ASPECTOS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO MINERÁRIO
Lilian Mendes Haber1
Podemos dizer que o direito minerário possui base constitucional antiga e mais
do que nunca este fundamento constitucional se consolidou e foi detalhado.
A afirmação poderá ser adiante confirmada quando verificamos variados
dispositivos na Constituição de 1988 que tratam especificamente da questão minerária,
como veremos nos tópicos adiante colacionados.
1
PROPRIEDADE DOS RECURSOS MINERAIS
O direito minerário encontra sua expressão máxima na Constituição Federal
(CF). É ela quem delimita a quem pertence a propriedade dos recursos minerários, quem
os normatiza e os regula com suas especificidades inerentes e as obrigações decorrentes
desta exploração.
Com efeito, “a propriedade dos recursos minerários é da União”. Art. 20 – São
bens da União IX – os recursos minerais, inclusive os do subsolo.
Em adendo, a Constituição Federal mais adiante detalha o que vem a ser essa
propriedade da União.
Art. 176 - As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais
de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de
exploração ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao concessionário
a propriedade do produto da lavra (destaques nosso).
Pela leitura do dispositivo acima, podemos verificar que a União é proprietária
das jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais, sendo que estes se constituem
em propriedade distinta do solo.
Sobre este dispositivo transcrevemos o seguinte comentário de William Freire: 2
Os recursos minerais (não apenas as reservas minerais) e as jazidas são domínio
da União. Isso impõe classificar recursos minerais e as jazidas em categorias à
parte dos bens dominicais e dos bens de uso especial, porque inclui sob o domínio
da União tanto os recursos minerais conhecidos quanto os potenciais. Essa
distinção se justifica, ainda, porque os recursos minerais são destinados à
exploração e a explotação exclusivamente pelo minerador e são exauríveis – o
que lhes acrescenta uma característica de temporalidade – não se mantendo
inteiros e perpetuamente no domínio no domínio estatal.
Essa característica, só encontrável nos recursos minerais não renováveis, cria um
equilíbrio sutil: enquanto algumas reservas se exaurem, outras são descobertas.
Esta propriedade não renovável da União com características especiais é
comercializada pelo concessionário, sob sua conta e risco e o que o concessionário tem
como propriedade é o produto da lavra, e não ela em si mesma.
A este respeito o Supremo Tribunal Federal já se manifestou na ADI 3366 – DF,
Relator Min. Carlos Britto:
1
Procuradora do Estado do Pará, Advogada, Mestre em Direito Internacional Ambiental – Universidade de
Limoges – França.
2
FREIRE, William. Código de Mineração anotado. 4. ed. rev. atual. ampl. Belo Horizonte: Mandamentos,
2009. p.61.
(...) A propriedade do produto da lavra das jazidas minerais atribuídas ao
concessionário pelo preceito do art. 176 da Constituição do Brasil é inerente ao
modo de produção capitalista. A propriedade sobre o produto da exploração é
plena, desde que exista concessão de lavra regularmente outorgada. 9. Embora o
art. 20, IX, da CB/88 estabeleça que os recursos minerais, inclusive os do subsolo,
são bens da União, o art. 176 garante ao concessionário da lavra a propriedade do
produto de sua exploração. 10. Tanto as atividades previstas no art. 176 quanto as
contratações de empresas estatais ou privadas, nos termos do disposto no § 1º do
art. 177 da Constituição, seriam materialmente impossíveis se os concessionários
e contratados, respectivamente, não pudessem apropriar-se, direta ou
indiretamente, do produto da exploração das jazidas (…).
E a Constituição Federal prossegue ao explicitar de que modo pode ser esta
exploração, ou seja, qual regime de direito minerário poderá ser aplicado.
Art. 176 - § 1º - A pesquisa e a lavra de recursos minerais e o aproveitamento dos
potenciais a que se refere o "caput" deste artigo somente poderão ser efetuados
mediante autorização ou concessão da União, no interesse nacional, por
brasileiros ou empresa constituída sob as leis brasileiras e que tenha sua sede e
administração no País, na forma da lei, que estabelecerá as condições específicas
quando essas atividades se desenvolverem em faixa de fronteira ou terras
indígenas (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 6, de 1995) (Destaques
nosso).
(...)
