PODER JUDICIáRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO
GABINETE DO DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO WILDO
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 122765/CE (0002126-27.2012.4.05.0000)
AGRTE
: INEP - INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS
EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA
REPTE
: PROCURADORIA REGIONAL FEDERAL - 5ª REGIÃO
AGRDO
: IAGO TECIO DA SILVA DE SOUSA INCAPAZ
REPTE
: TEREZA CRISTINA DA SILVA
REPTE
: DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
ORIGEM
: 8ª VARA FEDERAL DO CEARá - CE
RELATOR
: DES. FED. FRANCISCO WILDO
RELATÓRIO
O Sr. Des. Fed. FRANCISCO WILDO (Relator):
Cuida-se de agravo de instrumento desafiado contra decisão da lavra
do MM. Juízo Federal da 8ª Vara do Ceará, que, nos autos da Ação Ordinária nº 000104760.2012.4.05.8100, deferiu pedido de antecipação da tutela, determinando que o ora agravante
disponibilize para o recorrido cópia de sua prova de redação do ENEM 2011, com as
correções da banca examinadora. Também foi ordenado que seja concedido ao autor o prazo
de 48 (quarenta e oito) horas, a contar da entrega do referido material, para a interposição de
recurso administrativo.
Aduz a agravante que o ENEM não se trata de concurso público,
possuindo natureza de processo seletivo voluntário. Assere também que o certame tem por
escopo avaliar a qualidade do Ensino Médio brasileiro, tratando-se o seu resultado como mera
informação científica – o aluno não é considerado aprovado ou reprovado, nem há a
classificação dos candidatos - não havendo que se falar em julgamento ou valoração do
desempenho individual do aluno. Defende, assim, que o ENEM não é um processo
administrativo de natureza contenciosa, sendo meramente participativa a relação entre o
candidato e o INEP.
Alega, em face de ausência de litígio no procedimento avaliatório, a
inaplicabilidade dos princípios da ampla defesa e do contraditório, bem como das disposições
do art. 5º, LV, da Constituição Federal, o que lhe retira a obrigatoriedade de apresentação dos
espelhos de prova, assim como o direito a recurso.
Invoca também, em favor da sua tese, a celebração do Termo de
Ajustamento de Conduta, firmado entre a recorrente e o Ministério Público Federal, o qual,
dentre outros, firmou o compromisso de assegurar aos participantes do ENEM 2012 vistas
das provas, assim como foi reconhecido pelo MPF que o recurso de ofício previsto no edital
regente da seleção de 2011 supre o recurso voluntário.
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AGTR122765/CE
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Por fim, menciona a existência de Ação Civil Pública ajuizada pelo
Ministério Público Federal, na qual foi firmado um Termo de Ajustamento de Conduta firmado
entre o INEP e o autor da ação acerca das questões em debate. Na oportunidade, aduz, restou
acordado que, a partir do ENEM 2012, seria propiciado o direito de vista de provas a todos os
participantes e que –segundo alega –teria sido reconhecido pelo Ministério Público que o
recurso de ofício previsto no edital do ENEM 2011 supriria o recurso voluntário. Defende, por
tal razão, que como houve sentença extintiva da Ação Civil Pública, com a homologação dos
termos ajustados, configurou-se a coisa julgada, com efeitos erga omnes por se tratar de ação
coletiva.
Contrarrazões protestando pela manutenção do decisum impugnado.
Parecer do Ministério Público Federal opinando, preliminarmente, pela
perda de objeto, e, no mérito, pelo improvimento do recurso.
É o relatório.
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AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 122765/CE (0002126-27.2012.4.05.0000)
AGRTE
: INEP - INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS
EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA
REPTE
: PROCURADORIA REGIONAL FEDERAL - 5ª REGIÃO
AGRDO
: IAGO TECIO DA SILVA DE SOUSA INCAPAZ
REPTE
: TEREZA CRISTINA DA SILVA
REPTE
: DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
ORIGEM
: 8ª VARA FEDERAL DO CEARá - CE
RELATOR
: DES. FED. FRANCISCO WILDO
VOTO
O Sr. Des. Fed. FRANCISCO WILDO (Relator):
Penso que não merece reforma a decisão objurgada. Explico.
Com efeito, embora o ENEM não se apresente como um concurso
público, o seu resultado tem sido utilizado pelas entidades de ensino superior como elemento
de aprovação para os cursos que são oferecidos, e tal faculdade tem sido respeitada pelo
sistema educacional do país.
Desta feita, ainda que, originariamente, na essência, não tenha esse
caráter de concurso público, na prática, integra o processo de seleção para o ingresso no
ensino superior sendo, inclusive, em alguns casos, o único mecanismo para esse acesso.
