CENTRO HISTÓRICO EMBRAER Entrevista: Luís Carlos Affonso São José dos Campos – SP Fevereiro de 2007 Privatização A crise que se abateu na Embraer no final dos anos 80, eu costumo dizer na verdade que foi a conjunção de três crises. Primeiro, uma crise no cenário mundial com a guerra do Golfo, onde os preços do petróleo dispararam. Estávamos também vivendo o final da Guerra Fria, com as encomendas da área de defesa sendo drasticamente reduzidas. Várias empresas aeronáuticas do mundo fechando ou se juntando através de fusões e aquisições. Então, havia um cenário mundial negativo. O cenário no Brasil também de crise. A crise da guerra do Golfo afetou tremendamente a economia brasileira e a Embraer, como uma empresa estatal, dependendo de um governo que enfrentava tremendas dificuldades. Então, o modelo do estado empreendedor e das empresas estatais chegava ao fim. No final dos anos 80, as visões políticas e econômicas estavam mudando de forma acelerada. E a terceira crise é a da própria Embraer, que havia investido centenas de milhões de dólares num avião, o CBA 123, que não obteve sucesso. Não chegou nem a ser certificado e nenhuma aeronave entregue. Portanto, um investimento que não gerou retorno. Devo acrescentar também que a Empresa, como empresa estatal num governo sem capacidade de investimento e muito engessada do ponto de vista de gestão, não tinha como tomar as medidas adequadas até para enfrentar esta crise enquanto empresa estatal. Então, a conjunção destas três crises, o fato da Empresa ser estatal e dela ter tido insucesso num dos produtos, gerou uma crise muito grande na 1 Embraer. Foi um período duríssimo. Eu fiquei na Embraer todo esse período. Era muito difícil. A moral muito baixa de todos. Muita insegurança. Realmente, não havia certeza sobre o futuro. E eu acho que o que nos segurou neste período todo foi, basicamente, a certeza de todos de que se a Embraer fosse ter algum futuro, esse futuro passava por um novo avião, que seria um jato regional, o 145 (ERJ 145). Na época, eu fazia parte, de novo com uma equipe fantástica, então liderada pelo Satoshi, que era o gerente do Programa 145. Uma boa parte desse período eu fui gerente de engenharia de sistemas, a partir de 91. Então, nós sabíamos que se houvesse uma Embraer no futuro, essa Embraer passaria pelo projeto do 145. Então, era isso que nos segurava na Embraer. Mas foi difícil. Aviação Executiva O investimento inicial num novo avião ou numa nova plataforma é muito alto. Então, é muito natural que se busque maximizar a utilização desta plataforma gerando derivativos – outros aviões baseados naquele desenvolvimento inicial. Foi o que fizemos na plataforma do 145 (ERJ 145). Na aviação comercial, ele gerou, inicialmente, o 135 (ERJ 135), porque havia clientes com restrições a aviões com 50 assentos, que só podiam ter aviões de, no máximo, 37 assentos. Então, nós encurtamos o avião. Foi um projeto bastante simples - tirar um anel da frente e outro atrás da asa. Depois, nós fizemos o 140 (ERJ 140), que foi um outro passo na mesma direção, pois havia outros clientes que tinham restrições, mas agora não era com 37, mas com 40 assentos, e nós fizemos também um avião intermediário. Claro que foram aviões que venderam menos do que o próprio 145, mas nós já sabíamos disso desde início, pois foram aviões criados para atender objetivos de empresas que tinham certas 2 restrições, digamos, “artificiais”. Agora, a plataforma do 145 deu margem também a aviões na área de defesa – os aviões de early warning, os aviões de sensoriamento remoto, de patrulha marítima e outros, como os aviões empregados no SIVAM – e também essa mesma plataforma, baseada na verdade no 135 -, nos permitiu experimentar a aviação executiva, com a criação do Legacy. Felizmente, nós fizemos isso, pois foi um investimento relativamente pequeno, dado que a plataforma existia e nos permitiu conhecer este mercado e conhecer este cliente e hoje a aviação executiva está se transformando e espera-se que se transforme cada vez mais no futuro num importante negócio para nós. E o Legacy foi o “ponta de lança” desta iniciativa. Então, acho que o 145 foi não só o avião da virada, mas ele, na verdade, nucleou outros negócios na área de defesa e na área de aviação executiva. Sobre o nascimento do 170/190 (EMBRAER 