§ 3º - A autorização de pesquisa será sempre por prazo determinado, e as
autorizações e concessões previstas neste artigo não poderão ser cedidas ou
transferidas, total ou parcialmente, sem prévia anuência do poder concedente.
§ 4º - Não dependerá de autorização ou concessão o aproveitamento do potencial
de energia renovável de capacidade reduzida.
Na leitura do dispositivo acima transcrito observamos que a Constituição utiliza
as expressões autorização e concessão, todavia, estas não são idênticas aos institutos de
direito administrativo, já que têm regras próprias na própria Constituição e na legislação
minerária.3
Normas constitucionais estas que devem encontrar ressonância em todo o
ordenamento minerário infraconstitucional e tem precedência sobre as demais, vez que
são aplicadas em razão do interesse nacional.4
O interesse nacional decorre do fato de que os recursos minerários são
considerados essenciais, estratégicos para o desenvolvimento econômico do país e a
União proprietária e a quem compete privativamente legislar manifesta com estas
prerrogativas a soberania do país sobre os seus próprios recursos.
A Constituição Federal, também, prevê o que vem a ser o monopólio da União
no art. 177, dentre os quais a pesquisa, a lavra, o enriquecimento, o reprocessamento, a
industrialização e o comércio de minérios e minerais nucleares e seus derivados, exceto
os radioisótopos cuja produção, comercialização e utilização poderão ser autorizadas sob
regime de permissão (inciso V), sendo que toda atividade nuclear somente é admitida no
Brasil para fins pacíficos, pelo Congresso Nacional (art. 21, XXIII, “a”).
3
Os termos autorização e concessão são inadequados para designar o consentimento da União ao
minerador para explorar e explotar recursos minerais, porque confundem esses atos administrativos, de
natureza mineral especial, com as autorizações e concessões clássicas de Direito Administrativo. Melhor
seria ter o legislador adotados as expressões Consentimento para pesquisa e Consentimento para lavra,
criando terminologia própria para designar esses atos administrativos de natureza eminentemente minerária
(Idem, ibidem, p. 66).
4
E a atividade minerária é considerada pela legislação ordinária de utilidade pública. Ex: VI art. 5º, f, do
Decreto-Lei nº 3.365/1941.
O texto constitucional vai além nas preocupações com a adequada utilização
dos recursos minerais nucleares, quer ao determinar o regime de aproveitamento, quer
ao estabelecer que o monopólio inclui os riscos e resultados decorrentes das atividades
nele mencionadas, sendo vedado à União ceder ou conceder qualquer tipo de
participação, em espécie ou em valor, na exploração de jazidas de petróleo ou gás
natural, ressalvado o disposto no art. 20, § 1º, cujo dispositivo mais adiante é explicitado,
ou seja os royalties aqui são, também, devidos aos órgãos da administração direta da
União, aos Estados, aos Municípios e ao Distrito Federal (DF).
2
PARTICIPAÇÃO NOS RESULTADOS OU COMPENSAÇÃO FINANCEIRA
SOBRE OS RECURSOS MINERÁRIOS – ROYALTIES
A participação nos resultados ou compensação financeira pela exploração de
recursos minerais é criada e garantida no texto constitucional de 1988 aos Estados,
Distrito Federal, aos Municípios e aos órgãos da Administração Direta da União; e remete
à lei5 sua disciplina.
Art. 20 - São bens da União:
§ 1º - É assegurada, nos termos da lei, aos Estados, ao Distrito Federal e aos
Municípios, bem como a órgãos da administração direta da União, participação no
resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins
de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo
território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou
compensação financeira por essa exploração.
Este dispositivo constitucional é essencial para o deslinde de várias
controvérsias.
Em primeiro lugar, no tocante às pessoas de direito público que recebem
participação ou compensação financeira, ou seja, a lei infralegal não pode inovar e atribuir
este recebimento a outras pessoas jurídicas. Podemos observar que em relação à União
somente os órgãos da administração direta estão aptos por determinação constitucional
ao recebimento desta receita.
É inconstitucional, neste aspecto, lei ordinária que determina o recebimento de
participação ou compensação financeira à ente da administração indireta da União.
