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n.11 – março de 2013 -
Tradução
O que significa pensar? Fragmento da preleção homônima de Martin Heidegger1
Roberto S. Kahlmeyer-Mertens2
Resumo: Trata-se da tradução do primeiro capítulo da primeira parte de O que significa
pensar? de Martin Heidegger (1889-1976). O texto é uma preleção originalmente
proferida pelo filósofo no semestre de inverno de 1951-52, na Universidade de
Freiburg, e continuada no semestre de verão de 1952, na mesma universidade. Esta
tradução, inédita e feita imediatamente do alemão, obedece ao texto da segunda edição
de Was heißt Denken?, editada pela Max Niemeyer Verlag: Tübingen, 1961,
compreendendo as páginas 1-8.
Palavras-chave: Heidegger, metafísica, fenomenologia, interpretação heideggeriana de
Hölderlin.
Abstract: This is a translation of the first chapter of the first part of What is called
Thinking?, by Martin Heidegger (1889-1976). The text is a lesson originally given by
philosopher in the winter semester of 1951-1952, in the University of Freiburg, and
continued in the summer semester of 1952, at the same University. This translation, not
yet published in Portuguese, follows the text of the second edition of Was heißt
Denken?, edited by Max Niemeyer Verlag: Tübingen, 1961, comprising the 1-8 pages.
Keywords: Heidegger, metaphysics, phenomenology, Heidegger's interpretation of
Hölderlin.
Alcançamos o que significa pensar quando propriamente pensamos. Entretanto,
para que isso seja bem sucedido, precisaremos nos dispor a aprender a pensar.
1
Registra-se aqui um agradecimento cordial às sugestões de tradução dadas por Eduardo Henrique
Silveira Kisse, revisor desta tradução.
2
Doutor em filosofia pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Niterói - RJ, Brasil. Email:
[email protected], Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/1160022857910767
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Se nos deixarmos levar por esta aprendizagem, precisaríamos, antes, admitir que
não seríamos capazes de pensar.
2
Mas, ora, o homem é aquele que pode pensar – e isso com direito, porque ele é o
ser vivo racional. A razão, a ratio, se desdobra em pensamento. Como ser vivo racional,
o homem deve poder pensar, só dependendo de querer. De todo modo, talvez o homem
queira pensar e, no entanto, não o possa. Afinal, nesse querer pensar, ele quer demais e
pode menos. O homem pode pensar, conquanto ele tenha essa possibilidade. Mas,
sozinha, tal possibilidade ainda não nos garante o pensamento. Isto, pelo fato de
podermos apenas o que podemos.3 Mas nós podemos verdadeiramente, em
compensação, apenas aquilo que, por sua vez, nos possibilita a nós mesmos e, em
verdade, a nós em nossa essência. Essência na qual aquilo se adjudica sobre nossa
essência como o que nela nos mantém. Manter significa propriamente abrigar, deixar-se
apascentar na pastagem. O que nos mantém em nossa essência, nos mantém, apenas
enquanto nós mesmos re-tenhamos em nós mesmos o mantido. Nós o re-temos, quando
nós não o perdemos do pensamento. O pensamento é uma coleção de pensares. Em que?
Naquilo que nos mantêm, enquanto for pensado por nós, considerado, a saber: o que
permanece a-se-considerar. O considerado é aquilo com uma recordação contemplada,
porque nós o podemos. Apenas quando nós podemos o que em si é o a-se-considerar,
podemos propriamente pensar.
Para poder pensar, nós precisamos aprendê-lo. O que é aprender? O homem
aprende, na medida em que ele traz seu fazer e seu permitir à correspondência do que
cada vez em essência lhe é adjudicado. Nós aprendemos a pensar, pensar para o qual
nós atentamos quanto ao que há a se considerar.
Em nossa língua, por exemplo, tomamos a amizade como o que pertence à
essência do amigo. Do mesmo modo, tomaremos agora o que é em si o a-se-considerar:
3
Neste período, Heidegger usa dois vocábulos alemães diferentes, os verbos “vermögen” e “mögen”.
