História da Matemática e Conjunto dos Números Racionais – uma proposta de trabalho para a sala de aula da educação básica. Lídia de Sousa da Cruz1 GD5 – História da Matemática e Cultura Resumo do trabalho. O presente trabalho pretende discutir como a história da Matemática pode ser inserida em atividades de ensino, visando favorecer o aprendizado dos conceitos relacionados ao campo numérico dos racionais. O conjunto dos números racionais é apresentado às crianças já nas séries/anos iniciais do ensino fundamental em sua forma mais simples, com atividades que propõem identificar a fração utilizando-se da representação parte-todo, na maioria das vezes. No entanto, é nos anos finais do Ensino Fundamental que esse conjunto pode ser melhor explorado. Todavia, construir, compreender e apreender o conjunto dos números racionais e suas diferentes representações não é uma tarefa simples. Educadores, pesquisadores e os resultados das macro avalições aplicadas em todo o Brasil corroboram a necessidade de trabalhos com diferentes perspectivas e abordagens dentro do campo da Educação Matemática que contemplem os problemas de ensino e aprendizagem desse conceito matemático. Escolhemos o uso da História da Matemática para estruturar nossa pesquisa porque acreditamos que ao proporcionar o contato com o contexto histórico e com as necessidades e problemas que fomentaram o surgimento de um conceito matemático estaremos despertando no educando a aprendizagem e compreensão desse conceito. Apresentar o conceito de números racionais como um conhecimento historicamente construído é o caminho que pretendemos percorrer nesse trabalho. Nosso objetivo é o de desenvolver uma proposta de trabalho que utilize a História da Matemática inserida em contexto histórico e que favoreça o aprendizado do conceito de números racionais na educação básica. Palavras-chave: Números Racionais. História da Matemática. Estratégias. Ensino e aprendizagem. Introdução e justificativa: por que os números racionais? O conjunto dos números racionais é apresentado às crianças já nas séries/anos iniciais do ensino fundamental em sua forma mais simples, com atividades que propõem identificar a fração utilizando-se da representação parte-todo para a maioria dos professores e até mesmo nos livros didáticos. Contudo, construir, compreender e apreender o conjunto dos números racionais e suas diferentes representações não é uma tarefa simples. Educadores e pesquisadores como Damico (2007), Bezerra, Magina e Spinillo (2009), Bezerra (2001), 1 Universidade Federal do ABC, e-mail: [email protected], orientador: Profª. Drª.Thais Cyrino de Mello Forato, coorientador: Prof.Dr. Francisco José Brabo Bezerra. Catalani (2002) e Woerle (1999) entre outros, concordam que ensinar as noções básicas envolvendo o conjunto dos números racionais tem sido um sério obstáculo no aprendizado matemático. As implicações da não acessibilidade a esses conhecimentos podem acarretar graves prejuízos à aprendizagem de diversos ramos da Matemática e das demais ciências da natureza. Por essas e outras razões, o tema tem sido alvo de várias pesquisas dentro da educação matemática. Ao encontro dos apontamentos dessas pesquisas temos os indicadores das macro avaliações aplicadas em todo o Brasil por meio do Saeb 2 e, especificamente no Estado de São Paulo, do Saresp 3. Questões onde as habilidades avaliadas estão relacionadas aos números racionais e suas diferentes representações tem apresentado baixos índice de desempenho escolar (Relatório do Saresp, 2012). Por isso, concordamos com Damico (2007) quando ele afirma que estas constatações nos mostram que os problemas relacionados ao ensino e a aprendizagem dos números racionais são extremamente amplos e devem ser atacados por diversos ângulos. Partindo desses pressupostos e dispondo de diferentes perspectivas e abordagens metodológicas existentes no campo da Educação Matemática como: Resolução de Problemas, Etnomatemática, Modelagem Matemática entre outras, escolhemos o uso da História da Matemática para estruturar nossa pesquisa visando contribuir para o aprendizado dos números racionais. Segundo Matthews: A história, a filosofia e a sociologia da ciência não têm todas as respostas para essa crise, porém possuem algumas delas: podem humanizar as ciências e aproximá-las dos interesses pessoais, éticos, culturais e políticos da comunidade; podem tornar as aulas de ciências mais desafiadoras e reflexivas, permitindo, deste modo, o desenvolvimento do pensamento crítico; podem contribuir para um entendimento mais integral de matéria científica, isto é, podem contribuir para a superação do “mar de falta de significação” que se diz ter inundado as salas de aula de ciências, onde fórmulas e equações são recitadas sem que muitos cheguem, a saber, o que significam [...] (Matthews,1995, p.165). 