ESCOLA DO CAMPO, TRABALHO PEDAGÓGICO E RELAÇÃO COM A COMUNIDADE VAZ, Gessiana Künzle Tristão – UTP [email protected] SOUZA, Maria Antônia de – UTP. [email protected] Área Temática: Diversidade e Inclusão Agência Financiadora: Não contou com financiamento Resumo Este trabalho é resultado de uma pesquisa realizada numa escola localizada na zona rural do município de Campo Magro – PR, para conhecer, discutir e explanar como está sendo realizado o trabalho pedagógico na escola do campo atualmente, identificando a contribuição do professor para a realidade cultural dos alunos moradores de zona rural. Os objetivos específicos pautaram-se na caracterização da escola pesquisada (infra-estrutura, funcionários e projetos escolares, professores – formação e tempo de trabalho na instituição), bem como as técnicas de ensino na terceira série. Procurou-se evidenciar se há relação dos conteúdos com a realidade destes alunos. Analisou-se o projeto político pedagógico da escola e observou-se a prática pedagógica no contexto da sala de aula da terceira série, verificando-se, dentre outros aspectos, conteúdos e avaliação. Caracterizou-se o surgimento da escola rural no Paraná, a trajetória da Educação Rural no Brasil e os principais acontecimentos que fizeram emergir a Educação do Campo, como outra concepção de educação, oposta à Educação Rural. Como principais referenciais teóricos estão Maria Antônia de Souza, Sérgio Celani Leite e Maria Julieta Costa Calazans. Dentre os principais documentos oficiais consultados estão as Diretrizes Curriculares Estaduais e Nacionais da Educação do Campo. Utilizou-se a pesquisa qualitativa como metodologia, a partir de entrevistas, observações e tiragem de fotos. Como resultados destacam-se o interesse da professora em articular os conteúdos com a realidade dos alunos, a valorização do homem do campo presente no Projeto Político Pedagógico da escola e a consolidação da Educação do Campo, como sendo um novo paradigma que orientará o currículo e a prática pedagógica nas escolas. Palavras-chave: Educação rural; Educação do campo; Prática pedagógica. Introdução 866 O presente trabalho é fruto de uma pesquisa realizada com a finalidade de discutir a atuação do professor numa escola localizada na zona rural, pensando a sua contribuição para a realidade cultural dos alunos, focando-se nas séries iniciais do Ensino Fundamental. Foi escolhida uma escola rural do município de Campo Magro – PR para a realização de um trabalho de campo, em que foi feita uma pesquisa de cunho qualitativo, com entrevistas, observações em sala de aula e tiragem de fotos. A realização deste trabalho surgiu do interesse em conhecer, discutir e demonstrar como está sendo desenvolvido o trabalho do professor nas escolas de zona rural, ou seja, a sua prática pedagógica, visto que esse trabalho deve ser feito de acordo com as necessidades da população que vive no campo, a qual possui particularidades que representam a necessidade de conteúdos voltados à realidade dos alunos moradores de zona rural e que levem em consideração características do lugar em que estão inseridos. Atualmente, a temática Educação do Campo vem sendo problematizada nas universidades por força dos movimentos sociais. Existem cursos de Pedagogia do Campo e cursos de Especialização em Educação do Campo, ao lado de outros como Direito, Agronomia e História, para citar alguns, cuja temática está em desenvolvimento nas universidades brasileiras. Isso representa, de certo modo, uma forma de inserção da Educação do Campo na academia, ao lado das questões que são tratadas nos grupos de pesquisa e nos projetos de extensão. Os pedagogos necessitam conhece essa outra realidade existente e saber como trabalhar com as crianças do campo, tendo em vista a possibilidade de trabalho em escolas municipais e estaduais localizadas no campo e a demanda por políticas públicas pelos movimentos sociais − particularmente o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) −, os quais foram os protagonistas da emergência da Educação do Campo no final dos anos 90. Segundo Leite (1999), a Educação Rural é caracterizada como as políticas vindas do Estado através da história da educação brasileira. O Estado, como instância política, e o capitalismo, como instância econômica, visavam o lucro da produção, proporcionando um ensino voltado a uma formação mais técnica, em que o trabalhador aprenderia o suficiente para desempenhar funções com o objetivo de fortalecer a ambos: os alunos usufruindo do processo escolar para atender seus objetivos, e o Estado pensando a educação que o trabalhador rural deveria ter. 867 A Educação do Campo é um conceito (paradigma) que surgiu no final do século XX (1990), por meio das lutas dos movimentos sociais, particularmente o MST, que exprime, nos diversos seminários, encontros e conferências estaduais e nacionais a educação que desejam ter, pensada por eles mesmos, sem a intervenção primária do Estado. Conforme Souza (2006), começam a haver várias iniciativas que procuram inserir a Educação do Campo na agenda política do Estado, surgindo, assim, inúmeras parcerias, experiências educativas e mudanças na estrutura política, econômica e social do país, tendo como principais sujeitos os trabalhadores rurais e a necessidade de criação de conhecimentos educacionais críticos, voltados aos próprios sujeitos do campo. Portanto, a Educação do Campo deve contemplar um ensino voltado à realidade de seus alunos, em que o conteúdo curricular e as metodologias de ensino do professor devem ser adequados às necessidades e interesses dos alunos de zona rural, os quais precisam de um ensino que valorize, dentre outros aspectos, a cultura da criança que vive no campo e seu modo de vida. Um professor que trabalha no meio rural deve conhecer o local em que o aluno vive para poder nele despertar a vontade de conhecer a região em que se encontra inserido e os aspectos culturais da população característica de seu meio; ainda, para que o aluno possa saber viver nesse espaço e, quando se tornar adulto, ser um trabalhador digno do campo, que conheça e saiba utilizar as riquezas de sua terra, o que não seria possível àquela criança que recebeu uma educação apenas pautada no currículo urbano. Além disso, a escola é o local no qual o aluno entrará em contato com realidades de outros lugares e terá acesso aos conhecimentos construídos socialmente na trajetória humana. A intenção implícita da pesquisa foi analisar em que medida há a presença do paradigma da Educação do Campo na escola em questão, ou em que medida o trabalho pedagógico é marcado pelo paradigma da Educação Rural. O objetivo é discutir o trabalho pedagógico na Escola do Campo, bem como revelar os indícios de sua contribuição para a realidade cultural dos alunos moradores do campo. Os dados empíricos são oriundos da utilização de entrevista com a diretora da escola (a fim de se levantar dados da Escola sobre funcionários, infra-estrutura, projetos desenvolvidos e recursos didático-pedagógicos), e com a professora da 3ª série (para identificar a forma como ela trabalha em sala de aula: se realiza ou já realizou aulas ou projetos diferenciados para os alunos, tendo em vista a sua realidade, e como seu trabalho 868 pode contribuir para o ensino, verificando se esse ensino vai ao encontro do que está disposto no Projeto Político Pedagógico da Escola e nas Diretrizes Nacionais e Estaduais da Educação do Campo). Também foram utilizadas as técnicas da observação em sala de aula, na turma de 3ª série da professora entrevistada, com intenção de se observar sua prática pedagógica no contexto da sala de aula, considerando que a referida professora sempre trabalhou em escolas rurais e abrange dezessete anos de experiência. Em síntese, foram utilizados procedimentos metodológicos da abordagem qualitativa, baseando-se nos autores Bogdan e Biklen (1994). Trajetória da Educação Rural e o contexto da Educação do Campo no Brasil O ensino regular em áreas rurais surgiu com o fim do Segundo Império, ampliou-se na primeira metade deste século, e foi desenvolvido de acordo com as necessidades que iam surgindo, decorrentes da evolução das estruturas socioagrárias do país (CALAZANS, 1993). A monocultura da cana-de-açúcar precisava de mão-de-obra especializada, e, com a chegada da monocultura cafeeira e o fim da escravidão, a agricultura necessitou de pessoal mais especializado para o setor agrícola, sendo que a qualificação deveria ser dada pela escola (CALAZANS, 1993). A autora destaca que somente a partir de 1930 surgiram programas de escolarização para a população do campo; antes desta década, merecem respectivo destaque o Plano de Educação de 1812 (no governo de Dom João VI), o Plano Nacional de Educação (na reforma de 1826) e a Reforma de 1879. Todos destacavam a importância de um ensino voltado às necessidades dos agricultores, a partir de conhecimentos sobre horticultura, noções de lavoura, conhecimento dos terrenos, dentre outros, os quais deveriam ser ensinados no ensino médio. Pode-se perceber, então, que o ensino para a população rural foi se desenvolvendo aos poucos, e à medida que ia se expandindo, surgiam projetos e programas educacionais para atender a realidade da população do campo. Em 1930, predominaram ideias do grupo de pioneiros do “ruralismo pedagógico”, os quais propunham, dentre outros fatores, uma escola rural voltada aos interesses da região em que fosse destinada e que norteasse a ação para a conquista da terra (CALAZANS, 1993). 