Enquanto o segundo significa um poder, o primeiro é não somente poder, mas um possuir, um ter, sendo
essa palavra associada ao substantivo “das Vermögen”, que quer dizer “bens” ou “fortuna”. Optamos pelo
uso de “poder” para traduzir ambos os vocábulos, para manter a repetição de termos feita por Heidegger
(Denn wir vermögen nur das, was wir vermögen.), mesmo que isso não chegue a mostrar qualquer
diferença substancial.
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o considerável. Todo considerável dá a pensar. Mas sempre existe esse dom, somente
contanto que o considerável já seja desde si o a-se-considerar. Tomamos agora e na
sequência aquilo que, por ser originalmente e antecipadamente, permanece o a se
considerar: o considerável. O que é o considerável? Como ele se mostra em nossa
época?
O considerável é o que ainda não pensamos; é um sempre e ainda não, apesar do
estado do mundo ser requerido consideravelmente. Esse processo antes aparece
livremente a sustentar o fato de que o homem prioritariamente está na lida, sem demora,
em vez de dar conferências em congressos e se movimentar em meras apresentações
daquilo que deveria ser e como deveria ser feito.
E, não obstante, − talvez o homem de até então há séculos já tenha lidado demais e
pensado muito pouco. Mas como alguém pode hoje afirmar que nós ainda não
pensamos, quando por toda a parte o interesse pela filosofia vive cada vez mais ruidoso,
quando todo homem quer saber sobre o que, afinal, é a filosofia. Os filósofos são “os”
pensadores. Assim eles se chamam, pois é na filosofia que acontece o pensar.
Ninguém quer ser contestado sobre a subsistência de um interesse pela filosofia.
Mas ainda haveria algo hoje pelo qual o homem não se interessa no sentido mesmo de
como ele entende “interessar”?
Inter-esse significa: estar sob e entre as coisas, deter-se em meio às coisas e
permanecer nelas. Para o interesse atual, vige somente o interessante. Isso é de um tal
modo que permite ser, no momento seguinte, já equivalente e, através de outros,
descolado, o que então diz respeito a um tanto quanto ao anterior. Julga-se hoje
frequentemente, por meio disso, apreciar-se algo de especial que se acha interessante.
Na verdade, por conta deste julgamento, lançou-se o interessante diretamente no que é
equivalente e imediatamente entediante.
Um enfático interesse pela filosofia ainda não testemunha uma predisposição ao
pensar. Com certeza há por toda a parte uma séria ocupação com a filosofia e suas
perguntas; ainda, há um elogiável esforço de erudição pela pesquisa de sua história.
Aqui existem tarefas úteis e louváveis para as quais apenas as melhores forças são
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suficientes em sua realização, sobretudo quando ela traz aos nossos olhos uma imagem
dos grandes pensadores. Mas mesmo o fato de que nós nos entreguemos insistentemente
ao longo dos anos a tratados e escritos dos grandes pensadores não garante que nós
mesmos pensemos ou estejamos prontos para aprender a pensar. Em contrapartida: a
ocupação com a filosofia pode nos simular até mesmo a aparência mais sólida de que
pensamos por meio do “filosofar” ininterruptamente.
Não obstante, continua estranho e parece presunção afirmar que o mais
considerável seja que nós ainda não pensamos. Daí, termos que comprovar esta
afirmativa. Ainda mais oportuno seria, no entanto, esclarecer a afirmativa somente uma
vez. Poderia mesmo acontecer a exigência de uma comprovação mínima, assim que se
clarifique com suficiência o que a afirmativa diz. Segundo ela:
O mais considerável em nossa época é que nós ainda não pensemos.
Com a expressão “o mais considerável”, o que deveria ser compreendido já foi
esclarecido. É o que nos faz pensar. Nós o observamos bem sopesamos cada palavra. Há
aqueles que nos dão a pensar desde si mesmos, como que a partir de seu lar. Há aqueles
que, por conseguinte, nos pedem que os consideremos, e que nós, pensando, a ele nos
dediquemos.
