CAPITULO 5 Laudo Psicol6gico: A Expressao da Cornpetencia Profissional por Raquel Souza Lobo Guzzo & Luiz Pasquali I. lntroducao o laudo psicologico e um importante instrumerito de traba lho para 0 profissional de Psicologia. Em todas as situacoes em que atua, 0 psicologo se utiliza do laudo como uma conclusao sobre uma avaliacao realizada, a partir da qual importantes consequen cias podern estar contribuindo para 0 planejamento de uma inter vericao de qualidade ou, ao contrario, scm resultados efetivos, aperias constatando 0 que parecia obvio. Por esta razao, 0 laudo psicologico pode ser considerado uma ex pressao da competencia profissional. Espera-se que a partir dele medi das possam ser tomadas para intervencoes colerivas ou individuais. A importancia do laudo serve nao somente ao psicologo, mas, principal mente, aos outros profissionais cujo trabalho depende dos resultados de uma avaliacao psicol6gica, como juizes, profess ores e medicos. No Brasil, durante muito tempo a elaboracao de urn laudo psico logico foi pouco discutida e assistida, canto no ambito cia formacao basica quanto do exercicio da protissao em diferentes contextos. Era ....... 156 Tfc~ICAS DE EXAME PSrCOLClc,rco - TEP L"CDO PSrCOLC)(;ICO: A EXPRES sAo [H CmIPETE~ClA PROF!SSION."L como se, ao aprender uma tecnica especffica de avaliacao psico16gica, de forma autornatica, 0 laudo sobre este exame pudesse ser executado sem necessidade de atencao especffica a esta fase do processo avaliativo. No entanto, atualmente, por terem se tornado ineficientes em rela<:;ao aos seus prop6sitos de subsidiar acoes e decisoes para com sujeitos e grupos, os laudos psico16gicos vern sendo objeto de estudo e assumindo urn espaco importante na formacao e no exerdcio profissional. A pratica profissional tem mostrado que a elaboracao de lau dos psico16gicos em diferentes contextos de atuacao tem se mos trado diffcH e sem resultados, sobretudo no Brasil, e que uma ateri <:;ao a este memento do processo avaliativo deve subsidiar a forma cao de profissionais nesta area. o objetivo deste capitulo e definir 0 que e 0 laudo psico16gico, seus objetivos e conseqiiencias, como tern sido realizados no Brasil, e apresentar orientacoes, diretrizes e precaucoes para 0 exerdcio profissional adequado quanto a sua elaboracao, principalmente con siderando os principais desafios profissionais relacionados a esta questao para os psicologos brasileiros. 2. 0 que e0 laudo Psico/6gico? Para definir 0 laudo psicologico, e necessario considera-lo como o resultado de urn procedimento de avaliacao. Deve-se partir, portan to, de consideracoes sobre 0 que seja a Avaliacao Psico16gica. entendimento sobre 0 que significa a avalia<;;ao psico16gica passa pela compreensao do sentido da palavra avaliar, ou seja, julgar, medir, determinar valia ou valor, apreciar, estimar, calcular, computar (Ferreira, 1986). Todas estas acoes ocorrem com bastante freqliencia na vida cotidiana, porern nern sempre de forma precisa e objetiva. A precisao, a clareza e a objetividade em situacao de avaliacao profissional sao importantes e nccessarias, pois tornam 0 laude psico16gico um docu rnento comprobat6rio de significativas alteracoes na vida de indivi duos e grupos e justificarn a intcrvencao realizada, Os resultados da avaliacao devem ser precisos e objetivos, de tal forma que outras o ! I I I I I 157 pessoas possam compreender 0 processo de analise realizado, bem como os criterios para as conclusoes ali chegadas. Existem diferentes formas da avaliacao, as quais, em cad a contex to onde ocorrem, apresentam significados especificos e consequencias tarnbem especificas. Em uma avaliacao profissional, no entanto, ha que se estabelecer a priori 0 procedimento de coleta das informacoes, seus instrumentos e forrnas de medida para que se possa chegar a conclusao do processo. 