Matematicamente pensando: Os números e a sua utilização Carlos Morais São múltiplas as utilizações dos números e dos algarismos que os constituem. De um modo geral, a utilização dos números depende dos objetivos a atingir. Assim, é comum utilizar os números numa das perspetivas: nominal, cardinal e ordinal. Os números utilizam-se numa perspetiva nominal quando funcionam como identificadores, tais como números de telefones e números de edifícios ou de habitações; Utilizam-se numa perspetiva cardinal quando se referem a quantidades, sendo exemplos o número de desempregados, o número de países que fazem parte da moeda única ou o número de funcionários públicos; A utilização dos números numa perspetiva ordinal verifica-se sempre que a ordem é determinante para relacionar a parte com o todo, salientam-se como exemplos: a posição das equipas de futebol em cada uma das ligas, a posição dos países relativamente aos direitos humanos ou a posição dos países relativamente aos vários índices de desenvolvimento. Foram referidas três perspetivas que geralmente são aceites sem contestação, por poderem ser usadas de uma forma isenta e bastante objetiva. Talvez por isso, é comum ouvir-se dizer que os números não mentem. Obviamente que os números nem mentem nem falam verdade. Fornecem informação, cabendo a cada pessoa que a produz ou lhe tenha acesso interpretá-la. É inquestionável que por detrás da isenção aparente dos números existem intenções com objetivos bem definidos. Começou o apelo ao consumismo de Natal. Este apelo, para além das múltiplas campanhas publicitárias reforça-se na convicção que os potenciais consumidores são mais sensíveis à leitura dos preços do que aos próprios preços. Recordo, o que quase toda a gente sabe, que a cada euro correspondem 100 cêntimos, assim, se poupar um cêntimo em cada produto que compre preciso de comprar 100 produtos para poupar um euro. Neste sentido, a acompanhar o jornal Expresso, de 26/11/11, vinha uma brochura com os preços de diversos produtos. Não vou salientar qualquer produto, mas vou salientar os números associados aos produtos publicitados na página 2 da referida brochura. Assim, os preços, em euros, são: 99,99; 149; 129,99; 38,99; 69,99; 299,99; 18,99 e 249,99. A brochura tem 72 páginas, verificando-se que quase todos os preços terminam no algarismo 9. Porquê esta simpatia pelo 9? Será para facilitar os trocos? Não. Apenas para que os produtos pareçam ser mais baratos do que realmente são. Quando observo que o preço do produto é representado por um número que termina com a repetição do algarismo 9, questiono-me sempre. Tenho dúvidas se a tentativa de enganar, quem queira comprar, está só no preço ou também na qualidade do produto? Talvez esteja a ser injusto, pois há procedimentos comerciais que decorrem de estratégias de marketing ou de uma forte vontade, legítima, de aumentar a quantidade de vendas. Outro exemplo onde os números são utilizados com o objetivo claro de influenciar os cidadãos é no discurso político. Saliento uma afirmação do secretário de Estado do Orçamento, durante a discussão no Parlamento da proposta de Orçamento do Estado para 2012: "Cerca de 51 mil funcionários públicos ficam isentos de qualquer corte, 174 mil terão um corte parcial dos subsídios de Natal e de férias, e relativamente aos pensionistas cerca de 1,2 milhões ficam isentos de corte, e cerca de 280 mil terão um corte apenas parcial, estes são os números de que dispomos", (http://aeiou.visao.pt, acedido em 28/11/2011). Que relações têm os dados apresentados com a totalidade dos pensionistas e dos funcionários públicos? Quantos funcionários públicos e quantos pensionistas vão perder os dois subsídios? Os números não deveriam servir para mascarar ou construir simulações erróneas da realidade. Merecem ser utilizados com objetividade e observados com admiração, atendendo às suas enormes potencialidades na compreensão, interpretação e evolução do mundo em que vivemos. Morais, C. (2011). Matematicamente pensando: Os números e a sua utilização. Mensageiro de Bragança, 1 de Dezembro de 2011, p. 14.