MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO SECRETARIA DE EDUCAÇÃO POFISSIONAL E TECNOLÓGICA CENTRO FEDERAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA DE BENTO GONÇALVES CURSO SUPERIOR DE TECNOLOGIA EM VITICULTURA E ENOLOGIA AVALIAÇÃO DA UTILIZAÇÃO DO PROCESSO DE PASSIFICAÇÃO PARCIAL PARA AUMENTAR A QUANTIDADE DE AÇÚCARES EM UVAS DA VARIEDADE CABERNET SAUVIGNON LEONARDO VALDUGA Bento Gonçalves, maio de 2005. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO SECRETARIA DE EDUCAÇÃO PROFISSINAL E TECNOLÓGICA CENTRO FEDERAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA DE BENTO GONÇALVES CURSO SUPERIOR DE TECNOLOGIA EM VITICULTURA E ENOLOGIA AVALIAÇÃO DA UTILIZAÇÃO DO PROCESSO DE PASSIFICAÇÃO PARCIAL PARA AUMENTAR A QUANTIDADE DE AÇÚCARES EM UVAS DA VARIEDADE CABERNET SAUVIGNON LEONARDO VALDUGA Trabalho apresentado para a obtenção do título de Tecnólogo em Viticultura e Enologia Supervisor(a): Prof.: Júlio Menegusso Bento Gonçalves, maio de 2005. SUMÁRIO 1 AGRADECIMENTOS ........................................................................................... 4 2 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 5 3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA .............................................................................. 7 3.1 CICLO DE DESENVOLVIMENTO DA VIDEIRA ........................................ 7 3.2 MATURAÇÃO DA UVA............................................................................... 11 3.3 FASES DE DESENVOLVIMENTO DAS UVAS ......................................... 11 3.3.1 PERÍODO HERBÁCEO......................................................................... 11 3.3.2 PERÍODO DE MATURAÇÃO .............................................................. 13 3.3.3 PERIODO DE SOBREMATURAÇAO ................................................. 14 3.4 EVOLUÇÃO AO CURSO DA MATURAÇÃO DOS CONSTITUINTES DOS RÁCEMOS ................................................................................................................. 16 3.4.1 ÁCIDOS ORGÂNICOS ......................................................................... 16 3.4.2 AÇÚCARES ........................................................................................... 18 3.5 MATURAÇÃO FISIOLÓGICA ..................................................................... 21 3.6 MATURAÇÃO INDUSTRIAL ...................................................................... 21 3.7 MATURAÇÃO FENÓLICA .......................................................................... 22 3.8 SOBREMATURAÇÃO E PASSIFICAÇÃO DAS UVAS ............................. 22 3.8.1 SOBREMATURAÇÃO EM AMBIENTE NATURAL ......................... 24 3.8.2 SOBREMATURAÇÃO EM AMBIENTE ARTIFICIAL ...................... 26 4 MATERIAL E MÉTODOS ................................................................................. 28 4.1 4.2 4.3 4.4 4.5 4.6 5 VIDEIRAS ...................................................................................................... 28 SELEÇÃO DAS VIDEIRAS .......................................................................... 28 MONTAGEM DO EXPERIMENTO ............................................................. 28 AMOSTRAGEM ............................................................................................ 30 ANÁLISES LABORATORIAIS .................................................................... 30 TESTEMUNHA ............................................................................................. 31 RESULTADOS E DISCUSSÃO .......................................................................... 32 5.1 5.2 5.3 5.4 ACIDEZ TOTAL ............................................................................................ 32 PH .................................................................................................................... 34 AÇÚCARES ................................................................................................... 34 PESO DOS CACHOS ..................................................................................... 38 6 CONCLUSÃO ....................................................................................................... 39 7 BIBLIOGRAFIA .................................................................................................. 43 ÍNDICE DE FIGURAS Figura 1: Evolução do tamanho das bagas durante o período de maturação no desenvolvimento das bagas. .................................................................................... 12 Figura 2: Resultados obtidos na análise de açúcar, em °Brix. ........................................ 33 Figura 3: Resultados obtidos na análise de açucares redutores. ..................................... 37 Figura 4: Resultados obtidos nas análises de pH dos três tratamentos. .......................... 37 Figura 5: Resultados obtidos na pesagem das amostras dos tratamentos antes de serem realizadas as análises. ............................................................................................. 38 Figura 6: Uvas antes de se iniciar o processo de passificação. Vinhedo da Vinícola Marco Luigi, Vale dos Vinhedos, Bento Gonçalves-RS. ....................................... 40 Figura 7: Aspecto das uvas após o processo de passificação em ambiente externo (DMD). ................................................................................................................... 41 Figura 8: Aspecto geral das uvas colocadas em ambiente protegido sobre as caixas plásticas. .................................................................................................................. 42 Figura 9: Aspecto das uvas no tratamento em ambiente protegido e com as grades. ..... 42 ÍNDICE DE TABELAS Tabela 1: Balanço do conteúdo de açúcares no envero da planta, dado em % de açúcar contido na polpa. ..................................................................................................... 20 Tabela 2: Evolução da glicose e da frutose durante a maturação das uvas da cepa Cabernet Sauvignon, Graves-França, 1937 ............................................................ 23 Tabela 3: Análise da presença de podridão nos cachos. ................................................. 31 Tabela 4: Resultados das análises físico-químicas dos tratamentos (média das três repetições em cada tratamento)............................................................................... 36 3 1 AGRADECIMENTOS Agradeço de maneira zelosa a todos que de alguma forma ajudar na realização deste trabalho científico que exerce muita importância para o bom enriquecimento do setor vitivinícola da Serra Gaúcha. Gostaria de agradecer a todos os professores do Curso Superior do CEFET-BG pela disponibilidade e incentivo para a realização desta pesquisa que visa melhorar ainda mais a elaboração de vinhos de qualidade no Brasil. 4 2 INTRODUÇÃO A produção brasileira de uvas sofreu um forte incremento durante o fim da década de 90. Isto se deve, principalmente, ao aumento da demanda de produtos oriundos da uva. Além disso, houve um incremento na melhoria das condições de cultivo e na disponibilidade de programas de fomento. No âmbito da Serra Gaúcha, o grande problema encontrado é o baixo índice de maturação das uvas ocasionando uma concentração insuficiente de açúares para se obterem vinhos de qualidade superior. Desta forma, cada vez mais empresas privadas e entidades governamentais buscam alternativas para minimizar a incidência deste problema no cultivo de videiras da espécie Vitis vinifera. Para tal ,novos métodos de cultivo e diferentes técnicas póscolheita, aumentando assim o grau glucométrico de várias variedades de uva plantadas na região , vem sendo empregados. Um exemplo diso é o processo parcial de passificação das uvas. É um método ainda sem muitas pesquisas científicas , porém apresenta resultados satisfatórios. Esta técnica consiste na “secagem” das uvas à sombra até que se obtenha uma relação suficiente entre a quantidade de açúcar e a acidez total. Entretanto, os cachos das uvas devem apresentar um baixo índice de deterioração (ataque fúngico, principalmente o fungo Botrytis cinerea). Este método já é muito utilizado na Itália para se obterem vinhos diferenciados por sua qualidade organoléptica superior. O grau de maturação das uvas é importante, pois define a qualidade das mesmas. Com a maturação, há o aumento da concentração de açúcares e o decréscimo na acidez (ácidos orgânicos, principalmente o ácido tartárico e málico), originando as condições ótimas para a vinificação das uvas. O ponto ideal de maturação das uvas é estimado pela relação entre acidez e açúcar, seja por testes físico-químicos ou apenas 5 utilizando o paladar. Além disso, substâncias precursoras de aroma são formadas durante o período de maturação, originando as características varietais dos vinhos. O processo de passificação das uvas é