0 laudo, portanro, como conclusao de urn procedimento especffico, e situado em urn contexto hist6rico e social, deve ser apre sentado sob forma escrira, para impedir sua modificacao. Urn retrato do mornento, uma analise de perspectivas para 0 problema, uma compreensao do que acontece, estas sao as razoes do laude psicologico. A expressao "avaliacao psicologica" tern sido utilizada para de nominar um processo de investigacao, analise e conclusao sobre um sujeito em contexte e fase de vida especificos, com a finalidade de uma compreensao sobre ele e tomada de decisao quanta a urna intervencao necessaria. Como um processo de investigacao, e preciso que se faca a distin <:;ao entre 0 resultado do laudo e os resultados de um teste ou outro instrumento medida ou coleta de dados sobre 0 sujeito, incluidos no processo como um todo. A avaliacao psicologica e urn conjunto de procedimentos para a tomada de informacoes de que se necessita e nao deve ser entendida como um momenta unico em que urn instrumento poderia ser sufici ente para responder as questoes relacionadas ao problema que se pre tende investigar (Guzzo, 1995). Geralmente, inclui diferentes proce dimentos de medida, identificacao de dirnensoes especfficas sobre 0 sujeito e seu ambiente. A cada procedimento de medida ou investiga cao tem-se um resultado sfntese, 0 qual nao pode ser confundido com o resultado final do processo, a que se atribui 0 significado do laudo. Hoje, considerada como area especifica de conhecimento dentro da Psicologia, a Avaliacao Psico16gica inclui pesquisas, tanto sobre 0 processo avaliativo quanta suas tecnicas. A Associacao Americana de Psicologia - APA mantem uma secao dedicada a Avaliacao Psicologi ca, responsavel por publica<:;oes espedficas, tais como Psychological -~ 158 ! i , I I ,I ! J LAUDO P:;JCOLC~GICO: A EXPRESS,\O DA COMPHENC\.\ PROFlSSIOI'AL TtCNICA:; DE E:V\\IE P:;rCOLOC;ICO - TEP Assessment. Outros paises e associacoes cientfficas de psicologia, considerando a importancia deste assunto para a qualidade da for macae e exerdcio profissional, tambern dedicararn-se a aglutinar pesquisas sobre a avaliacao psicologica em publicacoes especiais, como e 0 casu da Revista Iberoamericana de Avaliac;ao Psicol6gica (Associacao Ibero-Americana de Avaliacao Psicol6gica), European Journal of Psychological Assessment (European Association of Psyhcological Assessment) e a Revista Brasileira de Avaliac;ao Psu:o 16gica, recern-criada pelo Instituto Brasileiro de Avaliacao Psicolo gica, para citar apenas algumas. A leitura dos trabalhos publicados nestas Fontes torna evidente o volume de investigacoes, conclusoes e debates ace rca do processo da Avaliacao Psicol6gica, bem como de suas mais variadas formas e contextos. Atualmente, 0 termo Avaliacao Psicol6gica tem sido utilizado no lugar de Psicodiagn6stico, por ser mais abrangente e envolver 0 pro cesso em diferentes campos de atuacao. Psicodiagn6stico, tal como era designada tradicionalmente esta area, esta mais relacionado a avalia <,;:3.0 em contextos de intervencao clmica. Mas, independentemente da terminologia utilizada, esta area cia Psicologia evolui com muita rapi dez. Por esta razao, profissionais, estudantes de psicologia, bem como seus professores, necessitam estar em constante aprimoramento, so bretudo em relacao a evolucao na construcao, adaptacao e validacao de instrumentos de medidas ou procedimentos outros de avaliacao do fenomeno psicol6gico. Nao se pode elaborar laudos psicologicos sem um aprimoramento necessaria na area da Avaliacao Psicol6gica. Da mesma forma nao se pode excrcer a protissao de Psicologia sem 3 preocupacao epistemol6gica sobre 3 medida do fenomeno psicol6gico. A area da Psicologia como profissao fica <omprometida quando as rormas e coruextos de avaliacao psicologica i1~10 ten, rervesenrarividade e respeito dos p'5prios profissio nais. Em : tiC!. tese de courorado, Noronha Ct 999) pesqtrsou a relacao psicologica de 21";' psicologos credenciados. em exercom Ci Clci( G:::.o. 2TiC0l1trou, i-:rn prilnc-irc urn grande r.