EDUCAÇÃO SUPERIOR E O PROCESSO DE FORMULAÇÃO DE POLÍTICAS DE AVALIAÇÃO EDUCACIONAL: CONSIDERAÇÕES SOBRE OS EXAMES DE DESEMPENHO DOS CURSOS DE GRADUAÇÃO E DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA RECENTE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL(1990-2012). Regina Lúcia Ferreira Cravo Doutoranda em Educação PUC-Rio Professora da Universidade Estácio de Sá Email: [email protected] Resumo: Este estudo busca analisar o processo de formulação de políticas de avaliação educacional para a educação superior brasileira. O estudo busca fazê-lo focalizando o sentido dos exames de desempenho em larga escala dos estudantes dos cursos de graduação e suas conseqüências para a dinâmica do sistema de ensino do referido nível de ensino. O estudo busca igualmente conduzir as reflexões para a questão da formação de professores no Brasil na primeira década do século XXI. Destaca-se o impacto de tais processos sobre a formulação de políticas docentes no País evidenciado através da publicação das diretrizes curriculares nacionais e da ênfase da noção de ensino por competências. Partindo de considerações sobre a educação superior na atualidade, com destaque para a intensa reforma universitária que perdura por aproximadamente quinze anos na história da educação brasileira ao final da contemporaneidade. Em seguida, o sistema de avaliação da educação superior é abordado, buscando explicitar a triangulação entre as práticas de avaliação em larga escala, pela renovação periódica, pela autoavaliação institucional no contexto do Estado avaliador cuja ênfase vai recaindo sobre o acompanhamento da qualidade dos cursos e das instituições e da garantia da suas funções avaliativas. Na terceira parte, as características do Exame Nacional de Cursos e Desempenho de estudantes são descritas. O sentido da avaliação em larga escala na educação superior é descrito em seus procedimentos usados. A quarta parte relaciona as avaliações de larga escala com as políticas de currículo, no caso, especificamente, voltadas para os cursos de formação de professoresLicenciaturas. O estudo encontra nas contribuições teóricas de Dourado, Gomes, Rothen e Barreyro, Catani, Dias, Gatti o apoio necessário para o seu desenvolvimento do processo de avaliação educacional na educação superior no Brasil. Por fim, o estudo discute o sistema de avaliação instalado como estimulador da operacionalização de práticas acadêmicas, reformas estruturais mediadas pelas exigências dos estudantes, do mercado e pela aceitação das mesmas pela sociedade. Interessa a considerar a avaliação como um campo e disputas uma vez que pode evidenciar os fins da educação, o conceito de homem, o projeto social deverá ainda que na prática ganhar centralidade como forma de controle e definição de políticas que estimulam a expansão no ensino superior. Palavras-chave: políticas de avaliação educacional, educação superior , currículo. Este estudo busca analisar o processo de formulação de políticas de avaliação educacional para a Educação Superior Brasileira. Particularmente, busca fazê-lo focando o sentido dos exames de desempenho em larga escala dos estudantes dos cursos de graduação, suas possíveis conseqüências para a dinâmica do sistema de ensino do referido nível e para os currículos dos cursos de formação de professores. A temática aqui apresentada interessa-me como objeto de estudo, uma vez que tenho a formação de professores como eixo privilegiado de pesquisa. A temática relaciona-se com minha trajetória profissional enquanto assessora pedagógica da Coordenação de Avaliação Institucional da Univesidade na qual atuei durante um período de quatro anos, além das atividades ligadas à docência na mesma realizada até o presente momento. 1.Considerações sobre a Educação Superior na Atualidade ou intensa reforma universitária que perdura quinze anos... A ampliação da demanda e a massificação da educação superior, a expansão da oferta de vagas no setor privado, as novas funções da Universidade, o papel das novas tecnologias da informação e da comunicação, a (des) integração entre pesquisa e ensino, as modificações nos perfis profissionais esperados e suas repercussões curriculares para os cursos de graduação, a formação de professores e seu referencial de competências, as práticas avaliativas e os exames nacionais, a disputa por eficiência e qualidade, a competição entre as IES representam alguns dos temas