869 Os programas educacionais voltados à população rural ampliavam-se cada vez mais, de acordo com as necessidades que iam surgindo no país e as providências que iam sendo tomadas pelo governo. Na década de 1940, as ideias do “ruralismo pedagógico” − ideal que propunha combater o êxodo rural, fixando o homem no campo − estavam presentes em algumas regiões do país, e cada vez mais havia a necessidade de se adaptar programas e currículos voltados à cultura rural. Segundo Calazans (1993), em 1942 foi realizado um Congresso Nacional de Educação para buscar diretrizes e soluções para o ensino rural: o Oitavo Congresso Brasileiro de Educação, promovido pela Associação Brasileira de Educação, que propunha, através dos estudos e debates discutidos, uma escola com o objetivo de ajustar o indivíduo ao meio rural, que o fixa ao campo para fins de produção, seguindo as ideias do “ruralismo pedagógico”. Entende-se que a principal preocupação da época era essa: fixar o homem no campo, por meio de escola voltada para o trabalho, que “ruralizasse” o homem “rural”, para evitar a ocorrência do êxodo rural. Não era, portanto, bem vista e necessária uma educação urbanizada para o homem do campo. Nas décadas de 1960 e 1970, foram criados diversos programas para o meio rural, todos com a intenção de voltar ações educacionais às necessidades da população rural, sendo a maioria para o desenvolvimento da comunidade e educação de adultos. Na década de 1980, foi criado, no Nordeste, um projeto especial de Educação Rural (EDURURAL), que criticava a implantação do currículo urbano nas escolas rurais, propondo uma educação voltada para a realidade campesina (LEITE, 1999). A LDB 9394/96 promoveu a desvinculação da escola rural dos meios escolares urbanos, com a exigência de um planejamento interligado à vida rural e a adequação das instituições ao calendário rural, enfatizando que o ensino nas escolas deve ser voltado às necessidades da população do campo. A emergência da Educação do Campo: principais acontecimentos O principal fator que levou a emergência da Educação do Campo foram as reivindicações manifestadas pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), os quais, através de uma intensa luta, buscaram a atenção do governo para criação de políticas públicas que atendessem as peculiaridades do sujeito do campo. 870 O MST é um movimento que sempre se preocupou com o sujeito do campo e lutou para que este conquistasse seu espaço, e na área educacional, lutou e vem lutando por escola pública, preocupando-se com uma educação voltada à realidade do indivíduo que mora no campo e que atenda as suas necessidades. No Estado do Paraná foi criada, no ano de 2000, a Articulação Paranaense de Educação do Campo, e também, no mesmo ano, ocorreu a II Conferência Estadual por uma Educação Básica do Campo. Houve também a aprovação, pelo Conselho Nacional de Educação, das Diretrizes Operacionais para as Escolas de Educação Básica do Campo (Resolução CNE/CEB n.1, de 3 de abril de 2002), resultado das reivindicações em prol de educação com qualidade para os povos do campo (ROTTA, 2007). Essas diretrizes1 expõem o que as propostas pedagógicas das escolas do campo devem contemplar, abordam aspectos sobre formação de professores para o exercício da docência nas escolas do campo, dispondo também sobre as responsabilidades do poder público com relação a essa educação diferenciada, levando em consideração a diversidade do campo. Em 2004, é criada, pelo Ministério da Educação (MEC), a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD), na qual estão reunidos temas como Alfabetização e Educação de Jovens e Adultos, Educação Ambiental, Educação Indígena e Educação do Campo. No Estado do Paraná, em 2006, foram criadas as Diretrizes Curriculares da Educação do Campo, as quais apresentam diversos eixos temáticos e alternativas metodológicas com o propósito de nortear o trabalho de professores nas escolas do campo, enfatizando que “[...] os sujeitos do campo têm direito a uma educação pensada, desde o seu lugar e com a sua participação, vinculada à sua cultura e as suas necessidades humanas e sociais” (SEED, 2006, p. 9). Os povos do campo representam diversas categorias sociais, como posseiros, bóiasfrias, ribeirinhos, ilhéus, atingidos por barragens, assentados, acampados, arrendatários, pequenos proprietários ou colonos ou sitiantes – dependendo da região do país onde se 1 As Diretrizes Operacionais para as Escolas