N. 6 - Ano II - outubro 2002
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Itinerando
an te
Juntos construindo uma Amazônia
mais fraterna e plural,
mais justa e solidária.
Rua Luiz de Freitas, 113 São Jorge
69033- Manaus – AM. BRASIL
Fone/Fax: (92) 625-2899. E-mail: [email protected]
EQUIPE ITINERANTE: Notícias Gerais
Nos dias 12 13 de outubro tecemos o primeiro Encontro da Equipe Itinerante com o superior dos Jesuítas da
Amazônia (Pe. Bruno), a provincial das Cônegas de Santo Agostinho (Irmãs Valdete e Odete), as provinciais
das Filhas do Sagrado Coração de Jesus (Irmã Inelda e Sonia). Era também um dia especial por ser a Festa
de Nossa Senhora Aparecida e dia das Crianças. Dedicamos a Eucaristia de abertura ao povo brasileiro neste
tempo de Advento Político de histórico significado diante da possibilidade de consolidação democrática com a
vitória de um Projeto Social representada por Luiz Inácio Lula da Silva. A cor negra de Aparecida nos exortou
à conversão pessoal e social desta chaga contra-cultural do Racismo, da discriminação e do preconceito racial
contra os negros, o indígenas, as mulheres e os pobres deste país.
O Encontro teve continuidade com a apresentação pessoal (nossas origens e níveis de participação na equipe),
destaque e perguntas em torno aos projetos da Equipe e Comunidade Itinerante. O clima de fraternidade,
amizade e comunhão foi uma constante durante todo o Encontro, proporcionando um espaço favorável e
agradável de diálogo e entendimento profundos.
A avaliação foi muito positiva e durante a Eucaristia de encerramento selou-se o compromisso com o Projeto
em seu caráter inter-congregacional e inter-institucional assumido como obra comum, que deve manter-se
com este espírito de leveza, pobreza e disponibilidade para o serviço aos mais pobres e onde a vida está mais
ameaçada. Definiu-se para fins 2003 nos encontrarmos pela segunda vez para celebrarmos 05 anos de
caminhada.
RIBEIRINHOS: Analfabetismo - O Brasil desigual e injusto
Analfabetismo - O município de Pauini-AM (1.900 Km de Manaus) está situado na margem esquerda do rio
Purus, com uma área territorial de 42.652 Km e uma população de 18.292 hab., sendo que 12.558 hab. vivem na
área rural. Limita-se a Oeste com o Estado do Acre com a principal linha de acesso fluvial ou de avião de
pequeno porte. Sua população é maioritariamente ribeirinha que vivem do extrativismo e da agricultura de
subsistência. A alimentação básica é o peixe com farinha de mandioca variada com alguma caça.
É crescente a chegada de madeireiros para exploração predatória e criminal de madeiras de lei além de usar
mão de obra semi-escrava ribeirinha. Todo este processo tem causado nos últimos anos um crescente êxodo
rural e aumento da pobreza, marginalidade e exclusão. A juventude é atingida mais diretamente pela
prostituição, alcoolismo e uso de outras drogas.
Segundo dados do IBGE, este município tem maior índice de analfabetismo no Brasil, com mais de 65% da
população. Se olharmos apenas a população adulta, este índice sobe para mais de 80%. A viagem de barco
entre Pauini e Manaus pode durar entre 10 e 15 dias e este é isto é uma das causas do isolamento e abandono,
tendo muita dificuldade, inclusive de escoar seu produtos para a comercialização. Pauini é uma terra fértil e
de um povo trabalhador e como todo bom amazonense, muito acolhedor.
Política e democracia para quem? Por aí passamos uns 30 dias visitando 12 comunidades. Era tempo
eleitoral e o assunto era política. “ Aqui somos abandonados até mesmo em tempo de política. Um ou outro vem
por aqui e quando vem é para prometer tudo que precisamos: escola, posto de saúde, transporte, luz, etc. Mas
entra ano e sai ano e a vida continua no mesmo ou pior”. Tivemos a oportunidade de constatar que, faltando
um mês para as eleições, em diversas comunidades a maioria das pessoas não sabiam sequer o nome dos
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candidatos a presidente e governador. Um ou outra sabia algum nome de candidato a deputado. De senador
ninguém. Imaginem na hora de votar em modernas urnas eletrônicas... e para 6 cargos!