~.'):TlerCI DrohsS1Gl~(~,-:~ ._~',:.:s·~a anlcstra que n2~(} rc:,ponder':-irLl as quest6es ~~'-'i>:(:,as ~ohr i·~c-C1n(~f\tos '--: disserc-lm naG r~ 159 avaliacao. Quem fazia avaliacao em sua pratica indicou instrumentos de personalidade como os mais utilizados, depois de urna medida de avaliacao intelectual que nem sequel' esta norrnatizada para a realida de brasileira. Indicaram ainda, como mais graves problemas nesta area, exatamente a falta de instrumentos nacionais e pesquisas para afericao dos processos de avaliacao e instrumentos para a realidade brasileira. Apontararn tambem as dificuldades em avaliar criancas, sobretudo aque las com necessidades especiais, e tambem formas especfficas em dite rentes contextos de atuacao. Este trabalho demonstra que discutir a avaliacao psicol6gica no Brasil e decidir por f01111as mais adequadas de formacao profissional ainda continua sendo uma das grandes urgencies e prioridades para a profissao. Historicamente, a Avaliacao Psicol6gica tem sido associada a me dida psicol6gica e, como conseqiiencia, 0 laudo psicol6gico ao resulta do de urn teste. Este equivoco acabou par conrribuir para grandes difi culdades, sobretudo no Brasil, em relacao ao planejamento de politicas para a formacao profissional nesta area, em que 0 estudo das T ecnicas do Exame Psicol6gico se diferencia do estudo da Avaliacao Psicol6gica. Ensinam-se nos cursos de Psicologia diferentes tecnicas sem uma preo cupacao maior no processo de investigacao do qual uma avaliacao deve resultar. As consequencias desta formacao acabam par limitar a acao profissional em sua funcao laudatoria, tornando os laudos instrumentos pouco eficazes para 0 planejamento de uma acao interventiva. Aprender tecnicas do exame psicol6gico de fonna isolada e pontual nao assegura a competencia profissional para elaborar urna conclusao sobre um processo de avaliacao, ou seja, um laudo eficaz. o processo da avaliacao psicologica envolve a aplicacao de dife rentes tecnicas, mas deve ser compreendido como um procedimento independente que se utiliza dos resultados de medidas especificas para a compreensao de toda a investigacao. Este processo se inicia com a analise da queixa ou motivo da avaliacao, seguindo-se pelo planeja mento das estrategias de investigacao e a conclusao. Especialistas nes ta area tern chamado a atens;ao para a necessidade do detalhamento de um conjunto de caracteristicas para a sfntese laudat6ria como uma expressao conclusiva sobre 0 que se investigou (Azevedo, Almeida, Pasquali & Veiga, 1996). ......... 160 TECNIC.\S DE EXA'IE P,ICOLOGICO - TEP LAUDO PSICOLl)GICO: A EXPREssAo DA COMPETENCIA PROFIS,IONAL 3. Para que Serve urn Laudo Psicol6gico? A importancia da avaliacao psicologica e de sua conclusao esta, de fato, relacionada a importancia da profissao, ria medida em que ambos os processos contribuem para a tornada de decisoes sobre urn indivfduo, para a resolucao de urn problema apresentado por urn agente educador, pai ou outro adulto que interage com uma crianca ou ado lescente. 