de Educação Básica do Campo podem ser encontradas no site do MEC, na Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, disponível em: http://portal.mec.gov.br/secad/index.php?option=com_content&task=view&id=187&Itemid= 871 encontram – caboclos dos faxinais, comunidades negras rurais, quilombolas e também as etnias indígenas. Atualmente, é um desafio para o professor que leciona no campo vincular os conteúdos curriculares com a realidade dos alunos do campo, fazendo com que sua prática seja voltada para a formação humana de um indivíduo que mora na zona rural, e que necessita de conhecimentos que fortaleçam sua “fixação” no campo. Mas as escolas estão se preocupando com o ensino desse professor, que, ao trabalhar com projetos e aulas práticas visando o aprendizado dos alunos, em conformidade com sua realidade, valoriza-os enquanto seres que fazem parte de uma sociedade cada vez mais exigente e competitiva. Já é possível observar, no Projeto Político Pedagógico da escola pesquisada, uma preocupação em ensinar os conteúdos vinculando-os com a realidade dos alunos, com ênfase na importância do ensino do uso da terra e do solo, em aulas práticas e trabalhos com projetos, dentre outros. Dentre os projetos e programas desenvolvidos pela Escola e pela Secretaria Municipal de Educação de Campo Magro − PR, há o Projeto Horta e Jardim, considerado o mais importante na escola, por ensinar o cultivo e a plantação para os alunos, destacando a importância da não utilização dos agrotóxicos, educando-os para o uso consciente dos recursos naturais, a identificação das diferenças entre hortaliças, o conhecimento das ervas medicinais, a valorização de locais improdutivos para torná-los produtivos, o trabalho com as hortaliças cultivadas na horta escolar, feita pelos próprios alunos. O Projeto Político Pedagógico da Escola faz citação de diversos conteúdos que podem ser trabalhados com os alunos: tipos de agricultura, uso do solo, culturas locais, uso de agrotóxicos, dentre outros, destacando que o conhecimento deve ser encaminhado de forma a potencializar o desenvolvimento da área rural, sendo necessária a capacitação dos profissionais de educação para que, dentre outros fatores, saibam aproveitar a história do local onde estão inseridos. A atualidade da Educação do Campo no Estado Nos dias atuais, segundo dados da Secretaria Estadual de Educação, Coordenação da Educação do Campo, através de pesquisa por ela realizada entre os meses de agosto e outubro de 2007 junto aos Núcleos Regionais Estaduais (NRE’s), existem 547 escolas estaduais 872 localizadas no campo, totalizando 99.908 alunos em nosso estado, sendo que o maior número de escolas encontra-se na cidade de Francisco Beltrão – PR, com 47 escolas e 4.227 alunos, e o maior número de alunos localiza-se na área metropolitana sul, totalizando 8.594 em apenas 32 escolas. A partir das reivindicações dos movimentos sociais foi criada, no ano de 2003, a Coordenação de Educação do Campo pela Secretaria Estadual de Educação do Paraná, o que representou um avanço na Educação do Campo no Paraná (ROTTA, 2007). A Coordenação de Educação do Campo tem como principais objetivos: identificar as demandas do campo e articular suas ações; promover ações para construção de políticas públicas para promover o desenvolvimento no campo; articular ações para promover o acesso e permanência dos povos do campo na escola; construir um currículo que leve em consideração as especificidades do campo, nos diferentes níveis e modalidades de ensino, junto aos Departamentos de Ensino da Secretaria Estadual de Educação; incentivar a criação de programas de formação que atendam as particularidades do campo, destinados aos docentes; articular projetos junto ao Programa Nacional de Educação da Reforma Agrária, para atender as necessidades locais; produzir materiais didático-pedagógicos com a abordagem da realidade do campo em suas temáticas, e promover a criação de Escolas Itinerantes2 para a universalização da educação e atendimento à diversidade cultural (ROTTA, 2007). Um grande avanço ocorrido na Educação do Campo paranaense foi a criação das Diretrizes Curriculares da Educação do Campo, em 2006, pela Secretaria de Estado da Educação – SEED. É um documento oficial criado para nortear o trabalho do professor, reorganizando sua prática educativa para torná-la cada vez mais próxima da realidade dos sujeitos do campo (SEED, 2006) Segundo as próprias Diretrizes, “[...] a intenção é que as Diretrizes possam motivar os professores na observação e apropriação da riqueza que o campo brasileiro oferece à ampliação dos conhecimentos escolares” (2006, p. 9). 