presentes no debate educacional e, principalmente, sobre a Educação Superior na atualidade. Refiro-me à atualidade como sendo os fatos ocorridos nas últimas duas décadas, ou melhor, esclarecendo, desde os anos noventa(CATANI, 2002; DOURADO, 2002; LESSARD, 2006; CASPER,1997; CUNHA, 2002; dentre outros, porém neste estudo privilegiados). A atualidade parece resultar da intensificação de um movimento de internacionalização do capital financeiro, da adoção de políticas ditas neoliberais, da crise do Estado de Bemestar. DURHAM(1998;p.102 apud TRINDADE,1999) afirma que “o cerne das novas políticas propostas refere-se para o setor público, implicando em uma alteração da relação entre instituições de ensino superior e o Estado, substituindo o sistema centralizado e burocrático de controle governamental e financiamento, por outro baseado na contenção de gastos públicos, na descentralização administrativa e introdução de processos de avaliação(p.119)”. Os comentários de DURHAM destacados referem-se ao momento posterior à publicação da Declaração Mundial sobre a Educação Superior no século XXI(UNESCO, 1988), seu impacto nas políticas educacionais e em especial naquelas produzidas na América Latina sob orientação de órgãos internacionais de financiamento 2 como é o caso do Banco Mundial(Dentre outros, ver DOURADO,2002). Sobre a declaração, o trecho destacado, extraído de seu Preâmbulo, é significativo para a compreensão do espírito indutor das reformas se que seguiram nesse nível de ensino, especialmente no Brasil, pois, “na véspera de um novo século há uma demanda inédita por uma grande diversificação na educação superior, ao mesmo tempo em que tal diversificação se acentua. De igual forma, verifica-se uma crescente conscientização de sua importância fundamental no que se refere ao desenvolvimento sociocultural e econômico, assim como a construção do futuro. (...)A educação superior envolve todas as formas de estudos e de treinamento voltados à pesquisa de nível pós secundário; formas oferecidas tanto por Universidades quanto por Instituições de Educação Superior aprovadas pelo ESTADO”. O trecho foi extraído do Preâmbulo da Declaração Mundial sobre a Educação Superior no século XXI publicada em 1998. No que respeita as considerações sobre a América Latina, as reformas apresentaram como principais características dentre outras: a proposta de cobrança de anuidades no caso do ensino superior público, a limitação de matrículas, a implantação de mecanismos de avaliação da qualidade do ensino, a associação de financiamento à fixação de metas de avaliação de desempenho, a descentralização do sistema, a simplificação do controle burocrático e a concessão de maior autonomia administrativa às IES(1998; p.103). No Brasil, as reformas na Educação Superior caracterizam-se principalmente pela implantação de exames nacionais de cursos de graduação, objetivando verificar a “qualidade” destes através da organização de um ranking de notas obtidas e de sua divulgação. A ação faz parte do processo de reformulação do sistema nacional de avaliação que buscou articular o programa de avaliação existente naquela época chamado PAIUB com os chamados “PROVÕES” do governo FHC (atualmente, ENADE dentro da perspectiva do SINAES criado em 2004 pelo governo LULA...), realizar visitas de comissões de especialistas formadas pela CAPES e pela SESU(Secretaria de Educação Superior) para credenciamento e recredenciamento das instituições e reconhecimento e renovação de reconhecimento dos cursos de graduação em todo País( Avaliações de Condições da Oferta dos Cursos de Graduação ou ACOC). 3 As medidas colaboraram promovendo sanções e favorecendo a competição entre as IES do setor privado por recursos do governo federal como financiamento e bolsas. Tais possibilidades foram acenadas pela LDB9394/96 e pela criação do PROUNI ou do Programa Universidade para Todos em 2005. Juntamente, os meios de comunicação acabam por promover a divulgação dos resultados dos cursos e IES, ainda que necessária para a sociedade, de forma descontextualizada quanto ao processo de produção de tais resultados e características locais. Outras ações das reformas incluem o apoio à expansão da matrícula para profissionais destinados ao mercado de trabalho como os cursos de graduação tecnológica e cursos seqüenciais, ampliação dos recursos destinados às bolsas de estudo e ao crédito educativo(FIES), revisão e publicação