Avaliação, Acreditação e Gestão do Ensino Superior em Angola: percepções, desafios e tendências Maria da Conceição Barbosa Mendes ([email protected]) Universidade Katyavala Bwila/Faculdade de Economia Benguela - Angola Eugénio Alves da Silva ([email protected]) Universidade do Minho/Instituto de Educação - Braga INTRODUÇÃO O actual processo de reestruturação do subsistema de ensino superior em Angola visa essencialmente regular e corrigir pontos de estrangulamento identificados; conferir maior eficácia à gestão das IES. Redimensionamento da UAN e reorganização da rede de IES (Rede actual: 17 públicas, 22 privadas). Criação da Secretaria de Estado para o Ensino Superior (SEES) que funcionou como órgão do Governo encarregue da concepção e coordenação da implementação das políticas do Estado para o subsistema de ensino superior (Março 2010); Ministério do Ensino Superior da Ciência e Tecnologia (MESCT), cuja orgânica absorveu e acomodou a SEES como um subsector desse departamento ministerial (Decreto Legislativo Presidencial n.º 1/10, de 5 de Março). Configuração actual – 7 Regiões Académicas INTRODUÇÃO Avaliação institucional: referenciada como um instrumento que pode vir a permitir, por um lado, a realização de uma radiografia mais completa da situação actual do ES em Angola e a promoção da qualidade e, por outro, servir de mecanismo de prestação de contas. Acentua-se a dimensão reguladora da avaliação na projecção da melhoria da qualidade do serviço educativo, como base para a construção da credibilidade social que se pretende para o ES em Angola. Avaliação e acreditação no Ensino Superior em Angola A avaliação e Acreditação no ES ganham, teoricamente, alguma relevância com a criação da Direcção Nacional para o Ensino Superior, a qual competia, entre outros aspectos, “velar pela qualidade e eficiência do subsistema” (art. 18º – Decreto-lei 7/03, de 17 de Junho). Em 2007, há uma autonomização da estrutura encarregue pelo ES, com a criação da SEES, sendo expressa a intenção de se promover a avaliação do subsistema numa dimensão internacional (Decreto-lei n.º 5/07, de 5 de Abril). Avaliação e acreditação no Ensino Superior em Angola SEES -GAA- MESCT -INAAES- “serviço de apoio técnico encarregue de monitorar e promover a qualidade dos serviços prestados no subsistema de ensino superior” Absorve as atribuições do GAA: “órgão encarregue da promoção e monitoria da qualidade dos serviços prestados pelas IES” Avaliação e acreditação no Ensino Superior em Angola No contexto actual de desenvolvimento de Angola em geral, e do subsistema de ES em particular, os termos ‘qualidade’, avaliação e credibilidade têm assumido acentuado destaque, passando a fazer parte, de forma explícita e/ou implícita, das narrativas correntes e de algumas práticas institucionais, ainda que episódicas. Acentuam-se os questionamentos à volta da qualidade dos serviços prestados pelas IES, incluindo da formação, havendo narrativas que apontam a ineficácia e ineficiência dos processos e práticas institucionais, decorrentes de diversos pontos de estrangulamento tais como: as distorções na concepção de IES, debilidades no domínio da gestão, do financiamento, dos currículos, do corpo docente e do corpo discente (SEES, 2005). Avaliação e acreditação no Ensino Superior em Angola Razões que sustentam a necessidade de melhoria da qualidade dos serviços prestados: Razões internas: baixas taxas de promoção de estudantes, sendo que apenas 5 a 20% destes atingem o último ano do curso sem reprovação e o elevado índice de abandono escolar (Nascimento, in SEES, 2005); Razões externas: fraca pertinência dos cursos o que se tem reflectido na desproporção entre a quantidade de diplomados e face às demandas dos vários sectores do país em termos de quadros (idem, ibdem). Avaliação e acreditação no Ensino Superior em Angola As preocupações sobre a qualidade, a acreditação e a avaliação do ensino superior em Angola não constituem um elemento novo. A avaliação, nos últimos anos, figura entre as prioridades do Governo, expressas em normativos que incorporam a intenção de se concretizar a avaliação no subsistema de ES por via de um sistema que corporiza dois níveis de intervenção (nível nacional, a ser operacionalizado por estruturas integradas no órgão de tutela, especificamente o Instituto de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (INAAES) e, ao nível local, a ser accionado por cada uma das IES. Avaliação e acreditação no Ensino Superior em Angola LBSE: “é objecto de avaliação contínua com incidência especial sobre o desenvolvimento […], tendo em conta os aspectos educativos, pedagógicos, psicológicos, sociológicos, organizacionais, económicos e financeiros” (art. 63º). Linhas Mestras para Melhoria da Gestão do Ensino Superior: “adoptar um sistema de avaliação (interna e externa) da qualidade das IES articulada com sistemas específicos de avaliação da qualidade de cada instituição de ensino …” (Resolução n.