formadas por dois tipos de materiais: O solo do Topo (argila arenosa vermelha) e solo
de Base (argila branca com nódulos vermelhos). As análises realizadas pelo método de Bishop
Simplificado mostraram que nas condições naturais (baixo grau de saturação) não ocorre ruptura e
que os Perfis Tipo 1 e 2 rompem quando o material do topo e 6 metros do material da base estão
saturados.
Abstract: This paper presents a study about the stability conditions of sea cliffs in littoral of Rio
Grande do Norte State. Tree typical profiles observed in study area were analyzed. Profile Type 1
is vertical; Type 2 is vertical with basal incision due to erosive action of sea water and Type 3 form
an angle of 45o with horizontal plane. All profiles were analyzed with height of 35 meters. The cliffs
are formed by two kinds of materials, a Top Soil (red sandy clay) and Base Soil (white clay with red
nodules). Stability analyses were carried out using the Simplified Bishop Method. Variations of
saturation degree of beds were considered in analyses. The results showed that in natural conditions
(low saturation degree) the slopes do not fail and slopes with profile Types 1 and 2 fail when the
Top Soil and 6 meters of Base Soil are saturated.
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1 INTRODUÇÃO
A zona costeira é uma das regiões mais dinâmicas do planeta. Sua posição e forma são modificadas por uma série de fatores, tais como
as variações do nível do mar, que ocorrem em
velocidades variadas através dos tempos, até
eventos diários, como as precipitações
pluviométricas. Nesta zona costuma ocorrer
grande quantidade de intervenções humanas,
o que pode levar a uma série de impactos
ambientais. Um dos mais importantes impactos observados nessas regiões é o problema
da erosão costeira, o qual pode ser caracterizado como o recuo da linha de costa sobre as
áreas ocupadas no continente. A ocupação
antrópica potencializa o problema da erosão
costeira, pois se fixando na zona costeira as
populações se colocam na trajetória de recuo
natural desta.
Nesse sentido, o litoral do Rio Grande do
Norte vem passando por um processo de ocupação acelerado, intensificado a partir da década de 80. Além da expansão urbana, do turismo
e das habitações para veraneio, o forte avanço
da aqüicultura são as causas mais evidentes
para esta ocupação.
Recentemente foram feitos vários estudos
sobre a ocorrência de erosão costeira em alguns trechos do litoral do RN (Amaral, 2000;
Diniz, 2002; Silva, 2003; Braga, 2005 e Severo,
2005). O presente trabalho procura analisar as
condições de estabilidade das falésias no município de Tibau do Sul, entre a sede do município e a praia de Pipa, no litoral leste do Rio Grande do Norte (Figura 1)
Figura 1 – Localização Geográfica da Área estudada
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2 DESCRIÇÃO DA ÁREA ESTUDADA
A área objeto do presente estudo está localizada na zona costeira leste do Rio Grande do Norte (Figura 1), a aproximadamente 80 km a sul de
Natal. Em termos geológicos a área é constituída por sedimentos terciários da Formação Barreiras, os quais consistem de camadas intercaladas de arenitos argilosos, argilitos e conglomerados. Em alguns locais apresentam elevada
consistência pela cimentação com óxidos de
ferro. É verificada também a presença de sedimentos arenosos eólicos (Dunas) recobrindo
parcialmente a Formação Barreiras e próximo a
linha de costa estão presentes as praias arenosas. Em termos geomorfológicos, ocorrem Ta-
buleiros Litorâneos a altitudes superiores a 40
metros e Falésias que se constituem nas bordas dos Tabuleiros.
A Figura 2 mostra um zoneamento ambiental
da área em estudo realizado por Amaral (2001),
o qual dividiu essa área em três trechos de
acordo com a orientação da linha de costa:
norte, central e sul. O trecho norte está compreendido entre a barra de Tibau do Sul e a
Ponta do Madeiro possuindo orientação aproximadamente N-S. O trecho central inicia na
Ponta do Madeiro e vai até a Pedra do Moleque, com orientação E-W e o trecho sul inicia
na Pedra do Moleque e culmina na desembocadura do rio Catú ou Sibaúma, com orientação N-S.
Figura 2 – Zoneamento Ambiental da área estudada (Amaral, 2001).
