Received May 18, 2009 / Accepted September 9, 2009
J. Technol. Manag. Innov. 2009, Volume 4, Issue 3
_________________________________________________________________________________
Determinantes da Transferência de Tecnologia na Agroindústria Brasileira
de Alimentos: Identificação e Caracterização
1
André Yves Cribb2
Abstract
This article aims to identify and characterize determinants of technology transfer, from the perspective of agro-industrial
firms operating in Brazil, and under the light of the core theoretical concepts. By reaching this objective, the article
provides a basis for studies and practices relating to technological change in the agrifood sector. Particularly, it may help in
defining or reformulating public policies favorable for the generation and application of technologies in the Brazilian food
industry.
Key words: Agrifood sector; technological management; research organization.
Resumo
Este artigo objetiva identificar e caracterizar determinantes da transferência de tecnologia à luz dos conceitos teóricos
básicos e na ótica de empresas agroindustriais que atuam no Brasil. Ao alcançar este objetivo, o artigo apresenta uma base
para estudos e práticas referentes à mudança tecnológica no setor agroalimentar. Particularmente, ele pode auxiliar na
definição ou reformulação de políticas públicas favoráveis para a geração e aplicação de tecnologias na agroindústria
brasileira de alimentos.
Palavras-chave: Setor agroalimentar; gestão tecnológica; organização de pesquisa.
1
O projeto de pesquisa do qual o artigo se originou foi executado graças ao suporte financeiro do CNPq – Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Cribb, 2000).
2
Pesquisador. Embrapa Agroindústria de Alimentos. Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Av. das Américas, 29501 – Guaratiba,
CEP: 23020-470, Rio de Janeiro – RJ, Brasil. Phone: +55 (21) 3622-9744. E-mail: [email protected].
ISSN: 0718-2724. (http://www.jotmi.org)
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1. Introdução
Nos últimos 35 anos, o agronegócio brasileiro tem-se
comportado como um sistema produtivo altamente
eficiente e competitivo. Tal eficiência e competitividade
têm decorrido da elevação da produtividade total dos
fatores (PTF) que, por exemplo, cresceu à taxa anual
média de 3,30% no período de 1975-2002. Esta taxa foi
bem maior à dos Estados Unidos de América (EUA)3, a
maior potência mundial agrícola no mesmo período
(Gasques et al., 2004; Barros & Barros, 2005; Jank et al.,
2005; RIPA, 2008).
O agronegócio tem participado expressivamente no valor
do PIB - Produto Interno Bruto (Nunes & Contini, 2000;
Pinto, 2006) e no ajuste da balança comercial do Brasil
(Jank & Nassar, 2000; Pinto, 2006). Segundo RIPA (2008), o
agronegócio brasileiro respondeu, em 2006, por 26,7% do
PIB, 36% dos empregos e 39,7% das exportações. Entre
2000 e 2006, o setor registrou expansão de 15%. O
desempenho do agronegócio brasileiro destacou-se
notadamente na agroindústria de alimentos, que foi objeto
de várias iniciativas de inovação tecnológica e
organizacional (Cribb, 2004).
A agroindústria de alimentos é tradicionalmente definida
como “o conjunto das empresas que transformam
produtos geralmente de origem agrícola para satisfazer as
necessidades alimentares dos consumidores” (Malassis,
1979: 12, apud Nefussi, 1989). Austin (1981) acrescenta
que a abrangência das operações de transformação pode
ser ampla, incluindo a lavagem, triagem, mistura, cocção e
processamento químico de alimentos provenientes da
agricultura, fruticultura e pecuária. Nefussi (1989) explica
que as empresas agroindustriais compram suas matériasprimas no segmento agropecuário e fabricam produtos
alimentícios para ser comercializados, distribuídos e
consumidos no mercado nacional e internacional. De
acordo com Goodman e colaboradores (1990: 69), “o
moderno sistema de alimentos se estende desde a
agricultura, num extremo, passando pelo processamento,
pela distribuição e pela venda no varejo, até o setor
produtor de alimentos e refeições industrializadas (catering
industry) e a preparação doméstica de alimentos, no
outro”.
3
A partir dos anos de 1990, a agroindustrialização foi
relativamente rápida e intensa no Brasil. Segundo
Wilkinson (1995 apud Reardon & Barrett, 2000), ela é
caracterizada por três conjuntos de mudanças: 1) o
crescimento de atividades de aquisição de matérias-primas
agrícolas, distribuição e agroprocessamento, empreendido
por grandes, médias e pequenas empresas agroindustriais
atuando no Brasil; 2) mudança institucional e
organizacional na relação entre empresas agroindustriais e
estabelecimentos agrícolas, como crescimento da
coordenação vertical; e; 3) mudanças concomitantes na
agropecuária, tais como mudanças na composição do
produto, tecnologia e estruturas setoriais e de mercado.