uma alternativa para aumentar a quantidade de açúcares da baga. O método produz uma desidratação nas bagas e posterior concentração de todas as substâncias no interior das mesmas. É realizado após a colheita das uvas e pode ser feito à sombra , em locais próprios, para que não haja o desenvolvimento de fungos, tais como Botrytis cinerea. É um método prático e que apresenta bons resultados, porém promove uma diminuição no rendimento em mosto, devido à desidratação que ocorre no interior das bagas. A passificação pode ser desenvolvida de varias formas, ou seja, as uvas podem ser penduradas individualmente em bancadas construídas especialmente para este processo, ou ainda, serem colocadas em prateleiras para que ocorra a passificação das mesmas. Em países de clima desértico, as uvas são colocadas diretamente no solo, somente protegidas por folhas ou ramas de plantas. A uva Cabernet Sauvignon é, dentre as variedades de uva pertencentes à espécie Vitis vinifera, uma das castas mais nobres e mais difundidas para a elaboração de vinho tinto. É uma cepa originária da França e foi expandida por todo o mundo, principalmente em países de vitivinicultura recente, tais como Chile, Argentina, Brasil, Austrália e etc. É considerada uma variedade de maturação tardia (Giovaninni, 1999). No Brasil, a Cabernet Sauvignon é uma das principais cultivares utilizadas para a elaboração de vinho tinto fino, principalmente para ser consumido após um curto período de envelhecimento em barricas de carvalho, ou com a utilização de chips de carvalho (Garavaglia, 2003). O presente trabalho teve por objetivo desenvolver um método prático para a obtenção de uma maior concentração de açúcares de uvas Cabernet Sauvignon, utilizando a passificação parcial das mesmas, comparando-se técnicas desenvolvidas a campo e em ambiente protegido. Além disso, foi proposto um local adequado para a otimização do processo, bem como parâmetros correlatos envolvidos nesta técnica. 6 3 3.1 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA CICLO DE DESENVOLVIMENTO DA VIDEIRA A videira pode ser definida como uma planta lenhosa perene, sendo assim, seu desenvolvimento se dá através de um ciclo vegetativo anual (Hidalgo, 1999). Desta forma, pode-se dividir este ciclo anual em: Ciclo Vegetativo e Ciclo Reprodutivo. Segundo Galet (1993), no ciclo vegetativo é que a videira forma os ramos herbáceos e as folhas necessários para o desenvolvimento das bagas e dos outros órgãos da planta. Já o ciclo reprodutivo compreende a formação e o desenvolvimento das inflorescências, sua fecundação e o crescimento e elongação de bagas e cachos. O principal evento deste ciclo, do ponto de vista mercadológico, é a formação e crescimento em volume das uvas. O ciclo reprodutivo se estende até a colheita das uvas. O ciclo vegetativo inicia-se com o período de poda seca, onde ocorre o “choro” da videira e posterior crescimento dos ramos e folhas. Este ciclo termina com a queda das folhas, que marcam o fim da sua vida ativa (Galet, 1993). Após a queda das folhas, a videira entre no período de repouso invernal iniciado pelas baixas temperaturas do inverno. De maneira prática, pode-se dizer que o período vegetativo inicia com o aumento das temperaturas na primavera e acaba com o decréscimo da temperatura com o início do inverno. A primeira manifestação da atividade da planta depois do repouso invernal é o “choro”. Segundo Hidalgo (1999), o “choro” é constituído da seiva que flui pelas fendas e cortes de poda e é realizado por uma ativação da respiração celular da planta, uma recuperação da absorção de água e elementos minerais do solo pelo sistema 7 radicular da videira. O “choro” representa o início do desenvolvimento vegetativo da videira nas estações quentes do ano, ou seja, na primavera e verão. Com o início da primavera, a temperatura sobe lentamente e o solo adquire temperaturas que passam os 10 °C. A absorção dos nutrientes ocorre com o aumento da temperatura, as células das gemas se incham. Com um aumento maior da temperatura, as gemas iniciam o período de Brotação. Com isso, as gemas vão se desenvolvendo e dão origem aos sarmentos, folhas e rácemos. Depois deste período de brotação, surgem as flores unidas em densas inflorescências, é o período da Floração. A brotação se inicia com o aumento da atividade radicular que estimula o desenvolvimento de todos os órgãos da planta através da absorção de micronutrientes do solo. Segundo Hidalgo (1999) a brotação é induzida pelo aporte de substâncias nutritivas para o sistema de condução da planta. O mecanismo da brotação se inicia nas gemas, estas últimas, crescem e se incham, quebrando a capa que as protege e iniciam o desenvolvimento vegetativo da planta. As gemas é que originaram os ramos, folhas, gavinhas e as inflorescências que originarão os cachos. Devido às diferentes posições das gemas no sarmento, nem todas gemas crescem igualmente na planta. Isto ocorre pois os nutrientes não estão distribuídos de maneira linear na videira. Esta diferenciação na nutrição das gemas faz com que nem todas as inflorescências se desenvolvam ao mesmo tempo, ocasionando um escalonamento na produção. A partir do broto, a videira desenvolve seus órgãos vitais que se encontram no interior das gemas, estas é que formarão todos as partes vegetativas da planta. Por isso é que existem gemas que são diferenciadas umas das outras,ou seja, nem todas as gemas do sarmento originam as mesmas partes da videira. Como por exemplo, existem gemas que somente produzem ramos vegetativos, sem formação de frutos e outras gemas, ditas reprodutivas irão produzir um sarmento que possuirá inflorescências e cachos desenvolvidos. O crescimento de uns ou outros ramos se verifica em longitude e grossura (Hidalgo, 1999). Os ramos continuam a crescer de maneira incessante até que em algum momento seu crescimento cessa. Isto pode ocorrer principalmente por mudanças climáticas, tais como as secas de verão e suas altas temperaturas e insolação. Estes fatores podem interferir ainda na diferenciação dos sarmentos em folhas, gemas e cachos (Galet, 1993). 8 As folhas começam a se desenvolver com o aumento longitudinal dos ramos. Segundo Galet (1993), as folhas são dispostas nos sarmentos em duas hélices foliares sobre duas direções opostas, distantes umas das outras formando um segmento folhar, os nós são as partes onde as folhas se soldam ao sarmento. A função das folhas está ligada com a fotossíntese e a síntese de açúcares para nutrir a planta. As folhas possuem uma forma laminar, de coloração verde devido à presença de clorofila, podem possuir diferentes tonalidades. Possuem formato característico e diferenciado, dependendo da variedade de uva. A folha é muito utilizada para distinguir uma variedade de uva da outra, porém todas as partes da planta devem ser analisadas separadamente. Isto é o objeto de estudo da Ampelografia. As folhas possuem cinco lóbulos separados por reentrâncias chamadas de seios. Elas se formam no ápice das gemas. Assim como todas as demais folhas, são formadas por nervuras, que se estendem desde o pedúnculo das folhas, por todos os lóbulos; por pedúnculo, que é a parte por onde elas se fixam no pecíolo; e pelo pecíolo as folhas se ligam aos sarmentos. A formação da inflorescência se realiza em gemas latentes do ano em que houve sua formação, após a terminação do estado vegetativo e início do ciclo reprodutor da videira. Logo após a formação das inflorescências é que inicia o período de floração. A floração somente se inicia com o término da primavera e início do verão, pois é neste período que há o aumento da temperatura média dos dias (Hidalgo, 1999). A iniciação floral demanda luz, calor e vigor das cepas (Blouim e Guimberteau, 2000). As gemas das bases dos sarmentos são mais férteis e produzem mais frutos que as gemas mais distantes ao longo do ramo. A floração é responsável pela formação do grão de pólen, que é liberado e permite a fecundação dos ovários das florais e seu desenvolvimento. Com o avanço do verão, se dá a polinização das flores, onde o vento se encarrega de leva o grão de pólen dos estames até o pistilo da flor. Começam então a formar-se os grãos da uva, pelo crescimento do pistilo floral, favorecido pelas altas temperaturas e por chuvas pouco abundantes. Segundo Galet (1993) a floração é influenciada pela luz, temperatura (pode variar de 15°C a 35°C), o vigor da videira, a posição da gema no sarmento, a fertilidade das cepas de uva, o porta-enxerto utilizado e o número de flores por 9 inflorescência. A fertilidade, que é dada pelo número de flores por gema, varia muito com as cepas e a posição da gema no sarmento (Blouim e Guimberteau, 2000). A fecundação da videira é anemófila (feita pelo vento), ocorrendo de uma flor para outra (Hidalgo, 1999). Desta forma, pode-se dizer que as flores são hermafroditas, pois possuem o órgão feminino (gineceu-pistilo) e