O mais considerável, o que nos dá a pensar, não é, portanto, de modo algum
fixado por nós, composto por nós ou representado por nós. O que na maioria se dá a
pensar desde si, o mais considerável, é, segundo a afirmação, isto: que nós ainda não
pensamos.
Isso quer dizer que, nós ainda não chegamos ao âmbito daquilo que quer ser
considerado a partir de si, em sentido essencial. A causa disso provavelmente será o fato
de nós, homens, ainda não nos dedicarmos o suficiente ao que deve ser considerado.
Então seria isso, o que nós ainda não pensamos, meramente um atraso, um retardo no
pensar ou, quando muito, um descuido por parte do homem? Daí poderia tal lentidão
humana ser remediada através de medidas convenientes em sentido humano. O descuido
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humano na verdade daria a pensar, mas ainda apenas de modo passageiro. Que nós
ainda não pensemos seria, em verdade, considerável, mas o mais considerável não
deveria nunca ser tomado como essa situação momentânea e remediável do homem
atual. Entretanto, nós o tomamos assim e insinuamos, por meio disso, o seguinte: o fato
de ainda não pensarmos, de modo algum tem sua causa no fato do homem ainda não
dedicar-se suficientemente ao que quer ser considerável por si, porque isso permanece
como a essência do a-se-pensar. Que nós ainda não pensemos tem sua origem muito
mais no fato de que esse a-se-pensar mesmo se desvie do homem, já há muito desviado.
Na sequência, vamos querer saber quando isso aconteceu. Vamos, antes disso,
perguntar avidamente como afinal podemos saber, em geral, de um tal acontecimento.
Perguntas de tal espécie à espreita precipitam-se de todo, quando nós ainda pouco
dissemos a este respeito: o que propriamente nos dá a pensar não se desviou em
qualquer instante do homem para uma época historicamente datada, mas o propriamente
a-se-pensar mantêm-se originariamente em tal desvio.
Por outro lado, o homem sempre pensou nossa história de algum modo; ele até
mesmo pensou o mais profundo e o confiou ao pensamento. Como o assim pensado, ele
permaneceu e permanece relacionado ao a-se-pensar. Não obstante, o homem não pode
propriamente pensar, conquanto se subtraia o a-se-pensar.
Então, quando nós, assim como estamos aqui agora, não nos deixamos precaver,
temos que rejeitar o até agora dito como apenas uma cadeia de proposições vazias e,
além disso, explicar que o que se disse nada tem a ver com ciência.
Seria bom se persistíssemos tão longamente quanto possível em defesa do já dito,
pois nós nos mantemos na distância necessária para o arranque, a partir do qual o salto
para o pensar talvez dê bom resultado. É mesmo verdade, que o até aqui dito e toda a
discussão seguinte com a ciência nada tem a ver, justamente, quando a discussão
deveria ser um pensamento. O motivo disso reside no fato da ciência, por sua vez, não
pensar e não poder pensar e, em verdade, para sua sorte, o que significa aqui para a
segurança de seu próprio caminho estabelecido. A ciência não pensa. Isso é uma
sentença escandalosa. Deixemos à sentença entregue ao ser caráter de escândalo
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também quando, logo a seguir, juntarmos a segunda parte; esta, segundo a qual a
ciência, não obstante, constantemente e a seu próprio modo, tem a ver com o
pensamento. Esse sentido é, contudo, apenas sério e fértil, se o abismo entre o
pensamento e a ciência se tornar visível, e isto em sua irreconciliabilidade. Deste modo,
não há aqui qualquer ponte, mas um salto. Daí ser um mal as pontes emergenciais, que
querem instituir justamente hoje um cômodo tráfego entre o pensamento e a ciência.