de Diretrizes Curriculares para os Cursos de Graduação, para as Licenciaturas(Parecer09/2001 e RES.02/2002), publicação do Referencial Curricular para a Formação de Professores da Educação Básica(2002), o incentivo à Educação à Distância, a interação com os resultados das avaliações do Ensino Médio(ENEM) para ampliação das possibilidades de acesso às vagas do ensino superior, a exigência de Projetos Pedagógicos para os Cursos(PPCs) além de Plano de Desenvolvimento Institucional e Estratégico (PDI)para as Instituições e a possibilidade de criação de centros universitários. Além de todas as medidas mencionadas, a diminuição dos recursos financeiros para as universidades públicas vivenciada nos anos noventa tem sido substituída por uma nova expansão do setor através da criação de novas universidades e de novos campi universitários(os chamados Institutos como exemplifica o IFRJ) conforme apontado por ROTHEN e BARREYRO(2011). A continuação, estímulo e consolidação do processo de expansão das vagas do ensino superior privado iniciado na passagem dos anos 60/70, a compra de Instituições de Ensino Superiores privadas por empresas e capital estrangeiro, a diversificação significativa dos cursos de graduação, a diferenciação dos estabelecimentos, a prática do rankeamento dos resultados das avaliações e de sua divulgação nos meios de comunicação, o fortalecimento de estudantes-consumidores(GOMES,2002) e desse “mercado” perduram como as principais conseqüências ou desdobramentos da(s) reforma(s) da política educacional voltada à Educação Superior Brasileira que, ganha destaque em meio ao contexto da chamada “Nova Gestão Pública”. Processo descrito 4 por LESSARD(2006)como uma tendência das políticas estatais que destacam o papel do ensino superior diante da formação de mão de obra qualificada e produção de saberes para diferentes setores, ao mesmo tempo em que investem na melhoria da escolarização e na profissionalização docente. No entanto, essa é outra discussão que não será contemplada neste estudo. Partindo das considerações expostas, o estudo abordará as características do processo de avaliação desenvolvido na Educação Superior, em especial, o referente à aplicação de testes “em larga escala” para aferição de competências dos estudantes. Um interessante e articulado processo envolvendo a aplicação de exames em larga escala, a realização de auto-avaliação institucional nas IES e a realização de visitas de comissões de especialistas para renovação periódica de credenciamento e reconhecimento iniciado em 1994 e consolidado pelo SINAES(Lei 10.861/2004) até os dias atuais. 2. Sistema de Avaliação da Educação Superior: uma dinâmica formada pela avaliação em larga escala, renovação periódica, auto-avaliação institucional... O sistema de avaliação da Educação Superior constitui-se de várias agências e instituições que operam conjuntamente a partir de marcos legais, políticos, interesses institucionais e particulares, implementando um conjunto de medidas a serem aplicadas, visando a aferição de resultados qualitativos desse nível educacional, além de coordenálo, controlá-lo e monitorá-lo em seu processo expansionista. A idéia principal consiste em recriar o antigo sistema, especialmente anulando os efeitos nefastos do extinto CFE(Conselho Federal de Educação) junto às IES, ao MEC e a uma cultura normativa que tentou unificar elementos e instrumentos reguladores intencionalmente desde a Reforma Universitária de 1968. O MEC, alinhado com o ideário da reforma do Estado, colocou a regulação do sistema de Educação Superior como centro das políticas para este nível de ensino A extinção do CFE ocorreu em 1994. Logo em seguida, o governo buscou redefinir as relações de poder entre o MEC e o CNE(Conselho Nacional de Educação), novo órgão instituído pouco mais de um ano depois do fim daquele. O MEC recentralizou seus poderes fundamentais diante da Educação e do Ensino Superior, estabelecendo uma tendência de ação estatal. O chamado Estado Avaliador(uma outra face do Estado Interventor conforme propõe GOMES(2002). Quanto ao CNE(Lei 5 9131/95), boa parte das suas funções passou a ser re-focalizada em torno do acompanhamento da qualidade dos cursos e das instituições e da garantia das funções avaliativas desse ESTADO AVALIADOR. Além disso, exercita funções normativas e interpretativas da avaliação, participa da elaboração das políticas educacionais e controla