o órgão masculino (androceu-estames). Após a fecundação, o tegumento do óvulo se desenvolve para formar a semente (Galet, 1993). A partir deste momento, o ovário inicia o seu desenvolvimento, iniciando o fenômeno chamado de maturação (Blouim e Guimberteau, 2000). Cada flor que compõe a inflorescência irá originar uma baga pelo desenvolvimento de seu ovário fecundado. As bagas iniciam um período de crescimento e aumento de seu volume. Este fenômeno é conseqüência da ação estimulante dos hormônios da polinização, fecundação e formação das sementes, assim como o aporte de substâncias nutrientes pela planta (Hidalgo, 1993). A partir desta fase a baga inicia seu desenvolvimento e seu crescimento em volume. Os hormônios vegetais possuem papel importante neste período do ciclo reprodutivo da videira: AUXINAS: classe de hormônios comum em muitos vegetais, estimulam a divisão celular na baga e a elongação da mesma; GIBERELINAS: estão presentes em tecidos que apresentam alta taxa de divisão celular, favorecem a elongação dos tecidos também; CITOCININAS: associadas com as auxinas favorecem a divisão celular. O crescimento das bagas depende do suprimento de água da videira (Galet, 1993). Desta forma, a maturação das uvas pode ser divida em três distintas fases bem determinadas: o período herbáceo, o período de maturação e o período de sobrematuração. Os primeiros estudos publicados sobre a diferenciação destas fases da maturação das uvas foram realizados por Guillon apud Galet (1993) em 1905. 10 3.2 MATURAÇÃO DA UVA O estado de maturação das uvas é o primeiro fator que condiciona a quantidade da uva na colheita (Ribéreau-Gayon, 1986). A maturação da uva converte as bagas em armazéns de reserva proveniente da seiva elaborada pelos órgãos verdes, regida também, pelas variações de calor e luz, que unidos à umidade do solo, em conjunto condicionam a quantidade da colheita (Hidalgo, 1999). Durante a maturação, a baga sofre um grande aumento em tamanho e volume. Estudos realizados por Ribéreau-Gayon (1986), demonstram que os diversos órgãos da uva não aumentam de peso nas mesmas proporções no curso da maturação, como por exemplo, na baga a polpa cresce mais que a película, porém o peso das sementes não aumenta muito com a maturação do cacho. Todo o desenvolvimento dos frutos é induzido e controlado por fatores externos de crescimentos, como os fatores climáticos do ano. A expansão da baga e seu enriquecimento em açúcares, ácidos e outras substâncias que levam à maturação possuem notável desenvolvimento neste período. Estes fatores podem ser importantes para se avaliar o ponto ideal de colheita dos frutos. A maturação das uvas compreende três fases distintas e perfeitamente definidas. 3.3 FASES DE DESENVOLVIMENTO DAS UVAS 3.3.1 PERÍODO HERBÁCEO Este período também é chamado de Envero ou Veração. Neste momento, os cachos começam a perder a coloração verde, que é dada pela clorofila, e tomam a sua coloração característica da maturação (Blouim e Guimberteau, 2000). Este fenômeno é brusco não uniforme; um grão do cacho muda de cor em um dia, porém os cachos permanecem em envero, quando em condições ideais, até uma quinzena de dias (Peynaud, E., apud Blouim e Guimberteau, 2000). As mudanças de coloração começam a ocorrer logo após o desenvolvimento do ovário floral e esta transformação está ligada com o rápido desaparecimento de pigmentos clorofilados que se formaram com a fecundação das flores. 11 Com o avanço do período do envero, a quantidade de clorofila das bagas vai diminuindo gradualmente até quase o seu desaparecimento logo após o período de maturação. Outro fator importante, é que a baga inicialmente possui uma estrutura rígida e dura. Assim, as bagas se tornam macias e podem ser deformadas com facilidade (Blouim e Guimberteau, 2000). O envero é responsável pelo aumento da concentração de polifenóis nas bagas, principalmente as antocianas nas variedades tintas. o volume das bagas e a concentração de açúcares aumenta, entretanto a concentração dos ácidos diminui com o avanço do período de envero (Blouim e Guimberteau, 2000). As bagas crescem devido aos fenômenos de multiplicação e crescimento celulares (Galet, 1993). Segundo Hidalgo (1999) o envero é caracterizado pela perda progressiva da clorofila e simultânea aparição dos pigmentos que chegarão a dar a coloração típica de cada variedade de uva. O aumento da peso das bagas é bastante visível ao inicio do período de maturação, como pode ser visto na Figura 1. Fonte: Navarre (1991). Figura 1: Evolução do tamanho das bagas durante o período de maturação no desenvolvimento das bagas. Quando iniciado o desenvolvimento do ovário floral, formam-se as bagas verdes e são órgãos consumidores da videira, pois entram em concorrência com as partes vegetativas da planta. Os açúcares, transportados na forma de sacarose, migram para as bagas onde são hidrolisados em glicose e frutose (Galet, 1993). As 12 bagas recebem também, quantidades de ácidos que migram das folhas e do rácemo, como é o caso dos ácidos málico e tartárico (o ácido tartárico pode ser produzido nas folhas e no cacho). Os açúcares e os ácidos orgânicos são utilizados no curso da respiração celular da baga (ciclo de Krebs) para produzir a energia que será armazenada na forma de adenosina trifosfato (ATP) e esta será utilizada nos processos de biossíntese e crescimento do grão (Galet, 1993). Os processos enzimáticos que ocorrem no grão, assim como o seu crescimento, ocorre com a parada do crescimento das folhas, ou seja, a transformação dos ramos verdes em sarmentos lignificados e marrons. A película se recobre de cera, a pruína, e reduz a taxa de evaporação da água regulando a temperatura da baga. Estudos complementares, demonstram que o gás carbônico é liberado em quantidades muito superiores às quantidades de oxigênio durante este período. A liberação destes gases se dá graças ao processo de respiração na baga, com a assimilação de clorofila e ácidos orgânicos (Blouim e Guimberteau, 2000). 3.3.2 PERÍODO DE MATURAÇÃO Também é conhecido com período translúcido. Segundo Hidalgo (1999), o aumento do volume das bagas durante este período, devido a uma dilatação celular, se produz por um aporte externo de substâncias nutritivas e água, com enriquecimento em açúcar e outros componentes determinantes da madurez, e também o fator hormonal controla o crescimento do fruto. Inicia com o fim do período de envero e vai até a maturação das bagas. Esta fase pode durar de 35 a 56 dias. Com o avanço da maturação, o teor de ácidos diminui, inversamente proporcional à quantidade de açúcares no grão. Ainda há o desenvolvimento de aromas e substâncias nitrogenadas. O período de maturação é condicionado por vários fatores, tais como, a quantidade de folhas na planta (fotossíntese), o grau de insolação das bagas, a temperatura ambiente, além da taxa de respiração de cada baga. Desta forma pode-se dizer que dias quentes e com boa insolação determinam uma grande quantidade de açúcares no cacho. Quanto maior for o período de maturação, em condições favoráveis à maturação, mais açúcar será armazenado e melhor será a qualidade da colheita (Hidalgo, 1999). Porém em dias frios e com chuvas, a incidência de podridões de todos 13 os tipos é maior e produzem grandes perdas na hora da colheita. Devido à heterogeneidade na fecundação doas ovários florais, nem todos os grãos amadurecem igualmente. Estudos realizados por Ribéreau-Gayon et al. (1985) demonstram que existe uma grande variabilidade no tamanho e na composição das bagas de uma mesma cultivar nas mesmas datas. Desta forma, existem poucas bagas com muito açúcar, porém muitos grãos possuem pouca quantidade açúcar, os quais demonstram estar num estádio de maturação bem retardado. Pode-se considerar que na época da colheita existam em torno de 20% de bagas insuficiente maduras (Ribéreau-Gayon et al., 1985). Durante o período de maturação ocorrem vários fenômenos importantes para o desenvolvimento das rácemos. Dentre estes, podemos destacar a acumulação de açúcares associados com a diminuição da quantidade de ácidos orgânicos. As substâncias minerais sofrem um aumento continuo durante todo o curso do crescimento e maturação dos rácemos (Ribéreau-Gayon et al., 1986). Os compostos fenólicos sofrem um acréscimo, quase sempre são derivados de outros órgãos da videira, se localizam mais na película e nas sementes das bagas. Neste período é que se desenvolvem os precursores de aroma e os compostos aromáticos livres na película e polpa dos grãos no rácemo. 