5. Elétrons em Sólidos
5.1- O Gás de Elétrons Livres: Estado Fundamental
A maior parte das propriedades físicas dos sólidos é, de uma forma ou de outra,
determinada pelos elétrons. O estudo dos elétrons em sólidos, que se inicia neste capítulo,
representa portanto uma parte fundamental deste e qualquer outro curso de FMC.
O comportamento de elétrons em sólidos dá origem aos mais diversos fenômenos:
desde a variedade de formas de coesão cristalina que estudamos no Capítulo 1, passando
por diferentes fenômenos de transporte e térmicos, até o comportamento coletivo
responsável por fenômenos como magnetismo e supercondutividade. Obviamente, o
estudo destes fenômenos deve obedecer a uma escala progressiva de complexidade. Deste
modo, iniciaremos nosso estudo dos elétrons em sólidos com um modelo extremamente
simples, mas que servirá de base para descrições mais elaboradas: o gás de elétrons
livres.
A expressão “gás de elétrons livres” já traduz as duas aproximações básicas do
modelo. É “gás” porque os elétrons não interagem entre si, a situação ideal para que
consideremos cada elétron como uma partícula independente, ou seja, que se
“movimenta” de maneira não-correlacionada com as demais. São “livres” porque não
estão sob a ação de nenhum potencial externo (como por exemplo o potencial devido aos
íons do cristal). Ambas aproximações são bastante drásticas: em sólidos reais, um elétron
interage fortemente tanto com a rede como com os demais elétrons. Ainda assim, o
modelo de elétrons livres pode servir como uma aproximação razoável em alguns metais,
especialmente os metais alcalinos, nos quais a influência dos íons é bastante enfraquecida
devido ao fenômeno de blindagem e os elétrons de valência se distribuem de maneira
quase uniforme pelo cristal.
Nesta Seção, iremos descrever as propriedades do gás de elétrons livres a T = 0 K,
ou seja, seu estado fundamental. Consideremos um gás de N elétrons em uma caixa de
volume V. A Hamiltoniana para um elétron deste sistema contém apenas a energia
cinética:
p2
22
(5.1)
,
H

2m
2m
1 ikr
2 k 2
e com autovalores  (k ) 
cujas autofunções são ondas planas  k (r ) 
.O
2m
V
fator 1 V garante que a probabilidade de encontrarmos o elétron em qualquer ponto da
caixa seja igual a 1:
1
 dV 
caixa
56
2
Nos falta escolher o formato e as condições de contorno da caixa. Fisicamente,
espera-se que os resultados obtidos a partir deste modelo não sejam dependentes destas
escolhas, já que no limite macroscópico temos V   . Desta forma, podemos escolher o
formato e as condições de contorno que sejam mais simples do ponto de vista
matemático. A convenção para o formato da caixa é um cubo de lado L, de modo que
L  V 1/ 3 . Quanto às condições de contorno, se poderia esperar que a escolha mais física
seria impor que   0 nas extremidades da caixa, como mostra a Fig. 5.1(a). Porém, isto
daria origem a ondas planas estacionárias, menos convenientes para descrever certos
fenômenos (transporte eletrônico, por exemplo), do que ondas propagantes. Escolhem-se
então as chamadas condições de contorno periódicas (ou de Born - von Karman):
 ( x  L, y , z )   ( x , y , z )
 ( x , y  L, z )   ( x , y , z )
 ( x , y , z  L)   ( x , y , z )
(5.3)
Estas condições de contorno de contorno equivalem a conectar cada face do cubo com a
face oposta1, como mostra a Fig. 5.1(b), simulando, desta forma, um cristal infinito.
Aplicando-se a primeira condição de contorno à função de onda  k (r) , obtém-se
1 i ( k x ( x  L) k y y  kz z )
1 i ( k x x  k y y  kz z )
e

e
 e ik x L  1.
V
V
(5.4)
Esta condição determina os valores possíveis para kx, e usando relações análogas para as
direções y e z, temos:
kx 
2n y
2n x
2nz
, ky 
e kz 
;
L
L
L
(5.5)
onde nx, ny e nz são inteiros.
(a)
0
(b)
=0
 (x)
 (x + L)
 (x) =  (x + L)
L
L
Figura 5.1 – (a) Condições de contorno fixas, segundo as quais a função de onda eletrônica é zero fora da
caixa cúbica de lado L. Isto dá origem a soluções correspondentes a ondas estacionárias dentro da caixa.
(b) Condições de contorno periódicas, segundo as quais a caixa é repetida periodicamente nas três direções
cartesianas, simulando um sistema infinito, e impõe-se que a função de onda deve ter a mesma
periodicidade, determinando assim um conjunto discreto de vetores de onda permitidos.
1
Mesmo que isto seja topologicamente impossível em 3 dimensões.
57
Portanto, os possíveis valores do vetor de onda k ocupam pontos de uma rede cúbica
simples no espaço recíproco. A Fig. 5.2 mostra estes pontos no plano k z  0 . Note que o
volume ocupado (no espaço recíproco) por cada ponto k é (2 ) 3 V . Portanto, quanto
maior o volume V do sólido mais densa será esta rede de pontos k permitidos, e no limite
V   teremos um conjunto contínuo destes vetores.
A partir destes estados permitidos de 1 elétron, podemos construir o estado
fundamental de um gás de N elétrons livres. Para isto, é necessário levar em consideração
o princípio de exclusão de Pauli, segundo o qual dois elétrons não podem ocupar o
mesmo estado quântico. Levando-se em conta o spin do elétron, cada estado quântico
associado a um vetor de onda k permitido pode então conter 2 elétrons, um com ms = ½ e
outro com ms = -½. Desta forma, constrói-se o estado fundamental de N elétrons
ocupando-se progressivamente os níveis de mais baixa energia. Para um gás com um
número macroscópico de elétrons no limite V   , a densidade de pontos k permitidos
é grande o suficiente de modo que os níveis preenchidos ocupam o interior de uma esfera
no espaço dos vetores de onda, como mostra a Fig. 5.3. Esta esfera é conhecida como
esfera de Fermi. Sua superfície, onde estão localizados os elétrons de maior energia é a
superfície de Fermi, e os elétrons aí localizados têm a energia de Fermi (F) e vetor de
onda com módulo igual a kF (vetor de onda de Fermi).
ky
kx
2 / L
Figura 5.2 - Pontos k permitidos no plano kz = 0.
kz
Superfície de Fermi
(kF) = F
kF
ky
kx
Esfera de Fermi
Figura 5.3 - A região cinza (esfera de Fermi) representa os vetores de onda ocupados no gás de elétrons
livres. Os elétrons mais energéticos, localizados na superfície de Fermi, têm energia F e vetor de onda de
módulo kF.
Pode-se relacionar estas quantidades à densidade n  N V do gás de elétrons da
seguinte forma. Sabendo que N = 2(No de k’s ocupados), onde o fator 2 é devido ao
58
spin, e calculando-se o número de k’s ocupados como o volume da esfera de Fermi
dividido pelo volume ocupado por cada k, temos
N
2  43 k F3
(2 ) 3 V

Vk F3
,
3 2
(5.6)
de modo que
k F  (3 2 n)1/ 3 .
(5.7)
Como se vê, o vetor de onda de Fermi depende apenas da densidade de elétrons, e não do
número de elétrons ou do volume separadamente. O mesmo ocorre para a energia de
Fermi:
 2 k F2
2
F 

(3 2 n) 2 / 3 .
2m
2m
(5.8)
As funções de onda  k são também auto-estados do operador momento linear

p  i , com autovalores k e, portanto, do operador velocidade v  p m , com
autovalores k m . Define-se então o momento de Fermi pF  k F e a velocidade de
Fermi v F  k F m , respectivamente o momento e a velocidade daqueles elétrons de
mais alta energia. Para as densidades típicas dos metais, v F  106 m/s, ou seja, mesmo à
temperatura zero a velocidade dos elétrons em um metal pode chegar a um centésimo da
velocidade da luz! Isto é um efeito essencialmente quântico, originário do princípio de
exclusão, e contrasta frontalmente com o comportamento que partículas clássicas teriam a
T = 0 K.
Por fim, terminamos nossas definições da nomenclatura não muito original
relacionada ao gás de elétrons livres com a temperatura de Fermi, TF   F k B , onde kB
é a constante de Boltzmann. Para densidades típicas, TF  104 K. Esta não é a
temperatura termodinâmica do gás de elétrons, mas apenas um parâmetro que exerce um
papel importante com relação às propriedades térmicas do gás de elétrons, como veremos
na próxima seção.
Em muitas situações, necessitamos calcular somas de quantidades diversas sobre
todos os k’s ocupados. Exemplos dessas quantidades são o número total de elétrons, N,
ou a energia total do gás de elétrons, E. De modo geral, dada uma quantidade qualquer
F(k ) , queremos calcular a soma por todos os k’s ocupados:
Ftot  2  F (k ) ,
k kF
(5.9)
onde o fator 2 é devido ao spin e a soma é sobre todos os k’s com módulo menor que kF.
59
Como dissemos, no limite macroscópico ( V   ), a densidade de pontos k
permitidos dentro da esfera de Fermi é grande o suficiente para substituirmos o somatório
por uma integral:
Ftot  2
V
(2 ) 3
 dk F (k ) ,
(5.10)
k kF
V
é a densidade de pontos k permitidos. Comparando as Equações (5.9)
(2 ) 3
e (5.10), chegamos à relação geral entre somatórios e integrais na esfera de Fermi:
onde o fator
lim
V 
V
 F (k )  (2 )  dk F (k ) .
3
k kF
k kF
(5.11)
Como exemplos, vamos aplicar a Eq. (5.11) para calcular o número total de
elétrons, N, e a energia total, E. A expressão para N é
N  2 1  2
k kF
V
(2 ) 3
V 4 3
k F ,
3
3
 dk  4
k kF
(5.12)
que dá n  k F3 3 2 , o mesmo resultado obtido anteriormente (Eq. (5.7)).
Para a energia total, temos
V
2k 2
V
E  2   (k )  2
dk
 3
3 
(2 ) k k F 2m
4
k k F
kF
 2 k 2  2 k F5 V
0 dk(4k ) 2m  10 2 m .
2
(5.13)
Usando V  N n e n  k F3 3 2 , obtemos a energia por elétron
E 3
  .
N 5 F
(5.14)
Em muitas situações, a quantidade F(k) é mais facilmente expressa como função
da energia (k), ou seja, como F((k)). Neste caso, gostaríamos de expressar Ftot como
uma integral na energia, e não em k:
Ftot   d D( ) F ( ) .
(5.15)
A quantidade D() é a densidade de estados, definida de modo que D()d é o número
de estados quânticos com energia entre  e  + d. Pode-se calcular D() a partir da
expressão (5.8) que dá o número de elétrons com energia menor que F. Esta expressão
60
pode ser generalizada para qualquer valor de energia, de modo que podemos definir N()
como o número de elétrons com energia menor que :
V  2m 
N ( ) 


