Análise do Conservadorismo Condicional nas Empresas cotadas na BM&FBOVESPA
que possuem ativos biológicos
Autoria: Waldenir Sidney Fagundes Britto
RESUMO
O Brasil adotou plenamente as normas contábeis internacionais a partir de 2010. O setor
agropecuário sofreu importantes alterações com a IAS 41, que
passou a exigir
separadamente, a divulgação dos valores do ativo biológico. O objetivo foi estudar se as
alterações provocadas pela adoção das IFRS modificou o conservadorismo condicional nas
empresas brasileiras cotadas possuidoras de ativo biológico. Buscou-se informações no
período de 2007 a 2012. Foi utilizado o método de Basu (1997). Os resultados encontrados
não evidenciaram a prática do conservadorismo condicional após a adoção das IFRS, nem
para o conjunto das empresas durante o período analisado.
1 1 – INTRODUÇÃO
O prazo para a convergência às normas Internacionais de contabilidade no Brasil
terminou no ano de 2010, promovendo significativas mudanças na organização, divulgação e
controle da informação contábil. De entre as diversas alterações promovidas nesse processo,
se destaca para as empresas agropecuárias, a obrigação de divulgarem no balanço o seus
Ativos biológicos. A norma do Comitê de Pronunciamentos Contábeis 29 - CPC 29, baseada
na International Accounting Standard - IAS 41, obriga as empresas a divulgarem o ativo
biológico – considerado animal ou planta, vivos - dos demais ativos das empresas. Tal
alteração, fez com que as empresas rurais efetivamente produtoras passassem a ser
diferenciadas das que industrializam os produtos, criando condições de comparação
econômicas financeiras, entre empresas e com empresas correlatas no mundo. (Britto,
Azevedo e Ferreira, 2013). Como o Brasil é um país que tem forte participação tanto na
produção quanto na comercialização dos produtos agropecuários no mundo (OECD-FAO,
2012), a possibilidade de comparação das empresas nacionais com internacionais, aliada a
padronização dos relatórios contábeis, pode levar a um aumento de interesse pelas empresas
brasileiras deste segmento por investidores internacionais (Santos e Calixto, 2010), isto se
torna mais evidente ainda para as empresas com valores cotados nas bolsas, como é o caso da
Bolsa de Mercadorias e Valores de São Paulo, BM&FBOVESPA, a principal bolsa de valores
do Brasil. Outro fator é a possibilidade de avaliar se houve modificação por parte dos gestores
no processo de divulgação obrigatória, após a implementação e adoção das normas IFRS no
Brasil.
No entanto, mesmo com a padronização dos relatórios contábeis, outros aspectos
precisam ser analisados por parte dos investidores e demais utentes, que podem causar
distorções nas informações. A divulgação da informação contábil, que segundo Kothari,
(2001), é gerada em ambientes onde risco e incerteza tem lugar definido e pode sofrer
influências, principalmente de fatores econômicos emitidos tanto por grupos sociais quanto
por governos, utilizando políticas e regulamentos que levem as empresas a procurar
resultados mais conservadores. Assim, o conservadorismo pode ser influenciado tanto por
parte de políticas reguladoras, como por parte dos litígios e relações contratuais das firmas.
(Ball e Shivakumar, 2006); (Watts, 2003a); (Watts, 2003b). Avaliar como o conservadorismo
pode influenciar os relatórios divulgados pelas empresas passar a ser importante para um
conjunto de utilizadores. Identificar, portanto, se os relatórios estão ou foram elaborados de
forma conservadora pode contribuir para a melhoria da informação, nomeadamente em
segmentos específicos da economia. De entre os diversos modelos desenvolvidos, uma das
métricas mais utilizadas para a pesquisa sobre o conservadorismo, é a adotada pelo modelo
proposto por Basu (1997). (Ettredge, Huang e Zhang, 2012).
