Sala Especializada 3: O que aprendemos com o algodão-Bt? Para onde ir? ASPECTOS PRÁTICOS DA EVOLUÇÃO DA RESISTÊNCIA DAS PRAGAS ÀS TOXINAS DE BT E AS BASES CIENTÍFICAS DA ADOÇÃO (OU NÃO) DE REFÚGIO ESTRUTURADO, ALTERNATIVO OU ENSACADO. Celso Omoto1 1 Departamento de Entomologia e Acarologia, Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, Universidade de São Paulo, Av. Pádua Dias, 11, 13418-900 Piracicaba-SP. E-mail: [email protected] A adoção de plantas transgênicas que expressam gene(s) que codificam proteínas de Bacillus thuringiensis (Bt) tem sido crescente no Brasil. O primeiro evento de algodão transgênico resistente a insetos que expressa a proteína Cry1Ac de Bt foi aprovado no Brasil em 2005. Posteriormente, foram aprovados outros eventos de algodão que expressam mais de uma proteína de Bt, tais como Cry1Ac/Cry2Ab2, Cry1Ac/Cry1F e Cry1Ab/Cry2Ae. As pragas-alvo do algodão Bt no Brasil são curuquerê Alabama argillacea (Hübner), lagarta-das-maçãs Heliothis virescens (Fabricius), lagarta rosada Pectinophora gossypiella (Saunders), lagarta militar Spodoptera frugiperda (J.E. Smith) e falsa-medideira Chrysodeixis includens (Walker). Com a recente detecção de Helicoverpa armigera (Hübner), espera-se também que a tecnologia Bt promova o controle dessa praga. Devido à expressão contínua da(s) proteína(s) de Bt, uma das grandes preocupações tem sido a implantação efetiva de estratégias de manejo da resistência para preservar a vida útil da tecnologia Bt em sistemas intensivos e complexos de cultivos (soja-milho-algodão) nas principais regiões agrícolas do Brasil. A evolução da resistência é o resultado da pressão de seleção que, consequentemente pode ocasionar mudanças na composição genética das populações aumentando a frequência relativa de indivíduos resistentes, acarretando assim a necessidade de realização de pulverizações de inseticidas para o controle de algumas pragas que anteriormente eram controladas com a tecnologia Bt. Dentre as várias estratégias de manejo da resistência de insetos (MRI) que tem sido propostas para evitar ou retardar a evolução da resistência, uma das estratégias tem sido a expressão de altas doses da proteína inseticida nos tecidos da planta e o plantio e manutenção de áreas de refúgio (plantas não-Bt). O principal objetivo dessas áreas de refúgio está na manutenção de insetos suscetíveis para acasalar com os possíveis insetos resistentes selecionados nas áreas de cultivos Bt. A disposição espacial do refúgio no ambiente de cultivo pode ser de duas formas: estruturada, onde o plantio de áreas com plantas Bt e não-Bt ocorre em proximidade e assegura o acasalamento aleatório com indivíduos oriundos do cultivo Bt e a mistura de sementes de plantas Bt e não-Bt para a semeadura. Para a estratégia de alta dose é necessário que a expressão das proteínas Bt nas plantas garanta a mortalidade dos descendentes do cruzamento de indivíduos resistentes com indivíduos suscetíveis, ou seja, as proteínas devem ser expressas em alta dose. Para as tecnologias Bt aprovadas no Brasil, a maioria dos eventos não atende o conceito de alta dose, principalmente para S. frugiperda, C. includens, e H. armigera. Sendo assim, o risco de evolução de resistência para essas pragas é alto no Brasil. Eventos com duas ou mais proteínas apresentam maior eficácia no controle das pragas-alvos; contudo o sucesso desses eventos dependerá do atendimento das premissas para o sucesso da utilização de duas proteínas na mesma planta (piramidização ou mistura de proteínas), ou seja, (i) as frequências de resistência deverão ser baixas para as duas proteínas; (ii) ausência de resistência cruzada entre as Brasilia, 3-6 Setembro 2013 duas proteínas, (iii) as duas proteínas devem conferir alta mortalidade das pragas-alvo; (iv) a resistência deverá ser funcionalmente recessiva para pelo menos uma das proteínas (ou seja, deve garantir a mortalidade de indivíduos oriundos do cruzamento de indivíduos resistentes com suscetíveis). No Brasil, as empresas detentoras da tecnologia Bt têm recomendado uma área de refúgio entre 10 a 20% da área cultivada para plantas Bt com somente uma proteína inseticida em comparação ao refúgio de apenas 5% para plantas Bt com mais de uma proteína inseticida. Na Austrália, a recomendação de área de refúgio para algodão que expressa Cry1Ac/Cry2Ab é de 50% de refúgio estruturado pelo fato de não atender o conceito de alta dose para H. armigera. Plantas hospedeiras alternativas podem contribuir para fornecer indivíduos suscetíveis para espécies polífagas como S. frugiperda e H. armigera. Na Austrália, por exemplo, alternativamente à adoção de 50% de refúgio de algodão não-Bt pulverizado com inseticida, os cotonicultores podem optar pelo plantio de 5% da área com feijão-guandu não pulverizado com inseticida para produzir indivíduos suscetíveis de H. armigera no campo. No caso de S. frugiperda, o cultivo de sorgo poderia ser considerado para o manejo de resistência dessa praga. No entanto, as culturas hospedeiras alternativas devem ser consideradas adicionalmente ao refúgio estruturado para os cultivos de algodão Bt, pois algumas espécies como A. argillacea são monófagas e dependem de algodão não-Bt para produção de indivíduos suscetíveis. A mistura de sementes Bt e não-Bt na sacaria tem sido proposto como uma das estratégias de manejo de resistência. Essa estratégia de mistura de sementes na sacaria não seria adequada no Brasil, visto que os eventos Bt disponíveis até a presente data não atendem o conceito de alta dose para as principais pragas-alvo (por ex. S. frugiperda e H. armigera) e também devido à alta mobilidade larval entre plantas não-Bt e Bt. Um dos grandes desafios tem sido a implantação de estratégias de MRI no Brasil, considerando-se o sistema intensivo de produção de algodão Bt associado a outros cultivos Bt (milho e soja) na mesma região. Trabalhos cooperativos deverão ser realizados com todos os envolvidos na cadeia produtiva do milho, ou seja, universidades/instituições de pesquisa, empresas de biotecnologia, produtores, consultores, revendas, órgão de regulamentação etc. Programas educacionais e projetos de pesquisa serão fundamentais para o sucesso de programas de MRI no Brasil. Brasilia, 3-6 Setembro 2013