3 2   2 
3/ 2
.
(5.16)
Pode-se obter o número de elétrons com energia menor que  +d usando-se a
própria definição de D():
N (  d )  N ( )  D( )d .
(5.17)
Desta forma, a densidade de estados de um gás de elétrons livres pode ser calculada por
dN ( )
V
D(  ) 

d
2 2
 2m 
 2
 
3/ 2
 1/ 2 .
(5.18)
Como se vê, a densidade de estados tem uma dependência com 1/2 (Fig. 5.4).
Esta dependência é característica da dimensionalidade (e também da relação de dispersão
quadrática): como veremos no Problema 1 da lista de problemas, a densidade de estados é
independente da energia para um gás de elétrons livres bidimensional2.
D()
~1/2

Figura 5.4 - Esboço da densidade de estados em 3 dimensões.
2
Em 1 dimensão, a dependência é com -1/2.
61
5.2 - Propriedades Térmicas do Gás de Elétrons Livres
Se os elétrons fossem partículas clássicas, suas propriedades térmicas seriam bem
descritas pela termodinâmica clássica. Pelo Teorema da Equipartição da Energia, um gás
com N partículas clássicas livres tem energia interna U  23 Nk B T e, portanto,
capacidade térmica (a volume constante):
C
dU 3
 Nk B ,
dT 2
(5.19)
independente da temperatura.
Porém, já no início do século XX, se sabia que a contribuição eletrônica para a
capacidade térmica dos metais é tipicamente 100 vezes menor que este valor a
temperatura ambiente. Este enigma intrigou os físicos no início do século, já que os
elétrons pareciam agir como um gás livre para efeitos de condução de eletricidade, mas
pareciam não contribuir para a capacidade térmica. Este aparente paradoxo só foi
resolvido com a física quântica, em especial com a descoberta de que as partículas
quânticas se dividem em dois tipos, férmions e bósons, cada qual com sua distribuição
estatística própria. Os elétrons são férmions, e por isso obedecem à distribuição de
Fermi-Dirac3.
A distribuição de Fermi-Dirac dá a probabilidade de que um estado eletrônico de
energia  esteja ocupado em equilíbrio térmico a temperatura T:
f ( ) 
1
e
(   ) k BT
1
.
(5.20)
A quantidade  é conhecida como potencial químico. Note que f ( )  21 . Como
veremos, o potencial químico depende da temperatura, ou seja,    T  . A temperatura
zero, o potencial químico é simplesmente a energia de Fermi:  (0)   F , como vimos na
Seção anterior. Veja na Fig. 5.5 a distribuição de Fermi-Dirac para T = 0 e T  0. Para um
gás de elétrons livres em 3 dimensões com um número fixo N de elétrons, o potencial
químico decresce com o aumento da temperatura, como mostrado na figura. Esta
dependência é obtida, como veremos a seguir, pela condição de que o número total de
partículas, N, seja constante e independente de T.
A temperatura finita, a expressão para o número total de elétrons é

N   d D( ) f ( )
(5.21)
0
Podemos obter a dependência qualitativa de (T) analisando graficamente a integral
(5.21), como na Fig. 5.6. O número de elétrons N é dado pela área sombreada no gráfico.
3
Aqui o curso de FMC faz uso de ter Física Estatística como pré-requisito. Iremos supor que a distribuição
de Fermi-Dirac é conhecida. O estudante que quiser rever estes conceitos deve procurar algum livro de
Física Estatística, como por exemplo o Fundamentals of Statistical and Thermal Physics, F. Reif, Cap. 9.
62
Na Fig. 5.6(a), temos a situação em T = 0, com F. Se  fosse independente da
temperatura, a T diferente de zero teríamos a situação mostrada na Fig. 5.6(b). Note,
porém, que a área "ganha" para  (N+ na figura) é maior que a área "perdida" para
 (N- na figura). Isto ocorre por dois motivos: (i) A função f() é "simétrica" com
relação a  1 2  f (    )  f (    )  1 2 (ii) A densidade de estados D() tem
derivada positiva em    . Assim, o número de elétrons ( N  na figura) aumentaria.
Como N deve permanecer constante,  deve diminuir com a temperatura para
contrabalançar este efeito.
f ()
1,0
T>0
T=0
0,5
0,0

 (T)  (0)= F
Figura 5.5 - A distribuição de Fermi-Dirac a T = 0 e T>0. Note que o potencial químico, definido tal que
f() = 1/2, diminui com o aumento da temperatura para um gás de elétrons livres em 3 dimensões.
Quantitativamente, até segunda ordem em T, pode-se mostrar (Ashcroft, p. 46)
que
 (T )   F 
 2 D  ( F )
(k T ) 2 .
6 D(  F ) B
(5.22)
Note a dependência com a derivada da densidade de estados no nível de Fermi, D( F ) ,
ou seja, se a densidade de estados for crescente,  deve diminuir com a temperatura, e
vice-versa. Podemos reescrever a expressão (5.22) da seguinte maneira (verifique!):
  2  T 2 
 (T )   F 1     .
(5.22a)
 12  TF  
Desta forma fica claro que o potencial químico não difere muito da energia de Fermi se a
temperatura for muito menor que a temperatura de Fermi, o que usualmente é o caso à
temperatura ambiente.
Vamos agora obter a capacidade térmica de um gás de elétrons livres. Como
dissemos no início desta seção, ela deve ser tipicamente 100 vezes menor que o resultado
clássico a temperatura ambiente.
63
3
(a)
T=0
f ()
2
f(ε)D(ε)
1
N
0
F

3
(b)
T>0
f ()
2
f(ε)D(ε)
N1
N’
N+
0
F

Figura 5.6 - Ilustração gráfica do aumento do número de elétrons com a temperatura se  fosse
constante. Para compensar este efeito, deve de fato diminuir com a temperatura. O número de
elétrons (N e N’) é dado pela área sombreada em cada caso.
A escala de temperatura relevante em um gás de Fermi é a temperatura de Fermi,
definida na seção anterior como TF   F k B . Como vimos, a temperaturas muito
menores que TF, a distribuição de Fermi-Dirac pouco se desvia do comportamento a T =
0 e podemos, com aproximação, supor que    F , de modo que a distribuição de FermiDirac torna-se
f ( ) 
1
e
(  F ) k BT
1
(T  TF ) .
(5.23)
Uma análise da equação (5.23) sugere que, para T  TF , a distribuição de FermiDirac é diferente de 0 ou 1 apenas para valores da energia  tais que    F  k BT . Isto
está ilustrado na Fig. 5.7. Assim, os elétrons excitados termicamente são apenas aqueles
correspondentes a esta faixa de energias, tipicamente D( F )  k BT elétrons. Além disso, a
64
energia de excitação típica é também da ordem de k BT . Desta forma, a variação de
energia U do gás de elétrons é dada aproximadamente por
U  (número de elétrons excitados)  (energia de excitação média de um elétron) 
( D( F )  k B T )  (k B T )  D( F )  (k B T ) 2
(5.24)
f ()
2
kBT
kBT
1
0
F

Figura 5.7 - Apenas os elétrons com energia próxima à energia de Fermi são excitados termicamente.
Podemos agora calcular a capacidade térmica do gás de elétrons livres:
Cele 
T
dU
 2 D( F )k B2T  3N k B 
dT
 TF

 .