Desta forma, considerando ser importante obter maiores informações sobre o setor
agropecuário brasileiro, especificamente nas empresas com valores cotados que possuem
ativos biológicos nas suas demonstrações financeiras leva-nos a formular o seguinte problema
de pesquisa: Existe prática de conservadorismo condicional nas empresas brasileiras
cotadas que possuem ativo biológico? Houve alteração após a adoção às IFRS? A partir
deste problema, o objetivo principal deste trabalho é verificar a existência de conservadorismo
nas demonstrações financeiras das empresas listadas na BM&FBOVESPA que possuem
ativos biológicos, no período de 2007 a 2012, além de comparar o período anterior e posterior
a adoção das IFRS.
2 Difere de estudos já realizados sobre o processo de convergência no Brasil (Garbrecht
et al., 2012; Kaizer et al., 2009; Maciel, 2012; Paulo, Antunes e Formigoni, 2008) dentre
outros, pois busca analisar empresas com ativos biológicos cotadas na BM&FBOVESPA.
Para cumprir com o objetivo da pesquisa, o artigo foi dividido em seções, a saber: a
primeira onde se faz a introdução ao tema; a segunda apresenta o referencial teórico; a terceira
apresenta as hipóteses; a quarta a metodologia; a quinta expõe a análise e discussão dos dados
e finalmente são apresentadas as considerações finais/conclusões e sugestões.
2 – REFERENCIAL TEÓRICO
O processo de harmonização da contabilidade já é uma realidade no mundo dos
negócios para um elevado número de países que adotaram as normas internacionais – tendo
como finalidade a padronização através das normas do International Financial Reporting
Standards (IFRS) - ou estão nesta direção. O processo de convergência nem sempre é
tranquilo e adequado, pois cada país tem que fazer adaptações nas suas normas internas com o
intuito de convergir, procurando aumentar a qualidade da divulgação das informações
financeiras.
No Brasil, a convergência foi conseguida principalmente a partir da criação do Comitê
de Pronunciamentos Contábeis (CPC), em 2005, cujo objetivo era emitir pronunciamentos
contábeis de acordo com as IFRS e, posteriormente, com a emissão da Lei 11.638, de 2007 e
logo em seguida da Lei 11.941 de 2009, com o intuito de formalizar as necessárias alterações
para o processo de convergência com as normas internacionais de contabilidade. Houve uma
deliberação para que a adoção das IFRS no Brasil fosse efetuada em duas fases: a primeira,
abrangendo as empresas com valores admitidos a negociação no mercado de valores
mobiliários e as grandes sociedades, no ano de transição para 2008 e 2009 (conforme CPCs 1
a 14, publicados durante o ano de 2008) e a segunda, de adoção completa às IFRS, a partir de
2010 abrangendo todas as empresas. Como no Brasil o Conselho Federal de Contabilidade
(CFC), órgão que regulamenta a profissão contábil é também responsável pela emissão das
Normas Brasileiras de Contabilidade, adotou todos os pronunciamentos emitidos pelo CPC,
obrigando desta forma todas as empresas a obedecer e acatar as novas regras contábeis, seja
com a observância completa dos CPC ou a aplicação do CPC específico para as pequenas e
médias empresas, a partir de 2010. Desta forma, todas as empresas devem adotar os novos
procedimentos e não só as empresas que têm valores admitidos à negociação no mercado de
valores mobiliários (Grecco, Geron e Formigoni, 2009; Grecco, Formigoni, Geron e Segura,
2011; Santos, Lima, Freitas e Lima, 2011);
Conservadorismo
Apesar da característica de prudência –conservadorismo – ter sido retirada da condição
de representação fidedigna por ser considerada inconsistente com a desejada neutralidade,
isso não significa que imediatamente os reguladores e gestores das empresas aplicariam tal
recomendação, pois precisam de um tempo para adaptação. Além disso, o presente estudo
avalia o conservadorismo nos anos de 2007 a 2012, portanto apenas um ano após a adoção do
normativo sobre neutralidade no Brasil. Assim, se mantém e justifica o presente estudo.
(CFC, 2011).