0 laudo serve ainda para identificar caracteristicas de indivi duos ou de grupos, de forma a compreender seu processo de desenvol vimento ou para 0 planejamento de intervencoes. Segundo Batsche e Knoff (1995), 0 resultado ou efeito de urn laudo e avaliado pela apropriacao das suas conseqiiencias, ou seja, nao existe possibilidade de se completar urn laudo apenas pel a apresenta cao de suas conclusoes. A finalidade de urn laudo esta diretamente relacionada a qualidade da intervencao que ele sugere, assim que este processo de decidir sobre 0 que se esta avaliando e avaliar 0 efeito desta decisao sobre 0 desenvolvimento do sujeito passa a ser a dinami ca mais importante no processo de avaliacao psicologica. De acordo com esta ideia de que urn laudo psicologico esta es treitamente ligado a intervencao que ele pr6prio sugere, pode-se com preender por que a avaliacao psico16gica no Brasil vern sofrendo urn descredito cada vez maior, mesmo dos profissionais de psicologia que nao conseguem romper com a "burocracia" das avaliacoes realizadas em diferentes contextos de atuacao profissional. Faz-se avaliacao, por que a lei exige. 0 avaliador, geralmente, nao tern 0 menor compromis so com a intervencao consequence. De uma forma muito presente em meio as arividades profissionais da psicologia (Brandao, 1995; Benzi, 1996; Ciasca, 1990; Noronha, 1995), as avaliacoes realizadas na maio ria das vezes resultam em encaminhamentos a outros profissionais, 0 que significa .Iizer cornecar nova mente 0 processo de avaliacao, agora em um contexte diferente. Alguns autores como Mash e Terdal (1988) idennficaram quatro finalidades para a avaliacao psicologica que produzem diferentes tipos de laudos: (a) 0 diagnostico, (b) 0 progn6stico, (c) 0 delinea mento da intervencao e (d) a avaliacao da eficacia da intervencao proposta. A primeira finalidade do laudo parece ser a mais conhecida 161 e disseminada entre os psicologos brasileiros. Avalia-se para identi ficar causas de queixas apresentadas. Ja 0 conceito de progn6stico parece receber pouca ou nenhuma atencao dos psic6logos brasilei ros. Para Batshe e Knoff (1995), esta finalidade do laude parece estar relacionada a severidade do problema diagnosticado e nao a qualidade da intervencao proposta. Assim, quanto rnais grave 0 pro blema, pior 0 progn6stico, ao pas so que, quanto menos grave, as perspectivas de melhora podem ser mais evidentes. A relacao entre severidade e gravidade de urn problema esta, segundo ainda estes autores, relacionada a resistencia apresentada a intervencao. Des ta forma, a avaliacao da intervencao incluida no laudo pode contri buir para sua finalidade progn6stica. Para os mesmos autores, 0 pro cesso de avaliacao e sua conclusao passa por etapas que incluem a identificacao do problema e procedimentos por meio de desenvolvi menta de hip6teses, seguindo-se a avaliacao propriamente dita das hip6teses identificadas com a aplicacao de provas, testes e coleta de inforrnacao sobre 0 que se esta investigando, finalizando com 0 planejamento de intervencao associada a verificacao das hip6teses estabelecidas no inicio da avaliacao. Por esta razao, em suas diferentes finalidades, 0 laudo deve indi car, sobretudo, 0 tipo e as condicoes de intervencao a que 0 sujeito avaliado deve ser submetido, levando-se em conta todas as suas con dicoes e historia de vida, deixando claras as hip6teses pelas quais se esta planejando e desenvolvendo a intervencao. 0 laudo passa a ser urn referencial para a verificacao e a comprovacao das decisoes toma das sobre urn sujeito ou urn grupo. 4. Como Tern Sido Realizados os Laudos Psicol6gicos? I Pela falta de formacao adequada e especffica ria elaboracao dos laudos, profissionais tern reproduzido nestes os resultados de alguns testes, sem levar em conta inforrnacoes tomadas do indivi duo em seus contextos de desenvolvimento. Ha laudos que apre i ~ . 162 TEC"lCA5 DE EXAl-IE P51COLCl(;lC'C' - TEP LAllDO PSICOLOGICO: A EXPRES"Ao DA CO:-1PETENCL'c ['!