a prática educativa por meio das Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação. Quanto à avaliação, o MEC tornou-se a agência formal das políticas, coordenando, avaliando e monitorando o seu desenvolvimento no setor. Para isso, o resultado do ENC(inicialmente PROVÃO e posteriormente, ENADE) ou Exame Nacional de Cursos e as visitas de especialistas nas Avaliações das Condições da Oferta dos Cursos são importantes. Em meio às modificações implementadas, duas medidas instituídas pela lei 9131/95, deram início a nova dinâmica de organização e funcionamento do sistema ensino superior: a renovação periódica (ACOC) e o ENC(Exame Nacional de Cursos). A primeira, diz respeito aos processos de reconhecimento de cursos e credenciamento de IES, voltada para indicar uma necessária temporalidade dos cursos que a partir de então receberiam autorizações para oferta e funcionamento com prazo de término. A segunda, a criação de um instrumento que contribuísse com esse processo de credenciamento e reconhecimento dos cursos e, por conseguinte, das IES. Nesse caso, um exame nacional para ser realizado por estudantes do ensino superior antes da conclusão da graduação. Com isso, o caráter periódico do processo de autorização e credenciamento dos cursos e a sua relação com a auto-avaliação institucional regular obrigatória, realizada nas IES superiores, passou a sofrer a mediação direta dos resultados obtidos pelos estudantes das diversas áreas no cumprimento do ENC. O processo de avaliação externo às IES e seus cursos vai sendo consolidado, através do CNE, com base nos relatórios de auto-avaliação encaminhados pelas Comissões Próprias de Avaliação institucionais e nos processos de recredenciamento e reconhecimento nele em andamento, especificamente, na Câmara de Educação Superior. Assim, o sistema tem sido “recriado” por ocasião da introdução de uma nova dinâmica de funcionamento e pela concretização de instrumentos como exames nacionais “em larga escala” e relatórios que modificam as bases das relações entre o MEC, o CNE e principalmente as IES. 6 Os resultados dos cursos e das IES analisados são enviados ao MEC com as informações do CNE, que tem a última palavra sobre a recomendação da renovação de reconhecimento, reconhecimento dos cursos ou recredenciamento desses. No entanto, ressalta GOMES(2002), a reestruturação ou a reforma da educação superior acabou por definir o MEC como um formulador e coordenador do sistema, enquanto o CNE pode ser definido como um consultor das condições da oferta do ensino superior. Resumindo, na dinâmica do sistema de educação superior brasileiro, os cursos são avaliados, os resultados são avaliados e as conclusões dessas análises devem ser consideradas pelas agências reguladoras, juntamente com os indicadores de desempenho propostos para o momento da avaliação da IES. Como afirma ROTHEN e BARREYRO(2011), a regulação do sistema desde os anos noventa encontra-se vinculada à avaliação, seja pela obrigatoriedade de renovação periódica de cursos e IES, seja pela consolidação da idéia de que um exame “em larga escala” é um indicador suficiente para a avaliação da Educação Superior. 3) O Exame Nacional de Cursos e Desempenho de Estudantes ou como se dá avaliação em larga escala na educação superior brasileira. Cabe esclarecer o sentido da avaliação em “larga escala” no espírito das reformas educacionais, antes de abordar o tema proposto. Nessa direção, a colaboração da leitura do texto de BECKER(2010) por ocasião do seminário de estudos por mim realizado nesta disciplina foi fundamental. Para caracterizar a avaliação “em larga escala”, BECKER(2010) retoma ao contexto dos anos 90. Aquela época foi iniciado um Processo de Reformas dos Sistemas Educativos em vários países do mundo com objetivo de modificar o desenho organizacional e institucional desses, além do baixo nível de responsabilidade por resultados, em especial, resultados de bom desempenho na aprendizagem dos conteúdos de ensino. O chamado Education Reform Act(1988)ou ato de reforma educacional apresentou como características o favorecimento da centralização curricular, a criação de sistemas e modelos de avaliação e a implantação de gradativa autonomia das instituições de ensino na gestão. Os governos passaram a dar maior importância ao assunto, coletando dados estatísticos que retratavam o funcionamento do sistema educacional, mas não avaliavam a aprendizagem dos alunos. 