Daí, termos agora de suportar o escandaloso e o estranho do pensamento – [afirmar] que
estamos prontos a aprender a pensar. Aprender significa: trazer nosso fazer e nosso
deixar ser em correspondência do que nos adjudica essencialmente a cada vez. Para tal,
temos que nos pôr a caminho. Se aprendermos a pensar, não devemos nos enganar
afobadamente sobre as perguntas críticas, sobretudo, pelo caminho que percorríamos,
mas sim nos admitirmos às perguntas procuradas por aquilo, que não pode ser achado
por meio de qualquer invenção. Nós, especialmente hoje, apenas podemos aprender se,
concomitantemente, também desaprendermos. Para o caso do qual tratamos: nós
podemos apenas aprender o pensar, caso desaprendamos sua essência de até agora a
partir do fundamento. Mas, para isso, é necessário que nós a aprendamos ao mesmo
tempo.
Nós dizíamos: o homem ainda não pensa e, em verdade, porque o a-se-pensar
desvia-se dele; ele não pensa de modo algum apenas porque o homem volta-se de modo
insuficiente ao a-se-pensar.
O a-se-pensar desvia-se do homem. Ele o evita. Então como podemos nós nomear
ou também saber mesmo o mínimo de algo que desde sempre se desvia de nós? O que
se desvia, nega a chegada. Sozinho – o desviar-se não é nada. Desvio é acontecimento.
O que se desvia pode até mesmo tocar o homem em sua essência e requisitá-lo como
todo o presente que vem ao seu encontro e a ele se refere. Essa referência através do real
é tida como o que constitui a realidade do real. Mas a referência através do real pode
bloquear o homem contra o que o toca, e o toca na essência de certa maneira
enigmática, escapando-o ao desviar-se. O acontecimento do desvio poderia ser o mais
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presente em todos os agora presentes e assim exceder sem fim a atualidade de todo
atual.
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O que se desvia de nós, move-nos em conjunto, percebendo-o imediatamente, de
modo geral ou não. Quando chegamos ao impulso do desvio, estamos – de modo bem
diverso ao dos pássaros migratórios – no impulso que nos atrai enquanto nos desvia.
Quando estamos com o atraído, o impulso nos atrai; então a nossa essência está já
caracterizada através desse “impulso a...”. No impulso ao se-desviando indicamos a nós
mesmos no desviar-se. Nós somos nós, enquanto assim nos indicarmos; não
posteriormente e não adicionalmente, mas sim: esse “no impulso a...” é em si um
indicar essencial e daí constante do se-desviando. “No impulso a...” já diz: mostrando o
se-desviando.
Conquanto que o homem esteja neste impulso, ele se mostrará, como o que atrai, o
que se desvia. Enquanto mostra isso, o homem é o que mostra. Entretanto, com isso, o
homem não é momentaneamente homem e então, ainda, além disso, e ocasionalmente,
aquele que mostra, mas sim: atraído pelo se-desviando, no impulso a ele e,
consequentemente, mostrando o desvio, o homem é, antes de tudo, homem. Sua
essência reside em ser este que mostra. O que em si, segundo sua essência, é o que
mostra. No impulso ao se-desviando, o homem é um sinal. Porque esse sinal indica o
se-desviando e, no entanto, não subministra muito do que aí se des-via, do se-desviando.
O sinal permanece sem interpretação.
É assim que nos diz Hölderlin nos esboços para um hino:
“Um sinal somos nós, indecifrado.”
E prossegue com outros dois versos:
“Indolores somos nós e quase
perdemos a língua no desconhecido.”
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Os esboços ao hino foram, ao lado de títulos como “A serpente” (Die Schlange),
“O sinal” (Die Zeichen), “A ninfa” (Die Nymphe), igualmente chamados de
“Mnemosyne”. Podemos traduzir esta palavra grega por: memória 4. Nossa língua diz: “a
memória”; mas ela diz também: o conhecimento (Die Erkenntnis) e, por outro lado: o
acontecimento. Kant, p.ex., diz com sua linguagem própria: o conhecimento. Devemos,
assim, traduzir sem violentar o vocábulo feminino grego correspondente: “Die
Gedächtnis” (A Memória).
É que Hölderlin toma a palavra grega mnemosine como o nome da filha de titãs.