Em segundo lugar, cumpre dizer que “esta receita ligada à exploração
minerária é receita patrimonial originária 6 de cada ente”. Este entendimento há muito já foi
consolidado.7
Muito embora o art. 20, IX, da CF, estabeleça que os recursos minerais são da
União, a própria Constituição Federal estabelece em seu art. 20, § 1º, que parte da receita
pela exploração ou compensação por esta exploração pertence aos entes federativos
(Estado, Município e DF) e dos órgãos da Administração Direta da União.
Em outras palavras, embora os recursos naturais da plataforma continental e
os recursos minerais sejam bens da União (CF, art. 20, V e IX), a participação ou
compensação aos Estados, Distrito Federal e Municípios no resultado da exploração de
5
Conferir para a mineração a Lei Federal nº 7.990/1989 e Lei Federal nº 8.001/1990 que regulamentaram a
CFEM, com as alterações da Lei Federal nº 9.984/2000.
6
Podemos dizer que as receitas dividem-se em dois grupos, compreendendo: a) as receitas originárias ou
patrimoniais (ou de economia privada) e b) as receitas derivadas (ou de economia pública).
7
Jurisprudência:
AC 94.01.26833-9/DF; APELAÇÃO CÍVEL Relator JUIZ HILTON QUEIROZ Convocado JUIZA VERA
CARLA CRUZ (CONV.) Órgão Julgador QUARTA TURMA Publicação 11/06/1999 DJ p.502 Data da
Decisão 26/03/1999.
petróleo, xisto betuminoso e gás natural são receitas originárias destes últimos entes
federativos (CF, art. 20, § 1º).8
A receita da participação no resultado ou a receita da CFEM (Compensação
Financeira pela Exploração de Recursos Minerais), portanto, tem natureza jurídica de
preço público, já que se constituem em exação não tributária, de caráter indenizatório, em
razão do bem lesado para a obtenção do recurso mineral, que está no espaço territorial
dos entes da federação.
Tal entendimento está em consonância com o próprio conceito de receita
pública da Lei nº 4.320/1964, já que Receita pública é a entrada que, integrando-se ao
patrimônio público, sem quaisquer reservas, condições ou correspondência no passivo,
vem acrescer o seu vulto, como elemento novo e positivo. 9
Esta confirmação pelos tribunais brasileiros sobre a natureza jurídica da
participação nos resultados e da CFEM traz reflexos quanto à prescrição para exigir tal
direito. Tema este, a ser abordado em análise específica.
A importância da disciplina constitucional quanto ao direito minerário
prossegue, já que delineia inclusive a participação ao proprietário do solo nos resultados
da lavra e remete à disciplina da lei: “Art. 176, § 2º - É assegurada participação ao
proprietário do solo nos resultados da lavra, na forma e no valor que dispuser a lei”.
Ademais, a participação nos resultados da lavra é assegurada aos indígenas,
nos termos da lei. Porém, esta exploração de recursos minerais somente poderá ser
realizada em terras indígenas mediante autorização do Congresso Nacional e ouvidas as
comunidades afetadas (art. 49, IX, c/c art. 231, § 3º, ambos da CF).
3
COMPETÊNCIA PARA LEGISLAR SOBRE DIREITO MINERÁRIO E DIREITO
FINANCEIRO
A competência constitucional para legislar sobre direito minerário é da União,
em razão da dicção do art. 22, XII, da CF: Compete privativamente à União legislar
sobre: XII – jazidas, minas, outros recursos minerais e metalurgia.
Todavia, o art. 24 da Lei Maior, que trata da competência concorrente para
legislar sobre direito financeiro (inciso I do referido artigo), dispõe em seus §§1º e 2º que a
competência da União limitar-se-á a traçar normas gerais, não excluindo a competência
suplementar do Estado, “literis”:
Art. 24 - Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar
concorrentemente sobre:
I - direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico;
§ 1º - No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a
estabelecer normas gerais.
§ 2º - A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a
competência suplementar dos Estados.
§ 3º - Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a
8
9
Jurisprudência:
MS 24312 / DF - DISTRITO FEDERAL - MANDADO DE SEGURANÇA - Relator(a): Min. ELLEN
GRACIE - Julgamento: 19/02/2003 Órgão Julgador: Tribunal Pleno Publicação: DJ DATA-19-122003 PP-00050 EMENT v. -02137-02 p.-00350.