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3 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE OS
PROCESSOS ATUANTES NAS FALÉSIAS
No litoral do Rio Grande do Norte, ao sul da
cidade de Natal, ocorrem feições morfológicas
conhecidas como “Falésias”, as quais consistem de cortes abruptos no relevo, formadas pelo
avanço das águas oceânicas em direção ao continente. As falésias consistem no limite leste
dos “Tabuleiros” (unidade morfológica predominante na região costeira oriental do RN). Em
termos geológicos os Tabuleiros são constituídos por sedimentos terciários da Formação
Barreiras, que consistem de camadas de
granulometria areno-argilosas, com presença de
conglomerados e horizontes com cimentação
ferruginosa. Em alguns locais ocorrem campos
de dunas cobrindo a borda dos Tabuleiros. A
Figura 3 ilustra de forma esquemática uma
falésia.
As Falésias podem atingir alturas de até 50
metros de desnível entre o topo do Tabuleiro e
a Planície Costeira. Em função disso, são
freqüentemente usadas como mirantes por servirem como área de observação das belas paisagens litorâneas. Esse aspecto favorece a implantação de empreendimentos turísticos e de
lazer na parte superior das Falésias.
Figura 3 – Falésia formada na borda do Tabuleiro com
ocorrência de campo de dunas
490
Estudos já realizados nas áreas de Falésias
no litoral do Rio Grande do Norte indicam que
em uma escala de tempo geológica, a costa encontra-se em processo de recuo contínuo e lento (Amaral et al., 1997; Santos Jr. et al, 2001). Em
escala de tempo histórico ou menor (ordem de
dezenas de anos) a costa recua de acordo com
processos naturais, os quais podem ser acelerados por ações antrópicas.
Os processos que induzem o recuo da linha
de costa em direção ao continente estão associados à erosão na base das falésias e a ocorrência de movimentos de massas no topo e na
meia encosta. A erosão na base é provocada
pela ação das ondas e correntes das águas do
mar. Em relação ao topo, destacam-se os processos relacionados à ocorrências de chuvas
de elevada intensidade e longa duração.
Através do ataque direto das ondas em praias
com falésias ocorre a diminuição do volume de
sedimentos protegendo o sopé do talude. Isso
eleva o poder erosivo das ondas e a formação
de incisões na base da falésia, o que provoca o
solapamento da parte superior. O passo seguinte
é a queda do material instável da parte elevada
da encosta. Esse mecanismo pode ser
visualizado de forma esquemática na Figura 4
(Santos Jr., et al., 2004).
Nos períodos chuvosos verifica-se a ocorrência de vários processos de desestabilização
nas falésias que se somam àqueles provocados
pela ação das águas do mar. Tais processos decorrem principalmente do escoamento superficial das águas de chuva que se dirigem para a
quebra de relevo formada pela falésia. Ocorrem
ainda quedas de blocos, tombamentos e
deslizamentos.
Os movimentos mais expressivos em termos
de volume e de dano potencial são os
deslizamentos. Estes podem ocorrer inclusive
em encostas menos íngremes e resultam da diminuição da resistência do material que forma a
encosta pela ação da água (Figura 5). O movi-
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mento se caracteriza pelo escorregamento de
uma massa de material que se move em relação
ao maciço remanescente através de uma superfície bem definida.
Figura 5 – Deslizamento em uma falésia
4 ANÁLISE DE ESTABILIDADE
4.1 Características dos solos
Foi verificado na área que há predominância de
duas camadas diferentes de solo, as quais foram
denominadas de Solo Topo e Solo Base. Verificou-se a presença eventual de camadas cimentadas na interface dessas camadas e em uma região do Solo Base. As características físicas e os
parâmetros de resistência dos solos identificados na área são apresentados nas Tabelas 1 e 2,
respectivamente. Os parâmetros de resistência
foram obtidos através de ensaios de cisalhamento
direto realizados nas condições de campo (umidade natural) e inundada.
Tabela 1 – Caracterização Física
Figura 4 – Mecanismo de recuo da linha de costa em
áreas de falésias (Santos Jr et. al., 2004)
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Os valores apresentados na Tabela 1 se referem à média dos índices obtidos em todos os
corpos de prova ensaiados na condição natural. Os ensaios realizados na condição inundada no Solo Topo e no Solo Base apresentaram
após a ruptura teor de umidade médio de 26% e
16%, respectivamente.