As potencialidades do mercado agroalimentar brasileiro
tem atraído novos investimentos de companhias
multinacionais. Aquisições têm constituído a estratégia
mais comum de expansão e inserção em novos mercados.
Os contratos, adotados entre as agroindústrias de
alimentos e os agricultores, têm estabelecido preços
diferentes, principalmente em função de requisitos de
qualidade e práticas de cultivo, colheita e pós-colheita. Ao
mesmo tempo, tem-se manifestado a aceitação do
consumidor de alimentos a pagar preços premium. Frente a
tais mudanças, os pequenos e médios produtores têm
recorrido à ação coletiva para poder sobreviver e
competir com as grandes empresas agroindustriais (Farina,
2001; Cribb e colaboradores, 2008).
No Brasil, a atuação das empresas agroindustriais tem
ocorrido num contexto internacional caracterizado pela
abertura comercial. Este contexto não só tem trazido
novas oportunidades de mercado no exterior, mas
também tem facilitado a presença de competidores
estrangeiros no país (Cribb, 2004; RIPA, 2008). Em razão
da importância da tecnologia no crescimento econômico
(Rosenberg, 1982; Guellec, 1993; Guan et al., 2006; Wang
& Chien, 2007), as empresas agroindustriais têm-se
encontrado, portanto, numa posição de permanente busca
por recursos tecnológicos necessários ao enfrentamento
dos desafios da competição internacional. Entretanto, no
sistema agroalimentar, são relativamente poucas aquelas
que têm estratégias próprias de atuação englobando ao
mesmo tempo atividades de geração e aplicação de
tecnologias (Arrow, 1962; Lin, 2003). Frente a essa
realidade, existem no Brasil, como em outros países,
organizações públicas de pesquisa e desenvolvimento
Nesse período, a PTF cresceu à taxa anual de 1,57% nos EUA.
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(P&D) para assistir cientifica e tecnologicamente as
empresas agroindustriais.
O objetivo deste artigo é identificar e caracterizar
determinantes da transferência de tecnologias de uma
organização pública de pesquisa – denominada Embrapa
Agroindústria de Alimentos4 - para as médias, pequenas e
micro empresas agroindustriais que atuam no Brasil. Na
sua segunda parte, o artigo apresenta as dimensões e
características da transferência de tecnologia vista como
processo multidimensional e interativo. Na sua terceira
parte, define a metodologia da pesquisa, abrangendo as
abordagens e os procedimentos utilizados na revisão de
literatura, coleta de dados primários e observação direta
em campo. Na sua quarta parte, descreve e discute os
resultados da pesquisa. Na sua quinta parte, conclui com as
principais contribuições e implicações da pesquisa.
2. Multidimensionalidade e interatividade do
processo de transferência de tecnologia
A tecnologia pode ser definida como o conhecimento
teórico e prático, relativo a certos tipos de ocorrências e
atividades associadas à produção e transformação de
materiais (Rosenberg, 1982; Burgelman et al, 2004).
Importante na determinação da vantagem competitiva
(UNCTAD, 1996), ela é apontada como ingrediente
essencial no desempenho das empresas. Segundo Gilbert e
Cordey-Hayes (1996), a chave de sucesso para uma
organização ou empresa está incorporada na sua habilidade
de implementar, dominar e valorizar conhecimentos
tecnológicos. Nesse mesmo sentido, Burgelman e
colaboradores (2004: 2) ressaltam que "a tecnologia é um
recurso de alta relevância a diversas organizações;
gerenciar esse recurso para vantagem competitiva significa
integrá-lo na estratégia da empresa". Nesse sentido, a
competitividade organizacional exige amplamente não
apenas o conhecimento tecnológico mas também o
gerenciamento tecnológico.
O conhecimento tecnológico refere-se basicamente "à
competência de reconhecer problemas técnicos, desenvolver
4
A Embrapa Agroindústria de Alimentos é uma unidade da
Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Ela tem por missão
viabilizar soluções tecnológicas para a sustentabilidade da
agroindústria de alimentos, com foco na inovação e atendendo às
expectativas dos consumidores por qualidade e segurança
(Embrapa Agroindústria de Alimentos, 2009).
novos conceitos e soluções tangíveis a problemas técnicos,
(...) assim como à competência de aproveitar os conceitos e
soluções tangíveis de maneira efetiva" (Autio & Laamanen,
1995: 647). É embutido em pessoas, materiais, processos
cognitivos e físicos, plantas, máquinas e ferramentas (Dosi,
1988; Lin, 2003; Burgelman et al., 2004).
