A ÉTICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Marcelo Moura1
Ana Eleonora S. Assis2
RESUMO
Este artigo tem por objetivo discutir a ética na educação infantil, um período em
que a criança deve adquirir valores morais e éticos, princípios estes com o fim de guiar
e orientar as relações humanas. Hoje vivemos em um mundo onde os pais passam
pouco tempo com os filhos, assim, deixam um espaço muito grande para a mídia, e
quando esses vêm para a escola sem essa base que é tão importante para o
desenvolvimento e para a criação de um indivíduo ético e atuante na comunidade, os
educadores acabam assumindo uma missão muito árdua: o de primeiro educar as
crianças para depois tentarem passar o conteúdo de aula. Como se deve trabalhar esse
assunto na educação infantil, onde um dos principais problemas da escola atualmente
está em como lidar com os conflitos sócio-morais provindos desta realidade? Perante
este contexto, um dos desafios é fazer destas situações de conflitos meios de
aprendizagem. É o que esse artigo aborda.
Palavras-chave: família, criança, educação, escola, conflito, ética, moral.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho se propõe a analisar como a ética está sendo colocada em
prática pelas famílias e escolas na educação infantil nos últimos tempos. Nota-se que os
pais estão deixando de cumprir seu papel perante a educação dos filhos e em
consequência disso a escola está ficando mais sobrecarregada com o aumento dos
conflitos e problemas advindos desta nova fase que a educação está passando.
A ÉTICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Segundo as autoras Rheta De Vries e Betty Zan (1998), a ética é um conjunto de
decisões, princípios e valores com o fim de guiar e orientar as relações humanas. Esses
valores devem ter característica universal, e têm de ser válidos para todas as pessoas por
um tempo indeterminado. Mas este conceito não tem sido posto em prática, inclusive na
criação dos filhos.
Nos últimos tempos, a escola e a mídia vêm assumindo praticamente sozinhas
um papel que deveria ser dos pais: o de educar as crianças para a cidadania. A sociedade
sofreu transformações e, com isso, mudaram os valores éticos inseridos nela.
1
2
trabalho.
Acadêmico do curso de Educação Física da Universidade Luterana do Brasil.
Docente do curso de Educação Física e da Universidade Luterana do Brasil e orientadora deste
Antigamente, era a escola que se encarregava com a transmissão da cultura (tendo o
professor como centro de conhecimento) e à televisão só restava a função de
entretenimento. Hoje, o papel de transmitir valores morais às crianças, antes realizados
pelos pais, passou a ser indiretamente executado pela escola e pela mídia.
Não que os pais estejam acomodados com a situação. O fato é que eles
trabalham mais e passam menos tempo com os filhos. A mãe que antes ficava em casa e
ensinava valores éticos agora trabalha fora e, em alguns casos, é quem sustenta a
família. Esta realidade está estampada nitidamente nas escolas. Os pais, pelo fato de se
sentirem culpados por essa ausência, ao chegarem do trabalho, acabam tornando-se
tolerantes, deixando de ditar limites e mostrar o que é certo ou errado.
Os pilares da educação infantil, a família, esquecem muitas vezes que educar é
promover o crescimento e o amadurecimento da pessoa referente a todas as sua
dimensões, tanto material, moral como também religiosa. Os pais esquecem que a célula
mãe da sociedade é a família. Se a família não vai bem, a sociedade perece.
A principal carência dos filhos é a falta de ética dos pais, onde estes deixam de
dar amor e atenção aos filhos, são omissos e estão ausentes na educação destes, e ainda
muitos dizem que este papel de educadores são deles, mas sim da escola. Observa-se
um dos principais erros cometidos por eles: não ter tempo para os filhos e jogar suas
obrigações e responsabilidades para a escola. Os pais esquecem que educar os filhos
significa estar com eles e acompanhá-los no dia a dia.