2 A Escola Itinerante é uma escola que acompanha o deslocamento das famílias Sem Terra, garantindo às crianças, jovens e adultos acampados, o acesso e o direito à educação. É uma escola pública, e devido à sua situação de itinerância, tem sua base oficial e toda parte documental e pedagógica sustentada por Escolas-Base. Mais informações podem ser encontradas no link: http://200.189.113.133/dedi/cec/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=19. Acesso em 16/11/08. 873 Essas Diretrizes também são produto da relação governo e sociedade civil organizada, por meio do atendimento às demandas sociais, mediante iniciativa da equipe governamental responsável pelos níveis e modalidades de ensino (SEED, 2006) A Educação do Campo está concretizando e progredindo sua prática educativa e formativa devido à movimentação da sociedade civil organizada, buscando um profissional que, para atuar nas escolas do campo, necessita, dentre outros fatores, conhecer as lutas dos movimentos sociais e ter conhecimentos específicos das questões agrárias (SOUZA, 2008). A realidade pedagógica da Escola Municipal Professora Mercedes Marques dos Santos A Escola, cujo terreno foi doado por pessoas da comunidade, foi construída em 1990 e está localizada no município de Campo Magro, emancipado de Almirante Tamandaré, no bairro Retiro, culminando na desativação de várias escolinhas multisseriadas, sendo conhecida na região como “Escola Consolidada”. As atividades escolares na instituição iniciaram-se em 1991, sob a Resolução no 310/91 de 25/10/91, com o nome de Escola Municipal Nossa Senhora Aparecida. Mais tarde, com a Resolução no 3034/97 de 10/09/97, passou a ser chamada de Escola Municipal Professora Mercedes Marques dos Santos, em homenagem à sua primeira diretora. No mesmo local onde está a escola funcionou, até o ano de 2007, o Colégio Estadual Nossa Senhora da Conceição, que ofertava ensino fundamental e médio nos turnos tarde e noite. Assim, configurava um prédio com duas instâncias: municipal e estadual. A diretora lá trabalha há 29 anos e seis meses, sendo 17 anos como professora, quando ainda havia as escolinhas multisseriadas, e depois assumiu o cargo da direção, estando nessa função há 12 anos. No ano de 2008, a Escola contava com 253 alunos matriculados e 21 funcionários, sendo uma secretária com ensino fundamental completo, duas merendeiras com ensino fundamental incompleto até a 5a série, seis auxiliares de serviços gerais com a 4a série incompleta, um vigia alfabetizado, uma coordenadora pedagógica com magistério superior a distância, nove professoras − cinco com curso de Magistério superior a distância que trabalham há 17 anos na escola, uma com curso de Magistério de segundo grau que trabalha há um ano na escola, uma com formação em Matemática que trabalha há três anos na escola, e duas com cursos de pós-graduação realizados, sendo que uma trabalha há sete anos e a outra 874 há cinco anos, e a própria diretora, que têm formação em Pedagogia e pós-graduação em Supervisão e Orientação Escolar. Com funcionamento em dois turnos − manhã e tarde −, a Escola oferta a Educação Infantil (Jardim II) e as séries iniciais do Ensino Fundamental (1o ano a 4a série), não contando com a Educação de Jovens e Adultos (EJA). Até o ano de 2008, foi a única escola rural do município a ofertar a Educação Infantil. Quando indagada sobre o perfil dos alunos, a diretora responde que a maioria são famílias de classe baixa, filhos de agricultores e de funcionários da Água Mineral Ouro Fino. Com relação ao transporte utilizado por alunos e funcionários, todos os alunos e funcionários utilizam o transporte escolar, que é mantido pela Prefeitura do município e terceirizado por pessoas da região. A estrutura física é composta por três banheiros, cinco salas de aula, uma cozinha, uma cantina, um pátio, sala da direção, sala da secretaria e uma biblioteca com sala dos professores no mesmo local. Sobre os recursos didático-pedagógicos que a escola oferece, a diretora afirmou que a Escola possui uma televisão, um vídeo, um rádio, revistas, livros, jogos, um computador, mimeógrafo e um retroprojetor. Os professores, a Secretaria de Educação e a APMF (Associação de Pais, Mestres e Funcionários) selecionam o material didático (livros) da Escola, provindo da Prefeitura Municipal. A participação da comunidade nos projetos e programas escolares possibilita a socialização, a valorização da cultura e da realidade dos alunos da região, deixando clara a importância que a Escola dá a essa realidade. A junção da comunidade com a Escola, por meio dessas atividades, resulta na igualdade entre os moradores da região, os quais valorizam