Por outro lado, para nossa maior surpresa encontramos aí uma presença organizativa bastante significativa
das comunidades e movimentos sociais, apoiados pela diocese de Lábrea em parceria com a CPT que carece de
apoio, recursos humanos e financeiros.
Odila e Paulo Sérgio
MARGINALIZADOS URBANOS: A Eficácia da Gratuidade
Muitos nos questionam sobre a eficácia do nosso trabalho nas invasões, que tem um jeito diferenciado dos
outros existentes. Não queremos ser melhores tão pouco piores, queremos apenas somar seguindo nossas
intuições, nos colocando realmente a caminho, andando de um lugar para outro como fazia Aquele ao qual
queremos seguir.
O que nos faz acreditar que nosso jeito é valido e bom, são as pessoas que visitamos que geralmente
expressam frases como “Nossa vida mudou depois que conhecemos vocês”, “minha casa é abençoada toda
semana com a presença de vocês”, ou ainda “agora tenho amigos para convidar para o meu aniversario”.
O mundo das periferias é muito duro, violento, deprimente até. As famílias estão em sua maioria desfeitas,
magoas acumuladas que se transformam em vícios, muitas e muitas vezes encontramos pessoas desesperadas
e afogadas em meio aos seus problemas precisando apenas que alguém lhes ouça como amigos...
... A família de dona Marina é composta por cinco membros. Ela é uma senhora, de saúde frágil, que durante
muito tempo teve problemas com a traição do marido Elias. A conhecemos na comunidade Santa Clara e
começamos a dar-lhe atenção, ouvir seus lamentos e freqüentar sua casa,, dormir e comer com a família. Até
que um dia ela muito feliz nos diz “ o Elias falou que agora ele tem que mudar pois temos amigos da igreja que
visitam nossa casa”. E assim parece que foi.
Na Comunidade Santa Clara há três anos atras reuniam-se 4- 5 pessoas em um terreno ao ar livre para rezar
juntos e a animadora Cileuza queria desanimar. Iniciamos então as visitas gratuitas, não para convidar para a
igreja e sim para conhecer as famílias, nos interessar e fazer amizade com elas.
...As pessoas começaram a gostar do nosso jeito simples, despojado, não interesseiro e diziam “se vocês são
assim tão `legais` e estão na igreja, o que tem lá deve ser bom”. Hoje a Comunidade está muito viva e muitas
das pessoas que participam dela foram visitadas por nós. A Comunidade já caminha firme com seus próprios
pés, por isso, já não se faz necessário a nossa presença permanente e sim, apenas, quando pede alguma
assessoria e, claro, quando a saudade das amigas e amigos aperta.
Muito devagar –como o ritmo da natureza- também nos alegramos ao perceber algumas sementes espalhadas
no âmbito social. Assim, na área da Comunidade S. João Batista, está acontecendo um encontro de rua a cada
terça-feira à noite. Já aconteceram doze. A idéia é ter um espaço humano para conhecer-se e aproximar-se
mais, conversando sobre os mais diversos assuntos que as pessoas sugerem: família, violência, missão,
educação dos filhos, política, amizade, etc. Cada semana o encontro acontece numa das casas dessa rua e,
claro está, é ecumênico no mais amplo sentido. O desejo é que isto se multiplique e cada rua tenha seu espaço
de conhecimento e bem-querer.