BALEEIRO, Aliomar. Uma Introdução à Ciência das Finanças. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999, apud
TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 5. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1998.
p.157.
competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.
§ 4º - A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da
lei estadual, no que lhe for contrário.
Normas Gerais são normas concernentes a interesses que afetam a nação
como um todo, v.g., defesa do país frente a nações estrangeiras, ou ainda, aquelas
normas que traçam diretrizes essenciais para o funcionamento da federação ou ainda de
determinados institutos que exigem aplicação uniforme pelos entes federados.
Ou seja, a União traça parâmetros de conduta para serem adotados pelos
demais entes da federação, mas não exclui a possibilidade de os demais entes em
caráter suplementar editarem suas respectivas normas.
Assim é que, se algum aspecto do direito financeiro relativo à questão
minerária não for contemplado pela União, pode o Estado suplementar, por lei, tal
necessidade, apenas no tocante ao interesse próprio deste ente federado, 10 como por
exemplo, sobre os critérios de atualização financeira da dívida gerada pelo não
recolhimento de CFEM.
4
COMPETÊNCIA FISCALIZATÓRIA SOBRE OS RECURSOS MINERÁRIOS
Todavia, para fiscalizar as receitas advindas da exploração, a competência
constitucional é comum, ou seja da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios. É o teor do art. 23, XI, da CF: É competência comum da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios... XI – registrar, acompanhar e fiscalizar as
concessões de direitos de pesquisa e exploração de recursos hídricos e minerais em seus
territórios.
É constitucional a lei que habilita os demais entes além da União a editar
normas que tratem sobre os aspectos fiscalizatórios da cobrança da receita pela
exploração minerária.
Os convênios ou instrumentos de cooperação técnica, neste sentido, podem
ser editados pelos entes federados não como forma de delegação anômala de
competência da união para os demais entes federados, mas sim como reforço do disposto
no art. 23, parágrafo único, que contempla o princípio da cooperação dos entes
federados, pendente de lei complementar, mas exercitável desde logo por se tratar de
princípio intrínseco ao próprio federalismo adotado no Brasil.
E, os convênios ou instrumentos de cooperação técnica apesar de desejáveis
não são obrigatórios para que a fiscalização levada a efeito por um ente federado possa
ser considerada válida. Vale ressaltar que nem mesmo a edição de uma lei por este ente
seja obrigatória, de per si, já que o art. 23, XI, da CF é autoaplicável.
Todavia, na ausência de lei específica para fiscalizar problemas de ordem
prática e operacional poderiam ser gerados, já que o ato de fiscalizar decorre do natural
poder de polícia de que goza a administração e, como este pode ser limitante da esfera
patrimonial do particular, é necessário que seja adequadamente disciplinado para não ferir
outros princípios e garantias constitucionais, como o princípio do contraditório e ampla
defesa (art. 5º, LV da CF), e o devido processo legal, dentre outros.
10
A este respeito conforme ACO-960, pendente de julgamento, em que o Estado do Pará normatizou o
recebimento de CFEM diretamente aos entes da federação por lacunas na lei federal e ante a não
implementação pela União de recolhimento direto, na forma do disposto no art. 8º da Lei Federal nº
8.001/1990.
A cominação de infrações e penalidades, por lei ordinária, tudo em consonância
com o princípio do contraditório e da ampla defesa, insculpidos na Carta Magna é
necessária em estrita observância à necessidade de implementar uma atividade
fiscalizatória que frutifique em uma efetiva arrecadação para o ente estadual, sem,
contudo, incorrer em quaisquer medidas confiscatórias.
Ademais, o capítulo VII da Constituição Federal que trata da Administração
Pública, o caput do artigo 37 e seus incisos elencam os princípios que devem ser
obedecidos pela administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da
União, Estados, Distrito Federal e Municípios.
Dentre os referidos princípios está previsto no inciso XXII:
Art. 37, XXII - as administrações tributárias da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios, atividades essenciais ao funcionamento do Estado,
exercidas por servidores de carreiras específicas, terão recursos prioritários para a
realização de suas atividades e atuarão de forma integrada, inclusive com o
compartilhamento de cadastro e de informações fiscais, na forma da lei ou
convênio.
