. Um problema com leões Existe um local na África onde as montanhas dão lugar a grandes campos de grama. As zebras pastam lá, assim como os búfalos e, se você tiver sorte, também pode ver os leões. Nos lagos, pela manhã, há ainda mais animais: as girafas, que inclinam o pescoço até a água; os javalis e suas famílias, que correm para matar a sede quando ninguém está olhando; além de outros bichos. Akimbo, que vivia à beira dessa enorme reserva, conhecia muito bem todos esses animais e seus hábitos. Mas ele andava entediado. Com a chegada das férias, os amigos tinham ido embora e não acontecia nada de interessante na reserva. O pai estava ocupado demais desde que se tornara chefe dos guardas e preenchia os dias com todo tipo de tarefas urgentes, de modo que não sobrava tempo para o filho. Pelo menos era o que achava Akimbo. Ele pensou em construir uma casa na árvore. Havia muitas árvores frondosas para escolher, mas quando começou a procurar madeira, descobriu que todas as tábuas do tamanho certo estavam reservadas para outro uso. E teve que abandonar a idéia. Um dia, no café-da-manhã, seu pai anunciou de forma inesperada que ficaria fora por alguns dias. "Tenho que ir até uma das fazendas no sul", ele disse. "Recebemos relatos de ataques de leões a criações de gado. O fazendeiro pediu que fôssemos até lá para resolver o problema." Akimbo ouviu com atenção. Ataques de leões! Ficou logo imaginando se poderia ir junto. Às vezes, recebia a permissão de ir com os homens para o interior da selva em uma ronda de rotina, mas nunca tinha conseguido ajudar em uma coisa dessas. Ele olhou para o pai, aguardando maiores detalhes, mas o guarda limitou-se a bebericar o chá e não disse mais nada. Akimbo decidiu perguntar de uma vez. "Posso ir junto?", ele disse, de forma hesitante. "Não vou atrapalhar, eu prometo." O pai de Akimbo franziu a testa e chacoalhou a cabeça. "Desculpe, Akimbo", respondeu. "Estarei muito ocupado e não terei tempo de cuidar de você." "Mas eu sei cuidar de mim mesmo", Akimbo protestou. "Não vou dar trabalho, eu prometo." O pai de Akimbo olhou para o menino. Era bom tê-lo por perto quando tinha pequenos serviços para fazer, mas uma expedição para combater leões predadores?... Aquilo era diferente. Ainda assim, tinha que admitir que o filho já estava crescido e certamente sabia como se manter longe de encrencas na selva. "Bom...", ele começou a frase, hesitante. "Você não vai atrapalhar, certo?" Akimbo ficou tão contente que caiu de joelhos. "Claro que não", respondeu. "E sei que posso ajudar." "Humm", disse o pai, ainda sem muita convicção. "Sobre isso, não tenho certeza. Mas acho que não há problema em levar você junto." Akimbo mal podia se agüentar de tão feliz. O tédio que vinha sentindo até então desapareceu por completo. Ele iria partir em busca de leões - os animais mais perigosos e soberbos da selva! É claro que ele já tinha visto leões à distância, e uma vez surpreendeu uma leoa dormindo a poucos metros dele, mas desta vez parecia que eles iriam chegar mais perto do que isso! Akimbo ficou imaginando se esta seria tão empolgante quanto sua última aventura. Seguir a pista dos caçadores de marfim e salvar os elefantes foi a coisa mais emocionante de toda a sua vida. Mas também foi a mais aterrorizante, e ele ficou feliz quando acabou. No dia seguinte, eles partiram bem cedo, antes que o sol nascesse por trás das montanhas. O ar da manhã era frio e cortante, e os homens esfregavam as mãos para se aquecer enquanto esperavam o jipe dar a partida. Akimbo estava sentado com o pai na cabine, ao passo que os outros empoleiravam-se na traseira com o equipamento. Sua mãe tinha preparado uma garrafa térmica com chá e alguns sanduíches para o café-damanhã e, quando o jipe deu a partida na estrada sacolejante, Akimbo desembrulhou os sanduíches e começou a comer. O sol apareceu, tingindo as planícies de dourado. Revoadas de pássaros subiram dos lagos e da copa das árvores; manadas de zebra observaram o veículo em movimento antes de estourar em uma nuvem de poeira; em pânico, um antílope e seu filhotinho cruzaram a estrada na frente deles. Akimbo não tinha dormido bem na noite anterior, ansioso com a viagem. Agora, conforme o clima ia esquentando, ele cochilava sem querer e era acordado de vez em quando por um solavanco na estrada, mas logo caía no sono de novo. Eles pararam uma ou duas vezes antes de chegar à fazenda. Os homens saltaram da traseira do jipe, esticaram as pernas e prepararam uma cuia de chá em uma fogueira feita de gravetos. Então, por fim, pouco antes do meio-dia, vislumbraram a fazenda que estavam procurando, um aglomerado de edificações distantes e cercadas de árvores. Assim que o jipe estacionou na propriedade, os cachorros latiram de forma defensiva e o fazendeiro apareceu na varanda da casa, acenando de forma simpática. Akimbo sentou-se ao pé da cadeira do pai enquanto os dois homens discutiam o problema. "Ao todo, foram cinco ataques", disse o fazendeiro, com a voz séria. "Só no último mês." O pai de Akimbo assentiu com a cabeça. "Fale mais sobre eles", pediu. O fazendeiro suspirou. "Perdi doze cabeças de gado", disse. "Em todos os casos, o ataque foi à noite. O leão quebrou a cerca do curral e matou um ou dois animais. Ele arrastou as presas por um tempo, tentando carregá-las para fora, mas acabou desistindo e jantou ali mesmo." "E alguém viu?", perguntou o pai de Akimbo. O fazendeiro sorriu. "Paguei um homem para ficar de vigia na cerca por algumas noites, mas quando ele ouviu o tumulto, decidiu voltar correndo pra cá. Não posso culpá-lo, é claro, mas isso quer dizer que ele não viu o que aconteceu. No entanto, ele acha que é apenas um leão." O pai de Akimbo ficou pensando por um instante. "É provavelmente o mesmo animal", ele disse. "Sempre que um leão não quer ter o trabalho de caçar suas presas na selva, acaba escolhendo um alvo fácil." Ele fez uma pausa antes de continuar. "O problema é que a única maneira de acabar com isso é atirando no leão ou transportando-o para outro lugar. Não há como fazê-lo abandonar o novo costume." "Vocês acham que conseguem pegá-lo?", perguntou o fazendeiro, um pouco incrédulo. O pai de Akimbo soltou uma risada. "Pode levar alguns dias", respondeu. "Pode levar uma semana. Mas com certeza vamos tentar. O certo é que vamos pegá-lo ou ele pega a gente!" Akimbo engoliu em seco. Sabia que o pai não estava só brincando, e que aquilo era perigoso sob qualquer ponto de vista. Ainda assim, ele tinha pedido para ir junto, e certamente não mudaria de idéia agora.