3.3.3 PERIODO DE SOBREMATURAÇAO É realizado logo depois de alcançada a maturação dos cachos e pode ser realizado com os rácemos ainda sobre as videiras em tempos mais ou menos longos, ou também pode ser feito após a colheita colocando-se os cachos ao solo, em grades próprias ou sobre palha (Galet, 1993). Segundo Hidalgo (1999) somente ocorre em climas privilegiados, onde o rácemo pode permanecer na parreira para que alcance um teor maior de açúcares. A sobrematuraçao é um processo físico e fisiológico, pois as bagas continuam a realizar o processo de transpiração. Desta forma, o cacho não perde seiva elaborada para o resto da planta e seus componentes se concentram, obtendo uma perda de peso por evaporação de água. Este fenômeno pode ser aumentado com o corte dos sarmentos onde os cachos estão dispostos ou com a colheita dos rácemos. Segundo Galet (1993), pode-se distinguir duas fases, na primeira, ocorre uma simples concentraçao dos açúcares por evaporação de água e uma pequena parte de ácido málico. Na segunda, o fenômeno de sobrematuração pode murchar as bagas. 14 Fisiologicamente, as bagas podem ser mais enriquecidas em açúcar pelo período de sobrematuraçao, devido a um aumento relativo devido às perdas de água da baga. Durante sua duração, a película sofre uma evaporação e perda de água, porém este fenômeno é nulo em atmosfera saturada com água e ainda há o risco de desenvolvimento de podridões (Blouim e Guimberteau, 2000). As variações nos teores de açúcar podem ocorrer de maneira rápida, aumentando continuamente com o avanço deste processo. A acidez continua a baixar pela metabolização dos ácidos orgânicos (processo de respiração celular), principalmente os ácidos málico e tartárico. A evolução dos cachos é muito complexa conforme as variedades de uva (Blouim e Guimberteau, 2000). Também ocorre uma pequena perda de aromas varietais e liberação de aromas combinados. Em zonas quentes, esta evolução é acelerada e acentuada, ou seja, há uma maior destruição de compostos aromáticos. Nestas zonas, aparecem nos vinhos aromas ditos “torrados”,pois ocorre uma diminuição de aromas florais e frutados da polpa em variedades de uva aromáticas, como a variedade Riesling e algumas finas como a Chardonnay (Blouim e Guimberteau, 2000). Os compostos fenólicos sofrem um decréscimo e as bagas perdem as características herbáceas, rústicas e adstringentes dadas pelas concentrações de taninos. As antocianas sofrem uma degradação que é inversamente proporcional a sua síntese no período de maturação (Galet, 1993). Sendo assim, pode-se notar visualmente a perda de cor das bagas e gustativamente (insipidez, flacidez e maciez, etc.); este fenômenos são favorecidos por altas temperaturas (Blouim e Guimberteau, 2000). A sobrematuração somente pode ser levada a cabo quando em condições ótimas no que se refere ao clima. Fortes ventos, ou então altas quantidades de chuvas são maléficas para o período de sobrematuração originando grandes problemas de perdas da produção e o desenvolvimento de fungos prejudiciais, respectivamente. O processo de sobrematuraçao origina um decréscimo na acidez e pode ser prejudicial para alguns vinhos. Além disso, pode originar problemas na fermentação, pois as leveduras sofrerão mais para terminar o processo fermentativo e no seu início também pela alta concentração de açúcares, geralmente estes vinhos não possuem mais que 12,5% a 13%vol de grau alcoólico (Blouim e Guimberteau, 2000). 15 Segundo Flanzy (2000), a evolução dos caracteres aromáticos varietais podem se encontrar no limite, no estado ótimo, sem alcançar a degradação ou a diminuição da tipicidade. 3.4 EVOLUÇÃO AO CURSO DA MATURAÇÃO DOS CONSTITUINTES DOS RÁCEMOS 3.4.1 ÁCIDOS ORGÂNICOS As uvas são principalmente formadas pelos ácidos tartárico, málico e cítrico (em pequenas quantidades). A quantidade de ácidos orgânicos é muito variável, segundo as cepas, o clima, as práticas culturais e a temperatura do ambiente. Podem estar encontrados na forma livre ou então, combinados ânions minerais (potássio, cálcio, sódio ou magnésio) formando sais ácidos (Galet, 1993). O ácido tartárico é encontrado no seu isômero “L” (ácido L(+) tartárico), se em grandes quantidades na uva ao contrário de outras tantas espécies vegetais. É um ácido forte e portanto, influencia muito o pH dos cachos. O ácido málico é mais comum em vários frutos, varia sua concentração dependendo de cada cepa e da temperatura ao curso da maturação, variado de 2 g/L (em zonas quentes) até 8 g/L. É encontrado na forma de seu isômeros L(-) e ácido D(+) málico. O ácido cítrico é pouco presente nas uvas, em torno de 150 a 300 mg/L, porém é maior produzido por rácemos atacados por Botrytis cinerea. Com o período de maturação, os ácidos orgânicos da uva evoluem de maneiras diferentes, ou seja, há um maior consumo de ácido málico do que ácido tartárico. Experimentos realizados revelam que a quantidade individual de ácidos sofre um substancial decréscimo com o avanço do período de maturação. Duas causas simultâneas são responsáveis pela diminuição da acidez do mosto da baga ao curso da maturação: o fenômeno da diluição e da combustão por respiração (Blouim e Guimberteau, 2000). Esta evolução irá determinar as futuras características do vinho e não se limita a acidez titulável e ao pH (Ribéreau-Gayon, 1985). Os ácidos orgânicos são elaborados na folhas da videira e possuem um papel principal na acidez dos mostos (Galet, 1993). O consumo de ácidos orgânicos pela 16 baga sofre grande influencia da temperatura ambiental, já a luminosidade apresenta um efeito secundário. 3.4.1.1 ÁCIDO MÁLICO Sua síntese é o resultado de uma reação secundária da fotossíntese, sendo produzido a favor da energia liberada pela degradação dos açúcares nas raízes das plantas, principalmente (Galet, 1993). Além disso, o ácido málico é um metabólito intermediário do ciclo de Krebs e este ciclo ocorre mais efetivamente no engaço verde dos cachos. Segundo Ribéreau-Gayon et al. (1985), o engaço lignificado é capaz de transformar acido málico em açúcares. Enfim, o ácido málico pode ser formado com a fotossíntese, em presença da enzima málica (Galet, 1985). Os teores de ácido málico das uvas sofrem interferência de três fatores: as condições meteorológicas do ano, a variedade de uva e o complexo solo-microclima (Ribéreau-Gayon, et al., 1985). Comparando-se com ácido tartárico, a videira sintetiza mais ácido tartárico que málico, porém os dois ácidos unidos é que determinam a acidez final dos mostos. Ao final do período herbáceo, os teores de ácido málico decrescem regularmente, em média de 3 a 6 meq ao dia, causado por uma queima respiratória e as migrações de outras partes da planta são muito insuficientes para suprir as perdas com a respiração. Durante todo o período de maturação sua degradação é intensificada, dependendo unicamente da temperatura dos cachos (Blouim e Guimberteau, 2000). Ao fim da maturação da uva, o ácido málico pode ser reduzido a ácido oxalacético e depois é descarboxilado em ácido pirúvico que pode seguir a via inversa da glicólise e originar glicose (Blouim e Guimberteau, 2000). 3.4.1.2 ÁCIDO TARTÁRICO É o principal ácido constituinte das uvas, é um ácido forte e influencia notavelmente o pH do mosto. A maior parte do ácido tartárico das bagas é proveniente das folhas jovens, pois é sintetizado através do metabolismo da glicose. As bagas verdes também podem sintetizar ácido tartárico utilizando a mesma via de síntese (Galet, 1993). A continuação, sua formação é diminuída rapidamente ao fim do período de 17 envero (Blouim e Guimberteau, 2000). Quando formado na planta, o ácido tartárico se acumula facilmente, pois possui uma metabolização muito lenta. Durante a maturação das bagas, o seu teor em ácido tartárico é relativamente constante. No momento da formação do grão, o ácido tartárico constitui a quase totalidade de sua acidez, porém seus teores diminuem com o final do período de envero. Isto é conseqüência da descontinuidade dos fenômenos de migração e combustão por respiração deste ácido, em relação aos fatores externos (RibéreauGayon, 1985). 3.4.2 AÇÚCARES Os açúcares da baga se localizam, principalmente, na polpa e são compostos por hexoses, a glicose e a frutose. Durante o processo de maturação, as hexoses são diretamente provenientes da sacarose, um dissacarídeo formado por uma molécula de glicose ligada a uma molécula de frutose. A sacarose é sintetizada em todas as partes verdes da planta, sobretudo nas folhas (Navarre, 1991). Após sua formação, tal açúcar sofre um processo de migração até as células da polpa onde sofre uma hidrólise e posterior formação de glicose e frutose. As quantidades de glicose e frutose na maturação são sensivelmente iguais (Blouim e Guimberteau, 2000). Os açúcares da baga são correntemente chamados de açúcares fermentescíveis, que são transformados ao curso da fermentação alcoólica e/ou chamados de redutores (pois se reduzem no licor de Fehling). Durante a maturação, o conteúdo de açúcares redutores pode chegar até 250 g/L ou mais, dependendo de fatores climáticos, variedades de uva, podridão nobre, passificação, etc (Blouim e Guimberteau, 2000). A baga possui outros monossacarídeos diferentes de glicose e frutose, porém em pequenas quantidades, dando importância para a arabinose e a xilose, duas pentoses que não são fermentescíveis por leveduras e podem ser metabolizadas por bactérias. 