(5.25)
Note que a capacidade térmica apresenta uma dependência linear com a temperatura
(para temperaturas baixas), em contraste com o valor constante da previsão clássica.
Tomando valores típicos para metais, TF = 5  104 K, temos, para T = 300 K,
Cele  0,01 ( 32 N kB ) , ou seja, 100 vezes menor que a previsão clássica, como queríamos
mostrar.
A física por trás deste resultado é a seguinte: o Princípio de Exclusão de Pauli,
manifestado através da distribuição de Fermi-Dirac, impede que todo e qualquer elétron
seja excitado termicamente. Apenas serão excitados aqueles elétrons, em estados
inicialmente ocupados, que puderem ser promovidos para estados desocupados com
energias próximas, E ~ kBT, já que esta é a energia térmica disponível. Assim, apenas
uma pequena fração dos elétrons é excitada (tipicamente uma fração T /TF), o que
acarreta em uma redução na capacidade térmica.
65
Note que o resultado acima é válido apenas no limite de baixas temperaturas.
Repare também que o cálculo acima é aproximado, foram feitas diversas hipóteses
simplificadoras. O resultado exato é (veja Kittel):
Cele 
2
D( F ) k B2 T ,
(5.26)
3
ou seja, a dependência linear com T é preservada, apenas o pré-fator numérico é alterado.
Experimentalmente mede-se, além da dependência linear, uma dependência com
T3 que, como veremos no Capítulo 7, é devida às vibrações da rede:
Cexp  T  AT 3 .
(5.27)
Como  é proporcional à massa eletrônica através da densidade de estados D(F) (veja a
equação (5.18)), a determinação experimental de  permite determinar uma "massa
efetiva térmica" dos elétrons no sólido. Como veremos nos próximos capítulos, esta
massa efetiva não é, em geral, igual à massa de um elétron livre devido à influência da
rede cristalina e dos demais elétrons. Portanto, a determinação experimental de  é um
instrumento importante no estudo dos elétrons em sólidos. Tipicamente, mede-se a
capacidade térmica em diversas temperaturas e determina-se  pelo coeficiente linear em
um gráfico (C /T) vs. (T2), como o da figura abaixo.
Figura 5.8 - Determinação experimental para o potássio do coeficiente  , que está associado
contribuição eletrônica para a capacidade térmica de um sólido. Fonte: Kittel, p. 155.
5.3 - Elétrons em um Potencial Cristalino: Teorema de Bloch
Nas duas últimas Seções, analisamos as propriedades do estado fundamental e de
excitações térmicas do gás de elétrons livres. Como dissemos, esta é uma abordagem
simplificada para descrever elétrons em sólidos, mas que serve como ponto de partida
para refinamentos adicionais. Nesta Seção, iniciaremos nosso estudo do gás de elétrons
sob a ação do potencial cristalino.
Seja U(r) a energia potencial que um elétron no cristal. Contribuem para U(r) não
apenas os íons (núcleos + elétrons de caroço), mas também os demais elétrons de
66
valência. U(r) é portanto um potencial de uma partícula, ou seja, introduzimos a interação
elétron-elétron sob a forma de um potencial efetivo que represente de alguma forma a
interação média do elétron em questão com todos os demais elétrons. Isto é uma
aproximação que, como veremos ao final deste capítulo, pode ser justificada em diversas
situações. Apesar disto, o cálculo de U(r) em geral é não-trivial, e por hora vamos apenas
assumir que U(r) é dado.
Por mais complicado que seja o potencial U(r), sabemos que a periodicidade
cristalina nos impõe que
U (r)  U (r  R) ,
(5.28)
onde R é um vetor da rede de Bravais. Queremos encontrar soluções para a equação de
Schrödinger de um elétron na presença deste potencial periódico:
   2 2

H  
 U (r )    .
 2m

(5.29)
Nesse sentido, enunciaremos agora um dos resultados mais importantes em FMC, que
nos fornece a forma das soluções da Eq. (5.29), o Teorema de Bloch.
Teorema de Bloch: Se o potencial é periódico, ou seja, se U (r)  U (r  R) ,
então as soluções da equação de Schrödinger correspondente podem ser escolhidas da
forma
 nk (r)  e ikr u nk (r) ,
(5.30)
onde e ikr é uma onda plana com vetor de onda k e unk (r) é uma função com a mesma
periodicidade da rede, ou seja, unk (r)  unk (r  R) . O índice n é o chamado índice de
banda, e veremos seu significado físico em breve. Note que, em geral, a função de onda
não é periódica, apesar do potencial ser periódico. Isto é facilmente verificável
calculando-se  nk (r  R) diretamente:
 nk (r  R)  e ik(r  R ) u nk (r  R)  e ikR e ikr u nk (r)  e ikR nk (r) ,
(5.31)
ou seja, ao transladarmos a função de onda por um vetor da rede R, obtemos a própria
função de onda multiplicada por uma fase e ikR ,  nk (r  R)  e ikR nk (r) . Aliás, esta
expressão é um enunciado alternativo do Teorema de Bloch.
Vamos agora demonstrar o teorema. Seja TR um operador de translação tal que
TR f (r)  f (r  R) , onde f(r) é uma função qualquer. Como a Hamiltoniana é invariante
por translações de um vetor R, H (r  R)  H (r) , pode-se mostrar que o operador de
translação comuta com a Hamiltoniana, TR , H   0 , da seguinte maneira:
TR [ H (r) (r)]  H (r  R) (r  R)  H (r) TR  (r) .
67
(5.32)
Da mesma forma, é fácil mostrar que duas translações por vetores R e R’
comutam:
TR TR (r)   (r  R   R)   (r  R  R )  TRTR (r) .
(5.33)
Assim, H, TR, TR’, TR’’, etc., formam um conjunto de operadores que comutam e portanto
podem ser diagonalizados simultaneamente, ou seja, podemos encontrar autofunções
simultâneas de H e de um operador de translação qualquer TR, com autovalores  e
c(R) respectivamente:
H  
.
TR  c(R )
(5.34)
Vamos agora determinar os autovalores c(R). Como vimos, diferentes operadores
de translação comutam entre si. Similarmente, é fácil mostrar que TR TR  TR  R . Assim,
TR TR  c(R)c(R )  TR  R  c(R  R ) .
(5.35)
Portanto,
c(R)c(R)  c(R  R) .
(5.36)
A função matemática com esta propriedade é a exponencial. Assim, c(R)  e ikR .
Para completarmos a demonstração, falta mostrar que k é um vetor de onda real.
Para isso, vamos utilizar novamente a idéia de condições de contorno periódicas,
introduzida anteriormente. Vamos supor que temos um cristal com dimensões L1, L2 e L3
nas direções dos vetores unitários a1, a2 e a3, como mostra a figura abaixo, de modo que
Li  N i a i , onde Ni é inteiro.
N3a3
L3
N2a2
a3
a2
L2
N1a1
L1
a1
Figura 5.9 – Esquema da super-célula com condições de contorno periódicas.
Aplicamos então as condições de contorno periódicas:
(5.37)
68
 (r)   (r  N i a i )  e ik ( N a ) (r) ,
que implica em e ik ( N a )  1 para todo i. Usamos agora o fato que os vetores unitários da
rede recíproca, b1, b2 e b3, formam uma base no espaço recíproco, de modo que podemos
escrever o vetor de onda k como uma combinação linear k  x1b 1  x 2 b 2  x3 b 3 . Então,
usando a própria definição dos vetores unitários da rede recíproca, b i  a j  2 ij , temos
i i
i i
x1 
2 n1
;
N1
x2 
2 n 2
;
N2
x3 
2 n3
,
N3
(5.38)
onde n1, n2 e n3 são inteiros. Portanto, os coeficientes xi são reais, e desta forma k é um
vetor real. Está provado então o Teorema de Bloch:
 nk (r  R)  e ik R nk (r) .
(5.39)
A importância do Teorema de Bloch para a FMC é melhor compreendida quando
exploramos algumas de suas consequências :
1. Significado de k. Diferentemente do que ocorre com um elétron livre, para um
elétron de Bloch  não é um autoestado de p com autovalor k . Isto ocorre porque o
potencial cristalino quebra a simetria de translação completa do espaço. Podemos
verificar este resultado pela aplicação direta de p na função de onda de Bloch:




p nk  i e ik r u nk (r )  k  nk  i e ik r u nk (r ) .
(5.40)
Ainda assim, a quantidade k tem grande relevância e recebe o nome de momento
cristalino. Veremos seu significado físico em maior detalhe quando estudarmos a
dinâmica de elétrons em sólidos, assunto do próximo capítulo.
2. Multiplicidade na escolha de k. A função de onda de Bloch introduz o vetor
de onda k como um bom número quântico associado à fase e ikR pela qual a função de
onda é multiplicada quando fazemos um translação por um vetor da rede R. Porém, se
lembrarmos que e iGR  1 , temos
 nk (r  R)  e iGR e ik R nk (r)  e i (k G )R nk (r) ,
(5.41)
ou seja, se k é um bom número quântico associado uma função de Bloch, (k+G) também
é um bom número quântico associado à mesma função. Em muitas situações, é
conveniente eliminar esta multiplicidade de números quânticos, e para isso é necessário
restringir os vetores de onda k permitidos apenas àqueles contidos na 1a Zona de
Brillouin. Note que, se k está dentro da 1a Zona de Brillouin, (k+G) estará fora dela.
O número de vetores de onda k permitidos pode ser calculado da seguinte forma.
Como vimos anteriormente, o volume no espaço recíproco ocupado por cada k é
d 3 k  (2 ) 3 V , onde V é o volume total do cristal. Portanto, como os k's permitidos
estão restritos à 1a ZB, a quantidade deles é N k  (VZBV ) (2 3 ) , onde VZB é o volume da
69
Zona de Brillouin. Podemos escrever o volume total do cristal como V  N cel v cel , onde
Ncel é o número de células unitárias primitivas contidas no cristal e vcel é o volume de
cada célula. Desta maneira4,
N k  N cel
v cel
(2 ) 3
VZB  N cel .
(5.42)
Este é um resultado importante, que será usado futuramente: o número de k's permitidos
é igual ao número de células primitivas contidas no cristal. Assim, quando tomarmos o
limite V   (que é sempre um bom limite em se tratando de cristais macroscópios),
podemos supor que o conjunto de k's permitidos torna-se cada vez mais denso na 1a ZB,
aproximando-se de uma distribuição contínua.