O gerenciamento tecnológico é um processo complexo
que consiste essencialmente na geração e aplicação de
conhecimentos para desenvolver produtos e serviços
assim como sistemas de produção e distribuição. Ele pode
resultar na mudança tecnológica ou, preferencialmente,
num avanço tecnológico, materializado por certo aumento
da eficácia dos fatores de produção ou pela disponibilidade
de "novos produtos, processos e serviços e, em alguns
casos, setores totalmente novos” (Harrison, 2005: 55).
Uma das atividades do gerenciamento tecnológico é a
transferência de tecnologia, entendida como o
deslocamento do conhecimento tecnológico de um lugar
para outro. Envolvendo geralmente atividades de
comunicação e interação, tal deslocamento ocorre através
de negociações não comerciais ou por meio de transações
comerciais.
Voltada para a mudança ou inovação tecnológica, a
transferência de tecnologia não se reduz a atividades de
venda e compra de materiais, plantas, máquinas e
ferramentas. Ela implica também na mobilização de
indivíduos e organizações (Cribb, 1999 e 2000). Nonaka
(1991: 97) destaca este aspecto, assinalando que "o novo
conhecimento começa sempre com o indivíduo".
No processo de transferência de tecnologia, há pelo
menos duas partes: a emissora e a receptora de uma
determinada tecnologia. Com estatutos e objetivos
diferentes, cada uma das partes tem seus próprios
interesses que podem até ser dificilmente conciliáveis. O
processo de transferência de tecnologia envolve, além
desses atores, outros grupos tais como entidades
governamentais, usuários finais, instituições internacionais
e organizações não governamentais de desenvolvimento
(Nelson, 1993; Cribb, 1999).
A transferência de tecnologia não é a imitação passiva de
tecnologias oriundas de fontes externas, mas é um
processo ativo e criativo de adaptação que leva em conta
as condições locais de atuação das partes envolvidas. Os
mecanismos de transferência de tecnologia são diversos e
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incluem o licenciamento de tecnologia, acordos
cooperativos de P&D, a assistência técnica, o
compartilhamento de uso de equipamentos, programas de
troca de tecnologias, publicações e palestras. “Na verdade,
a transferência de tecnologia é um processo estrutural de
aprendizado” (Sankat et al., 2007: 646).
O aprendizado é um dos mais significativos processos
dinâmicos ocorridos nas empresas, no âmbito das quais ele
constitui a base da mudança técnica incremental. Graças a
ele, se constróem e se consolidam a aquisição, acumulação
e geração do conhecimento. Existe uma ampla variedade
de processos de aprendizado, tais como “learning by doing,
learning by using, learning from advances in science and
technology, learning from inter-industry spillovers, learning by
interacting e learning by searching” (Malerba, 1992: 849).
O deslocamento de uma tecnologia de uma organização
emissora a uma empresa receptora não se faz sem custo
(Teece, 1977), pois exige alocação de recursos para a
transmissão e absorção do conhecimento tecnológico. O
aprendizado não é um bem gratuito, mas sim uma atividade
custosa, focalizada e multidimensional. Em razão da
diversidade das características e influências dos processos
de aprendizado, as empresas podem ter direções
diferentes de mudança técnica incremental. Outra
observação que merece ser destacada é que o aprendizado
não surge do nada. As fontes externas de P&D
desempenham um papel importante na acumulação do
estoque de conhecimento das empresas e na geração de
trajetórias de avanço técnico incremental (Malerba, 1992).
Geralmente orientado pela busca de inovação, o sucesso
da transferência de tecnologia depende significativamente
do desempenho de cada uma das partes envolvidas.
Segundo Metcalfe (1995: 34),
"o fato central a respeito do processo moderno de
inovação é que ele é baseado numa divisão do
trabalho, (...). A divisão do trabalho produz
eficientemente ganhos a partir da especialização e
profissionalização, mas ela requer também um
arcabouço
para
conectar
juntamente
as
contribuições dos diferentes atores".