Ela é, de acordo com o mito, filha do Céu e da Terra. Mito quer dizer: a palavra dizente.
Dizer é para os gregos: manifestar, fazer aparecer, a saber: o brilho e o no brilho, sendo
em sua epifania. Mito é o sendo em seu dizer: o manifestar no desvelamento de sua
evocação. O mito é a evocação tocante a toda a essência do homem já e desde o
fundamento, evocação esta que faz pensar no que se manifesta. Lógos diz o mesmo;
mitos e lógos não seguem nenhum itinerário, como é muito comum a história da
filosofia crer, através da filosofia como tal em uma oposição, mas sim já os primeiros
pensadores dos gregos (Parmênides, fragmento 8) usavam mitos e lógos com o mesmo
significado; mitos e lógos caminham aí apenas e de modos opostos, onde nem mitos
nem lógos possam guardar sua essência inicial. Isto já acontecia em Platão. É um
preconceito, herdado na base do platonismo e do racionalismo moderno, que a história e
a filologia acreditem que os mitos sejam destruídos através do lógos. O religioso não é
nunca destruído pela lógica, a menos que um deus se desvie.
Mnemosyne, a filha do Céu e da Terra, fora desposada por Zeus em nove noites,
sendo a mãe das musas. Jogo e música, dança e poesia pertencem ao seio de
Mnemosyne, da memória. Notoriamente essa palavra quer dizer outra coisa do que
somente a faculdade determinável pela psicologia, a conservação do passado na
representação. A memória pensa no pensado. Mas, como o nome da mãe das musas,
“memória” não quer dizer um pensar qualquer pensamento. Memória é a reunião do
4
A palavra “memória” em alemão é traduzida por “das Gedächtnis” com gênero neutro. No entanto,
Heidegger sugere traduzir “mnemosyne” por “die Gedächtnis”, que seria memória no gênero feminino, tal
como já encontrada na língua portuguesa.
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pensar naquilo que por toda a parte já quer ser considerado antecipadamente. Memória é
a reunião do recordar. Ela salva consigo e oculta em si o a se pensar a cada vez
antecipadamente em tudo o que essencia e se adjudica como o que é, o que segue sendo:
memória, a mãe das musas: o recordar sobre o a-se-pensar é a fonte do poetar. O poetar
é, por isso, as águas que, de vez em quando, refluem para o manancial, para o pensar
como recordar. Contanto que nós livremente creiamos que a lógica nos dá uma
explicação sobre o que seja pensar, não poderemos considerar, em que medida todo
poetar reside no recordar. Todo poema provém da de-voção da recordação.
Sob o título de Mnemosyne, Hölderlin diz:
“Um sinal somos nós, indecifrado...”
Nós quem? Nós, os homens de hoje. Os homens de um hoje que de já há muito e
que ainda perdurará por um longo tempo, para o qual nenhum calendário da história
obteve uma medida. No mesmo hino, Mnemosyne diz o seguinte: “Longo é o tempo” –
a saber, aquele no qual nós somos um sinal sem interpretação. Isso não dá o suficiente a
pensar quanto a sermos um sinal e, em verdade, um sinal sem interpretação? Talvez isso
que o poeta diz nessas e naquelas palavras, pertença àquilo no qual o considerável se
mostre a nós, a aquele mais considerável, no qual a afirmação procura pensar sobre
nosso tempo considerável. Talvez essa afirmação traga, quando nós apenas a
discutirmos de modo suficiente, alguma luz sobre a palavra do poeta; talvez também
nos chame pretensiosamente mais uma vez a palavra de Hölderlin, por ela ser poética, e
daí indicadora do caminho de um pensar sobre o mais considerável. Não obstante,
permanece, até aqui, obscuro o que a indicação à palavra de Hölderlin possa significar.
Continua questionável com que direito nós tomamos o caminho da tentativa de pensar
um poeta, e principalmente este. Continua inexplicado também em que solo e dentro de
quais limites a indicação do poético tem que ficar.
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