Não há, portanto, qualquer obstáculo que possibilite o intercâmbio de
informações, inclusive quanto ao cadastro das concessionárias exploradoras de recursos
minerais e contribuintes do ICMS e compartilhamento e troca de outras informações, haja
vista a diretriz estampada no preceito constitucional supra transcrito.
5
PAPEL DO ESTADO NO DIREITO MINERÁRIO
A Constituição Federal além de tratar sobre receita pela exploração minerária,
propriedade dos recursos naturais, legislação de direito minerário e fiscalização também
trata de imprimir ao Estado (aqui todos os entes representados), a responsabilidade de
ser agente normativo e regulador da atividade econômica, com as funções de incentivo e
planejamento, este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.
Art. 174 - Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado
exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento,
sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.
§ 3º - O Estado favorecerá a organização da atividade garimpeira11 em
cooperativas, levando em conta a proteção do meio ambiente e a promoção
econômico-social dos garimpeiros.
§ 4º - As cooperativas a que se refere o parágrafo anterior terão prioridade na
autorização ou concessão para pesquisa e lavra dos recursos e jazidas de
minerais garimpáveis, nas áreas onde estejam atuando, e naquelas fixadas de
acordo com o art. 21, XXV, na forma da lei (destaques nosso).
6
DIREITO AMBIENTAL E DIREITO MINERÁRIO NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Além disso, a questão ambiental e minerária estão interligadas na Constituição
Federal.
É o teor do art. 170, VI:
Art. 170 - A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na
livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames
da justiça social, observados os seguintes princípios:
11
Conforme o Estatuto do Garimpeiro – Lei Federal nº 11.685, de 2.6.2008, DOU de 3.6.2008.
VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme
o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e
prestação (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003).
E,
Art. 225 - § 2º - Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o
meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão
público competente, na forma da lei.
É interessante notar que o art. 225, § 2º, estabelece uma presunção
constitucional, a de que a exploração de recursos minerais gera sempre um impacto
ambiental com danos, já que impõe a obrigação de recuperar o meio ambiente degradado
ante esta exploração. Constitucionalmente, não há a possibilidade de que a atividade de
mineração não gere dano, este é sabido e consentido ante o interesse nacional que
envolve a atividade minerária.
Todavia, a Constituição prevê uma reparação por intermédio de recuperação
do meio ambiente degradado, com a solução técnica a ser exigida pelo órgão público
competente e na forma da lei.
E, a obrigação de recuperar os danos causados pela atividade minerária se
aplica ao proprietário do solo, em razão da solidariedade adotada no direito ambiental e
reconhecida pelos tribunais.
Ademais, aplicamos à atividade minerária os seguintes dispositivos ambientais
constitucionais:
Estudo Prévio de Impacto Ambiental
Art. 225 - § 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder
Público:
...
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente
causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de
impacto ambiental, a que se dará publicidade;
E, a Constituição Federal, no art. 225, § 2º, determina que aquele que explorar
recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado (princípio da
obrigatoriedade da recuperação ambiental), de acordo com solução técnica exigida pelo
órgão público competente, na forma da lei, ou seja, é responsabilidade objetiva do
empreendedor.
A Constituição com este dispositivo deixa claro que não existe atividade
minerária sem que haja dano ambiental. Todavia, que a exploração traz como
consequência a obrigatoriedade de recuperar o meio ambiente degradado, em razão de
uma atividade lícita; sendo o dano, portanto, tolerado desde que mitigado o quanto
possível.
Também não é qualquer recuperação ao alvedrio do empreendedor, mas sim,
solução técnica exigida pelo órgão público competente.
Resta saber quem é o órgão público competente. E este em uma interpretação
sistemática da legislação em vigor é órgão do Sistema Nacional do Meio Ambiente –
SISNAMA, a quem compete conduzir o licenciamento ambiental do empreendimento.
É sabido que os empreendimentos mineiros raramente ficam circunscritos a
apenas um Município. Quando há a mera notícia de que vai haver exploração minerária
em determinado local é estabelecida uma verdadeira corrida de pessoas com os mais
variados interesses para o local, quer seja em busca de emprego, quer seja para fornecer
materiais e equipamentos para o empreendimento ou em busca de algum benefício
econômico ou social.