Nesse sentido, um aspecto fundamental do processo de
transferência de tecnologia refere-se à capacidade
absortiva da empresa receptora. É essa capacidade que
facilita a assimilação dos elementos da tecnologia por parte
da empresa. Ela se traduz pela competência de identificar
tecnologias disponíveis para aquisição e imitação, modificálas e adaptá-las a necessidades produtivas. A capacidade
das empresas de aproveitar de resultados de P&D constitui
um fator fundamental de seu futuro desempenho (Cohen &
Levinthal, 1990; Cribb, 1999; Haro-Domínguez et al.,
2007). No setor agroalimentar, as organizações públicas de
P&D, imbuídas da importância de tal capacidade para o
processo de transferência tecnológica, se empenham
geralmente não apenas na geração de tecnologias, mas
também na assistência e capacitação técnica de seus
clientes, beneficiários e parceiros (Cribb, 1999).
3. Metodologia
A pesquisa da qual surgiu este artigo foi realizada num
período de oito anos junto a médias, pequenas e micro
empresas
agroindustriais5,
clientes
da
Embrapa
Agroindústria de Alimentos. Suas atividades foram
concretizadas conforme um processo iterativo baseado na
triangulação de fontes e métodos. Essas podem ser
reagrupadas em quatro blocos: revisão de literatura, coleta
de informações e dados, observação nas empresas
pesquisadas e tratamento das informações e dos dados
coletados.
3.1 Revisão de literatura
Este bloco de atividades foi realizado através do banco de
dados da Embrapa Agroindústria de Alimentos e de textos
escritos nos últimos 40 anos sobre a transferência de
tecnologia e o setor agroindustrial brasileiro. A revisão da
literatura ajudou principalmente na compreensão de
conceitos-chaves a respeito da transferência de tecnologia
e na elaboração da lista das empresas pesquisadas.
Também, facilitou a identificação de especialistas do setor
agroalimentar brasileiro.
3.2 Coleta de informações e dados
As atividades de coleta de informações e dados foram
realizadas em três momentos. O primeiro correspondeu a
uma etapa do projeto de pesquisa descrito em Cribb
(2000) e se estendeu no período de março de 2001 a
março de 2002. O segundo momento, considerado etapa
5
A classificação das empresas em médias, pequenas e micro foi
obtida do banco de dados da Embrapa Agroindústria de
Alimentos.
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complementar do projeto, se referiu às ações técnicas de
avaliação anual de impactos de tecnologias transferidas pela
Embrapa Agroindústria de Alimentos e ocorreu ao longo
do período de março 2002 a março 2009. O terceiro
momento, definido também como etapa complementar do
projeto, foi o de entrevistas com especialistas
(pesquisadores e técnicos) do setor agroalimentar e se
concretizou no período de março a dezembro de 2006.
agroalimentar brasileiro. Esses foram escolhidos em três
organizações de pesquisa e extensão. As entrevistas
ajudaram a obter esclarecimentos sobre o macroambiente
em que se realiza a transferência de tecnologias
agroindustriais. Tais esclarecimentos permitiram melhor
entender as respostas recebidas junto às empresas
agroindustriais por ocasião do primeiro e segundo
momento da coleta de informações e dados.
No início do primeiro momento da coleta de informações
e dados, ou seja, em março de 2001, foram enviados
questionários a 61 empresas que se beneficiaram de
tecnologias e serviços gerados pela Embrapa Agroindústria
de Alimentos nos anos de 1999 e 2000. Desta forma,
tratou-se de entrevistas estruturadas. Até outubro de
2001, foram retornados sete questionários preenchidos; o
que correpondeu a uma taxa de resposta de
aproximadamente 11%. Esta taxa, considerada baixa, foi o
reflexo da pouca tradição do empresariado nacional em
conceder
dados
e
informações
sobre
seus
empreendimentos. Tal constatação já foi relatada por
Araújo (1996) e Matesco (2000). Por isso, foi decidido dar
continuidade ao levantamento de dados e informações em
outros períodos. Com a prorrogação de tal levantamento
até março de 2002, o número de questionários
preenchidos passou de 7 para 15. Assim, a taxa de
resposta subiu de 11% para 25%.
3.3 Observação nas empresas pesquisadas
No segundo momento da coleta de informações e dados,
outras dez empresas foram pesquisadas por ocasião da
realização das atividades anuais de avaliação dos impactos
de tecnologias. Nessas últimas empresas, a coleta de
informações e dados foi realizada por meio de entrevistas
semi-estruturadas que ajudaram a melhor entender as
especificidades do processo de transferência de tecnologia
na agroindústria brasileira de alimentos.
4. Resultados e discussão
Os temas, abordados nesses dois momentos da coleta de
informações e dados, foram diversos e incluíram o
desempenho e a transparência da Embrapa Agroindústria
de Alimentos, o interesse em colaboração para
financiamento de pesquisa, a aquisição de conhecimentos
tecnológicos, a busca de capital de desenvolvimento de
negócios, a comunicação empresarial e a cooperação
financeira entre concorrentes.