O estudo do conservadorismo contábil abrange diversas áreas das empresas, desde a
aplicação com a remuneração dos acionistas (O’connell, 2006), até à pesquisa em empresas
com forte presença de gestão familiar (Cheng, 2004), (Chen, Chen, e Cheng, 2013), onde a
3 teoria da agencia pode dar a sustentação teórica para as questões estudadas sobre o
conservadorismo, como já apresentado em estudos de Ahmed & Duellman, (2007), Ball e
Shivakumar, (2006).
Considerando que os gestores e acionistas procuram resultados que podem até ser
conflitantes dentro da empresa e que fatores econômicos podem influenciar decisivamente a
informação contábil, pois tal informação é gerada em ambientes que apresentam um grau de
risco e incerteza elevados, o estudo sobre o conservadorismo segue o referencial teórico da
teoria da agência (Kothari, 2001).
As políticas e regulamentos que os governos podem emitir tendem a interferir nos
fatores econômicos e consequentemente nas informações contábeis, o que pode levar as
empresas a procurarem resultados mais conservadores, principalmente em países de tradição
code-law, como é o caso do Brasil. Além disso, pode existir conflito entre os diversos
utilizadores das informações contábeis, exigindo que a informação seja produzida a partir de
critérios de qualidade, comparabilidade e relevância (Santos, 2009). Assim, autores destacam
que o conservadorismo sofre influencia tanto das políticas reguladoras, como dos litígios e
relações contratuais das firmas (Ball e Shivakumar, 2006); (Watts, 2003a); (Watts, 2003b).
Neste sentido, o conservadorismo pode ser definido como “anticipate no profits but
anticipate all losses” (Bliss,1924, apud Basu, 1997:7). Outra definição, é a do Financial
Accounting Standards Board - FASB, (2008:6) através do concepts nº 2, que define o
conservadorismo como “Aprudent reaction to uncertainty to try to ensure that uncertainty
and risks inherent in business situations are adequately considered”. Helbok e Walker,
(2004) define como a tendência que os sistemas financeiros possuem de reconhecer as
informações que são consideradas más notícias mais rapidamente do que se reconhece as
consideradas boas notícias. Para o Watts, (2003a), o conservadorismo deve ser entendido
como o diferencial de verificabilidade requerido para reconhecimento dos lucros contra as
perdas. O conservadorismo pode ser visto de duas formas: condicional e incondicional.
Autores como Beaver e Ryan, (2005) separam as duas formas de conservadorismo: ex-post
(condicional) e ex-ante (incondicional). Para estes autores, no conservadorismo incondicional,
o valor registrado na contabilidade dos ativos líquidos é subavaliado em função de
determinados procedimentos contábeis, enquanto que o conservadorismo condicional são
registrados menores valores em condições adversas e não são registrados com valores
elevados quando as condições são mais favoráveis. Outros autores como Ball e Shivakumar
(2005) também separam o conservadorismo em duas direções: condicional e incondicional.
Segundo estes autores, enquanto o conservadorismo incondicional possui tendências
contábeis em reconhecer valores menores do patrimônio liquido, com menores resultados
consequentemente, a tendência de reconhecimento de perdas econômicas enquadra-se no
conservadorismo condicional. Estudando as formas de conservadorismo condicional e
incondicional, Qiang, (2007) corroborou pesquisas anteriores sobre o conservadorismo,
destacando os trabalhos desenvolvidos com a utilização da regressão utilizada por Basu
(1997). Ahmed e Duellman, (2013) analisaram como a autoconfiança dos administradores
pode influenciar o conservadorismo contábil, tendo encontrado evidências de uma relação
negativa e significativa entre o excesso de confiança e conservadorismo tanto condicional
como incondicional. Utilizaram, dentre outras medidas, a métrica de Basu (1997).
Assim, este artigo busca analisar o conservadorismo condicional das empresas cotadas
brasileiras que possuem bens biológicos, no rol de seus ativos, aplicando o modelo de Basu
(1997), explicado na seção da metodologia.