170/190). Eu diria que, já em 97, nós víamos um movimento da concorrência em buscar o lançamento de aviões maiores do que o 145. Então, era algo que muitos na Embraer atentavam e olhavam com muito interesse. Eu me convenci muito sobre a nossa necessidade de fazer um avião de setenta ou cem lugares, como o 170 (EMBRAER 170) e o 190 (EMBRAER 190), ainda em 97, quando a American Eagle pediu cotações para aviões de 50 assentos e de 70 assentos. Nós apresentamos o 145 como a nossa opção para 50 assentos e para o avião de 70 assentos, nós fizemos um 145 espichado e alargado. Era um avião no qual nós tínhamos acrescentado tiras na fuselagem de modo que ele se tornou um avião com duas fileiras, o que nós chamamos de quatro abrest, com quatro assentos de frente. Mas o avião ficou horrível! Ficou péssimo o avião! Nós fomos lá oferecer porque nós não tínhamos mais nada a oferecer e não é também do nosso feitio não buscar um contrato. Mas o avião ficou muito ruim. E o 3 resultado foi que a American acabou selecionando o nosso avião de 50 assentos e selecionou o avião de 70 assentos da Bombardier, que era, no caso deles, um avião esticado de 70 lugares, porém, a plataforma deles já era um avião um pouco maior. Então, era um avião que ainda fazia algum sentido. Nessa oportunidade, em 1997, eu, na época era diretor de engenharia e o anteprojeto era uma divisão da engenharia, lembro de ter combinado ao Irano, que era o líder dessa área, que fizesse anteprojetos de aviões de 70 e 90 lugares. Eu guardo até hoje o primeiro relatório que foi feito e, nós tivemos ali que bolar requisitos junto com a equipe da DTE e com o Irano, e se nós olharmos este primeiro relatório, ele é muito parecido com a família 170/190 atual. Aquela visão foi criada, mas, evidentemente, que a Embraer acabava de certificar o 145. Em 97, os nossos principais esforços estavam voltados ao mock up do 145. É preciso lembrar, 97 foi o ano em que tínhamos o menor número de funcionários, acho que 3.700 funcionários. Ainda em 1997, a Embraer estava demitindo. Então, evidentemente, não parecia razoável que um avião como o 170/190 pudesse ser lançado naquele instante, o foco estava na produção e na entrada em serviço do 145, que também foi bastante desafiadora. Mas, eu me convenci ali, em 97. Vários outros colegas também que passaram também tinham esta visão. O Satoshi, que sempre foi muito inovador, também foi uma pessoa que logo viu. O Satoshi, aliás, estava nessa reunião com a American. Então, acho que para ele foi fácil perceber que o caminho para a Embraer era esse. Em 98, já no segundo semestre, nós realmente fizemos uma pesquisa de mercado, pois havia muita dúvida se faríamos um avião com quatro ou cinco abrests. Ou seja, numa seção transversal com quatro assentos, dois e dois com o corredor no meio, ou dois e três. Então, em 98 conversamos com quase 50% do mercado sobre preferências. Aí, a 4 ideia já amadurecia, com cada vez mais pessoas julgando que esse era o caminho, como Fred, Maurício, Antonio Luís, pessoas-chave no processo, se agregando e cada vez mais defendendo o projeto. Em fevereiro de 99 foi criada a diretoria do programa 170/190. Eu, então, saí da diretoria de programas e fui indicado para ser o diretor do programa 170/190. Um programa que ainda não existia. A primeira missão foi em conjunto com a área de planejamento estratégico, com o Herman e toda a equipe já agregando a fábrica inteira, para construir um plano de negócios, que finalmente foi aprovado em meados de 99. Antes de o programa ser lançado em Paris, em meados de 99, nós havíamos selecionado o motor, selecionamos a GE como fabricante do motor. E a nossa área comercial tinha conseguido capturar o cliente Crossair como o cliente-lançador do 170/190. Então, foi, eu diria, um processo muito interessante. Foi muito bacana ter participado e ter vivenciado. Mais tarde, claro, nós viemos a perceber que era um programa de muitos desafios. Mas eu falo isso depois. O programa 170/190 foi lançado em junho de 1999 e foi um programa de muitos desafios. Eu diria que este, provavelmente, foi o nosso programa mais desafiador. Certamente, para mim, foi o meu maior desafio profissional - a condução deste programa. Nós, em 99, estávamos atrasados. Já estava no mercado o CRJ-700, que era um avião de 70 lugares. A Europa