Tabela 2 – Parâmetros de resistência obtidos
em ensaios de cisalhamento direto.
De acordo com os dados apresentados na
Tabela 2, observa-se uma substancial perda de
coesão entre as condições de umidade natural
e inundada. Em relação ao ângulo de atrito, verificou-se apenas uma pequena diferença entre
as duas condições. A perda de coesão pode ser
atribuída à diminuição da sucção no solo.
4.2 Casos analisados
Verificou-se a predominância de três geometrias
das encostas nos trechos estudados, as quais
foram denominadas por Perfil Tipo 1, Perfil Tipo
2 e Perfil Tipo 3. As análises foram realizadas
considerando uma altura média das falésias de
35 metros, pois as mesmas variam entre 20 e 40
metros, porém a maior incidência é de falésias
acima de 30 metros de altura. As Figuras 6, 7 e 8
mostram a geometria dos perfis analisados.
O Perfil 1 é comumente encontrado no Trecho Norte e Central. É caracterizado por ser um
perfil reto formando aproximadamente 90° com a
superfície horizontal e não apresentar incisão em
sua base (Figura 6). Verifica-se eventualmente a
presença de cobertura vegetal em seu topo. O
Perfil 2 é comumente encontrado no Trecho Cen492
tral. Difere do Perfil 1 por apresentar incisão em
sua base provocada pela ação do mar (Figura 7).
O Perfil 3 é comumente encontrado no Trecho
Norte e Sul. É caracterizado por formar um ângulo
de aproximadamente 45° com a horizontal (Figura
8). Verifica-se normalmente a presença de material
oriundo da erosão pluvial em sua base, servindo
como proteção natural à ação do mar.
Camadas com cimentação ferruginosa com
espessura da ordem de 2,0 metros ocorrem de
forma esporádica nos três tipos de perfis (Figura
9). Esse material mostra resistência bem mais elevada que os solos de Topo e Base. O material
cimentado apresenta resistência compressão
variando de 500 kPa a 5000 kPa.
Foram realizadas análises de estabilidade dos
três perfis predominantes na região, utilizando-se
o método de Bishop Simplificado. Para cada perfil
foram analisadas situações de possível ocorrência nas falésias (Tabela 3). Essas situações levam
em conta a saturação dos solos (de topo e base) e
a existência ou não de camadas cimentadas. Como
resultados dessas análises, foram obtidos os fatores de segurança e a provável superfície de
escorregamento. As situações aqui apresentadas,
denominadas pelo tipo de perfil 1, 2 ou 3 e pelo
número do caso, variando de 1 a 12, não encerram
todas as possibilidades, mas são as que parecem
mais factíveis de ocorrência.
Os resultados mostrados na Tabela 3 mostram que as situações de maior segurança encontradas são para os casos 01, 02 e 03, em que
o mínimo fator de segurança foi de 2,80 no perfil
Tipo 2 e o máximo foi 7,39 para o perfil Tipo 3. Ao
se considerar a presença de uma camada cimentada na interface das camadas de topo e base da
falésia não saturadas, promoveu acréscimo do
fator de segurança de 56,1% para o perfil Tipo
01, 70,03% para o perfil Tipo 02 e 29,6% para o
perfil Tipo 03. Já o incremento da segunda camada cimentada surtiu efeito positivo e significativo apenas no perfil Tipo 03 onde o fator de segurança aumentou para 7,39.
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Figura 6 – Perfil Tipo 01
Figura 7 – Perfil Tipo 02
Figura 8 - Perfil Tipo 03
Figura 8 - Perfil Tipo 03
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493
Tabela 3 – Situações consideradas nas análises da estabilidade e seus respectivos fatores de
segurança.
Nos casos 04, 05 e 06, foram obtidos fatores
de segurança com valores bastante próximos,
independentemente de se considerar ou não a
presença de camadas cimentadas. Os resultados obtidos para os perfis 01 e 02 são bastante
próximos com valores que variam entre si em
torno de 1,0%. Já para o perfil Tipo 03 os valores obtidos foram mais elevados, com fator de
segurança médio de 2,33.