Bandas de energia


Para cada k
k
Figura 5.10 – Diagrama esquemático do conjunto discreto de soluções da equação de autovalores para cada k
(à esquerda). No limite de um cristal infinito, o conjunto de k’s permitidos (pontos no gráfico à direita) tornase contínuo e temos as bandas de energia (linhas o gráfico à direita).
3. Índice de banda. Para cada k na 1a ZB, há diversas soluções  nk possíveis da
equação de Schrödinger, cada qual indexada por um número inteiro n, conhecido como
índice de banda. Isto pode ser entendido através da equação de autovalores para a parte
periódica u k (r) da função de onda de Bloch. Partindo-se da equação de Schrödinger,
   2 2

 U (r ) e ik r u k (r )   k e ik r u k (r ) ,

 2m

(5.42)
e após alguma manipulação algébrica, chega-se à seguinte equação para u:

   2 (ik  ) 2

 U (r ) u k (r )   k u k (r ) .

2m


4
3
Usamos aqui um resultado demonstrado na última lista de exercícios, V  (2 ) .
ZB
v cel
70
(5.43)
Como uk(r) é uma função periódica, a equação acima pode ser resolvida apenas na região
contida em uma célula primitiva do cristal, com as condições de contorno
u k (r )  u k (r  R ) . Temos então, para cada k, um problema independente de autovalores
com condições de contorno em uma região finita do espaço. Esperamos, portanto, que as
soluções possíveis formem um conjunto discreto de autovalores, que indexamos então
por um índice de banda n,  nk como está mostrado na Fig. 5.10. Note que, no limite
V   , quando o conjunto de k's permitidos forma quase um contínuo, podemos
interpolar entre k's vizinhos para o mesmo n, formando uma distribuição quase contínua
de autovalores da energia,  n (k ) , conhecida como banda de energia.
4. Velocidade de um elétron de Bloch. Pode-se mostrar5 que um elétron em um
estado de Bloch com energia  n (k ) tem associado a si uma velocidade média (mais
precisamente, o valor esperado do operador velocidade p/m no estado de Bloch) igual a
v n (k ) 
1 
 k  n (k ) .

(5.44)
Note que este resultado tem consequências até certo ponto surpreendentes. Segundo a
expressão acima, um elétron no estado  nk (r) tem uma velocidade média em geral nãonula mesmo na ausência de campos externos. Isto seria esperado para um elétron livre,
mas não é imediatamente óbvio para um elétron sob a ação de um potencial devido aos
íons e aos demais elétrons. Na verdade, a expectativa que se tinha a partir de modelos
clássicos de condução eletrônica (que estudaremos em maior detalhe no próximo
capítulo), é que o elétron seria repetidamente “espalhado” através de colisões aleatórias
com os íons cristalinos, e este fenômeno seria responsável pela resistência elétrica dos
materiais. A teoria de Bloch nos apresenta uma imagem física completamente distinta: na
presença de um potencial periódico, os elétrons viajam pelo cristal sem colidir com os
núcleos, como se “aprendessem” a periodicidade cristalina. Isto pode ser entendido de
forma mais precisa invocando-se a natureza ondulatória do elétron e interpretando a
função de Bloch como uma onda que participa de um processo de espalhamento coerente
pelo potencial periódico.
Um dos sucessos mais significativos da teoria quântica dos estados eletrônicos em
um cristal, que delineamos nesta seção, foi a explicação da existência de diferentes tipos
de sólidos (metais e isolantes) a partir do conhecimento de sua estrutura de bandas e do
preenchimento das mesmas. Como vimos, o número de k’s permitidos é igual ao número
de células primitivas, Ncel. Assim, o número de estados eletrônicos que cada banda pode
comportar é 2 Ncel, onde o fator 2 aparece devido ao spin. Então, o número de elétrons
por célula unitária e a topologia da estrutura de bandas pode determinar se as bandas
estarão totalmente ou parcialmente preenchidas. Vamos analisar alguns exemplos:
1. Número ímpar de elétrons por célula primitiva. Se há um número ímpar de
elétrons por célula primitiva, a última banda ocupada nunca poderá ficar totalmente
ocupada, já que uma banda totalmente ocupada requer um número par de elétrons (2
5
Apêndice E do Ashcroft. Uma outra maneira de entender este resultado é pensando em um elétron como
sendo descrito por um pacote de ondas com velocidade de grupo ( v g
p. 203.)
71
 d dk   1 d dk ) (Kittel,
Ncel), como mostra a Fig. 5.11. Este é o caso, por exemplo, dos metais alcalinos, que
possuem 1 elétron no nível mais energético. Este nível dará origem a uma banda semipreenchida. Como veremos no próximo capítulo, apenas as bandas semi-preenchidas
contribuem para a condução de eletricidade, portanto esta análise simples pode ser usada
para prever que todo cristal com um número ímpar de elétrons por célula primitiva será
um metal.

F
k
a
1 ZB
Figura 5.11 – A última banda semi-preenchida de um cristal com um número ímpar de elétrons por
célula primitiva. Apenas os níveis com energia menor que a energia de Fermi estão ocupados.
2. Número par de elétrons por célula primitiva. Neste caso, teremos dois casos
possíveis:
2.a – Se as bandas próximas ao nível de Fermi não se superpõem em
energia, a última banda preenchida (comumente chamada de banda de valência) estará
totalmente preenchida e a banda seguinte (banda de condução) estará totalmente vazia,
como mostra a Fig. 5.12.

Banda de
condução
F
gap
Banda de
valência
k
1a ZB
Figura 5.12 – Esquema de bandas de um cristal com número par de elétrons por célula primitiva e sem
superposição entre as bandas.
72
Exemplos são o Si, Ge, NaCl, etc. Quando isto ocorre, o material será um isolante, e a
região de energias entre as duas bandas onde não há estados eletrônicos permitidos é
conhecida como gap de energia. Um tipo especial de isolante ocorre quando a energia do
gap é pequena, e elétrons podem ser excitados termicamente da banda de valência para a
de condução. Neste caso, o material é conhecido como semicondutor por ter
propriedades de condução intermediárias entre um metal e um isolante.
2.b – Se as bandas se superpõem em energia, podemos ter a situação
mostrada na Fig. 5.13 onde, apesar de haver um número par de elétrons por célula
primitiva, o material é metálico pois há duas bandas semipreenchidas. Exemplos são
alguns metais divalentes como o Ca e o Mg, e sistemas mais complicados como o As e o
grafite, estes últimos conhecidos como semimetais por apresentarem uma superposição
de bandas bem pequena.

F
1a ZB
k
Figura 5.13 – Esquema de bandas de um cristal com número par de elétrons por célula primitiva e com
superposição entre as bandas, dando origem a um metal divalente ou semimetal.
Estes resultados revelam uma teoria simples porém poderosa. Apenas utilizando a
Mecânica Quântica e considerações elementares de simetria, os físicos obtiveram, na
primeira metade do século, resultados que explicavam diversas propriedades dos sólidos
que eram conhecidas há muito tempo e de grande utilidade na vida prática. Isto deu
grande impulso na pesquisa, tanto teórica como experimental, em FMC.
5.4 - A equação central
O Teorema de Bloch nos fornece a forma geral das soluções da equação de
Schrödinger de um elétron em um potencial periódico. Desenvolveremos agora um
método prático para calcular estas funções de onda, a partir de um potencial dado.
Partimos da função de onda de Bloch,  nk (r)  e ik r u nk (r) . Como u nk (r) é uma
função com a mesma periodicidade da rede de Bravais, apenas os vetores G da rede
recíproca participam em sua expansão de Fourier. Podemos então escrever
73
u nk (r )   c n ,k ,G e  iGr .
(5.45)
G
Será mais conveniente escrever cn,k ,G  ck  G  . Isto é possível porque, para k dentro da
primeira ZB, existe apenas um par de vetores k e G associados a um dado k  G  .
Assim,
u nk (r )   c(k  G ) e  iGr .
(5.45a)
G
A função de onda de Bloch é então escrita da forma
 nk (r )   c(k  G ) e i (k G )r
.
(5.46)
G
O problema de se encontrar soluções para a equação de Schrödinger se resume portanto à
determinação dos coeficientes ck  G  .
O potencial cristalino U(r) também é periódico, de modo que também podemos
escrevê-lo como uma expansão de Fourier nos vetores G:
U (r )   U G  e iG r .
G
(5.47)
Assim, introduzimos estas expressões na equação de Schrödinger, que se torna um
sistema de equações para os coeficientes c(k - G):
   2 2

 U (r )  

 2m

  2 (k  G ) 2

   c(k  G ) e i (k G )r   U G  c(k  G ) e i (k G  G )r  0


2m
G 
G ,G 

(5.48)
Como as ondas planas são funções linearmente independentes, o coeficiente
multiplicativo de cada onda plana e i (k G)r deve ser zero separadamente. Obtemos assim,
  2 (k  G) 2

   c(k  G)  U G  c(k  G ) G ,G  G   0

2m
G ,G 


(5.49)
Devido à presença da delta de Kronecker no somatório duplo, este torna-se um somatório
simples:
  2 (k  G ) 2

   c(k  G )   U G c(k  G   G )  0

2m
G


74
(5.49a)
Por razões apenas estéticas, redefinimos os vetores de onda na equação acima: G   G ,
G   G   G , e chegamos na expressão
  2 (k  G ) 2

   c(k  G )   U G  G c(k  G )  0

2m
G


(5.50)
Esta é a equação central. Ela nos permite, em princípio, obter os coeficientes de Fourier
da função de onda ck  G  a partir de um potencial cristalino conhecido. Note que o
potencial cristalino "acopla" os coeficientes ck  G  e ck  G  através do coeficiente
de Fourier U GG . É portanto um sistema infinito de equações, uma para cada um dos
infinitos G's. Para que haja solução, é necessário que o seguinte determinante seja nulo:
 k G    U 0
1
U G1  G 2
U G1  G 3