\L'cISS[L'ClAL sentarn um conjunto de resultados de testes sem um sentido geral do que cada uma destas avaliacoes represent a no problema apre sentado au na sua forma de solucao. Este tipo de laudo cumpre com requisitos legais, porern sao ineficazes na tomada de decisoes sobre cad a caso especifico. No processo de avaliacao psico16gica, outros problemas acabam contribuindo para uma ineficacia na elaboracao dos laudos. Um dos mais graves e a utilizacao de instrumentos de medida nao apropriados para 0 contexto e a situacao de avaliacao. A inapropriacao dos testes e instrumentos de medida psicologi ca no Brasil vem sendo ha tempos denunciada (Wechsler, 1998), e medidas para a melhor formacao profissional e para a adequacao de instrumeritos vern sendo desenvolvidas em laborat6rios universi tarios com vistas ao incentivo das pesquisas que ajustem as testes a realidade brasileira. Outro grande problema tem sido a aplicacao de um conjunto de provas e medidas de diferentes dimensoes e com pressupostos te6ricos incompativeis, 0 que torna dificil uma sintese do que foi efetivamente investigado. Neste caso, alguns laudos, especialmente em alguns con textos de atuacao, tern sido apresentados de forma padronizada, nao contribuindo em nada para a tomada de decisao sabre as indivfduos e a planejamento de intcrvencoes adequadas. 163 avaliacao psicologica, assim como a aprimorarnento de propostas de formacao daqueles que ensinam psicologia au dos profissionais que se utilizam da avaliacao. Com este espfrito, Hambleton (1994) des en volveu 22 diretrizes para a adaptacao transcultural de instrumentos de medida, de pais que avaliou um dos principais problemas nesta area, ou seja, internacionalmente, a dificuldade de construir medi das em diferentes culturas e contextos e ao me smo tempo a inadequacao da utilizacao apenas traduzida de instrumentos de medida construidos e desenvolvidos em outros paises. Desde a inicio da dec ada de setenta, esta preocupacao ja fazia parte dos pesquisadares mais diretamente envolvidos com a quesrao da avaliacao psicologica e seus elementos mais cons titutivos, como as ins trumentos de medida e a laudo. Brislin (1970) apontava a dificuldade em se fazer pesquisas transculturais com as medidas psicol6gicas exis tentes na epoca e sugeria que cuidados deveriam ser tom ados para que as instrumentos de medida, ao serem utilizados em diferentes culturas, passassern por um processo de adaptacao para a desenvolvimento de uma medida equivalente, sem as problemas que uma simples traducao pode trazer. Mesmo com recomendacoes presentes na literatura desde essa epoca, no Brasil pesquisadores e psicologos ainda insistem em tra duzir e aplicar instrumentos de medida sem a devida adaptacao. Estes problemas tornarn a avaliacao psicologica vulneravel a enos e inadequacoes com graves consequencias para a vida do su jeito avaliado e a respeito a profissao de Psicologo. A principal iniciativa a ser tomada pelos psic6logos brasileiros de veria estar relacionada a alteracao na forma como as profissionais vern sendo farmados e a investimentos prioritarios na pesquisa com instru mentes psicologicos. Com a grande pressao profissional par instrumen tos de medida e uma perspectiva de bans resultados na vendagem de testes, editoras acabam por publicar varias medidas sem qualidades psicornerricas, que, portanto, nao poderiam ser utilizadas para a avalia <;:ao psico16gica. Este tern sido um grande desafio para aqueles que estao realmente preocupados com esta questao. Sem medidas adequadas, sem formacao completa, sera dificil 0 profissional de Psicologia demonstrar sua competencia profissional e, como consequencia, os laudos psicologicos continuarao a ser mais uma 50 Orientacoes, Diretrizes e Precaucoes para a Usa de Testes e Elaboracao de Laudas Psical6gicas o uso de testes em situacao de avaliacao psicologica, assim como todo 0 processo desde a construcao