4.1 Perfil das empresas informantes
No terceiro momento da coleta de informações e dados,
foram empreendidas entrevistas não-estruturadas com 9
especialistas (pesquisadores e técnicos) do setor
A observação in loco foi concretizada, sobretudo através de
visitas e reuniões nas empresas onde foram realizadas as
atividades de avaliação anual de impactos de tecnologias, e
também em locais onde houve feiras e outros eventos
relativos ao setor agroindustrial. Permitiu contatos diretos
e frequentes com as realidades agroindustriais. Tais
contatos foram importantes para a compreensão da
dinâmica do setor agroalimentar.
3.4 Tratamento das informações e dos dados
coletados
O tratamento das informações e dos dados coletados foi
efetuado por meio de métodos descritivos. As ferramentas
utilizadas incluíram gráficos de frequência e diagramas de
causa-efeito.
A análise dos dados e informações consistiu na procura de
diferenças e similaridades entre fatos revelados pelas
empresas agroindustriais, não só interpretando o
significado dessas diferenças e similaridades, mas também
tentando descobrir regularidades baseadas nelas. Os
resultados são abaixo apresentados e discutidos.
As funções principais das empresas que forneceram dados
e informações foram diversas e consistiram em três
categorias:
pesquisa
e
desenvolvimento
(P&D);
processamento de produtos; e, empacotamento de
produtos agrícolas. 7% das empresas estão envolvidas na
primeira categoria; 66% na segunda; e, 27 % na terceira. O
relativo baixo percentual de empresas agroindustriais
privadas tendo P&D como função principal foi compatível
com os indicadores observados, conforme os quais, no
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Brasil, as universidades e os laboratórios públicos são os
principais lugares da pesquisa (Cribb, 2007).
informantes
escolhidas.
Foi anotada uma concentração dos empregados das
empresas em atividades de produção de bens. De fato, os
empregados foram distribuídos da seguinte maneira: 13%
em administração; 7% em P&D; e, 80% em produção de
bens.
Uma das perguntas foi formulada para conferir se as
empresas já haviam usado serviços da Embrapa
Agroindústria de Alimentos. Todas as empresas
responderam afirmativamente.
Em termos de eficiência produtiva, as categorias de
processamento de produtos e empacotamento de
produtos agrícolas se encontraram em níveis próximos. A
taxa de eficiência, ou seja, a relação entre produção efetiva
e capacidade de produção foi, em média, de: 30% para as
empresas de P&D; 65% para as empresas de
processamento de produtos; e, 70% para as empresas de
empacotamento de produtos agrícolas.
4.2 Percepções das empresas acerca da Embrapa
Agroindústria de Alimentos
Um conjunto de perguntas foi usado para caracterizar as
experiências das empresas com a Embrapa Agroindústria
de Alimentos. Estas perguntas apresentaram aos
alternativas
de
respostas
para
serem
Para a avaliação dos serviços da Embrapa Agroindústria de
Alimentos, foi definida uma pergunta sugerindo cinco níveis
de desempenho: excelente, bom, médio, regular e ruim.
Nenhuma empresa achou regular ou ruim a atuação da
Embrapa Agroindústria de Alimentos. A Tabela 1 apresenta
as percentagens de empresas que escolheram cada um dos
demais níveis. O desempenho da Embrapa Agroindústria
de Alimentos é fundamentalmente a expressão da
motivação de seus recursos humanos na concretização da
transferência tecnológica.
Outra pergunta foi usada para saber se as empresas
estavam dispostas a participar do financiamento de
atividades de P&D que poderiam ser executadas pela
Embrapa Agroindústria de Alimentos. As respostas
encontram-se na Tabela 2.
Tabela 1. Desempenho da Embrapa Agroindústria de Alimentos
Serviços
1. Análises
2. Informações técnicas
3. Consultoria e assistência técnica
4. Treinamento
Excelente
33%
13%
20%
13%
Bom
60%
80%
60%
87%
Médio
7%
7%
20%
-
Regular
-
Ruím
-
Tabela 2. Interesse em colaboração para financiamento de pesquisa
Tipo de colaboração
Participação em financiamento de P&D na Embrapa
A boa imagem da Embrapa Agroindústria de Alimentos
diante as empresas agroindustriais é um aspecto
importante para o desenvolvimento de redes colaborativas
entre os atores participando do processo de transferência
de tecnologia. Mas, a vontade de colaboração das
empresas não se traduz automaticamente pela propensão
de financiar pesquisas.
Não há dúvida de que o envolvimento na pesquisa por
meio da colaboração no seu financiamento seja um
indicador do interesse da empresa em adquirir tecnologias.