U G 2 G 1
 k G 2    U 0
U G 2 G 3

U G 3 G 1
U G 3 G 2
 k G 3    U 0



0 ,


(5.51)
onde k G   2 (k  G) 2 2m .
O método de solução da equação de Schrödinger em um potencial periódico está
portanto formulado. Note que isto não quer dizer que a solução seja simples. Pelo
contrário, no momento ela nos parece uma tarefa absurdamente difícil: temos que
resolver um conjunto infinito de equações para cada um dos vetores de onda k (que são
também virtualmente infinitos, já que Nk = Ncel), a partir de um potencial cristalino que
ainda não sabemos determinar! Mas é importante não se desesperar, vamos resolver estes
problemas um de cada vez…
A questão do número infinito de pontos k é resolvida da seguinte maneira:
observando-se o determinante (5.51), é fácil intuir que as soluções para um dado k não
podem diferir muito das soluções para outros k's próximos a ele. É suficiente portanto
resolver a equação central apenas para uma amostragem discreta de pontos k na 1a ZB e,
a partir deles, se necessário, interpolar as soluções para os demais k's. Este procedimento
é conhecido como amostragem de pontos k.
O problema do número infinito de vetores G da rede recíproca também pode ser
resolvido de maneira simples. Ondas planas com G grande são funções rapidamente
oscilantes, com energia cinética alta. Porém, os estados eletrônicos de maior interesse são
aqueles de mais baixa energia, ou seja, os estados ocupados e os primeiros níveis
excitados. É razoável supor que as ondas planas que irão contribuir para a expansão de
Fourier destes estados são aquelas de mais baixa energia cinética, que oscilam mais
suavemente no espaço, ou seja, aquelas associadas a vetores G pequenos. Assim, sob o
ponto de vista prático, é sempre possível "truncar" a expansão (5.46), de modo que
 nk (r )  e ik r
 c(k  G) e
|G | Gmax
75
 iG  r
.
(5.52)
Deste modo, nossa tarefa se resume a resolver um determinante finito. Tipicamente, a
expansão da função de onda pode ser truncada com algumas centenas de vetores G por
átomo da célula unitária, e portanto o determinante correspondente pode ser resolvido
numericamente sem grandes dificuldades. Além disso, como veremos no final desta
Seção, o potencial cristalino UG também decresce rapidamente com o aumento de |G|.
Nos resta agora o problema de determinar o potencial U(r) através de suas
componentes de Fourier UG:
UG 
1
v cel
 dr U (r) e
 i G r
.
(5.53)
vcel
Podemos separar o potencial cristalino em diversas contribuições distintas. A
contribuição mais simples é devida aos núcleos positivos, que é dada por
U nuc (r)  
1
4 0

i
Zie2
,
r  Ri
(5.54)
onde o somatório é por todos os núcleos do cristal, cada qual com número atômico Zi e
posição Ri. Outro termo do potencial é devido à interação Coulombiana repulsiva entre
os elétrons, e pode ser aproximado como o potencial devido a uma distribuição contínua
de carga:
U H (r) 
1
4 0
 dr 
e 2 n(r )
.
r  r
(5.55)
Este termo, também conhecido como termo de Hartree, é um potencial de interação
eletrostática puramente clássico. Nele aparece a densidade eletrônica n(r), que pode ser
obtida a partir das funções de onda eletrônicas como
n(r )    j (r ) ,
2
(5.56)
j
onde o somatório é sobre todas as bandas ocupadas. Note portanto que UH é um potencial
auto-consistente, ou seja, depende das soluções da equação de Schrödinger, e como tal
deve ser obtido através de métodos iterativos.
Poderíamos pensar que o potencial Coulombiano devido aos núcleos e aos demais
elétrons seriam os únicos termos do potencial de um elétron. Porém, temos que lembrar
que estamos trabalhando dentro da aproximação de partícula independente. Nosso
ponto inicial, a equação de Schrödinger para uma partícula (5.43), já é uma aproximação.
De forma mais rigorosa, teríamos que resolver a equação de para uma função de onda de
muitos elétrons, o que é uma tarefa muito mais complicada. Isto dá origem aos efeitos
quânticos de troca e correlação. A interação de troca tem origem no princípio de
exclusão de Pauli, que impede que dois elétrons ocupem o mesmo estado quântico.
Assim, dois elétrons de mesmo spin sofrem uma repulsão efetiva e de curto alcance. A
76
inclusão dos efeitos de interação de troca leva à chamada aproximação de HartreeFock, bastante popular em cálculos de átomos e moléculas, mas cuja implementação não
é tão simples em sólidos cristalinos.
Além da interação de troca, há os efeitos de correlação. Mesmo elétrons de spin
oposto tendem a se "mover" de forma correlacionada, evitando as regiões próximas uns
dos outros, de forma a minimizar a repulsão Coulombiana.
No entanto, a boa notícia é que em muitos casos estes efeitos podem ser
mapeados em potenciais efetivos de uma partícula. A inclusão dos efeitos quânticos de
troca e correlação no potencial cristalino é ainda um problema em aberto em FMC.
Apesar de não haver no momento uma metodologia simples que leve a resultados
"exatos", muito tem sido feito nesta área nas últimas décadas, e excelentes aproximações
para o potencial efetivo de troca e correlação já existem.
Uma outra abordagem é a determinação empírica dos coeficientes de Fourier do
potencial cristalino, a partir de medidas experimentais da estrutura de bandas  n(k). Esta
abordagem é bastante útil em cálculos envolvendo sistemas complexos, como ligas,
defeitos, superfícies, interfaces, etc.
Vamos estudar em mais detalhe algumas propriedades do potencial cristalino:
(a) O coeficiente de Fourier para G = 0 é dado por
U0 
1
v cel
 dr U (r) ,
(5.57)
v cel
ou seja, é apenas o potencial médio do cristal. Como os resultados físicos não dependem
da escolha da origem de energias, é uma escolha conveniente e usual tomar U 0  0 , que
consiste simplesmente em subtrair-se U0 do potencial U(r).
(b) O potencial U(r) é real. Como consequência, U G  U G , como mostramos
abaixo (o somatório   agrupa os termos G e -G):
U (r )   U G e iG r  G (U G e iG r  U G e iG r ) .
'
(5.58)
G
(c) Se o cristal tem simetria de inversão, ou seja, se U (r)  U (r) , então
U (r)   U G e iGr   U G e iGr  U (r) 
G
G
 U G  U G
(5.59)
Juntamente com o resultado do item (b), isto implica que UG é real.
(d) As componentes de Fourier da contribuição dos núcleos para o potencial
cristalino, U Gnuc , decaem com 1/G2. Para mostrarmos este resultado, partimos da
expressão de Unuc(r) como uma soma de potenciais atômicos :

U nuc (r)   j (r  R   j ) ,
R
j
77
(5.60)

onde R são os vetores da rede de Bravais e  j são os vetores da base. Calculando as
componentes de Fourier, temos
UG 
1

vcel


1
vcel
 dr U (r) e
iG r

cel
 dr e
iG r
R
cel
1
vcel
e
1
vcel
e


iG  j
j
j

(r  R   j ) 
j
 dr e

iG ( r  j )

 j (r   j ) 
todo
espaço

iG  j
 j (G )
(5.61)
j
onde mais uma vez utilizamos o fato de que a soma sobre todas as células unitárias da
integral sobre uma célula é igual à integral sobre todo o espaço. Note a similaridade desta
expressão com o fator de estrutura, que encontramos no contexto da teoria de difração

 iG ( r  j )
 j (r   j ) como a
de raios-X (veja Eq. (4.24)). Definimos  j (G )   dr e
todo
espaço
transformada de Fourier do potencial do átomo j. Falta agora mostrar que  j (G ) decai
com 1/G2 se o potencial nuclear é Coulombiano, e isto será feito na próxima lista de
exercícios.
5.5 - Aproximação de elétron quase-livre
Como vimos na Seção anterior, a solução da equação de Schrödinger de um
elétron em um cristal é um problema bem formulado, porém sua implementação prática
não é trivial, principalmente devido às dificuldades em se calcular o potencial cristalino
de forma auto-consistente, a partir de primeiros princípios. Há, porém, métodos simples
que permitem a obtenção de soluções aproximadas da equação de Schrödinger e que são
bastante úteis em algumas situações. Iremos conhecer dois destes métodos nas próximas
Seções.
O primeiro tipo de aproximação que iremos descrever é a chamada aproximação
de elétron quase-livre. Esta aproximação será boa se o potencial cristalino for
suficientemente fraco de modo que possa ser considerado como uma perturbação.
Na verdade, é útil iniciar este estudo relembrando uma aproximação ainda mais
drástica que estudamos no início deste capítulo: a aproximação de elétron livre. Vamos
reformular a aproximação de elétron livre usando todo o formalismo desenvolvido nas
duas últimas seções para potenciais periódicos. Em outras palavras, iremos supor que
existe uma rede (e portanto uma rede recíproca), mas vamos considerar o limite extremo
78
em que o potencial cristalino é nulo6, ou seja, U G  0 para todo G. Assim, a equação
central torna-se simplesmente
  2 (k  G ) 2