º 4/07). Plano Implementação Linhas Mestras: entre os imperativos actuais “melhorar significativamente a qualidade do ensino ….; promover a investigação científica…” (Nascimento, in SEES, 2006: 7) Avaliação e acreditação no Ensino Superior em Angola A avaliação é ainda invocada como um instrumento regulador do subsistema, dado que a mesma é vista como necessária e indispensável para a “definição da situação legal de cada instituição do ensino superior, bem como de cada uma das suas unidades orgânicas e de cada um dos seus cursos” (SEES, 2006, p. 14). A qualidade e sua garantia constituem atribuições do Estado: garantir “um elevado nível de qualidade nos domínios pedagógico, científico, tecnológico e cultural das instituições de ensino superior” (Decreto 90/09, de 15 de Dezembro). Qualidade como princípio: assegurar a observância de padrões elevados de qualidade do ensino, da investigação e da extensão universitária (Decreto nº 90/09, de 15 de Dezembro). Avaliação e acreditação no Ensino Superior em Angola O MESCT, na prossecução da sua missão, deve “promover o desenvolvimento, a modernização, a qualidade, a competitividade e a avaliação do subsistema de ensino superior […]” (Decreto Presidencial n.º 70/10). Estado como guardião, na base do qual se assume como regulador e controlador do subsistema do ensino superior. Articulações entre o Estado e as IES no campo da avaliação MESCT: • “definir critérios gerais de avaliação do desempenho das instituições”; • “criar mecanismos que assegurem a avaliação externa da qualidade dos serviços prestados […]”; • “apreciar e avaliar o mérito da actividade e desempenho das instituições de ensino superior”; • “homologar os regimes de avaliação interna das IES […]” (Decreto nº 90/09, de 15 de Dezembro). IES: • Promover e executar a avaliação interna, assente na verificação de aspectos relacionados com os cursos e com as dimensões académica e administrativa; • Criar sistemas específicos de avaliação interna que se venham a conformar aos parâmetros a estabelecer no sistema nacional de avaliação. Articulações entre o Estado e as IES no campo da avaliação As disposições legais sobre a avaliação acentuam a intenção de se adoptar/conceber um modelo de avaliação integrador, no qual se englobam as diversas variáveis que conformam a dinâmica organizacional das IES; adoptar um sistema geral e específico de avaliação interna da qualidade da instituição que venha a incidir sobre “todos os dispositivos educativos” (Resolução n.º 4/07), entre os quais figuram a organização e gestão institucionais, o corpo docente e discente, os recursos financeiros e materiais. linha mestra aa): adoptar um sistema geral e específico de avaliação interna da qualidade da instituição que venha a incidir sobre “todos os dispositivos educativos” (Resolução n.º 4/07), entre os quais figuram a organização e gestão institucionais, o corpo docente e discente, os recursos financeiros e materiais. Algumas Tendências Lógica da regulação burocrática onde a avaliação é assumida “como instrumento de planeamento e gestão da provisão dos serviços públicos levada a cabo pelos aparelhos da administração do Estado” (Afonso, 2002, p. 55); Predominância da regulação da avaliação ao nível central e, consequentemente, a delimitação de um palco propício para a interferência de actores externos na concepção e implementação da avaliação, incluindo em processos de avaliação interna; Acentua-se a vinculação da avaliação à qualidade, tendo aquela como instrumento que pode, por um lado, radiografar a situação actual e, por outro lado, com base nisto, promover a melhoria; Reconhecimento da necessidade de se incorporar no sistema de avaliação elementos de referência internacional , da necessidade de formação de especialistas nacionais na perspectiva de se conferir maior contextualização ao processo e sustentabilidade. Condições Favoráveis Existência de uma liderança e estabilidade institucionais que através do envolvimento dos gestores da UO e da própria Reitoria da UAN (Reitor, Pró-Reitor para a Reforma Curricular) e da existência de um quadro legal assegurado por normativos permitiram a condução do processo e o envolvimento dos actores organizacionais no processo; Gestão do projecto, a existência de um projecto de avaliação institucional e de reforma assegurou a organização, estruturação e implementação das acções de forma planificada; Existência de ferramentas para a avaliação da qualidade (normativos e instrutivos, standards Globais da Educação Médica). Condições Favoráveis