3.4.2.1 FORMAÇÃO E ACUMULAÇÃO DOS AÇÚCARES Os açúcares provêm da fotossíntese, que é realizada por todos os órgãos da planta que possuem clorofila, principalmente nas folhas. A folhas e os outros órgãos 18 da planta, realizam a formação de açúcares na forma de sacarose, que é hidrolisada na polpa da baga, e esta sofre um processo de migração chamado de translocação. Os açúcares elaborados pelas folhas, são utilizados primeiramente para satisfazer as suas necessidades, sendo assim, os açúcares que não são consumidos pelas folhas são distribuídos por todos os outros órgãos da videira (Blouim e Guimberteau, 2000). No período herbáceo de desenvolvimento da baga, os açúcares são utilizados para realizar o crescimento e a maturação das sementes. Com o final do envero, ocorre uma acumulação de açúcares aumentando a quantidade de reserva na polpa. Segundo Navarre (1991), durante o crescimento da baga os açúcares são acumulados no cacho, sendo utilizados para a respiração celular, crescimento da planta e a parte que não é consumida fica acumulada na baga. Com o avanço do período de maturação, os açúcares vão se acumulando em maior quantidade e há uma maior produção pela planta devido ao amadurecimento das folhas e posterior aumento da superfície foliar. Segundo Blouim e Guimberteau (2000), no período herbáceo, o grão somente nutre a sim mesmo e ao final do período ocorre a maturação industrial das sementes, onde ocorre a maior acumulação de açúcares na baga. Segundo Galet (1993), os açúcares acumulados possuem duas origens: durante o período herbáceo, no qual as bagas são enriquecidas a partir de reservas que se acumulam na polpa (principalmente provenientes do tronco e dos sarmentos) e das folhas da base dos ramos, e depois progressivamente todo o açúcar é proveniente das folhas localizadas próximas ao cacho. 3.4.2.2 EVOLUÇÃO AO CURSO DA MATURAÇÃO A baga inicia seu desenvolvimento como um órgão da planta rico em clorofila, com o avanço do período herbáceo é que estas condições sofrem mudanças bruscas em relação à quantidade de açúcares. Até o envero, as bagas possuem pouco açúcar e sua composição, porém com o inicio desta fase ocorre um aporte brusco dos açúcares para a baga, em questão de uma semana, a taxa de açúcares do grão é multiplicada por 6 ou 7 (Gallet, 1993). Ocorre também, uma mobilização rápida e passageira das reservas, principalmente do 19 tronco e ramos lignificados, durante um momento crítico de desenvolvimento das bagas. Estas diferenças podem ser observadas na tabela 1. Quadro 1: Balanço do conteúdo de açúcares no envero da planta, dado em % de açúcar contido na polpa. Órgãos da Planta Antes do Envero Ao final do Envero Diferença Raízes 2,6 3,8 + 1,2 Raízes grossas 12,0 13,4 + 1,4 Tronco e sarmentos 27,4 18,1 - 9,3 Ramos verdes 21,4 14,6 - 6,8 Pedúnculo 2,2 1,7 - 0,5 Limbos 17,7 12,6 - 5,1 Engaços 1,3 1,1 - 0,2 Bagas 15,2 34,3 + 19,1 Total 99,8 99,6 ---- Fonte: Morreau e Vinet (1932) apud Gallet (1993) A quantidade de açúcares na baga é proveniente dos órgãos verdes da planta, estes é que contribuem sensivelmente sobre o enriquecimento das bagas em açúcares. Se as reservas da planta são abundantes, permitem o amadurecimento dos cachos, porém em condições climáticas desfavoráveis, a vindima não possuirá condições qualitativas necessárias à vinificação. Ao curso da maturação as bagas continuam a acumular açúcares, porém muito mais lentamente que no envero (Blouim e Guimberteau, 2000). A acumulação de açúcares na baga é diretamente relacionada com as condições climáticas e a localização do vinhedo. Outros elementos podem interferir: as precipitações atmosféricas e as temperaturas baixas, limitam a acumulação de açúcares, todavia, períodos quentes e secos ao final da maturação são favoráveis ao acúmulo de açúcares. Durante os vinte primeiros dias após o fim do envero, os açúcares aumentam rapidamente e se acumulam mais rápido com o aumento da baga (Ribereau20 Gayon, 1985). Desta forma, a migração se torna mais lenta e freqüentemente, durante os dias precedentes à colheita, os teores de açúcares da baga não aumentam mais, ao contrário, podem sofrer um leve decréscimo. O teor de açucares nas bagas não é constante para uma cepa, pois depende de numerosos fatores, tais como fatores ambientais (solo, clima, exposição), fotores da cultura (espaçamento, porta-enxerto, modo de condução) e ainda, ataque por parasitas animais e vegetais (Galet, 1993). Como resumo, é notável que as bagas sofremm um enriquecimento de 5 a 15 gramas de açúcar durante um mês de desenvolvimento, estes teores podem passar de 1% a 17,5%. Com relação a quantidade glicose e frutose, pode-se afirmar que existe uma relação de 4 a 5, e ao final da maturação, há uma maior quantidade de frutose na baga. A frutose é utilizada pela planta para nutrir seus processos metabólicos, enquanto que a glicose vai se acumulando na polpa da baga. Ao curso do processo de maturação do cacho, a relação entre estes dois monossacarídeos vai diminuindo, chegando a valores próximos da igualdade entre os teores dos diferentes açucares, como pode ser acompanhado na tabela 2. 3.5 MATURAÇÃO FISIOLÓGICA Ocorre quando as sementes já estão aptas para germinar, porém este critério é pouco válido para o produtor por não possuir importância tecnológica, más é fundamental, pois assim a videira já pode se reproduzir. Do ponto de vista enológico, a parte da uva que é utilizada para proporcionar melhores resultados, é a película. Este tipo de maturação pode ser atingido logo após o período herbáceo, visto que a semente já é capaz de germinar, porém o valor comercial destas uvas é muito baixo devido a sua alta concentração de acidez e baixos teores de açúcar. 3.6 MATURAÇÃO INDUSTRIAL Este conceito está diretamente relacionado com a quantidade máxima de açúcares, em teores mínimos em acidez total e o conteúdo individual dos ácidos da baga. A maturação industrial leva em conta também, a quantidade máxima de açúcar por hectare, assim como o provável grau alcoólico por hectolitros ao hectare. A 21 maturação industrial leva em conta a utilização das uvas, ou seja, se serão destinadas a elaboração de vinho doces ou espumantes, por exemplo. Segundo Blouim e Guimberteau (2000), os teores de açúcar e/ou de ácidos podem ser considerados como um critério único para a confirmação da data da colheita para se obter vinhos de qualidade. 3.7 MATURAÇÃO FENÓLICA Está baseada na determinação dos conteúdos de antocianas e taninos das uvas. Este tipo de maturação avalia a acumulação das antocianas, as fortes variações dos taninos, segundo suas estruturas poliméricas e sua origem (sementes, película, etc), além da extração de cor que, geralmente, seja crescente ao curso do período de maturação. Estas variações são muito heterogêneas e sofrem influência do clima, do ataque de fungos, das condições de amostragem, da extração, da determinação, etc. (Ribereau-Gayon et al., 1986). Recentes pesquisas nesta área, revelam que a análise (sensorial e físicoquímica) dos cachos durante distintas datas durante a maturação dos cachos, demonstra uma sensível melhora nas condições qualitativas das bagas durante o tempo, devido a formação de taninos menos agressivos. A determinação das antocianas do cacho ao final da maturação, permite uma maior diferenciação dos aspectos próximos da maturação, pois os teores de antocianas variam de 1% a 2%, enquanto que os teores de açúcares podem variar até 20% (Blouim e Guimberteau, 2000). 3.8 SOBREMATURAÇÃO E PASSIFICAÇÃO DAS UVAS A passificação das uvas pode ser considerada como uma maneira única para se obter vinhos com características diferentes. Dentro desta ótica, é dito como um processo utilizado na maioria dos vinhos de sobremesa elaborados no mundo todo, tais como o vinho Picollit e Amarone della Valpolicella , na Itália. Via de regra, a sobrematuração ocasiona uma matéria-prima rica em açúcares e conseqüentemente, uma maior graduação alcoólica (De Rosa, 1987). Segundo Navarre (1991), a sobrematuração ocorre quando o binômio “cachos-planta” é 22 interrompido e há um dessecamento dos cachos se as condições climáticas são favoráveis, estas condições são muito favoráveis ao desenvolvimento de fungos Botrytis cinerea. Mas também, a sobrematuração origina uvas mais ricas em substâncias aromáticas, melhorando as características organolépticas do vinho elaborado. Quadro 2: Evolução da glicose e da frutose durante a maturação das uvas da cepa Cabernet Sauvignon, (Graves-França 1937). Data Glicose Frutose Glicose/Frutose 10 de agosto 8,1 4,0 2,02 20 de agosto 31,5 23,5 1,35 31 de agosto 68,2 63,8 1,07 10 de setembro 88,5 90,5 0,98 20 de setembro 93,6 98,4 0,95 30 de setembro 101,0 109,0 0,93 Fonte: É. Peynaud apud Blouim e Guimberteau (2000) A fase de sobrematuração ocorre quando os cachos são separados da planta por um tempo, sobressaindo os limites normais da maturação, porém somente se as condições climáticas são propícias a tal processo. De outro modo, a passificação das uvas pode ser realizada ainda com os cachos na planta, ou então, podem se colhidos e conservados em locais particulares ou em suportes especiais. Este processo é mais utilizado industrialmente pela sua facilidade de emprego e por apresentar melhores resultados práticos. A passificação pode ocorrer ainda se for induzida. Segundo RibereauGayon e Peynaud (1969), a sobrematuração pode ser ainda provocada pela passificação das uvas, sob a ação do calor solar ou artificial. O processo é chamado de passificação artificial, onde condições como temperatura e umidades são controlados, principalmente, como parâmetros úteis para definir o processo. 