7 As análises demonstravam que os estudantes aprendiam pouco em relação ao tempo que permaneciam na escola e daí a necessidade e desafio de expandirem seus sistemas ao mesmo tempo em que garantissem a qualidade. Atualmente 16 países latinoamericanos realizam avaliações censitárias ou amostrais, nos diversos níveis de ensino, especialmente no ensino fundamental. A principal recomendação da utilização dos procedimentos de avaliação “em larga escala” é sejam definidos e aplicados a partir de um amplo debate que definiria os princípios a serem seguidos e a forma de apresentação dos resultados coerente com o objetivo das medições. A principal crítica é o seu uso apenas como mecanismo de controle, indiferente quanto à comunidade escolar, ignorada por professores, gestores e responsáveis pela formação docente, quando pouco contribui para a melhoria do ensino, quando é utilizada para fins exclusivos de ‘rankeamento’. Uma vez que as classificações não trariam contribuições efetivas para a melhora da qualidade dos cursos e programas. A legislação estabelece que o MEC “fará avaliações periódicas das IES e dos cursos de nível superior, fazendo uso de procedimentos e critérios abrangentes dos diversos fatores que determinam a qualidade e a eficiência das atividades de ensino, pesquisa e extensão(Lei 9131/95; art. 3º).” Ainda que não seja objetivo deste estudo, convém a menção do decreto sobre os novos procedimentos que devem ser utilizados para a composição da avaliação por parte do MEC para a Educação Superior. Menciono, especialmente, as ACOC. As ACOC desenham sua atuação de forma complementar ao movimento subjacente do ENC através das visitas in loco por comissões de professores específicos da área/curso avaliado em sua organização didático-pedagógica, corpo docente e infra-estrutura periodicamente. Então, desde 1996, o ENC tem sido realizado anualmente objetivando formalmente a aferição de conhecimentos e competências adquiridos pelos alunos ao longo do curso de graduação. É um exame realizado “em larga escala” um teste nacional aplicado aos estudantes que estão em fase de conclusão dos referidos cursos. Eles são formulados por comissões de especialistas, tendo os resultados divulgados anualmente pelo INEP, classificando o desempenho dos cursos por IES sem divulgar as 8 notas obtidas pelos estudantes, que devem participar como condição obrigatória para obtenção do diploma. O histórico escolar traz o registro da realização da prova. Cabe lembrar que o processo de desenvolvimento do estudante nos cursos de graduação não está vinculado aos resultados do ENC. Ou seja, sua aprovação conclusão da formação profissional relaciona-se ao seu desempenho nas disciplinas e em suas tarefas. Os resultados do ENC seriam, conforme afirma a lei, “para estimular e fomentar iniciativas para a melhoria da qualidade do ensino e a elevação da qualificação dos docentes(art.4;Lei 9131/95)”. Inicialmente, o PROVÃO como foi “apelidado” pela comunidade acadêmica era considerado o instrumento de avaliação por excelência pelo MEC, tanto pela ênfase governamental, quanto pela sua repercussão nos meios de comunicação no País. Agregado a isso, a utilização dos resultados pelas IES para a conquista dos estudantesconsumidores e a possibilidade de ampliação de sua influência no mercado local nas quais estão instaladas foi e tem sido bastante significativa. Sobretudo, as mantidas pelo setor privado. A principal característica do exame foi, através de uma avaliação censitária formada por questões de conteúdo específico, permitir a emissão de conceitos simplificados em uma escala de cinco níveis(de E até A). O exame era aplicado aos estudantes concluintes anualmente. Isso contribuiu para estimular a concorrência entre as IES, além da regulação do sistema tanto pelo MEC como pelos “clientes”, uma vez que as instituições que não obtivessem bons resultados nos exames eram ameaçadas de fechamento, ou melhor, de encerramento de suas atividades acadêmicas. Cabia ( e ainda cabe...) aos meios de comunicação, indiretamente, a elaboração de rankings e a sua divulgação em rede nacional, sempre num clima de espetáculo sensacionalista e passageiro como chuva de verão... A partir de 2004 foi implantado o ENADE ou Exame Nacional de Desempenho de Estudantes. O ENADE passou a avaliar, além de alunos concluintes, os alunos ingressantes dos cursos de graduação; ser aplicado a uma amostra de