Tudo isso precisa estar bem delineado no Estudo de Impacto Ambiental – EIA,
do empreendimento, documento técnico apresentado pelo empreendedor e que vai ser
analisado pelo órgão ambiental correspondente.
Voltamos à questão de quem irá apreciar a questão ambiental. Todo projeto
mineiro tem uma área de influência, a saber: a área de influência direta (AID) e área de
influência indireta (AII). Geralmente, quando há vários municípios envolvidos, mas ainda
dentro de um mesmo Estado da federação, a responsabilidade por receber o EIA será da
Secretaria Estadual de Meio Ambiente que por meio de sua equipe técnica poderá pedir
esclarecimentos e estudos complementares tantas vezes quantas forem necessárias para
a melhor segurança na aprovação do projeto.
Geralmente, a depender da legislação estadual de cada ente federativo, após a
realização de parecer pela equipe técnica do órgão estadual, o EIA e o Relatório de
Impacto Ambiental – RIMA, (Relatório simplificado e em linguagem acessível que resume
o EIA para a população e interessados), bem como o referido parecer são submetidos ao
Conselho Estadual de Meio Ambiente, colegiado de natureza plural (sociedade
organizada e Poder Público) que confeccionará o seu próprio parecer e o submeterá a
aprovação da plenária, para efeito de concessão da licença prévia.
O ato que concede a licença prévia ambiental, nesta hipótese, tem natureza de
ato jurídico complexo, pois se inicia com uma declaração do Conselho Colegiado e
aperfeiçoa-se com o ato do Secretário Estadual de Meio Ambiente que emite a licença.
Este momento de obtenção da licença prévia é muito importante, em razão de
que a atividade minerária está sujeita à rigidez locacional, ou seja, é uma atividade que
não se pode escolher o local para exercê-la, pois condicionada à ocorrência do recurso
mineral na natureza.
O licenciamento ambiental é composto de etapas. Assim, tanto a licença prévia,
quanto à de instalação e a de operação podem ser concedidas com condicionantes e
exigências. As primeiras surgem em razão da necessidade de melhor adequar um ponto
do projeto e não o inviabilizam, as segundas impedem que a próxima etapa do
licenciamento seja alcançada enquanto não se realizarem.
Vale ressaltar de tudo o quanto foi visto aqui neste item que a Constituição
Federal estabelece a obrigatoriedade de recuperar o meio ambiente degradado, isto é,
este deve ser novamente inserido na dinâmica da natureza. Daí a importância do
acompanhamento da atividade minerária desde o momento da pesquisa, a qual já produz
resultados danosos (como supressão de vegetação que exige autorização específica),
durante toda a definição do projeto, sua instalação e operação, bem como posteriormente
com o encerramento deste.
Sobre o encerramento da atividade mineira é exigido pelo Departamento
Nacional de Produção Mineral – DNPM, o Plano de Fechamento da Mina, 12 que deve
contemplar soluções para os meios físico, biótico e sócio-econômico (é dinâmico e pode
ser atualizado no decorrer da exploração) e que o empreendedor deve apresentar
usualmente em conjunto com o denominado Plano de Recuperação da Área Degradada PRAD. Estes documentos, também, devem ser apresentados ao órgão ambiental
licenciador.
A Lei Federal nº 6.938/1981 (Política Nacional do Meio Ambiente -PNMA)
estabelece em seu art. 2º, VIII, o atendimento a variados princípios dentre os quais, o de
recuperação das áreas degradadas, regulamentado quanto à atividade minerária pelo
Decreto federal nº 97.632/1989 que dentre outras medidas, estabelece que por ocasião
da apresentação do EIA o empreendedor deverá, também, apresentar o PRAD (art. 1º).
Este decreto conceitua degradação como os processos resultantes dos danos
ao meio ambiente, pelos quais se perdem ou se reduzem algumas de suas propriedades,
tais como, a qualidade ou capacidade produtiva dos recursos ambientais (art. 2º).
E o âmbito da recuperação13 que deverá ter por objetivo o retorno do sítio
degradado a uma forma de utilização, de acordo com plano preestabelecido para o uso
do solo, visando a obtenção de uma estabilidade ao meio ambiente (Art. 3º).