   c(k  G )  0

2m


(5.62)
Notamos que neste caso a equação central é de fácil solução:    2 (k  G) 2 2m ou
c(k  G)  0 , ou seja, para cada banda apenas um termo da expansão (5.46) da função de
onda sobrevive, correspondendo a um específico vetor da rede recíproca G. As
autofunções (devidamente normalizadas) e autovalores são, portanto,
 nk (r) 
1
V
e i (k G n )r ;  n (k ) 
 2 (k  G n ) 2
.
2m
(5.63)
As bandas de energia  n (k ) para um exemplo unidimensional estão mostradas na Fig.
5.14: são parábolas centradas nos diferentes G's. Lembre-se porém que podemos
restringir o vetor de onda k àqueles contidos na 1a ZB. Portanto, as bandas de energia
"suficientes" são aquelas mostradas em negrito na figura7.
 (k)
-G2
-G1
0
1 ZB
a
G1
G2
k
Figura 5.14 - Estrutura de bandas na aproximação de rede vazia. As bandas são parábolas centradas nos
diferentes vetores da rede recíproca. A parte "não-redundante" da estrutura de bandas é aquela em negrito
contida dentro da 1a Zona de Brillouin (indicada pelas linhas tracejadas).
Também não podemos nos esquecer que, na aproximação de rede vazia, a
periodicidade é totalmente artificial. Portanto, nossos resultados devem ser inteiramente
6
Por este motivo, esta aproximação é também conhecida como aproximação de rede vazia.
A equação central (5.50) torna mais fácil entender porque podemos restringir k à 1a ZB. O conjunto de
equações para um dado k é exatamente idêntico a um suposto conjunto de equações para um dado k – G
fora da 1a ZB, já que há uma equação para cada um dos vetores G.
7
79
equivalentes aos que obtemos na aproximação de elétron livre, ou seja,    2 k 2 2m .
Isto corresponde à parábola centrada na origem. Podemos notar que os dois resultados
são equivalentes observando que as bandas na 1a ZB são pedaços de parábolas que
podemos imaginar terem sido "recortados" da parábola centrada em G = 0 e deslocados
para dentro da 1a ZB.
Experimentos em alguns metais (tipicamente metais alcalinos), mostram que em
muitas situações os elétrons se comportam de maneira semelhante a elétrons livres. Isto
parece indicar que, de alguma maneira, o potencial cristalino efetivo para os elétrons de
valência destes materiais é fraco. Isto ocorre por dois motivos básicos: (a) os elétrons de
valência não penetram na região muito próxima aos núcleos (onde o potencial é
necessariamente forte) devido à repulsão efetiva (Coulombiana + Princípio de Exclusão
de Pauli) exercida pelos elétrons de caroço e (b) mesmo na região intersticial (longe dos
núcleos), o potencial iônico é blindado pelos demais elétrons de valência. Estes fatos
fornecem uma indicação de que podemos, para estes sistemas, tratar o potencial cristalino
como uma perturbação. Esta é a aproximação de elétron quase-livre, que iremos
descrever a seguir.
Separamos a Hamiltoniana em duas partes, H  H 0  U , onde H0 é apenas o
termo de energia cinética e U é o potencial cristalino, que iremos tratar em teoria de
perturbação. Os autovalores e autovetores da Hamiltoniana não-perturbada são aqueles da
equação (5.63). Iremos denominar os kets correspondentes como k  G n . Os
autovalores da Hamiltoniana completa, até 2a ordem de perturbação, são
 n (k )  k G  k  G n U k  G n  
n
onde k G
k  Gn U k  G j
2
,
(5.64)
U (r ) e i (k G n )r  U 0  0 .
(5.65)
 k G   k G
j n
n
j
 2 (k  G ) 2

. O termo de 1a ordem é:
2m
k  Gn U k  Gn 
1
vcel
 dr e
i ( k G n )r
vcel
Já o elemento de matriz do termo de 2a ordem é não-nulo:
k  Gn U k  G j 
1
vcel
 dr U (r) e
 i ( G j  G n ) r
 U G j G n
(5.66)
v cel
Portanto, a expressão completa das energias de um elétron “quase-livre”, até 2a ordem de
perturbação, é
2
 n (k )  k G  
n
jn
80
U G j G n
k G  k G
n
.
j
(5.67)
Como se nota, o denominador no termo de 2a ordem faz com que, no caso de um
potencial fraco, a correção devida ao potencial seja mais importante para vetores de onda
k onde ocorra uma “quase-degenerescência” dos níveis de elétron livre: k G n  k G j .
Isso ocorre na vizinhança dos “planos de Bragg”8 assim chamados porque são exatamente
os vetores k com extremidade nestes planos que satisfazem a condição de difração de von
Laue que descrevemos na equação (4.15) e na Fig. 4.7. Veja um plano de Bragg na Fig.
5.15.
(k – G1) 2 = (k – G2)2
k – G1
k – G2
G1
G2
G2 – G1
Figura 5.15 – Representação de um plano de Bragg entre os vetores da rede recíproca G1 e G2. Note que
o plano define a mesma condição geométrica da condição de von Laue.
Apenas na vizinhança destes planos de Bragg os autovalores da energia serão
substancialmente perturbados com relação às parábolas que representam a situação de
elétron livre. Isto está esquematizado na Fig. 5.16. A quebra de simetria devido ao
potencial cristalino faz com que haja uma “repulsão” entre os níveis de elétron livre,
abrindo-se um gap de magnitude 2 U G 2 G1 (como demonstraremos a seguir), no plano de
Bragg. O potencial cristalino é portanto o responsável pela origem dos gaps de energia
nos sólidos cristalinos.
Iremos obter agora uma solução analítica para as bandas na vizinhança de um
plano de Bragg. Considere um do plano de Bragg definido por k  G 1  k  G 2 . Na
vizinhança deste plano, dentro da aproximação de elétron quase-livre, é razoável supor
que apenas os coeficientes c(k - G1) e c(k – G2) irão contribuir para a expansão das
funções de onda de Bloch:
 k (r)  c(k  G1 )e i (k G )r  c(k  G 2 )ei (k G
1
2 )r
.
(5.68)
A equação central torna-se então:
8
Não confundir com os planos cristalinos no espaço real que descrevemos no Capítulo 4. Os planos de
Bragg são planos no espaço recíproco.
81
(k G1   ) c(k  G 1 )  U G 2 G1 c(k  G 2 )  0
(5.69)
(k G 2   ) c(k  G 2 )  U G1 G 2 c(k  G 1 )  0
Basta agora resolver um determinante (2x2). Deixamos isto a cargo do leitor, que usando
ainda que U G1 G 2  U G 2 G1 , poderá obter as energias das bandas de elétron quase-livre:
1
1
 (k )  (k G  k G )   (k G  k G ) 2  U G
2
4
1
2
2
1
2
2 G1


1/ 2
.
(5.70)
Plano de Bragg

2 U G 2  G1
G1
G2
k
Figura 5.16 – Representação da estrutura de bandas na vizinhança de um plano de Bragg, indicado pela
linha tracejada. As linhas pontilhadas são as energias de elétron livre.
Está portanto demonstrado que o gap tem magnitude 2 U G 2 G1 . Pode-se também
mostrar (verifique!), derivando a expressão (5.70), que quando o ponto k está no plano de
Bragg, o gradiente da energia no espaço recíproco é

(G  G 1 ) 
2 
k 
k  2
,
m
2

(5.70)
que é um vetor contido no plano de Bragg, ou seja, as superfícies de energia constante
são perpendiculares ao plano de Bragg, como veremos na lista de exercícios.
82
5.6 – Zonas de Brillouin e Superfícies de Fermi
Figura 5.17 – Figura 9.4 do Ashcroft.
Há diversos esquemas de visualização da estrutura de bandas. Como é suficiente
considerar apenas os vetores k contidos na 1a Zona de Brillouin, o esquema de
visualização mais usual é aquele conhecido como esquema de zona reduzida. Faz-se
exatamente como fizemos para as bandas de elétron livre, ou seja, desloca-se todos os
83
pontos  (k) fora da 1a ZB para dentro da mesma. Assim, todas as bandas ficam contidas
na 1a ZB e a convenção k  1a ZB fica explícita (Fig. 5.17(f)).
Este porém não é o único esquema de visualização possível. Há também o
esquema de zona estendida (veja Fig. 5.17(e)), onde se abre mão da convenção
k  1a ZB para se obter uma comparação mais clara com a situação de elétrons livres
(apenas uma parábola centrada em k = 0).
Um terceiro esquema possível é o de zona repetida ou zona periódica,
esquematizado na Fig. 5.17(g). Esta descrição é obtida repetindo-se todos os níveis de
zona reduzida  n (k ) para fora da 1a ZB, fazendo-se  n (k)   n (k  G) . É uma descrição
redundante, mas enfatiza a periodicidade da estrutura de bandas, sendo muitas vezes útil
para interpretar propriedades dinâmicas dos elétrons, como veremos no próximo capítulo.
Definimos no Capítulo 4 a 1a Zona de Brillouin como a célula de Wigner-Seitz da
rede recíproca. A própria expressão “primeira ZB” sugere que existem outras.
Definiremos a seguir as demais Zonas de Brillouin de uma maneira formal.
- A 1a ZB é o conjunto de pontos no espaço k que podem ser atingidos a partir
da origem sem cruzar nenhum plano de Bragg.
- A 2a ZB é o conjunto de pontos no espaço k que podem ser atingidos a partir
da 1a ZB cruzando apenas 1 plano de Bragg.
- Generalizando, a (n+1)-ésima ZB é o conjunto de pontos no espaço k que
podem ser atingidos a partir da n-ésima ZB cruzando apenas 1 plano de
Bragg, e que não estejam na (n-1)-ésima ZB.
O espaço recíproco é portanto completamente retalhado em Zonas de Brillouin.
Veja na Fig. 5.18 o exemplo da rede quadrada (bidimensional). Note que apenas a 1a ZB
é conexa. Pode-se verificar também que todas as ZB’s têm o mesmo volume e são células
primitivas da rede recíproca.
3 2
3
3
3
2
2
1
3
3
2
3
3
Figura 5.18 – As 3 primeiras Zonas de Brillouin da rede quadrada. Os círculos representam pontos da
rede recíproca e as linhas são os planos de Bragg.
84
Um outro conceito importante, e que também será útil na discussão do próximo
Capítulo sobre dinâmica de elétrons em sólidos, é a superfície de Fermi. Definimos a
superfície de Fermi na Seção 5.1 como o subconjunto de pontos k tais que  (k )   F .
Vimos que, no caso de elétrons livres, a superfície de Fermi é a superfície de uma esfera,
a esfera de Fermi. Vamos analisar com um pouco mais de detalhe como isso muda na
presença do potencial cristalino.
Inicialmente, consideremos a aproximação de rede vazia. Para fixar idéias, vamos
tomar novamente o exemplo da rede quadrada bidimensional. Em 2D, a superfície de
Fermi é uma curva, a curva de Fermi. Se o potencial cristalino for nulo, a curva de Fermi
será uma circunferência, e se o número de elétrons for pequeno o suficiente, esta
circunferência não irá tocar nenhum plano de Bragg e estará contida na 1a Zona de
Brillouin, como mostra a Fig. 5.19. A figura mostra ainda as bandas de elétron livre nesta
situação, indicando os estados ocupados e os desocupados.
(a)
ky