23 3.8.1 SOBREMATURAÇÃO EM AMBIENTE NATURAL Consiste apenas na conservação dos cachos ainda nas videiras além do tempo da maturação, porém sempre que as condições ambientais permitem (De Rosa, 1987). A passificação é praticada em cachos por longos tempos sobre a planta, ainda mais depois de uma torção do pedúnculo ou o seu corte (Ribereau-Gayon e Peynaud, 1969) Este tipo de processo pode ser levado a cabo devido ao corte dos sarmentos frutíferos, ou seja, os que possuem os cachos. Ou então, devido à torção do pedúnculo dos cachos. Qualquer dos dois processos provocam uma interrupção do fornecimento de seiva da planta para o cacho, assim como substâncias importantes para os grãos, como açúcar (na forma de sacarose através das folhas) e sais minerais oriundos do solo. Associado a esta interrupção, ocorre a retenção do conteúdo da baga, causando um acumulo de açúcar e ácidos, principalmente. Esta técnica é muito utilizada na França, onde recebe o nome de “Passerillage et Claireissage sur Souche (PES)”, na qual duas ou três semanas antes da colheita corta-se parte dos ramos na planta na base. Na Itália a técnica também está se expandindo e é conhecida como “Doppia Maturazione Redicionatta (DMR) (Dall’Agnol, 2000). No Brasil, o processo é chamado de Dupla Maturação Direcionada (DMD) e em experimentos realizados por Dall’Agnol (2000) percebe-se que há um aumento na quantidade açúcares (em torno de 7 ºBrix) e na acidez total. Este acréscimo ocorre devido à perda de água sofrida pela baga durante o processo de DMD. É certo que este sistema causa uma sensível perda por ação de pássaros (as outras uvas já estão colhidas), porém riscos notáveis são encontrados por condições meteorológicas desfavoráveis. Por estas desvantagens, as uvas devem ser colhidas antes de se iniciar o processo de passificação. Sendo assim, as uvas são colhidas e podem ser depositadas sobre palhas colocadas na terra (de Rosa, 1987). Porém, somente se as condições de insolação são boas e capazes de provocar o processo de passificação das uvas. As uvas levam uma cobertura noturna, esta serve como uma barreira contra a umidade, o que pode favorecer uma podridão não desejada. Estudos realizados por Ribereau-Gayon et al. (1986), ensaios de passificação na Alemanha, demonstram que sob uma temperatura de 20°C e por um 24 período de 21 dias, houve uma perda de peso de 33% e houve um aumento dos açúcares a 29% e a tendência da acidez é diminuir. As uvas podem ainda ser colocadas sobre grades que podem formar prateleiras, ou seja, as grades são sobrepostas horizontalmente. As grades são colocadas em locais secos ou com pouca umidade relativa do ar e bem ventilados. Nestas mesmas condições, as uvas colhidas podem ser dispostas num único plateaux. Ou também, podem ser colocadas em arames verticais compostos por ganchos que servem para suspender os cachos pelas ramificações do engaço. Quando suspendidos em arames, pode-se ter um melhor controle sobre as podridões, pois quando um dos grãos é infestado com fungos este pode ser retirado antes de contaminar as outras bagas sadias no cacho (De Rosa, 1987). Independente do sistema escolhido, é de fundamental importância uma baixa umidade relativa do ar, para impedir o desenvolvimento de podridões indesejadas, ainda origina uma maior resistência da película e pela proteção da camada de pruína. A fase de passificação pode ser considerada como sede de fenômenos destrutivos (De Rosa, 1987). Isto ocorre porque com o enriquecimento em açúcares por desidratação, aumentando o peso inicial de açúcar, há um consumo do mesmo decorrente do processo de respiração celular. Porém, não só os açúcares são consumidos, os ácidos da baga são consumidos muito rapidamente por combustão dentro do grão. Dentre estes, o ácido málico é o mais consumido dentre todos os ácidos da baga. A temperatura influencia de maneira notável, sendo que a 35ºC, a respiração celular apresenta maiores efeitos sobre o consumo de ácidos orgânicos. Segundo (Galet 1985), na temperatura de 35ºC, a respiração é de 6 a 7 vezes mais intensa que a 15ºC, porém a temperaturas superiores, como em torno de 60°C, as células são desnaturadas e a respiração cessa. Quando nestas condições, somente há uma desidratação pelo calor, a respiração não ocorre e o conteúdo ácido das bagas fica aumentado, pois os mesmos não são consumidos pelo processo de respiração celular. Quando comparados os três ácidos orgânicos mais numerosos na uva (ácido tartárico, ácido málico e ácido cítrico), o ácido tartárico é o que pouco diminui em relação aos outros ácidos da baga. Segundo De Rosa (1987), o ácido cítrico ao invés, não sofre uma diminuição por respiração celular, resultando num certo aumento por desidratação e sua concentração no interior das bagas. 25 O processo de passificação causa um aumento também, de compostos fosforados e do enxofre, causando ainda uma boa migração das substâncias corantes da película para o suco, ou seja, o mosto a ser obtido a partir destas uvas. Segundo Navarre (1991), as substâncias corantes permanecem conservadas na película até o momento do desengaçace e da prensagem De maneira geral, nos primeiros dias em que as uvas são submetidas ao processo de passificação são muito críticos. Isto se dá devido à alta umidade no cacho e porque os grãos ainda possuem uma quantidade elevada de polpa e com facilidade há o desenvolvimento de podridões. Com o avanço do período, tal situação é propicia para manter as condições sanitárias dos cachos. Este sistema é desfavorável em alguns aspectos: não é uniforme pelo perigo de contaminação com agentes fúngicos patógenos; possui um elevado tempo de duração, alcançando até alguns meses dependendo do tipo de vinho a ser elaborado; necessita de instalações próprias e somente para esta utilização; requer um elevado custo econômico. 3.8.2 SOBREMATURAÇÃO EM AMBIENTE ARTIFICIAL A utilização deste sistema possui interesse, do ponto de vista higrotérmico (De Rosa, 1987). Este sistema é conduzido através de estruturas que permitam a utilização de ar quente porém com baixa umidade. Estas duas variáveis devem ser analisadas profundamente antes de iniciar o processo. Parâmetros idéias, podem ser encontrados em temperaturas entre 30°C e 50°C (sendo que 35°C é o ideal) com uma umidade relativa de 60%. Segundo Ribéreau-Gayon et al (1986), mediante a utilização de ar quente com uma umidade relativa diminuta (30°C com umidade relativa de 60%), se reduz o tempo de passificação de 1/6 a 1/8 do tempo necessário a passificação natural em “frutaio”, com uma perda de peso de 35% a 45%. Segundo Blouim e Guimberteau (1999), o processo não se limita apenas a uma simples evaporação de água, aumentando na mesma proporção à quantidade de açúcares e ácidos, pois pela ação do processo de respiração celular ocorre um consumo de ácidos até o fim do processo. A perda de açúcar é em geral, proporcionalmente, muito pequena que a perda em acidez (ácidos orgânicos). Com relação aos fenômenos de dissolução dos elementos da película e das sementes, provocam um aumento da intensidade de 26 substâncias corantes, assim como, os teores de ácido fosfórico, substâncias de enxofre e polissacarídeos. Este processo é vantajoso devido a menor necessidade de utilização de mão-de-obra, reduzindo a contaminação por fungos causadores de podridões. Com a utilização de ar quente, pode-se enriquecer as bagas em até 55% do seu conteúdo de açúcares (Ribereau-Gayon e Peynaud, 1969). Comparado com o sistema tradicional em “frutaio”, estes processo produz um maior enriquecimento de açúcares, impedindo a adição de açúcares ao mosto para se obter a quantidade de etanol desejada. Sendo assim, a cinética fermentativa de leveduras nestes mostos são mais regulares por não possuir substâncias inibitórias. Há ainda, um menor desenvolvimento de fungos, principalmente da espécie Botritys cinerea. Porém, o sistema de “frutaio”, origina aromas mais intensos e mais agradáveis se comparado ao sistema de passificação artificial. As vantagens da passificação artificial são muito conhecidas e bastante favoráveis ao desenvolvimento do processo em escala comercial e o custo energético é aceitável, porém demanda maiores custos econômicos. 