Entretanto, não se pode esquecer que as médias, pequenas
Sim
53%
Não
27%
Indecisão
20%
e micro empresas não têm geralmente condições para
colaborar financeiramente em atividades de P&D (Arrow,
1962). Portanto, é de esperar que a maioria das empresas,
clientes da Embrapa Agroindústria de Alimentos, não
esteja disposta a participar do financiamento de atividades
de P&D.
4.3 Relevância de diversos fatores na transferência
de tecnologia
Outro conjunto de perguntas foi estabelecido para
determinar a importância de diversos fatores na
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transferência de conhecimentos tecnológicos. Estas
perguntas foram formuladas de maneira a fornecer aos
informantes um leque de respostas alternativas, incluindo a
possibilidade de eles formularem suas próprias
observações. Nesse sentido, foram definidos cinco grupos
de perguntas.
4) a empresa não tivesse capital próprio disponível para
colocar em prática este conhecimento. Também, houve
espaços para observações adicionais da empresa a respeito
deste grupo de perguntas.
Os resultados podem ser observados na Tabela 3. Como
pode-se constatar, a maioria das empresas aceitaria
adquirir o conhecimento tecnológico apesar da existência
das situações problemáticas. Esta constatação se explica
pela confiança das empresas na Embrapa Agroindústria de
Alimentos. Um dos informantes que escolheram a resposta
"não" para a quarta pergunta deste grupo destacou que,
pelo fato de sua empresa ser de pequeno porte, precisaria
de uma linha de crédito subsidiada para poder investir de
forma concreta.
O primeiro grupo se referiu à aquisição de conhecimento
tecnológico. Ele procurou saber se a empresa aceitaria
adquirir um determinado conhecimento tecnológico
divulgado pela Embrapa Agroindústria de Alimentos,
mesmo que: 1) este conhecimento não fosse aquele
esperado pela empresa para aplicação imediata; 2) a
empresa não tivesse mão-de-obra qualificada para colocar
em prática este conhecimento; 3) a adaptação deste
conhecimento à realidade da empresa fosse complexa; e,
Tabela 3. Aquisição de conhecimentos tecnológicos
Situação problemática
1. Conhecimento não esperado para aplicação imediata
2. Inexistência de mão-de-obra qualificada
3. Complexidade de adaptação do conhecimento
4. Indisponibilidade do capital próprio para o conhecimento
O segundo grupo foi constituído de uma única pergunta
formulada acerca da disposição da empresa em procurar
financiamento para adquirir um conhecimento tecnológico
competitivo e colocá-lo em prática. Também, foram
reservados espaços para observações das empresas.
Os resultados são apresentados na Tabela 4. Apesar de
declarar sua disposição para tal procura, outro informante
Sim
60%
67%
80%
53%
Não
40%
33%
47%
Indecisão
20%
-
(diferente daquele acima citado) observou que a disposição
do empreendedor não garantiria nem facilitaria a obtenção
dos recursos financeiros necessários. O fato de que todas
as empresas têm disposição em procurar financiamento
para adquirir o conhecimento tecnológico mostra que a
existência da tecnologia e a disponibilidade de capital
necessário ao aproveitamento desta são determinantes
significativos no processo de transferência tecnológica.
Tabela 4. Busca de capital de desenvolvimento
Razão da busca
Financiamento para aquisição e uso de conhecimento
O terceiro grupo foi composto de perguntas formuladas
acerca das características socioeconômicas da transmissão
de conhecimentos tecnológicos. Foi dividido em dois
subgrupos, procurando respectivamente saber: 1) que
meios permitiram à empresa ter informações sobre
serviços e produtos existentes na Embrapa Agroindústria
de Alimentos; e, 2) a influência de diversos fatores sobre a
aquisição de conhecimentos tecnológicos.
No que diz respeito ao primeiro subgrupo, foram fornecidas
algumas alternativas de respostas: jornais, internet e folders.
Sim
100%
Não
-
Indecisão
-
Também, foram disponibilizados ao informante espaços para
inserir outros meios de informação. Dentro da categoria de
outros meios de informação, os contatos pessoais foram
objeto de mais respostas.
No caso do segundo subgrupo, foram apresentados quatro
fatores (prazo de atendimento, preço do serviço fornecido
e qualidade do serviço) cuja influência respectiva sobre a
aquisição de conhecimentos tecnológicos foi avaliada pelas
empresas. A qualidade do serviço, aspecto fundamental
para a caracterização de uma organização de P&D, foi
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definida como um fator baseado nos seguintes critérios:
atendimento dentro do prazo previsto e viabilidade dos
prazos com relação à urgência das necessidades de
aquisição do conhecimento tecnológico. Ainda neste
subgrupo, foram sugeridos cinco níveis de influência: muito
alto, alto, médio, baixo e nenhum. Os dois últimos não
foram escolhidos por nenhuma empresa.