2 Saeb – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica. O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) aplica três avaliações externas em larga escala que compõem o Saeb: a Avaliação Nacional da Educação Básica (Aneb), a Avaliação Nacional do Rendimento Escolar (Anresc, mais conhecida como Prova Brasil) e a Avaliação Nacional de Alfabetização (ANA). 3 Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo – SARESP é uma avaliação externa em larga escala da Educação Básica, aplicada a cada ano desde 1996 pela Secretaria da Educação do Estado de São Paulo. No campo da Educação Matemática encontramos alguns autores que defendem a ampliação e o aprofundamento da discussão da participação da História da Matemática na Educação Matemática. Entre esses autores, Miguel e Miorim afirmam: [...], podemos entender ser possível buscar na história da Matemática apoio para se atingir, com os alunos, objetivos pedagógicos que os levem a perceber, por exemplo: (1) a matemática como uma criação humana; (2) as razões pelas quais as pessoas fazem matemática; (3) as necessidades práticas, sociais, econômicas e físicas que servem de estímulo ao desenvolvimento das ideias matemáticas; [...]. (Miguel, 2004, p.53). Diante do que foi exposto, estamos admitindo como hipótese que o contato com o contexto histórico e com as necessidades e problemas que fomentaram o surgimento de um conceito matemático poderia despertar no educando a aprendizagem e a compreensão desse conceito, contribuindo para a superação do “mar de falta de significação”. (Matthews, 1995, p.165). Ubiratan D´Ambrósio também nos traz: A história da matemática é um elemento fundamental para se perceber como teorias e práticas matemáticas foram criadas, desenvolvidas e utilizadas num contexto específico de sua época. (D´Ambrósio, 1996, p.29) Conhecer, historicamente, pontos altos da matemática de ontem poderá, na melhor das hipóteses, e de fato faz isso, orientar no aprendizado e no desenvolvimento da matemática de hoje. (D´Ambrósio, 1996, p.30) Apresentar o conceito de números racionais como um conhecimento historicamente construído é o caminho que pretendemos percorrer nesse trabalho. “O contexto histórico possibilita ver a Matemática em sua prática filosófica, científica e social e contribui para a compreensão do lugar que ela tem no mundo”. (PCN. 1997, p.19) Seremos balizados pelo PCN4 e pela Proposta Curricular do Estado de São Paulo, que utiliza como uma de suas estratégias de ensino a “contextualização da história da Matemática, aplicações práticas da vida real ou busca de argumentos relacionados à ampliação de horizontes das ideias matemáticas”. (Caderno do professor 5) Contudo, Baroni apud Bicudo (1999, p.130) nos chama a atenção quando coloca “que é preciso ter cautela quando se trata de propor o trabalho em sala de aula, nas aulas de matemática com a utilização da História da Matemática”. Ele reforça essa observação afirmando que: 4 Parâmetros Curriculares Nacionais Caderno do Professor, criado pelo programa São Paulo Faz Escola, apresenta orientações didáticopedagógicas e traz como base o conteúdo do Currículo Oficial do Estado de São Paulo, pode ser utilizado como complemento à Matriz Curricular. (2014-2017, 6ª série/7º ano – volume 1, p.07). 5 Ao desenvolver estudos relativos às contribuições da História da Matemática para a Educação Matemática, percebemos que é necessário muita cautela, pois pode-se incorrer ao erro de simplesmente assumir a História da Matemática como elemento motivador ao desenvolvimento do conteúdo. Sua amplitude extrapola o campo da motivação e engloba elementos cujas naturezas estão voltadas a uma interligação entre o conteúdo e sua atividade educacional. (Baroni apud Bicudo, 1999, p. 132) São muitos os obstáculos a serem superados quando pensamos no uso da História no ensino de Matemática. Miguel et al. (2009) cita algumas dificuldades: 1. O despreparo dos professores que não tiveram tanto em sua formação inicial quanto na continuada, oportunidade de estudo da história da Matemática e de análise das possibilidades de inserção desta história em suas práticas pedagógicas; 2. A falta de tempo de professores da Escola Básica para elaborar, testar e avaliar atividades pedagógicas que utilizem a história da matemática para a construção de conceitos matemáticos; 3. A ineficácia dos dados históricos inseridos em livros didáticos que, em sua maioria, restringe-se a citações de datas e nomes, sem qualquer indicação para o professor de como a história poderia ser utilizada na construção de conceitos matemáticos por parte de seus alunos; 4. A grande quantidade de dados históricos incorretos existentes tanto em