27 4 4.1 MATERIAL E MÉTODOS VIDEIRAS Para a execução do trabalho, foram utilizadas videiras da variedade Cabernet Sauvignon, que podem ser consideradas novas, pois foram plantadas a três anos. O vinhedo se localiza na propriedade da Vinícola Marco Luigi no Vale dos Vinhedos de Bento Gonçalves-RS. 4.2 SELEÇÃO DAS VIDEIRAS As videiras foram selecionadas por possuírem uma boa localização no terreno e também, por estarem em boas condições climáticas. O vinhedo esta implantado num terreno com uma pequena declividade norte, o que favorece a insolação. As videiras foram escolhidas ao acaso dentro do vinhedo, visto que possuíam as mesmas características fisiológicas e de crescimento. Para cada tratamento foram escolhidas 10 videiras no vinhedo. 4.3 MONTAGEM DO EXPERIMENTO O trabalho foi desenvolvido de maneira a estabelecer um modelo estatístico coerente dentro do experimento. Este experimento foi montado com um 28 Delineamento Experimental em blocos inteiramente casualizados para facilitar a análise estatística dos dados. O experimento consiste em 4 (quatro) tratamentos, incluíndo a testemunha, que é composto, pelas uvas maturadas e sem sofrer o processo de sobrematuraçao e passificação. O primeiro tratamento consiste na passificação em ambiente externo, ou seja, é composto pelas uvas sobrematuradas ainda nas videiras, através de um corte nos sarmentos que possuíam os cachos maduros. O segundo e o terceiro tratamento consistem na passificação dos cachos em ambiente protegido, ou seja, no terceiro tratamento as uvas foram colhidas e colocadas sobre o fundo de caixas plásticas com perfurações, como mostrado no anexo 3, em ambiente sem presença de luz solar direta (à sombra) e com ventilação apropriada. O quarto tratamento foi realizado da mesma forma que o terceiro, porém as uvas foram colocadas em grades confeccionadas para tal atividade. Essas grades foram desenvolvidas de maneira artesanal na propriedade,através da utilização de madeiras e uma grade de arame fino para proporcionar um bom suporte para os cachos sem que os mesmos sofressem perdas mecânicas durante o processo. As uvas foram mantidas sob processo de passificaçao durante 20 dias, sendo que amostras foram colhidas diariamente para as análises correlatas ao processo. O tempo do experimento foi determinado devido ao máximo do desenvolvimento das uvas sem que houvesse perdas mecânicas e/ou apodrecimento. O tempo total de 20 dias foi ótimo para o desenvolvimento do trabalho, além disso, os cachos ao fim do processo possuíam uma boa qualidade do ponto de vista enológico e microbiológico (ausência de podridões nocivas). Para cada tratamento foram escolhidas 10 (dez) videiras diferentes dentro do vinhedo e foram colhidas três caixas de plástico com capacidade de 20 Kg para cada tratamento. Cada caixa representa uma repetição dentro do tratamento escolhido, portanto o experimento foi conduzido em triplicata para melhor análise dos resultados. Para o tratamento em que a passificação foi realizada ainda na videira, foram colhidos apenas os cachos necessários para a realização das análises físicoquímicas, em torno de 3 cachos, ou então, 300 bagas para se obter uma melhor representatividade da amostra. 29 Foram coletadas amostras iniciais das uvas e realizadas as análises para detrminar as condições iniciais do experimento (testemunha). 4.4 AMOSTRAGEM Depois de colhidas as uvas, foi feita uma amostragem diária para a realização das análises de açúcar e acidez, principalmente. As amostras realizadas em torno de 2(dois) cachos de cada repetição e estes eram esmagados para obtenção do mosto. O mosto foi homogeneizado nas três repetições para obter uma uniformidade e seguia para a determinação dos parâmetros analisados. As análises foram realizadas no próprio laboratório da empresa seguindo normas utilizadas pela OIV (Office International de la Vigne e du Vin) e pela Union International des Oenologues. 4.5 ANÁLISES LABORATORIAIS Acidez Total: feita por titulação, utilizando-se uma solução de NaOH a 0,1 N, através do uso da fenolftaleína como indicador. A amostra foi previamente diluída para tal análise. O valor encontrado é expresso em meq/L. pH: é lido diretamente em pHmetro digital. Açúcares: foram quantificados diretamente utilizando-se um refratômetro digital de bancada, colocando-se o mosto obtido e se faz a leitura do valor diretamente no aparelho. O valor encontrado é expresso em ºBrix. Peso do cacho: foi realizado medindo-se diretamente os cachos antes da obtenção do mosto e feita uma média dos valores do peso de cada cacho da amostra. Foi utilizada uma balança da marca Filizola apara até 10 Kg de capacidade. 30 Presença de podridões: este parâmetro foi avaliado por observação visual segundo a tabela 1, elaborada para facilitar o resultado. Depois de terminado os experimento, os resultados obtidos sofreram uma análise estatística dos dados através do teste de Tukey a um nível de significância de 5%. 4.6 TESTEMUNHA As uvas somente foram colhidas devido ao seu estádio de maturação, ou seja, somente quando alcançaram as características analíticas e sensoriais usuais para colheita na região . Foram analisados parâmetros para a vinificação dessas uvas, ou seja, seu índice de maturação industrial. As uvas apresentaram um bom aspecto visual, além de não haver desenvolvimento de podridões nas mesmas, como pode ser visto na Figura 6. A testemunha apresentava os seguintes parâmetros analíticos: Açúcares: 18,5 ºBrix Acidez Total: 102 meq/L pH: 3,32 Peso do cacho: 250 g Presença de podridões: 0 Tabela 1: Ficha de Análise da presença de podridão nos cachos. Estado dos Cachos Número correspondente Sem presença de mofos – Uva Sã 0 Pouca presença de mofos 1 Média presença de mofos 2 Muita presença de mofos – Uva Podre 3 31 5 RESULTADOS E DISCUSSÃO Estão abaixo descritos os resultados obtidos observando-se as variáveis: acidez total, pH, açúcares, peso dos cachos e presença de podridões. 5.1 ACIDEZ TOTAL A acidez total pode ser definida como a quantidade total de ácidos encontrada na amostra. Sendo assim, nas uvas, seu valor é representado pelo conteúdo de ácidos da baga, sendo que principalmnete pelos ácidos tartárico, málico e cítrico. Vários outros ácidos orgânicos são encontrados nas bagas de uva, porém em quantidades mínimas, tais como, ácido pirúvico, ácido oxalacético, ácido fumárico, etc. Os níveis encontrados nos vinhos são muito variáveis, isto porque o conteúdo de ácidos é dependente da constituição genética de cada variedade de uva. Porém, de maneira geral, as uvas brancas possuem maior valor de acidez total que as uvas tintas. Desta forma, algumas variedades de uva podem possuir maior quantidade de ácido málico ou tartárico que outras, o que difere muito dentro das variedades. A quantidade de acidez total encontrada nas uvas sem nenhum tratamento, foi de 102 meq/L, valores medianos e corretamente encontrados em uvas da variedade Cabernet sauvignon quando maturadas adequadamente, como foi o caso da safra em questão. Analisando-se a Figura 2, nota-se que há uma evidente diferenciação dos valores obtidos ao final da execução do experimento. Nos primeiros dias, há um aumento lento do conteúdo de ácidos da baga, devido à evaporação sofrida pelo grão e conseqüente perda de água e concentração de todos os constituintes da polpa da baga. Após o 9º e/ou 10º dia do experimento, inicia-se um período de diminuição gradual da acidez total. Esta diminuição é decorrente de muitos fatores 32 fisiológicos ligados ao processo de passificação das uvas, porém a respiração celular é o agente principal desta diminuição. A respiração celular ocorre na baga por consumo de ácidos (principalmente o málico) formando os componentes necessários para o desenvolvimento da baga após o seu período de maturação, quando as uvas já estão colhidas. T rat I Acidez Total T rat II T rat III 160 140 120 100 80 60 40 20 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 Dias Figura 2: Resultados obtidos na análise de acidez total, em meq/L de ácido tartárico. De maneira global, a acidez total sofreu uma diminuição durante o período de realização do experimento. Do ponto de vista industrial, esta diminuição pode ser positiva, devido à obtenção de vinhos menos agressivos ao paladar e com melhores resultados mercadológicos. Ao iniciar o experimento, durante os primeiros 10 dias , há um crescente aumento na acidez total das uvas (Figura 2). Isto ocorreu devido à grande perda de água sofrida pelas bagas das uvas, concentrando portanto, todos os constituintes das mesmas. Com o avanço dos dias, a acidez iniciou uma gradual diminuição devido ao consumo de ácidos por processos enzimáticos desencadeados pelo fenômeno da respiração celular, como relatado anteriormente pela revisão bibliográfica. Analisando-se os valores finais, pode-se dizer que o tratamento III, representado pelas uvas colhidas e sobrepostas nas grades, obteve uma diminuição maior na quantidade de ácidos no cacho. Mas não há uma grande diferenciação entre o tratamento II onde as uvas são colocadas sobre as caixas plásticas. Porém quando analisados os três tratamentos nota-se que há uma menor diminuição da acidez no tratamento I, que é composto pelas uvas sobrematuradas no vinhedo. 