Os resultados dos dois subgrupos
respectivamente nas Tabelas 5 e 6.
encontram-se
Tabela 5. Meios de informações
Meios de informação
1. Jornais
2. Folders
3. Internet
4. Outros
Números de respostas
9
6
4
11
Tabela 6. Influência de fatores sobre aquisição de conhecimento
Fatores
1. Prazo de atendimento
2. Preço
3. Qualidade
Muito alta
27%
60%
66%
O quarto grupo abrangeu duas perguntas usadas para
conhecer as percepções das empresas agroindustriais
sobre condições de transparência da Embrapa
Agroindústria de Alimentos. A primeira foi uma pergunta
para saber se a Embrapa Agroindústria de Alimentos
Alta
27%
27%
27%
Média
46%
13%
7%
Baixa
-
Nenhuma
-
precisava intensificar mais seus programas de comunicação
com as empresas. A segunda foi formulada para saber se,
no planejamento das atividades da Embrapa Agroindústria
de Alimentos, a participação das empresas era necessária.
Os resultados são apresentados na Tabela 7.
Tabela 7. Transparência na Embrapa Agroindústria de Alimentos
Ação necessária
1. Mais comunicação
2. Mais participação dos clientes
O fato de uma tecnologia existir não significa que sua
completa transferência seja garantida. Como afirmam Dorf
& Worthington (1990: 265), "geralmente, as empresas
reconhecem o valor de novas descobertas realizadas em
universidades ou laboratórios públicos, mas algumas
complicações acerca da comunicação e segurança, assim
como dos arranjos contratuais, tendem a torná-las não
completamente motivadas".
O quinto grupo também consistiu em duas perguntas
usadas para saber como as empresas visualizavam a
participação ou colaboração de outros atores na rede de
relações necessárias à transferência de conhecimentos
tecnológicos. A primeira pergunta se referiu à indicação
das três principais ações que o setor público (governo
federal, estadual e/ou municipal) podia empreender para
melhorar o processo de aquisição de conhecimentos
Sim
93%
87%
Não
-
Indecisão
7%
13%
tecnológicos. Responderam a esta pergunta 60% dos
informantes. As respostas foram diversas e incluíram
principalmente propostas tais como: isenção de impostos;
parcerias financeiras; parcerias visando aumento de mão de
obra; melhoria na comunicação entre a Embrapa
Agroindústria de Alimentos e a empresa; promoção do
intercâmbio entre organizações de pesquisa e unidades
produtivas via redução de preços de acesso a serviços. Os
informantes justificaram essas propostas pelo fato de que
as atividades agroindustriais dependem amplamente de
fatores climáticos e apresentam um carater sazonal.
Apesar de sua confiança na competência da Embrapa
Agroindústria de Alimentos como organização de P&D e
de sua disposição em procurar financiamento, eles
destacaram a necessidade da adequação contínua dos
mecanismos de agilização do setor agroindustrial brasileiro.
A segunda pergunta foi formulada para saber a disposição
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da empresa em financiar, junto com empresas
concorrentes, uma atividade voltada ao desenvolvimento
ou aquisição de um novo conhecimento tecnológico. As
respostas estão na Tabela 8.
Tabela 8. Possibilidade de cooperação financeira com concorrentes
Tipo de cooperação
Cooperação para P&D
Sim
27%
Não
53%
Indecisão
20%
Graças a sua boa imagem, a Embrapa Agroindústria de
Alimentos ganha a confiança das empresas agroindustriais
privadas. Mas, esta confiança não é suficiente para
assegurar a transferência ou a ampla difusão do
conhecimento tecnológico. É preciso ter recursos
financeiros para poder investir não apenas em capacidade
absortiva, mas também em infra-estrutura tecnológica
(Cribb, 1999). Nesse sentido, a implantação de uma
política tecnológica apropriada, associada à política
industrial, pode ter efeitos significativamente positivos
sobre o processo de transferência de tecnologia. Além de
uma política tecnológica, a interação entre a emissora e a
receptora da tecnologia precisa ser continuamente
fortalecida através da adequação sempre renovada dos
meios de comunicação, da multiplicação dos canais de
participação e da melhoria das condições de
disponibilização de produtos e serviços (Lin, 2003). A
cooperação
entre
empresas
concorrentes
para
desenvolvimento ou aquisição de conhecimentos
tecnológicos merece ser incentivada, sobretudo nos casos
de tecnologias pré-competitivas.