Os pais a fim de suprir sua ausência na educação dos filhos, assumem
comportamentos que acabam por confundir e desestruturar as crianças. Por terem essa
atitude acabam tornando-se negligentes. Muitas vezes, os pais agem assim por sentiremse culpados pelo insucesso do filho que foi gerado e criado por eles. Essa realidade
reflete a incompetência da família no processo formativo do indivíduo. Se os mais
velhos não transmitem a educação, os usos e costumes para os mais novos, fica difícil
avançar a educação nas escolas, pois os professores ficam com uma dupla missão:
assumem o papel dos pais, tentando passar valores, atitudes, respeito, e a partir daí
prosseguem em suas aulas, sendo muitas vezes interrompidos pela falta de educação dos
mesmos:
Algumas pessoas julgam que a escola não deveria se preocupar
com a educação social e moral, mas centrar-se no ensino de temas
acadêmicos ou na promoção do desenvolvimento intelectual da criança. No
entanto, a escola acaba tendo essa função, quer pretenda fazer isso ou não,
até porque na sociedade atual essa é uma expectativa criada pelos pais.3
Essa carência de atenção dos pais reflete no desenvolvimento afetivo, moral e
intelectual das crianças.
Dessa maneira, as crianças têm suas necessidades intelectuais,
emocionais e fisiológicas atendidas pelo professor e pelos colegas de classe.
Sendo assim, o ambiente familiar deixa de estar presente de maneira
suficiente na vida dessas crianças, o que tem grande influência no seu
desenvolvimento e formação.4
Nos ambientes familiares carentes, a TV se torna um meio para compensar as
carências e frustrações sofridas em casa.
A televisão tem um papel fundamental no mundo globalizado. Por
ser um meio de comunicação bastante acessível, cada vez mais, ganha
espaço na maioria dos lares de diversas classes, tornando-se um fenômeno
social e cultural. A televisão é uma das principais fontes de informação do
país e as crianças são, em maioria, o público alvo. A TV supre nelas a falta
dos pais, tornando-se uma fonte fundamental de integração social. Elas se
identificam com os estereótipos e personagens apresentados, trazendo graves
consequências para sua formação.5
É possível demonstrar também o papel do professor que a TV assume. Onde na
maioria dos casos é a responsável pela transmissão de valores e conhecimentos que
trazem malefícios às crianças, por exemplo, o amadurecimento precoce e a banalização
de assuntos como sexo e violência. São imagens fortes que, a partir de então, passam a
interferir na construção da personalidade, de seu mundo interior, do caráter e na maneira
delas de verem e entenderem o mundo em sua volta. Sem falar que este grupo infantil é
o público que mais assiste TV, e um conteúdo direcionado para bem acima de suas faixa
etárias. E quem decide que programa é bom ou não são eles mesmos. Eles passam mais
tempo em frente à TV do que na escola ou com os próprios pais. Estes fatos são a
realidade que os professores encontram e enfrentam diariamente.
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Fonte: Http://www.viajus.com.br
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Dessa maneira, torna-se explícito um dos motivos da má formação
infantil nos dias atuais: a mídia. A influência desta na educação infantil,
muitas vezes, tem como reflexo as deturpações da idéia de como devem ser
os princípios e o comportamento das crianças, que serão os futuros adultos e
transmissores de valores da sociedade.6
Portanto, o educador possui um papel fundamental na formação ética e moral do
indivíduo, principalmente na educação infantil, onde se inicia a vida escolar.
Trabalhamos a ética e a moral na educação infantil vivendo-as, demonstrando-as aos
nossos alunos através dos nossos atos, da nossa postura, das atitudes e dos valores aos
quais acreditamos. Não se ensina moral e ética, vivencia-se.
A APRENDIZAGEM DA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS SÓCIOMORAIS
Um dos principais problemas da escola atualmente está em como lidar com os
conflitos no ambiente escolar. Diariamente, observamos nas escolas pais relatarem que
“não conseguem mais lidar com seus filhos”, por sua vez professores também reclamam
da indisciplina dos alunos, da falta de respeito, da falta de limites. Os (as) professores
(as), também cometem atos de violência, quando são autoritários, quando usam de
coerção ou intimidação para resolverem os conflitos que surgem, pois muitas vezes é a
maneira que sabem utilizar para tentarem resolver estes problemas.