livros didáticos quanto em paradidáticos que usam a história como mero instrumento ilustrativo, e a quase inexistência de material bibliográfico com sugestões de atividades que possam se utilizadas pelos professores em sala de aula. Esta última dificuldade decorre do fato de que nem todo texto sobre a história da Matemática tem potencialidades pedagógicas para o ensino de matemática na Escola Básica. Segundo Miguel (1993, p.109) “para poderem ser pedagogicamente úteis, é necessário que histórias da Matemática sejam escritas sob o ponto de vista do educador matemático”. (Miguel et al., 2009, p.10) Diante dessas considerações e observações, elencamos como questão norteadora de nossa pesquisa, a seguinte pergunta: “Como desenvolver uma proposta de trabalho que utilize a História da Matemática e que favoreça o aprendizado do conceito de números racionais na educação básica?”. E para estudar essa questão, apresentamos os nossos objetivos, que indicaram a linha de pensamento e execução desta pesquisa. A partir do objetivo geral: elaborar uma proposta de intervenção pedagógica que contemple o uso da História da Matemática no processo de ensino e aprendizagem do conjunto dos números racionais apresentamos os nossos três objetivos específicos: (1) identificar um episódio/narrativa da História da Matemática sobre conjunto dos números racionais com potencial pedagógico para atender o nosso objetivo central; (2) realizar uma revisão bibliográfica voltada à esse episódio/narrativa, percorrendo inicialmente fontes secundárias e se, em um segundo momento for pertinente, fontes primárias6 e por fim, (3) adaptar o episódio/narrativa para o ambiente escolar de forma a atender as necessidades da sala de aula nas séries finais do Ensino Fundamental II. Percurso Metodológico adotado De caráter qualitativo, nosso estudo pretende ser documental quanto da busca de um episódio histórico que permitirá ao pesquisador a construção de uma atividade, para posteriormente aplicá-la em sala de aula e discutir seus resultados. Propomos para esse trabalho de pesquisa a seleção de um episódio/narrativa da história da matemática acerca do conjunto dos números racionais e sua adequação para uso na sala de aula nas séries finais do Ensino Fundamental II. Privilegiamos esta etapa da Educação Básica porque é nela que ocorre o aprofundamento e a sistematização dos conceitos básicos da matemática, inclusive o conjunto dos números racionais. Acreditamos que se nesse momento for disponibilizado uma metodologia diferenciada e integrada ao currículo, poderemos favorecer a consolidação do mesmo e minimizar as dificuldades observadas diariamente na nossa prática docente bem como são apontadas por especialistas e nas macro avaliações realizadas na educação básica. Dividiremos a pesquisa em duas linhas de ação, sendo uma delas voltada para a prospecção e estudo de um episódio/narrativa do conjunto dos números racionais, visando explorar suas implicações pedagógicas para o Ensino Fundamental II e uma outra sendo adequação e construção de uma intervenção pedagógica para a sala de aula. A escolha do episódio... Para identificar um episódio/narrativa da História da Matemática sobre conjunto dos números racionais com potencial pedagógico para atender o nosso objetivo central, 6 No Brasil, no entanto, não é plausível dizer, por exemplo, que se pode realizar, sem dificuldades, uma investigação pura em História da Matemática sobre temas que foram desenvolvidos originalmente na Europa ou em outras regiões como mundo árabe, a Índia, a China etc. onde as fontes primárias se encontram. (Baroni apud Bicudo, 1999, p.131) realizaremos uma revisão bibliográfica sobre este conjunto numérico. Estudamos alguns textos como, por exemplo: Bezerra (2001), Catalani (2002), Ifrah (1996) e Caraça (1951) e ainda pretendemos ler as obras de Boyer (2003) e Eves (2004), que possibilitarão ampliar nosso olhar para com esse conjunto numérico. Após as leituras do trabalho de Bezerra (2001) e dos livros de Caraça (1951) e Ifrah (1996) estamos inclinados a investigar o período histórico compreendido entre o século XV ao século XVIII, mas precisamente até a Revolução Francesa. Em Bezerra (2001), no capítulo 03, intitulado “Números Fracionários Ontem e Hoje” encontramos um panorama geral dos fatos relacionados ao surgimento e desenvolvimento do conceito de fração e de notação para as frações. Neste trabalho, chamou-nos a atenção: Na segunda metade do século XV, a principal linha de desenvolvimento da matemática passa pelo crescimento das cidades mercantis sob a influência direta do comércio, da navegação, da astronomia e da agrimensura. A grande Era voltada às navegações e descobertas. As frações passaram a fazer parte do cotidiano das pessoas e os tipos