12
13
Segundo SOUZA, Marcelo Gomes de. Fechamento de Mina: aspectos legais, 2003. Disponível em:
<http://www.geologo.com.br/fechamentomina.htm>. Acesso em: 17 ago. 2010. Ipsi literis: “O Diretor Geral
do Departamento Nacional da Produção Mineral – DNPM editou a Portaria nº 237, de 18.10.2001,
alterada pela Portaria nº 12, de 22.1.2002, instituindo as Normas Reguladoras de Mineração (NRM´s),
tendo a NRM nº 20 disciplinado os procedimentos administrativos e operacionais em caso de
fechamento de mina (cessação definitiva das operações mineiras), suspensão (cessação temporária) e
retomada de operações mineiras, estabelecendo, inclusive, que tais hipóteses dependem de prévia
comunicação e autorização do DNPM, devendo o minerador apresentar requerimento justificativo,
devidamente acompanhado dos diversos documentos que formam o Plano de Fechamento ou de
Suspensão da Mina.
Do Plano de Fechamento de Mina devem constar: a) relatório dos trabalhos efetuados; b)
caracterização das reservas remanescentes; c) plano de desmobilização das instalações e
equipamentos que compõem a infra-estrutura do empreendimento mineiro indicando o destino a ser
dado
aos
mesmos;
controladores;
h) plano de controle de lançamento de efluentes com caracterização de parâmetros controladores;
i) medidas para impedir o acesso à mina de pessoas estranhas e interditar com barreiras os acessos às
áreas perigosas; j) definição dos impactos ambientais nas áreas de influência do empreendimento
levando em consideração os meios físico, biótico e antrópico; k) aptidão e intenção de uso futuro da
área; l) conformação topográfica e paisagística levando em consideração aspectos sobre a estabilidade,
controle de erosões e drenagens; m) relatório das condições de saúde ocupacional dos trabalhadores
durante a vida útil do empreendimento mineiro; e, n) cronograma físico e financeiro das atividades
propostas. Segundo a NRM nº 20, o Plano de Fechamento de Mina deve estar contemplado no Plano de
Aproveitamento Econômico da jazida - PAE, sendo que o DNPM poderá exigir sua apresentação, na
hipótese da mina não possuir o plano de fechamento, que será atualizado periodicamente, no que
couber, e estar disponível na mina para fiscalização.
Verifica-se, então, que o Plano de Fechamento exigido pelo DNPM prevê que as etapas de
desativação e fechamento de mina estão sendo consideradas desde o início do desenvolvimento do seu
projeto de implantação, permitindo a sua constante atualização e flexibilização, desde que não se
modifique a solução previamente aprovada pelo órgão ambiental competente para a recuperação da
área degradada pela mineração, prevista no EIA/RIMA, que ensejou a licença ambiental da mina.
d)atualização
de
todos
os
levantamentos
topográficos
da
mina;
e) planta da mina na qual conste as áreas lavradas recuperadas, áreas impactadas recuperadas e por
recuperar, áreas de disposição do solo orgânico, estéril, minérios e rejeitos, sistemas de disposição, vias
de acesso e outras obras civis; f) programas de acompanhamento e monitoramento relativos a: Isistemas de disposição e de contenção; II- taludes em geral; III- comportamento do lençol freático e IVdrenagem das águas; g) plano de controle da poluição do solo, atmosfera e recursos hídricos, com
caracterização de parâmetros”.
Confira também o conceito de recuperação na Lei Federal nº 9.985/2000 (Lei do Sistema Nacional de
Unidades de Conservação - SNUC). Art. 2º XIII- restituição de um ecossistema ou de uma população
silvestre degradada a uma condição não degradada, que pode ser diferente de sua condição de
condição original.
A obrigatoriedade de recuperação da área degradada tem, também,
repercussão na seara penal, em razão de dispositivo específico contido na Lei Federal nº
9.605/1998:
Art. 55 - Executar pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem a
competente autorização, permissão, concessão ou licença, ou em desacordo com
a obtida:
Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa.
Parágrafo único - Nas mesmas penas incorre quem deixa de recuperar a área
pesquisada ou explorada, nos termos da autorização, permissão, licença,
concessão ou determinação do órgão competente.
Como podemos observar, a questão ambiental não é posta de lado na
atividade minerária, muito pelo contrário, todavia, não é impeditiva 14 desta atividade, uma
vez que na existência de conflito entre o interesse nacional e o respeito ao meio
ambiente, deve prevalecer o primeiro, com a recuperação do segundo.