estava bastante avançada no lançamento do AIR, que era um lançamento sempre iminente, acabou nunca acontecendo, mas era iminente, um lançamento que poderia acontecer a qualquer instante. E a Fairchild Dornier já havia lançado um avião de 70 e 90 assentos. Então, dos atores do momento, sendo que a Embraer e Bombardier estavam dominando o mercado de 50 assentos, a Embraer era a única que não tinha um produto na faixa de 70 a 90 assentos. Eu me sentia muito atrasado. A Bombardier já havia 5 capturado clientes importantes com 70 assentos, como a Lufthansa e a American Eagle. Nós precisávamos também de um cliente âncora, de um cliente de lançamento. Naquele momento, como nos Estados Unidos havia restrições, as scope clauses, as empresas regionais não podiam comprar aviões de mais de 50 assentos, ou a grande maioria delas, então era um mercado que parecia fechado. Parecia que no mundo, naquele instante, havia um único cliente possível, que era a Crossair. Ou seja, nós nos sentimos, na verdade, atrasados. Uma pressão muito forte para capturar aquele cliente lançamento e, sem dúvida, precisávamos fazer um avião inovador, pois os nossos competidores, como o Fairchild Dornier e o AIR eram aviões inovadores, eram aviões fly by wire. Nós não podíamos lançar um avião e já termos uma posição de desvantagem no mercado. Era um avião que estava sendo projetado para os próximos 30 ou 40 anos. Então, este conjunto de condições, esta janela de oportunidades muito restrita, nos levou a lançar um projeto e um programa bastante agressivo. E eu acho que era o que tínhamos que fazer mesmo, porque senão, nós não teríamos capturado o cliente lançador e, talvez, o programa jamais tivesse existido. Agora, essa agressividade resultou, como eu disse, num programa de muitos desafios. Um avião fly by wire, sem que nós nunca tivéssemos trabalhado nessa tecnologia. Nós decidimos fazer um avião fly by wire e aí fomos começar a descobrir os desafios associados a este mundo, que depois se revelaram bastante grandes, maiores do que nós podíamos imaginar. Um avião com dimensões grandes, maiores do que qualquer avião que havíamos feito. E nós também aprendemos, com bastante sofrimento ao longo do desenvolvimento, que o tamanho é importante. Os efeitos de elasticidade, de flexibilidade são muito pronunciados e nós ainda não tínhamos lições aprendidas, não tínhamos experiência 6 nisso. Um avião que foi lançado com prazo muito apertado – nós falávamos de 38 meses do lançamento à certificação de um avião com toda essa complexidade. Nos lançamos ao desenvolvimento de vários modelos simultaneamente. Ao final, foram quatro modelos simultaneamente. Inicialmente, eram três, mas depois passamos para quatro modelos. Todos simultaneamente, com diferenças da ordem de menos de um ano entre a certificação de um modelo e outro. Então, claro, isso acrescenta complexidade ao programa. Também, nós tínhamos restrições de custos a serem investidos. Esse foi um programa de 1 bilhão de dólares. Como lançar um programa de 1 bilhão de dólares? A Embraer, mesmo em 99, ainda estava crescendo, ela ainda não tinha condições e não parecia muito razoável arriscar tanto, colocar 1 bilhão de dólares num único programa. Então, nós criamos também uma formatação de parcerias de risco, que já tinha sido, na verdade, criada lá no 145 por necessidade, mas no 170, ela foi criada com o objetivo de reduzir investimentos, reduzir riscos e, claro, também melhorar a penetração no mercado. Então, a conjunção de todos esses, digamos, desafios, fez com que o programa fosse muito desafiador. Tanto que, no final, nós tivemos que atrasar um pouco. Não conseguimos atender o requisito original de prazo. Mas eu acredito, sinceramente, que se nós não tivéssemos aceitado estes riscos originalmente, talvez o programa não tivesse existido. A Crossair, na época, queria muito competir com a Lufthansa e ela iria comprar o Fairchild Dornier, que depois atrasou muito mais do que nós e acabou nem existindo, a empresa até faliu. Mas a Fairchild Dornier dizia que podia entregar mais cedo e, então, a Crossair, de certa forma, ameaçava ir com outro fornecedor e aí nos deixaria sem o cliente lançador. Bem, alguns detalhes sobre o desenvolvimento. Eu acho que mais uma vez foi uma experiência muito bacana. Eu tive a 7 oportunidade de