de instrumentos de medida ate sua adequacao psicometrica a realidade onde sera aplicado, tern sido preocupacao da International Test Comission, urna associacao criada por pesquisadores da Avaliacao Psico16gica para oriental' a busca de qualidade tecnica minima dos instrumentos utilizados, 0 estimulo ao desenvolvimento de provas e testes para as diferentes realidades de I ~ r 164 TEC~ICAS DE EXAME PSICOLllCilCO - TEP peca de uma burocracia que pouco resolve os problemas tanto do indi vfduo que procura a avaliacao quanto do profissional que a executa. As mais recentes diretrizes para a elaboracao de um processo de avaliacao psicol6gica apresentadas pela International Test Commission em Graz, na Australia, em 1999, sao justificadas, prin cipalmente, pelas diferencas existentes entre paises no grau de con trole em que os profissionais sao form ados para 0 exerdcio compe tente da avaliacao psicologica. Ainda sao consideradas as dificul dades de acesso a materiais variados para a avaliacao que possam ser, de forma confiavel, aplicados a realidade das diferentes popula coes. Outra justificativa para a deterrninacao destas diretrizes e a violacao de copyright sem 0 conhecimento previo e autorizacao dos autores do teste ou dos editores. Estas diretrizes incluem padroes eticos e profissionais para 0 exer cicio da avaliacao psicologica, os dire itos que possuem os sujeitos en volvidos no processo de avaliacao psicologica, a escolha e a avaliacao de instrumentos alternativos em caso de problemas na determinacao de provas para 0 processo diagnostico, administracao das provas e ava liacao dos resultados, e finalmente 0 laudo escrito e a devolutiva. To dos estes aspectos detalhados no documento desta comissao interna cional sao sugeridos como elementos fundamentais para a formacao do profissional de psicologia. Alem destes itens, as diretrizes tambem apresentam padroes para a construcao de testes, documentacao para 0 usuario, como manuais e materiais de divulgacao, e padroes para a manutencao de um sistema de avaliacao e controle de cada prova em termos de sua validade e precisao. Seria importante que houvesse um comprometimento com uma proposta nacional de investimentos e conscierrtizaciio sobre a im portancia da avaliacao psicologica entre protissionais e estudantes de psicologia. Com esta medida, a profissao poderia dar um salro em seu reconhecimento social e real contribuicao ao bern-esrar das pessoas e dos diversos grupos sociais. Mesmo com melhoramentos nas condicoes de formacao dos pro fissionais e na oferta de instrumentos divers os para a avaliacao psico logica, 0 laudo em si necessita de urn padrao aceitavel de elaboracao, geralmente con tendo elementos importanres do processo de avaliacao LAUI)O PSICOUJC;rco: A EXPRESS~O DA cmlPETENCIA PROFISSIOI>:AL 165 realizado. Esta estrutura depende em grande parte do objetivo da avaliacao, mas, de maneira geral, consta de tres grandes partes: a historia do individuo com 0 motivo da avaliacao, as provas realiza das e seus resultados gerais e a conclusao corn os indicadores de intervencao. Uma sugestao de detalhamento para a elaboracao de laudos psicologicos depende do contexto em que esta sendo aplica da a avaliacao psicol6gica, mas, de modo geral, estrutura-se desta forma, principalmente relacionando a conclusao do processo com as possibilidades de intervencao. Sem esta estrutura, 0 laudo continua um instrumento ineficaz que aperias cumpre exigencias burocrati cas e pouco ajuda no processo de decisao sobre individuos e grupos. 