de representação e conceitos da antiguidade foram aperfeiçoados e adaptados ás soluções dos problemas da época. (Bezerra, 2001, p.52) Para a formação conceitual das frações, do ponto de vista histórico, os grandes insights vão da pré-história até a Idade Média. Após esse período, constatamos um aperfeiçoamento da escrita, a utilização para os decimais e as implicações dentro da Análise. (Bezerra, 2001, p.52) Em Ifrah também encontramos: As consequências desta racionalização da noção e da representação das frações foram incalculáveis em todos os domínios, a começar pela invenção do sistema métrico. Sistema metrológico fundado sobre a base dez, totalmente coerente e perfeitamente adaptado ao cálculo numérico, que a Revolução Francesa ofertou em 1792 “a todos os tempos e a todos os povos para seu maior proveito”, em substituição aos velhos sistemas de unidades arbitrárias incoerentes e variáveis. Sabemos muito bem do progresso fantástico que dele resultou no campo das aplicações práticas, em virtude da grande simplificação que esta inovação introduziu nos cálculos de todo tipo. (Ifrah,1996, p.328) Já no trabalho de Catalani (2002) encontramos aspectos do uso da história da Matemática que vão ao encontro do que queremos investigar. A autora propõe a organização de atividades frente a uma perspectiva criativa do conceito de fração envolvendo a reflexão sobre o desenvolvimento desse conceito na perspectiva lógico-histórica identificada em Kopnin (1978). Sob essa perspectiva, a história não se reduz aos fatos, não é ilustrativa e cronológica. A história não é entendida como uma sucessão linear em direção à forma mais verdadeira do conceito e não se deseja definir leis que pré-determinam a evolução do conceito. É o lógico da história do conceito que é chamado de dinâmica histórica. Sob esse olhar, pretendemos dialogar com outras áreas do currículo da educação básica, por exemplo, história e geografia. Apoiaremos nosso trabalho... Na busca de uma resposta a questão norteadora do nosso projeto, temos inicialmente como referencial teórico para nossa investigação os trabalhos de Forato (2009), Miguel [et al.] (2009), Miguel e Miorim (2004), Shulman (1986) e Ball (2008). Trata-se de trabalhos de linhas de pesquisas diferentes que em nossa pesquisa pretendemos interligá-los buscando a consistência e complementaridade entre eles. O referencial teórico adotado inicialmente para a construção da intervenção pedagógica é Forato (2009), a ser apresentado sucintamente a seguir. Acompanha várias etapas da pesquisa, desde o estabelecimento dos objetivos iniciais, a prospecção e seleção das fontes históricas, inclusive com vistas à coerência e consistência da proposta como um todo, e, ampara a construção da proposta, que é exatamente o objetivo desse trabalho. Os parâmetros buscam oferecer subsídios para a adequação de conteúdos da História e Filosofia da Ciência (HFC) para a Escola Básica. Sua construção abarca requisitos da didática das ciências e da historiografia contemporânea, pensados e confrontados mediante o contexto atual de pesquisas sobre os usos da HFC na educação científica. Tais parâmetros têm sido utilizados em algumas pesquisas e têm se mostrado frutíferos para a construção de propostas e usos na sala de aula, apontando tanto benefícios quanto dificuldades, por exemplo, Cardoso e colaboradores (2012); Gomes (2013); Pereira e Forato (2012), além de outras pesquisas em andamento. Os parâmetros não se configuram como regras rígidas, tampouco receitas milagrosas, mas constituem cerca de vinte ponderações que fomentam a reflexão sobre aspectos como, a consistência entre a visão de ciências, os objetivos pedagógicos que se almeja e a visão de natureza das ciências fomentada; seleção ou omissão de conteúdos históricos, epistemológicos e contextuais; riscos de cada simplificação histórica, entre outros aspectos. Uma breve relação desses parâmetros e uma discussão mais detalhada podem ser encontradas em Forato (2009, vol. 1, p. 188-196) ou Forato e colaboradores (2012). Sua utilização não se dá sequencialmente, como estão listados, mas há um constante ir e vir, ponderando e revendo cada detalhe, mediante as novas decisões que vão sendo tomadas. Não há uma obrigatoriedade no uso de todos os parâmetros visto que cada área do conhecimento que compõem o bloco das Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias possuem suas especificidades e peculiaridades. As contribuições de Miguel et al. (2009), Miguel e Miorim (2004) são imprescindíveis a nossa reflexão sobre o uso da História na Educação Matemática. Questões relativas ao ensino de Matemática começaram a ser discutidas com maior intensidade pelos professores durante a década de 50, devido especialmente à realização dos primeiros