estudantes; mensurar tanto conhecimentos específicos como conhecimentos de formação geral através da inserção de um conjunto de questões de temas amplos como política 9 internacional, diversidade racial e inclusão, cultura, sustentabilidade, código nacional de trânsito... Quanto aos resultados, até 2009, foram dois tipos de conceitos distribuídos em uma escala de cinco níveis, de 5 até 1. O primeiro é o conceito ENADE, obtido a partir do próprio resultado dos alunos. O segundo conceito atribuído desde 2005 passou a ser o IDD ou Indicador de Diferença entre os Desempenhos Observado e Esperado. Com isso, os cursos são separados quanto aos resultados dos ingressantes e do cálculo da evolução dos concluintes em relação a eles. Os cursos são comparados entre seus grupos de alunos ingressantes e concluintes, conforme seus desempenhos bom, médio, fraco suscessivamente. Após o cálculo do índice, eles são agrupados em uma escala de cinco conceitos(ROTHEN e BARREYRO, 2011). Atualmente, para além da utilização dos resultados do ENADE e das ACOC, o sistema de avaliação da Educação Superior faz uso dos índices CPC( Conceito Preliminar de Cursos) e do IGC(Índice Geral de Cursos) ambos criados em 2008. O primeiro, calculado partindo da avaliação da nota ENADE e dos insumos que influenciam na qualidade dos cursos e, o segundo, das médias ponderadas dos CPCs. Um tema para instigante análise posterior sem dúvida. Sobre a prática da implementação do ENC como instrumento externo de avaliação de cursos, GOMES(2002) ressalta a sua característica de instrumento de autoavaliação institucional simplificado e a sua colaboração com a formação de um valor sobre o curso, com a soma de resultados dos cursos aos das IEs e com a formação de um valor sobre elas. Com isso, supõe-se inicialmente, ocorrerá revisão dos conteúdos, a produção de rankings conceituais da qualidade de ensino e a preparação do mercado como um elemento da coordenação da Educação Superior. Não precisa dizer que desde o início foram inúmeras as críticas realizadas pela comunidade acadêmica aos procedimentos avaliativos instituídos e à dinâmica delineada a partir daquele momento no nível de ensino referido. 4)Políticas docentes no Brasil: as Diretrizes Curriculares Nacionais e a noção de ensino por competências O contexto atual da formação dos professores vem sendo definido, dentre os fatores mencionados, pelas transformações na função da escola, pelos resultados das avaliações em larga escala das redes de ensino, dos cursos e das instituições formadoras 10 conforme discutido (SINAES,2004). Define-se, também, pela discussão da profissionalização docente e pelas políticas educacionais que remetem, historicamente, à necessidade de análise com base no contexto em que estão inseridas. Os modos de gestão do currículo dos cursos de formação formam um importante aspecto a ser analisado nessa perspectiva (GATTI, 2011). Sobre as avaliações em larga escala, ressalta-se sua colaboração como parte das medidas de regulação e da centralização da política curricular desenvolvida e implementada pelo governo federal para motivar e incrementar o controle da educação nacional. SAEB(1990), PROVA BRASIL(2005), juntamente com ENEM, ENADE são modalidades desse processo cujos resultados são incluídos como parte do credenciamento dos cursos, das instituições e também da certificação dos professores. Os exames contribuem como uma forma de acompanhamento das políticas curriculares da educação básica, da educação superior e da formação docente. As políticas de currículo buscam conferir uma feição própria aos cursos que habilitam os docentes através da proposta do que deve ser ensinado, do que deve aprendido e como deve ser ensinado. No caso da formação de professores, as políticas curriculares representam o resultado de um a complexo processo de luta entre diferentes sujeitos em disputa por um projeto hegemônico na sociedade (DIAS 2009 apud DIAS 2011; 225). Na primeira década dos anos 2000, com a publicação da LDB 9394/96, alterações são propostas tanto para as instituições formadoras quanto para os cursos de formação de professores, tendo sido definido período de transição para efetivação de sua implantação(GATTI, 2011; p.98). As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica (RES.CNE/CP nº 1/2002) são promulgadas e nos anos seguintes as DCNs para cada curso de Licenciatura passam a ser aprovadas pelo CNE. No entanto, como ressalta a autora, apesar dos ajustes propostos, verifica-se nesses cursos, a prevalência da histórica idéia de oferecimento de formação com foco na área disciplinar específica, com pequeno espaço para formação pedagógica. O século XXI inicia-se com uma condição de formação de professores nas áreas disciplinares, segundo a qual, mesmo com as orientações mais integradoras quanto à relação formação disciplinar _ formação para a docência, na prática ainda se verifica a prevalência do modelo consagrado no início do século XX para essas licenciaturas(2011, p.98). 