É necessário salientar que em toda a convivência humana existem conflitos, e
eles também estão presentes na escola, na sala de aula, pois são ambientes onde as
pessoas interagem. Mas, alguns professores têm dificuldade para perceber que muitos
conflitos são excelentes oportunidades para se trabalhar a cooperação, valores e regras.
Outros reconhecem a importância de se trabalhar os sentimentos que afloram nas
situações de conflito, mas, alegam não ter formação necessária para resolver algumas
brigas, discussões entre as crianças e também com os professores. A formação
acadêmica tornou os professores mais hábeis para lidar com o mundo físico do que com
o social, pois conhecem mais o conteúdo em si, que as pessoas do nosso convívio.
Conforme Rheta e Betty (1998) a aprendizagem da resolução de conflitos
poderia possibilitar formas de convivência mais satisfatórias e à melhoria da qualidade
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de vida das pessoas, auxiliando a soma dos recursos mentais, intelectuais e emocionais
imprescindíveis para a convivência humana.
Na teoria construtivista, o conflito assume duas formas que Piaget considerava
importante, o conflito intra-individual e o conflito interindividual, que
Piaget considerava ambas imprescindíveis ao desenvolvimento,
embora seu foco principal estivesse sobre a primeira forma, o conflito intraindividual - isto é, o conflito dentro do indivíduo. Esse conflito é evidente,
por exemplo, quando uma criança tem a ideia de que a localização de sua
sombra depende da sua ação (VRIES & ZAN, 1998, pag. 90).
Já esta segunda forma de conflito,
é interindividual - conflito entre indivíduos. Piaget argumentava
que este conflito pode promover o desenvolvimento tanto moral quanto
intelectual. Isto ocorre pelo descentramento que ocorre a partir de uma única
perspectiva para levar em consideração a perspectiva de outros e é iniciado
pela confrontação com os desejos e ideias de outros... O conflito interpessoal
pode oferecer o contexto no qual as crianças tornam-se conscientes de que
outros têm sentimentos, ideias e desejos (VRIES & ZAN, 1998, pag. 90).
As situações conflituosas também são meios de aprender a conhecer e
reconhecer diferentes pontos de vista, sentimentos e desejos envolvidos que só são
possíveis nas interações sociais, com os outros. Já a ausência de conflitos mostra um
ambiente onde o respeito unilateral prevalece, pois não há discordância, atritos, brigas
ou discussões, caracterizando que só uma das partes detém a autoridade, o respeito, a
razão.
Segundo De Vries e Zan (1998), a atitude geral do professor deve ser a de
suporte para os alunos frente ao conflito gerado, conversando, observando sobre a
condução do conflito, onde elenca alguns princípios específicos de ensino: seja calmo e
controle suas reações; reconheça que o conflito pertence às crianças; acredite na
capacidade das crianças para a solução de seus conflitos; assuma a responsabilidade
pela segurança física das crianças; use métodos não-verbais para acalmar as crianças;
reconheça, aceite e valide os sentimentos de todas as crianças e suas percepções dos
conflitos; ajude as crianças a verbalizarem sentimentos e desejos umas às outras e a
escutarem o que outras têm a dizer; esclareça e declare o problema; dê uma
oportunidade para que as crianças sugiram soluções; proponha soluções quando as
crianças não têm idéias; enalteça o valor do acordo mútuo; ajude as crianças a
reconhecerem sua responsabilidade em uma situação de conflito; ajude as crianças a
restaurarem o relacionamento, mas não as force a serem insinceras e encoraje as
crianças a resolverem seus conflitos por si mesmas.
Estas atitudes do professor, colocadas em prática surgiriam um bom efeito na
resolução dos conflitos.
Não basta apenas transmitir lições de moral, mas desafiar os educandos a
olharem, questionarem e refletirem sobre as várias possibilidades de um mesmo
caminho. A problematização direciona para a construção de uma moralidade autônoma,
onde dessa forma, na escola, cada criança torna-se participante da formação de um novo
ambiente social, onde por sua natureza, é sempre moral.