33 5.2 pH Este parâmetro é importante do ponto de vista enológico. Com o fim do período de maturação, o pH das uvas ainda é baixo, comparando-se ao fim do processo de vinificação. Os vinhos possuem um pH mais elevado do que os encontrado nas uvas. O pH dos vinhos da Serra Gaúcha varia de 3,2 até 3,8, com valores que não ultrapassam 4,0. Sem dúvida, a medição de pH possui muita importância do ponto de vista técnico, pois o pH condiciona diversos fatores essenciais à qualidade dos vinhos produzidos. Durante a execução do trabalho, as medições de pH foram realizadas para melhor acompanhamento do conteúdo de ácidos nas uvas(Quadro 3). Houve, então um aumento no pH das uvas devido ao consumo dos ácidos pelo processo da respiração celular (Figura 3). Porém, não há uma evolução gradual no pH, decorrente de interferências externas correlatas à técnica analítica aplicada, que é muito sensível a pequenas quantidades de íons H+ na amostra. 5.3 AÇÚCARES A quantidade de açúcar que é encontrada nas bagas é muito variável. Esta variação é decorrente de fatores como as condições climáticas do ano, as condições genotípicas das videiras, a temperatura ambiental, o porta-enxerto utilizado, a quantidade de insolação, o sistema de condução, entre tantos fatores. A sua importância está na posterior conversão da quantidade total de açúcar encontrado na baga em etanol, processo chamado de fermentação alcoólica que é realizado pelas leveduras encontradas no mosto. Na região da Serra Gaúcha, a quantidade máxima de açúcares não é alcançada, devido às condições climáticas nem sempre favoráveis. Sendo assim, dificilmente são encontradas uvas com mais de 22 °Babo nos vinhedos da região, o que equivale em torno de 25 a 26 °Brix. Na testemunha , as uvas analisadas possuíam em torno de 18,6 °Brix, o que equivale a 19 °Babo (Figura 3), visto que as condições climáticas desta ultima safra estavam favoráveis ao desenvolvimento de melhores quantidades de açúcares nos grãos Com o avanço do período de passificação, as uvas sofreram um acréscimo na quantidade açúcar(Quadro 3) no valor médio de 4,27 dentre os três tratamentos, em comparação com a testemunha. Esse acréscimo é decorrente da 34 crescente perda de água que as uvas sofreram durante o tempo em que o experimento foi realizado. De maneira geral, o tratamento III apresentou um maior aumento na quantidade de açúcares das uvas, devido às melhores condições de realização do experimento. As grades proporcionaram melhores resultados, pois houve uma menor umidade relativa nas uvas colocadas em tal material, além de disponibilizar um ambiente pouco propício ao desenvolvimento de fungos indesejáveis, tais como os pertencentes a espécies de Botrytis cinerea. 35 Quadro 3: Resultados das análises físico-químicas dos tratamentos (média das três repetições em cada tratamento). Dias 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 Açúcares (ºBrix) Trat I Trat II Trat III 18,6 18,6 18,6 18,7 18,6 18,8 18,9 18,6 19 19,01 18,7 19,5 19,1 18,9 19,6 19,1 19 19,9 19,8 19,1 20 19,8 19,1 20,5 20,2 19,2 20,8 20,4 19,5 21 20,5 19,8 21 20,5 19,8 21,1 20,8 20 21,5 21,5 20,5 21,5 21,6 20,5 21,8 21,8 21 22 22 21,5 22,5 22 22 22,5 22,1 22,5 23 22,1 23 23,5 Acidez Total (meq/L) Trat I Trat II Trat III 102 102 102 103 108 105 103,5 115 108 104 120 110 107 118 114 117 120 120 118 125 134 125 128 135 128 130 135,5 135 131,5 125 122 129 120 120 122 117,5 118 120 115 117 117 112 109 114 1108 107 111,5 107 105 99 98 98 97 96 96 96,5 95 96 93 92,5 Trat I 3,32 3,32 3,31 3,35 3,34 3,35 3,36 3,37 3,38 3,4 3,38 3,41 3,45 3,45 3,47 3,46 3,48 3,4 3,45 3,45 pH Trat II 3,32 3,31 3,33 3,34 3,35 3,35 3,36 3,37 3,34 3,35 3,38 3,38 3,4 3,41 3,42 3,45 3,48 3,49 3,4 3,45 Trat III 3,32 3,36 3,39 3,37 3,35 3,39 3,4 3,41 3,42 3,43 3,45 3,44 3,41 3,43 3,42 3,48 3,48 3,5 3,35 3,51 Peso do Cacho (Kg) Trat I Trat II Trat III 250 250 250 250 250 250 248 250 250 241 250 249 232 248 247 231 245 245 231 242 247 225 238 243 2202 231 242 215 235 238 205 234 230 190 231 228 185 230 225 182 228 220 180 227 218 175 225 217 173 218 218 174 215 210 175 210 205 180 208 201 Presença de Podridões Trat I Trat II Trat III 0 0 0 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 0 1 1 0 1 0 2 2 2 1 0 1 0 0 0 2 0 2 1 1 0 0 1 0 0 1 1 1 1 2 0 0 1 0 0 1 1 1 0 0 0 0 1 0 36 O tratamento I demonstrou que o processo de “DMD”, proporciona um aumento na quantidade de açúcares que é evidente, mas em menor proporção que o desenvolvimento do processo de passificação. Em ambiente protegido, as uvas ficam imunes às intempéries que podem ocorrer em maior proporção nas uvas mantidas ainda no vinhedo, como por exemplo, a ocorrência de chuvas e/ou ventos, muito prejudicial neste período de desenvolvimento dos cachos. A quantidade de açúcares poderia sofrer um aumento ainda maior se uvas fossem mantidas num ambiente controlado, com circulação freqüente de ar aquecido e com baixo índice de umidade relativa. ºBrix 25 20 15 10 5 0 1 3 5 7 Trat I 9 11 13 Trat II 15 17 19 Dias Trat III Figura 4: Resultados obtidos na análise de sólidos solúveis totais ou Brix pH 3,6 3,5 3,4 3,3 3,2 3,1 1 3 5 7 9 11 13 15 17 19 Dias T rat I T rat II T rat III Figura 3: Resultados obtidos nas análises de pH dos três tratamentos. 37 Peso dos cachos T rat I T rat II T rat III 300 250 200 150 100 50 0 1 3 5 7 9 11 13 15 17 19 Dias Figura 3: Resultados obtidos na pesagem das amostras dos tratamentos antes de serem realizadas as análises. 5.4 PESO DOS CACHOS Esta medição foi realizada para se analisar as perdas de água sofridas pelos cachos. No período inicial do processo de passificação, há uma maior evaporação de água. Como o cacho não recebe mais os líquidos da planta, pode perder uma maior quantidade de água que contém em suas bagas. Após este período inicial, há uma perda menor de líquidos na baga, porém da-se de forma mais efetiva o processo de respiração celular, diminuindo também a quantidade de líquido dos grãos. De maneira geral, houve uma perda de até 20% na quantidade de mosto das uvas. Pode-se afirmar que tal quantidade proporciona um mosto de qualidade superior e com maior quantidade total de açúcares. Em alguns casos, a chaptalização dos mostos não é realizada, o que diminui a incidência de custos sobre ao processo de elaboração de vinhos. 38 6 CONCLUSÃO Todos os tratamentos realizados demonstraram que o processo de passificação e/ou “DMD”, são eficientes para promover o aumento da concentração de açúcares nas uvas. Quando comparados os tratamentos entre si, as uvas mantidas em ambiente protegido sobre as grades de arame, apresentaram melhores resultados no aumento da concentração de açúcares nas bagas e no controle da podridão . Como perspectivas para o trabalho, poderia ser realizado um estudo analítico com a elaboração do vinho com as uvas obtidas no experimento, assim como desenvolver técnicas de utilização de ar quente em associação com o controle da umidade relativa, para proporcionar melhores resultados no aumento gradual da quantidade de açúcares nas bagas. 39 Anexo 1: Uvas antes de se iniciar o processo de passificação. Vinhedo da Vinícola Marco Luigi, Vale dos Vinhedos, Bento Gonçalves-RS. 40 Anexo 2: Aspecto das uvas após o processo de passificação em ambiente externo (DMD). 41 Anexo 3 : Aspecto geral das uvas colocadas em ambiente protegido sobre as caixas plásticas. Anexo 4: Aspecto das uvas no tratamento em ambiente protegido com as grades. 42 7 BIBLIOGRAFIA BLOUIM, J., GUIMBERTEAU, G.. Maturation et Maturité dês Raisins. Bordeaux: Édition Féret, 2000. 151p. DALL’AGNOL, I.. Efeito da Dupla Maturação Direcionada (DMD) na Composição e Qualidade do Mosto e do Vinho Cabernet Sauvignon. Bento Gonçalves: 2000. Trabalho de Conclusão do CSTVE. FLANZY, C. Enologia: Fundamentos Científicos y Tecnológicos. Madrid: MundiPrensa/AMV Ediciones, 2000. 783 p. GALET, P. Precis de Viticulture. 6ª Edição. Montpellier: Déhan Parc Euromédicine, 1993. 582p. GARAVAGLIA, J. Avaliação da Utilização de “Chips” e Barricas de Carvalho Francês em Vinho Cabernet Sauvignon. Bento Gonçalves: 2003. Trabalho de Conclusão do CSTVE. NAVARRE,C.. Agiculture D'Aujourd’Hui, Sciences, Techniques, Applications – L’Oenologie. Paris: Lavoisier-Tec & Toc, 1991, 322p. RIBEREAU-GAYON, et al. Trattato di Scienza e Técnica Enológica. Brescia: Edizioni A&B Brescia, 1980. 2 v. 455 p. 43 44