Ao se observar os resultados obtidos nos
casos 04, 05 e 06, percebe-se que ao saturar-se
o solo de topo, os fatores de segurança decrescem significativamente se comparados com os
obtidos nos casos 01, 02 e 03. Entretanto os
fatores de segurança encontrados para os casos 04, 05 e 06, não configuram ruptura da
falésia.
No caso 07, foi realizado um estudo onde
procurou-se avançar a frente de saturação a
494
cada metro no solo de base da falésia, para assim averiguar quanto da base deveria estar
saturada para se configurar ruptura. Os fatores
de segurança menores que um, foram obtidos
para os perfis Tipo 01 e 02, ao se considerar o
solo de topo e seis metros do solo de base
saturados. Já o perfil Tipo 03, não apresenta
ruptura nem mesmo quando as duas camadas
estão saturadas.
No caso 08 foi considerada a presença de
uma camada cimentada e a saturação de 5 metros
da base. Observa-se neste caso uma significativa elevação do fator de segurança, ao se comparar com aqueles obtidos no caso 07. Neste
caso a presença de camadas cimentadas contribuiu para estabilização da falésia, aumentando
o fator de segurança para o perfil Tipo 01, 02 e
03 na ordem de 35,4%, 35,7% e 7,5% respectivamente.
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No caso 09, foi considerada a saturação da
metade da base, intercalada pela presença de
duas camadas cimentadas. Os resultados obtidos foram bastante semelhantes se comparados com os obtidos no caso 08.
No caso 10, a falésia foi levada a situação
mais crítica, dentre os casos analisados, onde
tanto o topo quanto à base foram saturadas.
Neste caso foram obtidos os menores fatores
de segurança com relação a todos os outros
casos. Esses valores foram de 0,64, 0,56 e 1,35,
para os perfis 01, 02 e 03 respectivamente.
Nos casos 11 e 12, foi considerada a presença primeiramente de uma e depois de duas
camadas cimentadas respectivamente. Os valores obtidos para esses dois casos, são muito semelhantes, praticamente não havendo variação do fator de segurança com o incremento da segunda camada cimentada. Entretanto
se for comparado os fatores de segurança obtidos nesses dois casos com os valores encontrados no caso 10, verifica-se que a presença da camada cimentada fez elevar significativamente o fator de segurança para todos
os perfis.
As análises mostraram que a incisão na
base não altera as condições de estabilidade.
Entretanto essa conclusão não é compatível
com as observações de campo, onde constata-se um grande número de rupturas superficiais associadas a essas incisões. É possível que
o método utilizado não considere adequadamente as condições vigentes em campo.
5 CONCLUSÕES
O trabalho analisa a variação das condições de
estabilidade de falésias no litoral leste do Rio
Grande do Norte. Foram analisados três perfis
típicos encontrados na área estudada. Dois
perfis aproximadamente verticais (Tipo 1 e 2) e
um com inclinação de 45° com a horizontal (Tipo
3). Os perfis são formados por dois tipos de
materiais, denominados de solo Topo e solo
Base. As análises foram realizadas pelo método
de Bishop Simplificado considerando as prováveis variações de ocorrência de saturação das
camadas.
Com base nos estudos realizados foi possível concluir que:
Na condição não saturada, com baixos
valores de grau de saturação, os três perfis analisados apresentaram-se estáveis;
A saturação da camada de topo provoca
redução significativa no fator de segurança, no entanto, não é suficiente para
provocar a ruptura;
A ruptura somente é atingida quando,
além da camada de topo, ocorre também a
saturação de 6 metros do solo da camada
de base. Isso foi verificado para os perfis
Tipo 1 e 2;
O perfil Tipo 3 não apresentou ruptura
nem mesmo quando as duas camadas
estão saturadas. Isso mostra que além dos
parâmetros de resistência dos solos, a
geometria da falésia é fundamental para
desencadear ou não movimentos de massas;
A presença de camadas cimentadas entre
as camadas de solos de Topo e Base, provocaram a elevação do fator de segurança. Nesse caso não se verifica ruptura
mesmo quando as duas camadas estão
saturadas
A presença das incisões basal praticamente não influenciou nos valores de fator
de segurança, o que é incompatível com
o que se observa em campo. A fim de buscar cada vez valores mais representativos, pesquisas como estas continuarão
sendo desenvolvidas.
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Sanitária) – UFRN, Natal.
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