Ainda outros exemplos no âmbito político, nestes últimos tempos antes das “Eleições”: Nas visitas que
fizemos a cada dia, muitas vezes surgiu na conversa o assunto político-eleitoral. Procuramos respeitar quem já
tinha opinião formada e, se nos perguntavam, colocávamos nossa opinião sem polemizar. Mas, muitas pessoas
se sentiam desorientadas totalmente e pediam para a gente orientar. Então, colocávamos alguns dados
tentando ajudar à pessoa discernir e escolher os candidatos. Claro que isto é muito limitado, mas é uma
pequena semente qualitativamente diferente de uma pessoa votar a troco de um favor ou porque fulano
mandou.
A gratuidade do nosso modo de agir, talvez não seja muito eficiente na hora de contabilizar os resultados
difíceis de medir, mas sim acreditamos que é eficaz e indispensável na perspectiva do Reino, da humanização
e transformação da cidade.
Cláudia e Paco
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INDÍGENAS: Itinerando no Rio Negro
Do dia 29/08 a 06/10 itineramos pela diocese de São Gabriel da Cachoeira, Rio Negro–Am. Ficamos alegres
com as novas forças que encontramos por lá. Dom José Song (SBD), novo bispo da região, nos acolheu com
muito carinho. Dom Walter, bispo emérito, foi morar entre os Yanomami em Maturaka, admirável! Várias
congregações estão somando força na região: Sagrados Corações, Catequistas Franciscanas, Missionários
Xaverianos, além de um grande número de vocações indígenas em formação com as Salesianas/os. Um passo
importante na diocese é a estruturação das pastorais e a criação de uma coordenação pastoral diocesana, sob
a animação de Pe. Jorge (SSCC).
A Ir. Dinair (FMA), coordenadora do GIPRAB (Grupo Indígena de Padres e Religiosas/os da Amazônia
Brasileira), nos convidou para participar das reuniões de preparação para o próximo encontro do grupo
(09/2003). É importante destacar que na referida diocese, está o maior número de padres e religiosas
indígenas do Brasil. Ainda na cidade, nos reunimos com os Srs. Orlando e Argemiro da coordenação da FOIRN
(Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro), com quem trocamos algumas idéias, informações e
sonhos.
Em seguida, a diocese nos enviou a visitar 11 comunidades (rio Curicuriari e Rio Negro, abaixo de São Gabriel),
região de fala nheengatu e tukano. Com elas desenvolvemos a oficina “A Marcha continua por uma terra sem
males”. A experiência foi muito rica e forte. Rica porque vimos, uma vez mais, o quanto temos que aprender
dos povos indígenas que conservam muitos valores que na sociedade “civilizada” já não existem: gratuidade,
partilha, desprendimento, generosidade, austeridade de vida... A experiência foi forte também, porque
partilharam os problemas e desafios atuais que enfrentam: militarização, políticos corruptos, exploração dos
comerciantes, alcoolismo, re-divisão territorial... Destacamos alguns dos depoimentos e desenhos feitos pelas
comunidades:
“Os comerciantes nos exploram. Se
enriquecem com o nosso suor.”
“Nossos trabalhos na roça são pesados e exigem muito da
gente. Os comerciantes são quem dão o preço de nossos
produtos. Um dia eu dei o meu preço e eles deram outro bem a
baixo e então eu respondi: eu vim aqui vender e não, dar de
graça. Se fosse pra dar, eu dava para os meus filhos que
precisam”.
“Os políticos mentirosos dividem
nossa comunidade”.
“Já estamos cansados de ser enganados por centenas
de políticos mentirosos que só querem nossos votos.
Prometem muitas coisas. Mas quando a gente precisa
deles, eles se escondem, mandam dizer que não estão ou
que estão ocupados. Não cumprem o que prometem.
Continuam mentindo e ainda caímos nas mentiras deles”.
“Os militares abusam de nossas filhas!”
“Os militares estão invadindo cada dia mais nossas terras.
Eles dizem que é para nos defender, porém, isso é
mentira. Eles se crêem os donos de tudo e não respeitam
ninguém. Os militares têm violentado e engravidado muitas
de nossas filhas. Eles fazem a ‘sujeira’ e logo são
transferidos sem assumir seus filhos... A quem vamos
recorrer?”
Arizete, Fernando e Hugo
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