6. Como Elaborar urn Laudo Psicol6gico o laudo e uma pec;:a escrita (deve-se evitar a devolucao oral, porque pode ser facilmente distorcida) na qual peritos expoern observacoe s e coric lusoes a que chegaram num processo de psicodiagnostico ou avaliacao psicologica. Trata-se de um parecer tecnico de avaliacao psicol6gica do individuo, 0 qual visa subsidiar profissionais e tomar decisoes. Assim, ele constitui a ultima etapa de um psicodiagn6stico ou avaliacao psicol6gica, consistindo na devolucao dos resultados obtidos neste mesmo processo Como 0 processo de avaliac;;ao po de ser realizado com objetivos os mais variados, assim 0 laudo deve ser congruente com estes obje tivos. Vejamos. ~_. 6.1. 0 Psicodiagnostico 1. Definic;;ao: "Psicodiagnostico e um processo cientifico, limitado no tempo, que utiliza metodos e tecnicas psicologicas (input), a nivel individual ou nao, entendendo, 8. luc de principios teori cos, os problemas, identificando e avaliando aspectos especffi cos, classificando 0 caso e prevendo seu curso possivel, para comunicar resultados (output)" (Cunha, Freitas & Raymundo, 1986, p. 9). 166 TECNICA;'; DE EXAME PSICOLC'GICO - TEP 2. LAUDO PSICOLc'lGICO: A EXPRES;,;Ao LH COMPETENCIA PROFISSIONAL Elementos: 0 psicodiagn6stico comporta geralmente uma serie de elementos; muitos destes devern ser levantados em entrevis tas e podern ser elencados como segue: • contrato de trabalho: contrato entre cliente ou responsavel e a • psic6logo, estabelecendo os objetivos e 0 processo de psicodia gn6stico; • dllrac;;Cio: no contrato deve ser dada uma estimativa do tempo (rnimero aproximado de sess6es) que a avaliacao vai exigir; • • instrumentos: testes que serao utilizados no processo de avalia cao; • historia clinica: levantarnento da hist6ria do problema do su • • • • 3. • jeito que iniciou 0 processo de avaliacao; objetivos: definicao dos objetivos especfficos a serem atingi dos pela avaliacao (veja objetivos a seguir): hipoteses: no final da avaliacao, 0 psic6logo deve chegar a es tabelecer hip6teses explicativas sobre 0 problema avaliado, de sorte que possa dar encaminhamento e sugest6es de inter vencao para 0 caso; prognostico: 0 psic6logo deve dar uma previsao de possivel cursu que 0 casu vai tomar; comunicac;;Cio dos resultados: eo laudo (veja adiante). • 4. 1ft f? ,:; aprofundado. Esta avaliacao e tipicamente feita por psico logos e psiquiatras e visa um possfvel tratamento psicotera pica do casu; entendimento dinamico: com base na teoria psicol6gica da personalidade, identificar a estruturacao de uma psicopa tologia do desenvolvimento que se instala no decorrer do crescimento do sujeito em interacao com seu arnbiente; classiiicaciio nosol6gica: consiste na avaliacao de problemas psicopatologicos, objetivando classificar 0 casu dentro da ta bela de classificacao psiquiatrica (DMS); forense: consiste na avaliacao psicol6gica para fins judiciais, geralmente para deterrninar niveis de sanidade ou insanida de mental de reus; progn6stico: avaliacao psicologica para determinar 0 cursu pos sivel de um casu clinico. Etapas: os passos de um processo psicol6gico (modele psicodi agn6stico) seguem os seguintes mementos: • identificar: consiste em (1) levantar 0 motivo da consulta (entrevista) e (2) selecionar, aplicar e interpretar os testes para a avaliacao: • integrar: consiste em consolidar todos os dados obtidos na Objetivos: Um psicodiagn6stico pode ter as mais variadas finali dades, quais sejam: • classificac;;Cio simples: consiste em dar 167 etapa anterior; • inferir: tirar as consequencias para 0 casu que os dados da etapa anterior permitem, isto e, trata-se de levantar hipo teses explicativas para os resultados obtidos sobre 0 caso; • intervir: trata-se de (1) comunicar os resultados ao sujeito ou responsavel (laude) e (2) sugerir tipo de intervencao apropriada para 0 casu (terapia, encaminhamento). perfil psicol6gico do sujeito que resulta da aplicacao dos testes, interpretados se gundo normas destes; dcscrir;;ao: consiste no perito (psicologo, psiquiatra, ...) deta ihar a presenca ou nao de sinais e sintomas de disnirbios psicopatologicos (nao precisa fazer usa de testes); tirevenr;;ao: consiste na identifica<;ao precoce de vulnerabi lidades a problemas psicol6gicos do sujeito, fazendo urna avaliacao de caracterfsticas fortes e fraquezas deste para enfrentar dificuldades e conflitos na vida; avaliac;;ao: consiste em identificar os indicadores de um dis tiirbio Oll psicopatologia por meio de urn processo mais 0 6.2.0 Laudo 1. Definic;;ao: trata-se da devolucao ou comunicacao dos resulta dos do psicodiagn6stico ao sujeito ou responsavel. 2. Solicirante: sujeito, medico, professor, DRH, juiz, dono da em presa, etc. ......... 168 TECNICAS DE EXA'lE PSICmC)(;ICO -- TEP 3. Objetivo e Enos a evitar: a laudo deve dar uma visao dinamica do individuo naquele momenta (quando foi feita a avaliacao). Logo, nao se permitem inferencias sabre a sujeito; todos as co mentarios devem ser feitos com base nos dados obtidos. Evite as seguintes falhas: • excess a de termos tecnicos • demonstracao de cientificismo • apresentacao de resultados sem uma visao integrada dos dados • usa de sentencas com abreviaturas • usa de "chavoes" • inferencias de resultados em outro campo profissional. L~l:DO PSICOLt)GICO: A EXPRESsAo DA CllMPET~I'CL\ PROFlSSIC'N,-\L • 169 conctusdo: as resultados observados na area intelectual sao corroborados (ex.: a linguagem do examinando confirma de alguma forma os resultados, etc.)? 0 comportamento do su jeito durante as sess6es confirma os resultados obtidos? As aptidoes do examinando estao de acordo com aquelas espe radas (au exigidas para a cargo)? Os resultados permitem uma avaliacao do perm do examinando? 0 perm do exami nando corresponde ao perm esperado (au necessaria para 0 cargo)? Qual a conclusao sobre a examinando (e indicado para a cargo)? • iunuacoes: tempo disponivel, necessidade de utilizar mais tes tes, testes com validade nao comprovada, normas que nao se aplicam a nossa realidade, informacoes que devem ser busca das na entrevistas, etc. 4. Contdldo: a laudo deve equilibrar as dados com a teoria psicolo gica, ilustrando as resultados com comportamentos observados do examinando. 0 conteudo do laudo deve canter: • idcntifica<;ao: miciais, sexo, idade, nivel educacional, nivel socio-economico, profissao: Bibliografia • motivo da consulta: deve-se atender as necessidades dos solicitantes: AZEVEDO, M. M., ALMEIDA,L. S., PASQUALI,L. &VEIGA, H. M. S. (1996). Utilizacao dos testes psicol6gicos no Brasil: dados de estudo prelimi nar em Brasilia. In L. S. Almeida (org) Aualiar;iio Psicoicgico: formas e contextos. V. IV. Braga, Portugal, p. 213-219. • descri<;ao flsica: algum defeito ffsico observado. No caso de • • • • • • criancas, costuma-se dar inforrnacoes sabre a peso e altura delas; impressiio geral obtida durante 0 rapport: inforrnacoes verbais, nao-verbais, problemas motores, concentracao do examinando; comportamento do examinando: inforrnacoes sabre a nivel de ansiedade, relacionamento estabe1ecido entre ele e a exami nador; variaveis ambientais: como estava 0 local de aplicacao, ilumi nacao, ventilacao, etc.; instrumentos utilizados: qual a objetivo e a nome de cada instrumento; planejamento: das sess6es de aplicacao (quantos e quais testes foram aplicados em cada sessao): resultados dos testes: cspecificar os resultados brutos e pa dronizados de cada teste, isto e: testes de inteligencia, ap tidoes, interesses, personalidade, etc.; BATSCHE, G. M. & KNOFF. H. M. (1995). Best practices in linking assessment to intervention. In A. Thomas & Jeff Grimes, Best Practices in School Psychology. Washington, DC: NASP. BENZI, N. P. (1996). 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