e convivem perante as mesmas condições.parei aqui A entrevista realizada com a professora da 3ª série da escola estudada ocorreu no dia 15 de setembro de 2008, com o objetivo de identificar de que forma ela trabalha em sala de aula, se realiza ou já realizou aulas ou projetos diferenciados para os alunos, tendo em vista a sua realidade, e como ela pode contribuir com seu trabalho para o ensino. A entrevistada afirmou que leciona há dezessete anos, sempre trabalhou nesta escola rural e já atuou em todas as séries da escola − da 1a até a 4a séries −, considerando-se bastante experiente. Para desenvolver o conhecimento sobre a realidade dos alunos, onde vivem e atuam, é necessário identificar os problemas da comunidade e buscar propostas de intervenção para solucionar ou melhorar as situações problemáticas identificadas. É preciso vincular as 875 disciplinas com a realidade local através de ações, trabalhos, pesquisas e exceção de projetos (BATISTA, 2007). Dentre os conteúdos trabalhados pela professora, destacam-se as disciplinas de Ciências, História e Geografia, em que a professora demonstra maior relação com a realidade dos alunos, sendo assim abordadas: Ciências: Respiração dos animais e reprodução, animais vertebrados e invertebrados, estudo do corpo humano (sustentação e movimentação, alimentação). História: História do município de Campo Magro, organização dos três poderes, relações culturais (esporte, lazer, música e dança), instituições religiosas e saúde no município. Geografia: Atividades primárias do município (agricultura, pecuária, extrativismo animal e mineral), preservação e conservação do município, os bens públicos do município, mananciais (rios e vegetação). A avaliação realizada pela professora é somativa, incluindo os trabalhos que os alunos realizam: as tarefas de casa, os trabalhos em grupo, a participação e o fator capricho. Com relação aos conteúdos trabalhados durante o ano de 2008, pode-se perceber que estão de acordo com os PCN’s e que os projetos desenvolvidos pela professora e pela Escola se aproximam do eixo temático Cultura e Identidade, sugerido pelas Diretrizes da Educação do Campo, uma vez que a Escola desenvolve festividades e projetos que envolvem a comunidade e valorizam a cultura dos alunos, e, por consequência, a cultura local. Considerações Finais Nesta pesquisa, buscou-se conhecer e discutir a atuação do professor na escola rural, pensando a contribuição do mesmo para a realidade cultural dos alunos. Os principais objetivos foram caracterizar a escola, as metodologias de ensino para o meio rural, observar a prática pedagógica e investigar o projeto político pedagógico. Através dessa pesquisa, é possível afirmar que a educação do campo, segundo os teóricos e os documentos nacionais e estaduais, vem se consolidando como um novo paradigma que orientará o currículo e a prática pedagógica nas escolas. Constatamos que a professora da escola pesquisada se esforça em contribuir com a realidade dos alunos e a promover a articulação entre os conteúdos e os aspectos da realidade por eles vivida. A partir de alguns projetos desenvolvidos pela escola, principalmente o Projeto Horta e Jardim − que 876 promove o aprendizado das técnicas de cultivo para os alunos, com aulas práticas na horta existente na própria escola −, eles desenvolvem o conhecimento e a autonomia necessários para trabalharem com a terra. A professora enfatizou que já fez vários projetos envolvendo aspectos da realidade e da cultura dos alunos, com objetivo de compreender a natureza e o ambiente em que vivem, e que todos esses trabalhos apresentaram bom resultado. Entretanto, existem potenciais que podem ser fortalecidos, a exemplo do estudo da divisão social e territorial do trabalho citado nas Diretrizes da Educação do Campo, assim como deveriam ser estudados aspectos da questão agrária do país, desenvolvimento sustentável e movimentos sociais. O projeto político-pedagógico da Escola apresenta diversos elementos que favorecem o homem do campo, uma vez que cita aspectos a serem estudados, ressalta que o conhecimento deve ser trabalhado de forma contextualizada a partir dos interesses da comunidade, além de ter como um dos seus objetivos o incentivo à agricultura, claramente percebido no Projeto Horta e Jardim. É possível afirmar que está havendo uma mudança gradativa de paradigmas no contexto educacional, em que a Educação Rural está ficando de lado para dar espaço à Educação do Campo, que, aos poucos, vem se instalando nas escolas, por meio de projetos, programas e ensinos diferenciados que valorizam os seus alunos. 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