trabalhar com times excepcionais, com pessoas de primeiríssima linha. Em conjunto, formamos uma equipe de programa espetacular e enfrentamos estes desafios todos aí. Soubemos superar as dificuldades, que foram muito grandes, seja na gestão de fornecedor, seja nos desafios técnicos. O avião certificado, ainda que com atraso, acho que ele atendeu - o que na minha visão é o mais importante - os requisitos básicos e mais importantes. Ele atendeu a performance, ele atendeu o consumo de combustível, ele atendeu o custo recorrente. Ou seja, ele estava bem posicionado ao final desse processo de desenvolvimento para ser um avião de sucesso como ele está sendo. A arquitetura do avião, o fato dele ser como dupla bolha, e várias inovações que fizemos, o fato dele ser fly by wire, que foi, sem dúvida, a solução de um risco grande, são fundamentais. Eu vejo que, hoje, o 190, se ele não fosse um avião fly by wire, ele teria poucas condições de competir bem com novos aviões que estão sendo lançados para competir nesse nicho de mercado. Então, foram riscos tomados, riscos, de certa forma, um pouco elevados, mas acho que o caminho era esse mesmo. Eu fico feliz que nós tenhamos trilhado este caminho. Agradeço muito as equipes que trabalharam comigo e que enfrentaram esses desafios. A entrada em operação da família 170/190 trouxe, eu diria, a confirmação do projeto do avião, quer dizer, passageiros reconhecendo o nível de conforto do avião, da dupla bolha, a adequação até a existência do mercado para aviões de 70 até 110 assentos. É preciso lembrar que, na época em que estávamos considerando lançar este produto, muitos diziam que este mercado não existia, “Olha, vocês vão lançar um avião para um mercado que não existe. Essa é uma terra de ninguém. Os aviões tem que ser ou de 50 assentos ou de 130 assentos. Vocês vão fazer um avião onde não há mercado”. E nós acreditávamos que na verdade havia sim mercado. 8 O que não havia era um avião projetado especificamente para este mercado e que tivesse sucesso. Também acreditávamos que as scope clauses nos Estados Unidos seriam flexibilizadas. E essas coisas aconteceram. E a entrada em serviço confirmou isso. Quer dizer, passageiros e pilotos confirmando essas visões. Como toda entrada em serviço, sempre existem ajustes a fazer. Os desafios do sistema do comando de voo e da aviônica muito integrada, claro que cobraram o seu preço na entrada de serviço e requereram muita atenção e até algumas modificações prévias. Eu diria, por outro lado, que nada diferente do que outros aviões, como o A320 e mesmo o 777 da Boeing, por exemplo, foram os primeiros aviões fly by wire da Airbus e da Boeing, requereram quando entraram em serviço. Mas também, claro, sempre lições aprendidas. Como eu mencionei o CBA 123, o 145, o 190 também trouxe muitas lições aprendidas. O lançamento do avião com mais tempo, mais tempo de projeto, iniciativas de redução de redução de risco, maiores iniciativas de maturidade. Então, sem dúvida, também foram grandes aprendizados que hoje nós já estamos utilizando, por exemplo, nos programas Phenom e em outros. Certamente, é todo esse aprendizado que está sendo utilizado. A Embraer deu seus primeiros passos na aviação executiva com o lançamento do Legacy, em 2001, com a primeira entrega em 2002. O Legacy é um derivado da plataforma do 145. O Legacy foi muito importante. Ele foi um enorme aprendizado. Ele foi uma escola para a Embraer, aprendendo os requisitos do mercado. O mercado de aviação executiva é muito diferente do mercado de aviação comercial. Os clientes são diferentes, seus requisitos são diferentes, sua forma e lógica de tomar decisão é diferente. E a Embraer vinha, claro, muito com uma visão do seu negócio principal, que era a aviação comercial. Então o Legacy entre 2002 que foi a primeira entrega até, digamos, 9 fins de 2004, foi um grande aprendizado, mas foi também uma história de sucesso. Demonstrou primeiro o potencial deste mercado de aviação executiva, demonstrou que se a Embraer focasse mais nesse negócio teria todas as condições de desenvolver as competências necessárias para ser vitoriosa nesse negócio, a ponto da alta direção da Empresa, em fins de 2004, tornar a aviação executiva uma das frentes de crescimento e diversificação da Embraer. É importante observar que a