(b)
M
X
Γ
kx
F
1a ZB
M
Γ
X
M
Figura 5.19 – (a) O círculo de Fermi na aproximação de rede vazia, para um número de elétrons pequeno
o suficiente para que a círculo esteja contido na 1 a ZB. A região cinza corresponde a estados eletrônicos
ocupados. (b) A estrutura de bandas correspondente, no esquema de banda estendida. A região em negrito
corresponde aos estados ocupados, com energia menor que F. Os pontos Γ: (0,0); X: (π/a,0) e M: (π/a,
π/a) indicam pontos de alta simetria da 1a ZB.
A situação mostrada na figura acima é na verdade bastante similar ao que ocorre
nos metais alcalinos. Os metais alcalinos têm 1 elétron por célula unitária e portanto a 1a
ZB está preenchida exatamente pela metade (cabem 2  N cel elétrons na 1a ZB). Como a
aproximação de elétron quase-livre é válida para estes materiais, a superfície de Fermi
(que fica distante dos planos de Bragg) é praticamente esférica.
Consideremos agora o que ocorre se tivermos mais elétrons no sistema, de modo
que o círculo de Fermi cruze a 1a ZB. Esta situação está esquematizada na Fig. 5.20. As
Figs. 5.20 (a) e (b) correspondem ao esquema de zona estendida, enquanto que as (c) e
(d) correspondem ao esquema de zona reduzida. Note que, neste esquema, as porções do
círculo de Fermi que estariam fora da 1a ZB são trazidas para dentro da mesma através de
translações por vetores da rede recíproca.
85
ky
(a)
Γ

(b)
M
F
kx
1a ZB
ky
(c)
M
M
X
Γ
kx
1a banda
Γ
X
M

(d)
1a ZB
F
ky
M
Γ
2a banda
X
kx
M
Γ
X
M
1a ZB
Figura 5.20 – (a) O círculo de Fermi na aproximação de rede vazia, no esquema de zona estendida, para
um número de elétrons grande o suficiente para que a círculo não esteja contido na 1a ZB. (b) A estrutura
de bandas correspondente. (c) O mesmo que (a), no esquema de zona reduzida. Note que agora há duas
bandas a serem consideradas. (d) A estrutura de bandas correspondente.
Consideremos agora o efeito do potencial cristalino. Assumindo que a
aproximação de elétron quase-livre seja válida, é razoável supor que a superfície de
Fermi só irá se desviar de uma esfera na vizinhança dos planos de Bragg. Podemos
entender qualitativamente a forma deste desvio lembrando o resultado da equação (5.70),
que implica em que as superfícies de energia constante são perpendiculares aos planos de
Bragg. Assim, a superfície de Fermi (que é uma superfície de energia constante) deve se
deformar de modo a satisfazer esta condição. A Fig. 5.21 mostra um esquema qualitativo
desta deformação no caso de uma rede quadrada bidimensional. Iremos investigar este
efeito mais detalhadamente na lista de exercícios.
86
1a ZB
Figura 5.21 – Efeito da deformação induzida pelo potencial cristalino no círculo de Fermi de uma rede
quadrada. Note que a superfície de Fermi (em negrito) fica perpendicular aos planos de Bragg.
5.7 - O método tight-binding
Na penúltima Seção, estudamos um método para obter soluções aproximadas da
equação central quando o potencial cristalino é fraco e pode ser considerado uma
perturbação, a aproximação de elétron quase-livre. Na ocasião, utilizamos ondas planas
como funções de base para expandir a função de onda de Bloch e vimos que eram
necessárias poucas ondas planas para descrever toda a estrutura de bandas, tipicamente 1
onda plana nas regiões interiores da 1a ZB e 2 ondas planas nas vizinhanças de um plano
de Bragg.
No entanto, há muitas situações em que o potencial cristalino não é
suficientemente fraco para que possa ser considerado uma perturbação. Isto ocorre na
maioria dos sistemas não-metálicos e mesmo para os elétrons mais localizados de alguns
sistemas metálicos (por exemplo, os elétrons d dos metais de transição). Neste caso,
apesar da expansão (5.46) em ondas planas ser em princípio exata e formalmente correta,
não será conveniente, pois serão necessárias muitas ondas planas para descrever estados
eletrônicos que são localizados espacialmente.
Quando isto ocorre, é mais conveniente utilizar uma base de orbitais atômicos
para descrever nosso estado de Bloch. Os orbitais atômicos são soluções da equação de
Schrödinger no limite em que temos átomos isolados. Assim, imagina-se que eles possam
fornecer uma boa descrição para estados eletrônicos que estão tão fortemente ligados aos
seus átomos de origem que o potencial dos demais íons pode ser considerado uma
perturbação. O método que iremos descrever a seguir é, portanto, uma boa aproximação
para estes elétrons fortemente ligados, e por este motivo é conhecido como método tightbinding (TB).
87
Por simplicidade, vamos considerar o caso de um cristal monoatômico (apenas 1
átomo na base) com apenas 1 orbital s por átomo, como se tivéssemos um cristal de
átomos de hidrogênio. O método pode ser facilmente generalizado para sistemas mais
complicados. Escrevemos nossa função de Bloch como uma combinação linear de
orbitais atômicos (LCAO),
 k (r )   c k (R ) (r  R ) .
(5.71)
R
Omitimos por simplicidade o índice de banda, mas está implícito que há uma combinação
linear distinta para cada banda. O somatório é sobre todos os átomos, localizados nos
pontos da rede R, e  (r  R) é um orbital atômico também centrado no sítio R. Se
lembrarmos nossa discussão sobre a molécula de H 2 , notaremos que a equação (5.71) é
apenas uma generalização daquela expansão para um sistema com N átomos. Na ocasião,
tínhamos apenas 2 átomos, e os auto-estados resultantes eram combinações lineares
ligante e anti-ligante. Portanto, devemos esperar aqui que os N níveis atômicos,
degenerados quando os átomos estão infinitamente afastados, abram-se em N estados que
irão formar uma banda de largura W, como mostra a Fig. 5.22. Sabemos também, a partir
da nossa análise geral sobre potenciais periódicos, que cada um destes níveis deve estar
associado a um vetor de onda k da 1a ZB, já que haverá N vetores k permitidos dentro da
1a ZB. Espera-se que, quanto menor a distância entre os átomos, maior será a
superposição (overlap) entre as funções de onda e portanto maior será a largura da banda
resultante. Mostraremos este resultado ao final desta Seção.
N estados em
uma banda de
largura W
N estados degenerados
Distância interatômica
Figura 5.22 - Os N estados degenerados de N átomos isolados "abrem-se" em uma banda de largura W.
A função de onda (5.71) deve satisfazer ao Teorema de Bloch. Mostraremos que
esta condição estará automaticamente satisfeita se
1
c k (R ) 
e ik  R .
(5.72)
N
O Teorema de Bloch nos diz que  k (r  R)  e ikR k (r) . Calculando  k (r  R ) com a
expressão (5.71) e utilizando ck (R) definido em (5.72), temos
88
 k (r  R ) 
1
e
N
ik R
 (r  R   R ) 
R
e
ik  R 
1
N
e
ik ( R  R  )
,
 (r  (R  R ))  e
(5.73)
ik R 
 k (r )
R
como queríamos demonstrar.
Utilizando a função de onda (5.71), iremos calcular agora  (k) :
 (k ) 
k H k
.
k k
(5.74)
O numerador desta expressão é dado por
k H k 
1
N
e
ik ( R   R )
R ,R
 R H  R ,
(5.75)
onde adotamos a notação r  R   r  R  Usamos agora um argumento de simetria de
translação: o elemento de matriz  R H  R deve depender apenas de R' - R, de modo
que podemos simplificar o somatório duplo considerando R'=0:
 k H  k   e  ik  R  R H  0
(5.76)
R
Se o overlap entre os orbitais atômicos é pequeno, podemos fazer a chamada
aproximação de primeiros vizinhos, que consiste em supor que a integral  R H  0 é
não-nula apenas se R  0 ou se R  R 1  , onde R 1  é o conjunto de vetores da rede
que unem a origem aos sítios mais próximos (1os vizinhos). Temos que lidar com apenas
dois elementos de matriz, exatamente análogos àqueles que consideramos no caso da
molécula de H 2 :  0 H  0   (energia de sítio) e  R1 H 0    (energia de
hopping). Assim, a expressão para o numerador torna-se extremamente simples:
 k H  k     
 e
 ik R
.
R R1
(5.76)
O cálculo do denominador da expressão (5.74) é realizado de maneira análoga:
k k 
1
N
e
R ,R
ik ( R   R )
 R  R    e  ik  R  R  0 .
R
89
(5.77)
Mais uma vez, toma-se a aproximação de primeiros vizinhos e, usando que  0  0  1
(normalização) e  R 1  0  S (overlap), temos
 k  k  1 S
 e
 ik  R
.
(5.78)
R R1
Assim, a relação de dispersão  (k) para a banda tight-binding torna-se
  