11 As Diretrizes Curriculares para o curso de Pedagogia(RES.CNE/CP nº 1/2006) foram aprovadas propondo-o como Licenciatura e atribuindo a ele a responsabilidade pela formação de professores para a educação infantil e anos iniciais do ensino fundamental, bem como o ensino médio na modalidade Normal, para EJA, além da formação de gestores(GATTI,2011). A complexidade curricular exigida torna-se muito grande, como também, a dispersão disciplinar que se impõe, em função da duração do curso e da sua carga horária. Ao discutir as demandas e os processos de articulação política em torno da organização de uma política curricular para a formação e professores, DIAS(2011) analisou os discursos sobre integração curricular, em especial as competências e a interdisciplinaridade no currículo da formação de professores. A análise complementa o estudo realizado por GATTI(2011) sobre as políticas docentes. Nele, uma característica das reformas iniciadas ainda nos anos 90 é a educação orientada pela noção de competência, seja nos documentos norteadores da educação superior, foco desse estudo, como naqueles voltados para a educação básica. Os discursos defensores de propostas de organização curricular apontam para a tendência de um currículo de tipo integrado, com o predomínio da organização interdisciplinar e por competências. Para DIAS(2011), a convergência entre as diferentes proposições de organização curricular integrada tem como propósito a substituição da organização disciplinar como modelo para a formação de professores, configurando desse modo uma oposição (2011; p.229). A ênfase por um modelo curricular integrado é uma tendência associada a uma idéia de que a produção do conhecimento é cada vez mais integrada, agregada a divulgação dos pilares da educação (Relatório Delors, 2001) e a defesa do aprender a aprender. Nessa proposta, apóia-se a idéia de flexibilidade do currículo derivada do discurso das modificações do conhecimento no mundo atual, tecnológico, digital, interligado... A defesa da flexibilidade curricular seria justificada pela necessidade dos currículos dos cursos formadores em apresentarem propostas mais enriquecidas aos alunos. O modelo de integração curricular busca corresponder ao processo de reformas curriculares da educação básica evidenciado pelos PCNS(1998). 12 No geral, apesar dos diversos sentidos do conceito de competências e seu uso curricular, das críticas a sua ambivalência no discurso curricular, a proposta consiste em favorecer um processo integral de formação(MARKET,2006 apud DIAS, 2011; p.231) através da mobilização de conhecimentos, habilidades, atitudes por parte dos alunos diante da necessidade de respostas satisfatórias a uma situação contextualizada. A noção de competências assume uma centralidade significativa, em uma condição de paradigma curricular novo. A relação teoria-prática no currículo por competências supõe outra organização do percurso de aprendizagem, no qual o exercício das práticas profissionais e da reflexão sistemática sobre elas ocupa um lugar central(Brasil, 2001;p.30). Sobre isso, vale lembrar “(...) que o paradigma curricular referido a competências demanda a utilização de estratégias didáticas que privilegiem a resolução de situações-problema contextualizadas, a formulação e realização de projetos, para as quais são indispensáveis abordagens interdisciplinares” (Brasil, 2001, p.54-55 apud DIAS, 2011;p.240). Na análise das políticas docentes, GATTI(2011) ressalta o surgimento ou delineamento de uma nova concepção curricular, mais aberta, flexível, apoiada, além do ensino por competências, na contextualização dos conteúdos, no caráter interdisciplinar do conhecimento e na valorização da diversidade. A principal expectativa é que os currículos contribuam para a promoção da mudança social, como instrumentos ou estratégias favorecedoras