Tal reconhecimento tem sido fundamental na aquisição e
adoção de novos conhecimentos tecnológicos por parte da
maioria destas que, mesmo em situações produtivas
problemáticas, não hesitariam em adquirir produtos e
serviços da Embrapa Agroindústria de Alimentos.
5. Conclusão
O capital foi visto por todas as empresas pesquisadas
como um fator que influencia bastante sua decisão. Pode
ser próprio ou emprestado. Mas, para elas, o importante é
tê-lo no momento certo para tirar proveito de uma
tecnologia recomendada pela Embrapa Agroindústria de
Alimentos.
Pelos resultados, os determinantes da transferência de
tecnologia na agroindústria brasileira são múltiplos. Eles
incluem a imagem da organização de P&D, a disponibilidade
da tecnologia transferível, a informação sobre as
características da tecnologia gerada, o capital necessário ao
aproveitamento da tecnologia, o envolvimento do usuário
potencial da tecnologia no projeto de pesquisa, o interesse
por parte do usuário potencial e a motivação do
pesquisador na transferência da tecnologia.
A Embrapa Agroindústria de Alimentos tem construído sua
imagem baseando-se essencialmente no seu desempenho.
Graças à qualidade dos produtos fornecidos e serviços
prestados, ela tem adquirido e consolidado sua
legitimidade, credibilidade e pertinência. Sua capacidade em
responder
às
expectativas
agroindustriais
foi
favoravelmente reconhecida pelas empresas pesquisadas.
A existência da tecnologia a ser transferida tem sido
também de fundamental importância. Tanto as
características quanto as funções da tecnologia têm sido
ingredientes utilizados pelas empresas agroindustriais no
processo de adoção tecnológica.
A informação, determinante mais destacado em todas as
etapas da pesquisa, aparece como um fator bastante
importante na tomada de decisão das empresas
agroindustriais a respeito de uma nova tecnologia. Ela tem
sido procurada por estas em diversos meios de divulgação
técnica, dentre os quais destacam-se jornais, folders e
internet. A grande maioria das empresas (93%) destacou a
necessidade de mais comunicação direta entre elas e a
Embrapa Agroindústria de Alimentos.
O envolvimento do usuário potencial nas atividades de
P&D foi reconhecido como necessário para desenvolver o
entrosamento entre o emissor e o receptor da tecnologia
esperada. A maioria das empresas (87%) quer mais
participação nessas atividades. Tal envolvimento pode, em
caso de geração e transferência da tecnologia, facilitar a
adoção e assimilação desta pelo usuário.
O interesse do usuário potencial na tecnologia foi também
levantado como determinante importante. Em termos de
financiamento de pesquisa, as respostas obtidas mostraram
que ele tem sido de caráter mais individual do que
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coletivo. Enquanto mais da metade das empresas (53%)
manifestou seu desejo de contribuir em atividades de P&D,
apenas 27% se sentiram dispostas a cooperar com seus
concorrentes para desenvolver ou adquirir novos
conhecimentos tecnológicos.
A motivação do pesquisador na transferência de tecnologia
foi também abordada pelas empresas pesquisadas. A
expressiva maioria dessas empresas (80 – 100%) achou
excelentes ou bons os serviços prestados pelos
profissionais da Embrapa Agroindústria de Alimentos.
Graças aos comportamentos desses profissionais, as
empresas têm tido percepções satisfatórias acerca da
Embrapa Agroindústria de Alimentos.
Ao identificar e caracterizar determinantes da
transferência de tecnologia na agroindústria de alimentos,
este artigo apresenta uma base para estudos e práticas
referentes à mudança tecnológica no setor produtivo. Os
diferentes atores do setor agroalimentar - tais como
entidades governamentais, agências de crédito e
instituições de fomento de P&D - tendo conhecimento
desses determinantes, podem melhor definir suas
estratégias para alcançar seus objetivos. Espera-se que os
resultados, apresentados e analisados neste artigo, possam
auxiliar na definição ou reformulação de políticas públicas
favoráveis à geração e aplicação de tecnologias na
agroindústria brasileira de alimentos.
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Sobre o autor
André Yves Cribb. D.Sc. em Engenharia de Produção pelo
Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e
Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de
Janeiro (COPPE/UFRJ). Pesquisador da Área de
Comunicação e Negócios da Embrapa Agroindústria de
Alimentos (CEP 23020-470 – Rio de Janeiro/RJ, Brasil).
100
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