Embraer, com o sucesso das famílias 145 e 170/190 tinha, e ainda tem, os seus negócios muito concentrados na aviação comercial. Então, a estratégia de negócios voltada para o crescimento e diversificação na área de defesa, de serviços e também na área de aviação executiva. Então foi no início de 2005 em que eu fui convidado a deixar o programa 170/190 e a Vice-Presidência de Engenharia e Desenvolvimento, que na verdade era a minha função naquele momento, para atuar como Vice-Presidente da Aviação Executiva, em substituição ao Monteiro, na verdade, ao Samil, que primeiro iniciou este trabalho e, depois, o Monteiro. Dar continuidade ao importante trabalho que eles tiveram de lançar e quebrar as primeiras barreiras. Então, dar continuidade a esse trabalho, inicialmente sobre supervisão e me reportando ao Fred, mas à frente me reportando diretamente ao Maurício. E devo dizer, com condições muito mais favoráveis do que os meus antecessores tiveram, porque esta decisão estratégica da Empresa foi importante. A Embraer, realmente, nos deu à área de aviação executiva a habilidade e a autorização de estudar novos produtos. Logo, fizemos novos planos de negócio, que já vinha caminhando também antes da minha chegada. É um contínuo. Acho importante frisar a continuidade dos trabalhos. Mas esta nova fase que se iniciou em 2005 foi de grande foco. Uma organização dedicada para a aviação executiva, lançamento de novos 10 produtos - lançamos três novos produtos sem adição do Legacy: a família Phenom 100 e 300 e, em 2006, lançamos o Lineage, que é um derivado do 190, executivo com cama king size, chuveiro, um avião espetacular. A visão é lançar novos produtos, ganhar também competências na área de suporte. Não só os requisitos do avião para o cliente são diferentes, mas os requisitos de suporte ao cliente são muito diferentes. Um avião executivo não faz uma rota regular como um avião comercial. Você sabe onde atender um avião comercial. O avião executivo é como um carro, ele vai onde o dono quiser. Então, também a rede de suporte também teve que ser totalmente repensada e os resultados tem sido muito bons. Em 2005, a aviação executiva representava 6% ou 7% da receita da Empresa e, já em 2006, ela representou 15% da receita, basicamente duplicando a nossa participação e a receita dessa unidade de negócios e também chegamos muito perto de dois bilhões de dólares em vendas em 2006. Pela primeira vez, a aviação executiva tem uma participação de algum significado ou representativa na carteira de pedidos da Empresa. Então, também tem sido um trabalho muito desafiador e muito gostoso. Pessoalmente, também muito interessante, porque eu já estava lá a cinco ou seis anos no 170/190. Era um momento em que os quatro aviões já tinham voado, dois estavam certificados e os outros dois estavam muito bem encaminhados, a equipe do 170/190 de muita maturidade – Mauro Kerr, Campello, Emílio na área da engenharia. Enfim, uma equipe de primeiríssima qualidade. Foi muito tranquilo sair do programa 170/190 e tem sido muito desafiador, continuo aprendendo muito agora também na aviação executiva. Aliás, tem sido uma constante. Acho que é algo da Embraer. Aqui, as possibilidades de continuar aprendendo são infinitas. 11 Embraer e Futuro Eu vejo hoje a Embraer como uma empresa muito bem posicionada na área da aviação comercial. Diria que a Embraer, a direção da Embraer e os controladores da Embraer, em todos os seus níveis, tomaram as decisões corretas de apoiar e lançar o 170/190 (EMBRAER 170/190). Nosso principal concorrente, que é a Bombardier, e que ficou considerando e acabou não lançando; hoje o mercado vê como a Embraer tendo tomado a decisão corajosa de fazer um avião tão grande para 100 assentos e a Bombardier como tendo perdido a oportunidade. Ela perdeu a janela de oportunidade. Então, eu vejo a Embraer muito bem posicionada na aviação comercial. As novas iniciativas na aviação executiva vão avançando bem. Eu acho que essa é realmente uma fronteira de grande crescimento para o futuro. A Embraer está dando importantes passos na área de serviços com a criação de uma divisão voltada a serviços e, em breve, de uma unidade de negócios voltada a serviços. Certamente é uma oportunidade de crescimento. E também na área de defesa, que é um mercado bastante difícil, pois as