Trabalho em equipe, a criação oficial de uma comissão de avaliação interna, bem como de grupos de trabalho, especificamente o grupo da reforma curricular do curso de medicina e reestruturação institucional (ordem de serviço 09/DFM – GD/FMUAN/2008, de 22 de Maio); Parcerias com outras instituições (Ministério da Saúde, Ordem dos Médicos), tendo conferido certa abrangência ao processo e, do mesmo modo, representado fonte de encorajamento. Condições Favoráveis Cooperação bilateral e multilateral com a organização mundial da saúde da região Afro, com a faculdade de Medicina do Porto e com a Federação Mundial para a Educação Médica que apoiaram o processo, fundamentalmente na adaptação e aplicação dos standards já referidos; Divulgação do processo através da apresentação de comunicações em eventos científicos nacionais e internacionais e edição e publicação de artigos na website da Faculdade; Progressão lógica do processo, ascendendo de uma avaliação interna para uma avaliação externa; Condições Desfavoráveis Ausência de Financiamento específico; Certo distanciamento da comunidade académica, incluindo alguns actores organizacionais internos à Faculdade que em várias ocasiões se mostrou distanciada do processo alegando a falta de conhecimento a respeito do mesmo, interpretados como formas de resistência à mudança; Percepção invertida do processo, fundamentalmente em relação às necessidades de reforma curricular, manifestada em atitudes altruístas, conservadores e de protecção de espaços de actuação; Escassa investigação científica. Considerações Finais O processo de estruturação de um sistema de avaliação institucional do ensino superior em Angola emerge com características que apontam para a configuração de um processo instituído ao nível central, com abrangência nacional, acentuando-se uma natureza de controlo e regulação das instituições, por parte do Estado, conformando um quadro que tende para o estabelecimento de uma certa uniformidade, em termos de princípios e linhas gerais de avaliação das IES. Legitimado pelo papel reitor, o Estado absorve um conjunto de competências na fase inicial de estruturação do sistema de avaliação institucional, no âmbito da promoção da auto-avaliação, através da definição dos princípios e linhas orientadoras, bem como da homologação do regime de auto-avaliação que se venha a instituir. Considerações Finais Partindo do pressuposto de que os estudos revelaram a marcada dissociação entre as funções substantivas da universidade e a pouca relevância de uma cultura de avaliação institucional, os principais desafios direcionam-se para os seguintes aspectos-chave: a) Configuração de um sistema de avaliação interna, com carácter mais democrático e inovador, baseado numa adequação entre os objetivos da avaliação e os objetos a avaliar, segundo uma abordagem avaliativa que contemple as especificidades do trinómio ensino-investigação-extensão e que se consubstancie num adequado processo prévio de formação dos agentes avaliadores; Considerações Finais b) Concepção/adaptação de modelos ou padrões de avaliação que privilegiem a contextualização, em conformidade com a realidade e condições específicas de cada instituição e, simultaneamente, segundo o princípio da integração nacional, regional e internacional. Significa que o sistema de avaliação interna deve conformar-se às especificidades organizacionais sem excluir os padrões de referência do sistema ‘nacional’, regional e internacional de avaliação, para salvaguardar a afirmação das universidades e demais IES angolanas nos planos nacional, regional e internacional; c) Criação de condições humanas, organizativas e financeiras para viabilizar um processo de avaliação credível que possa fornecer um retrato institucional o mais objectivo e completo, numa lógica de desenvolvimento e melhoria, constituindo-se numa condição essencial para a credibilização social da própria universidade. Considerações Finais É preciso que a avaliação institucional cumpra, para além das suas funções simbólica, de controlo social, relacionada com a selecção dos indivíduos, e de legitimação política (Afonso, 1998), uma função estratégica de desenvolvimento profissional e organizacional, o que exige maior sustentação teórica e política, para lhe conferir qualidade. Isso inclui a formação adequada dos agentes envolvidos, uma vez que esta é uma condição essencial para conferir legitimidade e seriedade à avaliação e um fator que em muito influi na institucionalização de uma cultura de avaliação. Muito obrigada Maria da Conceição Barbosa Mendes ([email protected]) Universidade Katyavala Bwila/Faculdade de Economia Benguela - Angola Eugénio Alves da Silva ([email protected]) Universidade do Minho/Instituto de Educação - Braga