A educação moral é, uma dimensão formativa que perpassa todos as esferas da
educação e da personalidade. Assim, a educação moral torna-se ponto central da
educação, pois pretende dar direção e sentido ao ser humano como um todo.
PIAGET apud DE VRIES e ZAN (1998, pág. 90), descreve significativamente
como se desenvolve a moralidade na criança, onde relata que existem dois tipos de
moral: a heterônima, que se baseia na obediência, na submissão e no castigo; e a
autônoma que está direcionada no respeito mútuo e na reciprocidade.
Pois ninguém inicia uma mudança pessoal sem se sentir acuado por um conflito
sócio-moral, ou sem pressionar a si mesmo colocando em foco a realidade em que vive.
Os fatores que integram o universo da moralidade na criança são motivos para que os
professores se sintam instigado, direcionado e desafiado a buscar na aprendizagem da
resolução de conflitos sócio-morais um desafiativo e importante fator de construção e
formatação da autonomia moral dos alunos.
O cerne da autonomia é que as crianças tornem-se capazes de tomar decisões por
si próprias. Mas não se deve confundir a autonomia com a liberdade completa, pois não
é a mesma coisa. A autonomia leva em consideração os fatos relevantes para decidir
agir da melhor forma para todos. Não pode haver moralidade quando se considera
somente o próprio ponto de vista, seja, quando se olha o próprio umbigo. Mas, quando
uma pessoa leva em consideração os pontos de vista das outras, não está mais livre para
mentir, quebrar promessas e ser leviano.
Para que se possa atingir a maturidade, é preciso ultrapassar fronteiras, desafiarse, ajudar e estimular a criança a transpor limites, dirigindo o seu caminhar desde cedo
para a idade adulta, para buscar a excelência e fazê-la viver a moralidade como busca de
dignidade, de auto-respeito.
Por conseguinte, considerando que os conflitos estarão sempre presentes nas
relações educativas, nos ambientes escolares, não podem ser vistos como anormais ou
antinaturais, pois a necessidade dessa aprendizagem deveria ser incluída nos currículos
escolares para que frutifiquem possivelmente em práticas educativas conduzindo e
formando os educandos em sujeitos autônomos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Atualmente, com as transformações da sociedade, a escola e a mídia, estão
assumindo praticamente sozinhas o papel da educação infantil, que deveria ser da
família. A principal carência dos filhos é a falta de ética dos pais, onde estes estão
omissos e ausentes, não assumindo a responsabilidade de educa-los. A televisão está
suprindo a falta da presença dos pais na educação, onde maleficamente interfere na
construção da personalidade, e dos valores éticos e morais. O público infantil passa
mais tempo em frente à TV do que com os pais ou na escola, e acabam tendo uma
educação defasada.
É com este público que os professores trabalham diariamente em suas aulas,
enfrentando um dos principais problemas da educação atualmente, que é a
aprendizagem da resolução dos conflitos sócio-morais. Sabemos que a presença dos
conflitos é um importante meio de aprendizagem, mas o professor deverá conduzir e dar
suporte para os alunos.
O educador deverá desafiar o educando na construção de uma moralidade
autônoma, assim, cada criança torna-se participante na tecelagem de um novo ambiente
social. É preciso dirigir o caminhar desde cedo, pois os conflitos estarão sempre
presentes, mas este desafio precisa ser encarado mais de perto e com urgência pelos
pais, tanto como, a educação moral deverá ser incluso nos currículos escolares, para dar
uma melhor direção e sentido ao ser humano.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
MENDES, Lara e GOMES, Roseane. Ética na educação infantil. Disponível em:
<http://www.viajus.com.br> Acesso em: 30 jun. 2009.
VRIES, Rheta, De. & ZAN, Betty. A ética na educação infantil - o ambiente sóciomoral na escola. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.
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A ÉTICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL Marcelo Moura Ana