influências geopolíticas são muito fortes, mas eu vejo a Embraer também com iniciativas muito acertadas nessa área. Talvez com prazo um pouquinho mais distante, mas também grandes oportunidades na área de defesa. Do ponto de vista de desafios, os desafios são enormes. O nosso mercado é muito competitivo. O Maurício Botelho gosta de dizer que quem anda mais devagar no nosso mercado voa. E é isso mesmo. Qualquer instante perdido significa perda de competitividade, pois os competidores estão avançando. Então, o desafio de manutenção da competitividade, seja da competitividade de projeto e desenvolvimento, ou seja, nós nos mantermos no estado da arte, é um desafio. O desafio da eficiência operacional. A Embraer se transformou numa Empresa complexa. A 12 Embraer na época do 145 (ERJ 145), aquela época heróica da virada, era uma Empresa de um produto só. Era uma empresa onde era possível gerenciar de cabeça, exagerando um pouco. Mas era mais simples. Hoje, a Embraer tem vários produtos, tem vários sites, tem vários negócios e, portanto, ela precisa investir em eficiência operacional para gerenciar este crescimento de forma eficiente. Tem sempre o desafio de criar e reter talentos. A Empresa é feita pelas pessoas. E hoje o mercado é totalmente aberto, as pessoas têm mobilidade. É criar, é agregar, é treinar e é reter talentos. São muitos desafios, acho que dá para passar duas horas falando. Mas acho que a Embraer tem sabido, com garra, com criatividade, com competência e muita paixão, enfrentar os desafios. Eu tenho certeza absoluta que vamos continuar fazendo isso e vamos continuar vencendo. Eu diria que a cultura da Embraer, hoje, é realmente um amálgama de duas culturas – a cultura da Embraer estatal – uma empresa que nasceu do ITA, do CTA, do ambiente acadêmico e de certa forma militar, e a cultura trazida após a privatização, uma cultura empresarial. Acho que nós somos muito felizes. A Embraer teve muita felicidade de ter tido os líderes que teve nas várias fases que teve e de ter conseguido fazer a fusão dessas duas culturas buscando o que há de melhor nelas. A Empresa nasceu do ITA e do CTA e, portanto, buscava a excelência técnica – foi esse o objetivo estratégico inicial – de engenharia, de desenvolvimento, de manufatura. Conseguiu atingir isso, mas nós poderíamos ter perdido isso na nova fase. Eu acho que foi uma condução brilhante, a agregação de novas competências e de novas culturas sem perder as competências essenciais, as core competences tão importantes para esse negócio. Eu vejo a cultura como o resultado desse processo. Agora, qual é a nossa cultura? Acho que uma cultura primeiramente de integridade, de elevados padrões, de elevados 13 princípios de integridade. Acho que é um excelente exemplo para o Brasil. É triste dizer, mas muitas pessoas e os nossos fornecedores se surpreendem como as coisas são gerenciadas aqui, mas é uma integridade em tudo. Integridade na escolha de fornecedores, no trato com o cliente. É uma cultura de foco no cliente. Nós falamos que o sustentáculo de nossa ação empresarial é o foco no cliente, é trazer os resultados através da satisfação do cliente. Então, eu acho que esta é uma cultura importante. A cultura da excelência permanece. É preciso fazer diferente, é preciso ser inovador, é preciso fazer melhor do que os nossos competidores. E é preciso mesmo. Baseados aqui no Brasil, se nós fizermos igual, nós já estamos em desvantagem. Nós temos que fazer melhor. É a cultura do fazer acontecer, da obstinação pelos resultados, da dedicação. É realmente da obstinação, do will power. Eu acho que a Embraer também tem a cultura da abertura, isso é algo que sempre me atraiu muito. Sempre falei isso para os meus subordinados, para os meus colaboradores, de nós buscarmos, não podemos ter pano preto. Trabalho em equipe é um trabalho com abertura, com objetivo comum. É o senso de equipe. Acho que a nossa cultura é um conjunto desses pontos todos. E agora também, uma cultura, eu diria mais recentemente, de consciência social, de governança corporativa. Não que isto não existisse no passado, mas hoje isso é muito mais explícito até em função da Empresa hoje ser uma empresa privada. Também a questão da boa governança e da boa gestão. Espero ter coberto todos os pontos, que são muitos sobre a cultura. 14