 (k ) 
 e
 ik  R
R R1
1 S
 e ikR
.
(5.79)
RR1 
Podemos simplificar ainda mais esta expressão invocando uma vez mais a condição de
overlap pequeno, de modo que S 1 . Assim,

 (k )       

 e
ik R
R R1


1  S  e ik R       e ik R ,


RR1 
RR1 


(5.80)
onde      S . Vamos aplicar a expressão (5.80) a um exemplo simples, a rede
quadrada. Para a rede quadrada, há 4 primeiros vizinhos, R 1    axˆ ou  ayˆ . Supondo
conhecidas as integrais  e  , temos

 (k )     e ik a  e ik a  e
x
x
ik y a
e
ik y a
    2 (cos k a  cos k a) .
x
y
(5.81)
A Fig. 5.23 mostra a banda  (k) ao longo de duas direções diferentes da 1a ZB. Note que
a largura de banda é proporcional à energia de overlap, como argumentamos
qualitativamente no início desta seção.
ky


- + 4 
M
-
X kx
- - 4 
M

X
Figura 5.23 - Banda tight-binding para uma rede quadrada, entre os pontos = (0,0), X = (/a,0) e M =
(/a,/a) da 1a ZB. Note que a largura de banda total é W = 8.
90
Note que, apesar da função de onda TB ser escrita como uma combinação linear
de orbitais localizados, um elétron descrito por esta função de onda tem igual
probabilidade de ser encontrado em qualquer sítio da rede, sendo portanto um elétron de
Bloch, genuinamente deslocalizado. Lembrando a expressão para a velocidade média de
um elétron de Bloch, Eq. (5.44), percebemos que, quanto maior for a largura de banda W,
maior será a velocidade de um elétron no meio dela: bandas largas terão elétrons mais
velozes (mais deslocalizados), enquanto que bandas estreitas terão elétrons mais lentos
(menos deslocalizados). Como verificamos que a largura de banda é proporcional à
superposição dos orbitais atômicos, este resultado fornece uma visão bastante intuitiva
para o movimento eletrônico: podemos imaginar que o elétron tunela de um sítio da rede
para o vizinho, e quanto maior a superposição dos orbitais atômicos (ou seja, quanto
maior for  ), maior será a taxa de tunelamento, e portanto a velocidade.
5.8 - Análise das aproximações
Descrevemos neste Capítulo as propriedades dos estados eletrônicos em um
cristal. Exceto na seção anterior, utilizamos a aproximação de elétron livre ou quaselivre, que consiste em considerar o potencial cristalino como sendo fraco, e
argumentamos que ela seria uma boa descrição para alguns metais. Durante todo o
capítulo, utilizamos ainda uma outra aproximação, a aproximação de partícula
independente, que consiste em ignorar a interação elétron-elétron, ou pelo menos tratá-la
como um potencial efetivo oriundo de uma distribuição média da carga eletrônica,
ponderada pelas funções de onda, como por exemplo na aproximação de Hartree, descrita
na Seção 5.4. Existem outros efeitos da interação elétron-elétron, como troca e
correlação. Apesar disso, a aproximação de partícula independente funciona
extremamente bem para a maioria dos sistemas. Nesta Seção, tentaremos justificar e
analisar estas duas aproximações básicas.
a) Aproximação de elétron quase-livre.
À primeira vista, o potencial atuante nos elétrons de valência devido aos núcleos
não poderia ser considerado fraco. É na verdade divergente, devido ao comportamento
U nuc  Z / r na origem. Porém, diversos fatores fazem com que o potencial efetivo
sentido por um elétron de valência possa ser considerado fraco. O primeiro deles é a
blindagem dos elétrons de caroço. Para sistemas contendo Zval elétrons de valência, os
(Z-Zval) elétrons de caroço, localizados bem próximos do núcleo, fazem com que o
potencial efetivo a longas distâncias se comporte não como -Z/r, mas como -Zval/r, o que
representa uma redução importante em muitos casos.
Ainda assim, o potencial parece divergir na origem. Entra em cena então a
ortogonalidade entre os estados de valência e de caroço, que faz com que as funções de
onda de valência sejam rapidamente oscilantes e na região do caroço. Assim, os elétrons
de valência são excluídos daquela região. Esta exclusão pode ser mapeada em um
potencial efetivo repulsivo, que não diverge na origem mas se comporta de maneira
91
suave, como mostrado na Fig. 5.24. A este potencial efetivo dá-se o nome de
pseudopotencial.
U
rc
r
Pseudopotencial
~1/r
Figura 5.24 - O efeito de ortogonalidade que repele os elétrons da região do caroço pode ser mapeado em
um potencial efetivo repulsivo. A soma deste potencial com o potencial atrativo dos núcleos é conhecida
como pseudopotencial. O caroço é a região r < rc.
Além dos efeitos de blindagem dos elétrons de caroço e da repulsão efetiva de
ortogonalidade, há também uma blindagem dos demais elétrons de valência. Se olharmos
a distribuição de carga eletrônica em um metal alcalino, veremos que os elétrons, apesar
de ocuparem toda a região intersticial, se "acumulam" com probabilidade maior na região
próxima aos núcleos. Isto ocorre porque o pseudopotencial, apesar de fraco, é atrativo.
Este efeito de blindagem dos elétrons de valência, está mostrado esquematicamente na
Fig. 5.25, e contribui ainda mais para enfraquecer o potencial na região intersticial.
Associado à esta distribuição ao redor do núcleo está um comprimento de blindagem
(screening length), s. O potencial Coulombiano blindado deixa de ter o longo alcance
q r
1/r, decaindo exponencialmente da forma U  e  s . Tipicamente, o comprimento de
r
blindagem dos metais é bastante é bastante curto, da ordem de 1Å. O gás de elétrons
exerce portanto uma blindagem bastante efetiva das cargas positivas nucleares, e faz com
que o potencial na região intersticial seja praticamente nulo, como no caso de elétrons
livres.
b) Aproximação de partícula independente.
Em um metal típico, a densidade eletrônica é tal que os elétrons estão em média
separados por uma distância da ordem de 2Å. Apesar disso, pode-se mostrar
experimentalmente que, em cristais de alta pureza e a temperaturas baixas (tipicamente 1
K), um elétron percorre em média 10 cm sem “colidir” com outro elétron, como se não
interagissem e se comportassem como partículas independentes! Na verdade, a interação
elétron-elétron é forte, como não poderia deixar de ser a interação entre duas partículas
92
carregadas distantes apenas 2Å uma da outra. Porém, os elétrons parecem se mover de
maneira extremamente organizada9 de modo que não colidem uns com os outros.
+
+
+
+
+
+
+
+
+
s
Figura 5.25 – Distribuição esquemática dos elétrons de valência em um metal alcalino. A região branca
ao redor dos núcleos indica a zona de exclusão do caroço, enquanto que a região mais escura representa a
maior concentração eletrônica ao redor dos núcleos que dá origem à blindagem eletrostática.
Um dos motivos para que isto ocorra é (mais uma vez...) o Princípio de Exclusão
de Pauli. Quando falamos de colisão, em Mecânica Quântica, estamos nos referindo a
um processo de espalhamento como o mostrado na Fig. 5.26, onde dois elétrons
inicialmente com vetores de onda k1 e k2 interagem e são espalhados com vetores de
onda finais k3 e k4.
k3
k4
k1
k2
Figura 5.26 – Processo de espalhamento entre dois elétrons.
A conservação do momento cristalino implica que k 1  k 2  k 3  k 4 , e a
conservação da energia nos diz que  (k 1 )   (k 2 )   (k 3 )   (k 4 ) . A T = 0K, k1 e k2
devem estar dentro da esfera de Fermi e portanto, pela conservação da energia, os estados
9
Como soldados marchando em um pelotão.
93
finais k3 e k4 também devem estar dentro da esfera de Fermi. No entanto, estes estados,
assim como todos os outros dentro da esfera de Fermi já estão ocupados, e o Princípio de
Exclusão impede que eles sejam ocupados ainda mais. Isto torna o processo de colisão
impossível, e chegamos então ao resultado surpreendente: não há colisões eletrônicas a
T=0K! Para temperaturas baixas, pode-se mostrar que a seção de choque de espalhamento
2
k T 
entre dois elétron em um gás de Fermi é    B   0 , onde  0 é a seção de choque
 F 
para dois elétrons livres.
Um outro fenômeno que contribui para enfraquecer a interação elétron-elétron é a
blindagem. De forma semelhante à blindagem dos íons positivos, há também uma
blindagem eletrônica de forma que cada elétron carrega consigo uma nuvem de “ausência
de elétrons”, ou seja, uma carga efetiva positiva que blinda a interação Coulombiana
entre os elétrons.
Referências:
- Gás de elétrons livres: Ashcroft (Cap. 2) e Kittel (Cap. 6).
- Elétrons em potencial cristalino: Ashcroft (Cap. 8) e Kittel (Cap. 7).
- Aproximação de elétron quase-livre: Ashcroft (Cap. 9) e Kittel (Cap. 7).
- Método tight-binding: Ashcroft (Cap. 10) e Kittel (Cap. 9).
- Pseudopotencial: Ashcroft (Cap. 11) e Kittel (Cap. 9).
- Blindagem e interação elétron-elétron: Ashcroft (Cap. 32) e Kittel (Cap. 10)
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5. Elétrons em Sólidos - Instituto de Física / UFRJ