Congressos Nacionais de Ensino da Matemática. Desde meados da década de 80 ações e estudos isolados relacionados ao tema História da Matemática podem ser identificados. Foi a partir da criação da Sociedade Brasileira de História da Matemática (SBHMat) no III Seminário Nacional de História da Matemática, ocorrido em março de 1999, na cidade de Vitória (ES) que o movimento organizado em torno da História da Matemática tornou-se visível. Miguel e Miorim, 2004 afirmam: Entretanto, o movimento em torno da História da Matemática já é tão amplo e diversificado que poderíamos acusar a constituição, em seu interior, de vários campos de pesquisa autônomos, que, no entanto, mantém, em comum, a preocupação de natureza histórica incidindo em uma das múltiplas relações que poderiam ser estabelecidas entre a História, a Matemática, a Educação. Dentre tais campos de investigação, três deles se destacam: o da História da Matemática propriamente dita, o da História da Educação Matemática e o da História na Educação Matemática. (Miguel e Miorim, 2004, p.11). Adotaremos os pressupostos encontrados nos PCN (Parâmetros Curriculares Nacionais) de Matemática para o uso da História da Matemática como recurso didático: A História da Matemática pode oferecer uma importante contribuição ao processo de ensino e aprendizagem dessa área do conhecimento. Ao revelar a Matemática como uma criação humana, ao mostrar necessidades e preocupações de diferentes culturas, em diferentes momentos históricos, ao estabelecer comparações entre os conceitos e processos matemáticos do passado e do presente, o professor cria condições para que o aluno desenvolva atitudes e valores mais favoráveis diante desse conhecimento. (PCN, 1998, p.42) Para usar a História da Matemática como um recurso didático é necessário compreender o seu potencial pedagógico sem reduzi-lo a um fator motivacional para o processo de ensinoaprendizagem. Entretanto, essa abordagem não deve ser entendida simplesmente que o professor deva situar no tempo e no espaço cada item do programa de Matemática ou contar sempre em suas aulas trechos da história da Matemática, mas que a encare como um recurso didático com muitas possibilidades para desenvolver diversos conceitos, sem reduzi-la a fatos, datas e nomes a serem memorizados. (PCN, 1998, p.43) Por fim temos as contribuições das pesquisas de Shulman (1986) e Ball (2008). Lee Shulman divide o conhecimento do professor em três categorias: conhecimento do conteúdo; conhecimento pedagógico do conteúdo e conhecimento curricular. Deborah Ball que, a partir da noção de conhecimento pedagógico do conteúdo de Shulman (1986) faz uma ampliação dessa noção com dois focos voltados para o ensino de matemática e a matemática usada para o ensino. Ball (2008) desenvolve uma abordagem empírica para compreender o conhecimento do conteúdo necessário para o ensino, o que proporcionou uma nova forma de investigar a natureza, o papel, e a importância de diferentes tipos de conhecimento matemático para o ensino. Ela põe em causa três ideias pré-concebidas acerca do ensino da Matemática: (1) O conteúdo tradicional da Matemática escolar é simples; (2) A educação pré-universitária proporciona aos futuros professores grande parte do conhecimento matemático que irão necessitar, (3) Estudos universitários de Matemática asseguram o conhecimento matemático para ensinar. Não há simplicidade nos conceitos matemáticos da educação básica. Tratá-los como simples e admitir que eles são comumente entendidos é uma questão que precisa ser melhor problematizada e investigada. Afinal, o que os professores precisam saber para ensinar matemática? Considerações Finais O presente trabalho encontra-se em etapa inicial. Ingressamos no Programa de Pós- Graduação em meados de junho de 2014. Foram apresentados elementos que estão em curso de estudo e desenvolvimento, ainda em fase de conjecturar possibilidades e recortes. A participação em um evento como este será de grande valia para os desdobramentos futuros da pesquisa. Bibliografia BALL, D. L. et al. Content knowledge for teaching: What makes it special? Journal of Teacher Education, n. 59, 2008, p. 389-407. BEZERRA, F.J.B. Introdução do conceito de número fracionário e de suas representações: uma abordagem criativa para a sala de aula. Dissertação de Mestrado em Educação Matemática. São Paulo: PUC/SP, 2001. BEZERRA, F.; MAGINA, S.; SPINILLO, A. Como desenvolver a compreensão da criança sobre fração? Uma experiência de ensino. R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 90, n. 225, p. 411-432, maio/ago. 2009. BEZERRA, Francisco J. B.; RIBEIRO, A. J.. Realidade social dos números decimais: a busca de contextos significativos. 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