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ATIVIDADE MINERÁRIA E TRIBUTAÇÃO
Como atividade econômica que é sobre esta incidem as regras relativas ao
Imposto sobre Importação (II), Imposto sobre Exportação (IE), Contribuições para a
seguridade social (COFINS, CSLL, PIS/PASEP), além de encargos trabalhistas e, de
1997 a 2007, CPMF.
A Constituição, aliás, expressamente limitou o campo de abrangência tributária,
no tocante aos impostos incidentes sobre a atividade minerária (art. 155, §3º).
Excluiu, portanto, IPI, Imposto de Renda (IR) – Imposto de Renda Pessoa
Jurídica (IRPJ) e Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) e IOF.
Quanto ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) incide
se destinado ao mercado interno e na exportação vigora a imunidade.
É importante se ter em mente qual tributação incide sobre a mineração, a fim
de se obter o valor do faturamento líquido da atividade o que gera reflexos na CFEM e na
indenização ao proprietário da terra.
Matéria esta ainda controversa nos tribunais, uma das propostas do que vem a
ser o faturamento líquido é de que ele é o resultado do faturamento do minério (-) custo
de transporte (-) tributos e seguro.
CONCLUSÃO
Da análise aqui feita podemos verificar que realmente a questão minerária
recebeu especial atenção na Constituição Federal de 1988 uma vez que contemplou de
forma específica:
a)
b)
c)
d)
e)
14
Propriedade dos recursos minerais – União;
Produto da lavra;
Regimes de exploração dos recursos minerais;
Definiu a atividade minerária como de interesse nacional;
Previu o monopólio da União quanto aos recursos minerais nucleares;
Resolução nº 369/2006 do CONAMA, que dispõe sobre os casos excepcionais, de utilidade pública,
interesse social ou baixo impacto ambiental que possibilitam a intervenção ou supressão de vegetação
em Área de Preservação Permanente – APP.
f) Criou participação nos resultados ou compensação financeira sobre os
recursos minerários – royalties;
g) Traçou normas de competência legislativa e material;
h) Estabeleceu diretrizes para o papel do Estado;
i) Teceu paralelo entre a questão ambiental e a minerária
j) Atividade minerária em terras indígenas etc.
Devemos acrescentar, também, que além dos dispositivos especiais na
Constituição Federal a atividade minerária obedece no que couber aos demais
dispositivos constitucionais, como por exemplo, os relativos à tributação, propriedade etc.
REFERÊNCIAS
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São Paulo: LTr, 1999.
BALEEIRO, Aliomar. Uma Introdução à Ciência das Finanças. 11. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1999, apud TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 5.
ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1998.
COELHO, Maria Célia Nunes;MONTEIRO, Maurílio de Abreu (Orgs.). Mineração e
reestruturação espacial na Amazônia. Belém: NAEA, 2007.
ENRIQUEZ, Maria Amélia. Mineração: maldição ou dádiva? Os dilemas
desenvolvimento sustentável a partir de uma base mineira. São Paulo: Signus, 2008.
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FONSECA, Luciana Costa da. Direito Tributário e Econômico aplicado ao Meio Ambiente
e à Mineração. São Paulo: Quartier Latin, 2009.
FREIRE, William. Código de Mineração anotado. 4. ed. rev. atual. ampl. Belo Horizonte:
Mandamentos, 2009.
PINHO, Anete Penna de Carvalho; HABER, Lilian Mendes. Royalties incidentes sobre
recursos hídricos e minerais: Possibilidade de Arrecadação pelos Estados da Federação:
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Econômica. Florianópolis: OAB/SC, 2006. p.1088-1104.
PONTES,
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Tributo
Mineral
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Disponível
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SERRA, Silvia Helena. Direitos Minerários: formação, condicionamentos e extinção. São
Paulo, Signus, 2000.
SOUZA, Marcelo Gomes de (Coord.). Direito minerário aplicado. Belo Horizonte:
Mandamentos, 2003. 389 p.
TRINDADE, José Raimundo Barreto. A metamorfose do trabalho na Amazônia: para além
da mineração Rio do Norte. Belém: UFPA/NAEA, 2001.
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