Sendo assim, não há como se deixar de reconhecer que existe interesse
do aluno em rever o resultado obtido –através do acesso ao espelho da prova de redação e
da concessão de prazo para recurso – como forma de obter a média compatível com uma
possível matrícula em curso de entidade superior, autorizado pelo Ministério da Educação. Por
sua vez, a resistência do INEP à satisfação desse interesse, para mim, caracteriza a lide,
ensejando, por conseguinte, a aplicação dos princípios constitucionais a ela referentes, quais
sejam o do contraditório, da ampla defesa e do duplo grau de jurisdição.
Não me convenço, também, de que o Termo de Ajustamento de
Conduta realizado entre o INEP e o Ministério Público Federal seja bastante para afastar a
apreciação do Judiciário em situações como a presente, em que se alega lesão de direito, em
face da garantia constitucional prevista no art. 5º, XXXV da CF/88, segundo o qual a lei não
excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.
Ora, é curial que o magistrado não pode se substituir à banca
avaliadora nem pode imiscuir-se na apreciação do mérito, mas pode intervir sempre que estiver
diante de uma ilegalidade ou, o que é mais grave, de uma inobservância a princípios
constitucionais, tais como o contraditório, a ampla defesa, e o duplo grau de jurisdição, acima
já citados.
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AGTR Nº 122765/CE
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Nessa linha de raciocínio, embora as regras do edital vinculem tanto a
Administração quanto o administrado, é consabido que os princípios basilares da Constituição
Federal devem ser sempre observados, ainda que o edital silencie a respeito. Dessa forma,
como o direito à apresentação do espelho da prova de redação e de recurso administrativo
nada mais é que o exercício do direito ao contraditório e à ampla defesa e concretiza o
princípio do duplo grau, assegurados constitucionalmente, penso que não há como este ser
negado, mormente quando se está diante de ato da Administração que não parece estar
pautado na razoabilidade.
Colaciono, a título ilustrativo, os seguintes precedentes desta Corte
Regional, aplicáveis mutatis mutandis ao presente caso:
“
CONSTITUCIONAL. EXAME DO ENEM 2010. EXIBIÇÃO DO
ESPELHO DE PROVA DE REDAÇÃO. DIREITO ASSEGURADO AO
CANDIDATO.
I - A CF/88, em seu artigo 5º, XXXIII, assegura a todos o direito a
receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou
de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo legal.
II - Amparada pelo comando constitucional, deve ser assegurado à
autora, o direito à exibição da sua prova de redação, a fim de que possa
verificar os critérios de correção utilizados no referido exame
vestibular.(Precedente: REOMS Nº 83104-CE).
III - Também não há que se falar em perda do objeto, uma vez que a decisão,
ainda não transitada em julgado, pode ser submetida a reexame em instância
superior.
IV - Apelação improvida.”
(PROCESSO:
00002502120114058100,
AC529574/CE,
DESEMBARGADORA FEDERAL MARGARIDA CANTARELLI, Quarta
Turma, JULGAMENTO: 25/10/2011, PUBLICAÇÃO: DJE 27/10/2011 Página 740)
“
CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. HABEAS DATA. ACESSO
ÀS INFORMAÇÕES DA CORREÇÃO DA PROVA DE REDAÇÃO DO
CONCURSO PARA PROVIMENTO DE CARGOS DO TRE-RN,
REALIZADO EM 2005.
1 - Cuida-se de Habeas Data impetrado em face de ato do Presidente da
Comissão do Concurso para Provimento de Cargos do TRE/RN, objetivando
a tutela jurisdicional que o assegure ter vista da prova de redação a que se
submeteu no dia 03.07.2005, juntamente com o respectivo espelho de
correção confeccionado pela Fundação Carlos Chagas.
2 - O processo foi extinto, sem exame do mérito, com o indeferimento da
petição inicial, ante o entendimento de ausência de interesse de agir do
impetrante, por inadequação da via eleita, nos termos dos arts. 267, I, e 295,
III, ambos do CPC, c/c o art. 10 da Lei nº 9.507/97.
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3 - O Habeas Data assegura o acesso a informações relativas à pessoa do
impetrante, constantes de registros públicos ou banco de dados de entidades
governamentais ou de caráter público (art. 5º, LXXII, 'a', CF/88), como na
hipótese dos autos, em que pretende o candidato ter acesso à prova que
realizou no concurso para provimento de cargo do quadro de carreira do
TRE/RN. Ademais, o direito de vista de prova relativa a concurso público
é assegurado ao candidato, pela Carta Magna vigente (art. 5º, incisos
XXXIII, XXXIV, 'b', LV, e art. 37).