de maior igualdade para os diferentes segmentos e equidade para grupos específicos. Retornando às considerações sobre a Educação Superior e o seu processo de avaliação Passados anos de intensas reformas, a avaliação da educação superior brasileiro pode ser caracterizada, nas palavras de DOURADO(2002) pela centralização, diversificação e diferenciação quanto às propostas políticas, aos tipos de IES, aos tipos de cursos e aos procedimentos de acompanhamento e verificação da qualidade das práticas de ensino e organização acadêmica dessas. As contribuições teóricas que apóiam esta análise indicam a avaliação como um dos eixos estruturantes das políticas educativas contemporâneas no Brasil. Manifestada em vários processos relacionados às mudanças econômicas e políticas mais amplas no cenário nacional desenvolvidas sem, no entanto, contrariamente ao esperado atuar de 13 modo emancipatório colaborando com o desenvolvimento institucional das IES. Como reforçam as análises, as políticas de avaliação delineadas a partir dos anos noventa parecem caminhar para a padronização e quantificação das atividades acadêmicas, nesse caso, os currículos dos cursos e as práticas de ensino. Isso remete a minha vivência como professora há 10 anos em uma Universidade privada...Intensa pressão e discursos institucionais na tentativa da manutenção de resultados acadêmicos...Movimento pertinente, porém com foco ainda incerto e talvez mal-interpretado pelos gestores. Importa retomar a análise. O conjunto de ações governamentais realizado pelo MEC e pelo CNE para a Educação Superior parece demonstrar a necessidade de maior diálogo com outros grupos da comunidade acadêmica como professores e sindicatos. A realização da avaliação como norma e a posteriori pode ser identificada como um traço significativo desse conjunto, ocupando um papel central no processo de reforma da Educação Superior. Tudo isso alicerçado pelas alterações nos processos de gestão e de regulação desencadeados nesse nível de ensino. Desse jeito, as mudanças na dinâmica do sistema resultam de certa indução à diversificação e a diferenciação das IES e de sua cultura institucional(DOURADO, 2002). Nesse contexto, a utilização dos instrumentos de avaliação contribuiu para reorganizar o sistema de Educação Superior no Brasil, tendo como propósitos a necessidade de racionalização da provisão educacional e do controle das práticas educativas(BROADFOOT,1996 apud GOMES,2002;p.277). A literatura estudada reforça como consequência das ações o expansionismo materializado através da criação de novas IES, novos cursos, novos formatos organizativos e reestruturações de cunho administrativo. Com isso, massificação da oferta estaria em curso, negligenciando o papel da educação superior como espaço de investigação. No cerne da problemática estariam as mudanças na identidade da função social da universidade, que a cada dia é considerada operacional “voltada para si mesma, mas não no sentido de um retorno a si e sim antes uma perda de si mesma”(Chauí, 1999 apud Trindade, 1999). Na análise do sistema de avaliação da Educação Superior, estaria em destaque, por trás das avaliações “em larga escala”, a implementação de um processo de 14 economização que altera objetivos, valores e o processo educativo, a ampliação do controle do Estado sobre a “lógica” do campo e o relacionamento entre as IES, as políticas avaliativas promovem mudanças na gestão das IES, no trabalho acadêmico e na formação profissional oferecida. Principalmente, o sistema de avaliação que vai sendo delineado parece estimular a uma operacionalização através de exames nacionais que contribuem para transformá-las em suas práticas acadêmicas, estrutura, mediados por exigências dos estudantes-consumidores, do mercado e pela “aceitação” das políticas concebidas. Interessa a consideração de DIAS SOBRINHO (apud DOURADO, 2002)sobre a avaliação como um campo e disputas uma vez que pode evidenciar os fins da educação, o conceito de homem, o projeto social a ser desenvolvido, ainda que na prática ela ganhe centralidade como forma de controle e definição de políticas que estimulam a expansão competitiva no ensino superior. Referências Bibliográficas BECKER, Fernanda. Avaliação Educacional em Larga Escala: a experiência brasileira. Revista Iberoamericana de Educação, n.53, 2010. CATANI, A.M. e OLIVEIRA, J.F.(orgs). 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