4 - Questão preliminar que prejudica o deferimento da pretensão do apelante:
o concurso a que ele se submeteu foi homologado em 22.12.2005, tendo sido
publicado do DOE de 14.01.2006, e no DOU de 17.01.2006, ou seja, há mais
de dois anos, não havendo nos autos notícia de que tenha havido qualquer
impugnação à homologação do referido resultado, pelo que se conclui ter
ocorrido perda do objeto para o prosseguimento da lide.
5 - Extinção do processo por perda do objeto. Apelação prejudicada.”
(PROCESSO: 200584000077010, AC371246/RN, DESEMBARGADOR
FEDERAL RUBENS DE MENDONÇA CANUTO (CONVOCADO),
Segunda Turma, JULGAMENTO: 07/07/2009, PUBLICAÇÃO: DJ
22/07/2009 - Página 180) (grifei)
Outrossim, deve-se registrar que os efeitos da coisa julgada erga
omnes ou ultra partes em ações coletivas não atingem os autores das ações individuais se não
requeridas por eles a suspensão da demanda individual no prazo de trinta dias (art. 104, do
CDC), a contar da ciência nos autos do ajuizamento da ação coletiva. In casu, tendo sido a
ação originária deste recurso proposta após o ajuizamento das Ações Civis Públicas em
questão (0004098-16.2011.4.05.8100 5ª Vara Federal/CE e 37994-96.2011.4.01.3400/13ª
Vara Federal/DF) evidenciada a opção do recorrido pela ação individual, não havendo que se
falar, portanto, em coisa julgada oriunda das ações coletivas em questão.
Com essas considerações, nego provimento ao agravo de instrumento.
É como voto.
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REPTE
: TEREZA CRISTINA DA SILVA
REPTE
: DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
ORIGEM
: 8ª VARA FEDERAL DO CEARá - CE
RELATOR
: DES. FED. FRANCISCO WILDO
EMENTA
CONSTITUCIONAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ENEM
2011. DISPONIBILIZAÇÃO DO ESPELHO DA PROVA DE
REDAÇÃO. INTERPOSIÇÃO DE RECURSO ADMINISTRATIVO.
DIREITO DO ALUNO. INTELIGÊNCIA DO ART. 5º, XXXIII DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. IMPROVIMENTO.
1. Agravo de instrumento desafiado contra decisão que deferiu pedido
de antecipação da tutela, determinando que o agravante disponibilize
para o recorrido o espelho digitalizado de sua prova de redação do
ENEM 2011 com as correções da banca examinadora. Também foi
ordenado que seja concedido ao autor o prazo de 48 (quarenta e oito)
horas, a contar da entrega do referido material, para a interposição de
recurso administrativo.
2. Conquanto o ENEM não se apresente como um concurso público, o
seu resultado tem sido utilizado pelas entidades de ensino superior
como elemento de aprovação para os cursos que são oferecidos, e tal
faculdade tem sido respeitada pelo sistema educacional do país. Desta
feita, ainda que, originariamente, na essência, não tenha esse caráter de
concurso público, na prática, integra o processo de seleção para o
ingresso no ensino superior sendo, inclusive, em alguns casos, o único
mecanismo para esse acesso.
3. Existência de interesse do aluno em rever o resultado obtido através do acesso ao espelho da prova de redação e da concessão de
prazo para recurso - como forma de obter a média compatível com
uma possível matrícula em curso de entidade superior, autorizado pelo
Ministério da Educação. Caracterização de litígio, haja vista a
resistência do recorrente ao atendimento da pretensão autoral,
ensejando, por conseguinte, a aplicação dos princípios constitucionais
do contraditório, da ampla defesa e do duplo grau de jurisdição.
4. O Termo de Ajustamento de Conduta pactuado entre o INEP e o
Ministério Público Federal não tem o condão de afastar a apreciação
do Judiciário em situações como a presente, em que se alega lesão de
direito, em face da garantia constitucional prevista no art. 5º, XXXV
PODER JUDICIáRIO
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GABINETE DO DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO WILDO
da CF/88, segundo o qual a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito.
AGTR Nº 122765/CE
Ac-02
5. Embora as regras do edital vinculem tanto a Administração quanto o
administrado, é consabido que os princípios basilares da Constituição
Federal devem ser sempre observados, ainda que o edital silencie a
respeito. Direito à apresentação do espelho da prova de redação e de
recurso administrativo, que representam o exercício do direito ao
contraditório e à ampla defesa e concretizam o princípio do duplo
grau, assegurados constitucionalmente.
6. Agravo de instrumento improvido.
ACÓRDÃO
Vistos, etc.
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região,
por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do Relatório, Voto
e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Recife, 08 de maio de 2012.
(Data de julgamento)
Des. Fed. FRANCISCO WILDO
Relator
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