Sobre o conservadorismo condicional, Gassen, Fülbier e Sellhorn, (2006) afirmam
que este tem funções econômicas importantes, citando exemplos, como alto risco de litígios,
4 dentre outros. Neste mesma direção, Basu (1997) afirma que conservadorismo contábil
condicional, é considerado como a tendência da contabilidade em reconhecer com mais
precisão as perdas – más noticias - do que os ganhos - boas notícias. Este autor, desenvolve
uma regressão para apontar e identificar tal conservadorismo condicional.
Ball, Kothari e Nikolaev, (2013a) afirmam que o conceito de conservadorismo
condicional apresentado por Basu, (1997) proporcionou uma nova visão sobre a prática dos
relatórios contábeis, bem como afirmam que foi um impulso para a pesquisa na área.
Ball, Kothari e Nikolaev, (2013b) afirmam que o conservadorismo condicional
consiste em definir o conservadorismo como uma resposta assimétrica para novas
informações.
Andre e Filip, (2012) analisaram empresas em 16 países europeus, entre os anos de
2003 e 2007, comparando informações antes e após a adoção das IFRS, por parte destes
países. Utilizando o método de Basu (1997), encontraram evidências de uma redução
significativa na antecipação assimétrica de reconhecimento de perda relativa aos ganhos de
reconhecimento (conservadorismo condicional) para o período pós adoção. Tais resultados
foram impulsionados por uma diminuição do conservadorismo em países como a França,
Alemanha, Grécia, Países Baixos, Portugal, Espanha e Suíça. Examinaram também diversos
fatores que poderiam explicar a diminuição na conservadorismo condicional, entre eles os
incentivos legais e institucionais, tipos de governança, países com tradição code law e
common Law, dentre outros.
Coelho e Lima, (2007) estudaram as empresas cotadas brasileiras no periodo de 1995 a
2004 através dos modelos de Basu, (1997) e Ball e Shivakumar, (2005), onde os resultados
confirmaram a hipótese de que os gestores das empresas analisadas não praticam o
conservadorismo condicional.
Existem algumas críticas na literatura sobre a utilização do modelo de Basu (1997),
notadamente as realizadas por Givoly, Hayn e Natarajan, (2007), Dietrich, Muller III e Riedl,
(2007) e Patatoukas e Thomas, (2011), que, segundo esses autores, o modelo de Basu (1997)
apresenta algumas falhas, inclusive relativas aos valores de mercado. Mas pesquisas
posteriores, realizadas por Ball, Kothari e Nikolaev, (2013a) e Ball, Kothari e Nikolaev,
(2013b) afirmam que problemas de variáveis omitidas são problemas típicos de pesquisas
empiricas, mas que isso não implica que todas as provas de antecipação assimétrica e que o
conceito de conservadirsmo condicional em Basu (1997) seja equivocado e que possíveis viés
apresentam várias soluções simples.
No Brasil, diversas pesquisas relataram estudos sobre o conservadorismo. Almeida et
al., (2012) estudaram a prática de suavização dos resultados e o conservadorismo condicional
em empresas com valores cotados na BOVESPA, utlizando o método de Basu (1997) e
concluiram que o mercado consegue antecipar no retorno das ações as perdas futuras contidas
nos lucros. Já Almeida, Scalzer e Costa, (2008) analisaram se o grau de conservadorismo
utilizado pelas empresas que fazem parte dos níveis diferenciados de governança corporativa
é diverso/diferente do conservadorismo utilizado pelas demais empresas. Utilizando o modelo
de Basu (1997), confirmaram que existe assimetria de reconhecimento das notícias boas e
notícias ruins no mercado brasileiro de ações.
Outras pesquisas estudaram o conservadorismo sobre outras óticas, como por
exemplo, entre países da America do Sul (Costa, Lopes e Costa, 2006); sobre o impacto da
regulação sobre o conservadorismo das empresas brasileiras (Costa, Nossa, Baptista e
Teixeira, 2006); comparando as companhias abertas familiares e não familiares (Paulo e
Cavalcante, 2012), dentre outros estudos.
5 Ativo Biológico
O ativo biológico reconhecido separadamente dos demais ativos agropecuários na
contabilidade, se torna importante, pois se trata de identificar as empresas que produzem
alimentos, base no desenvolvimento de qualquer sociedade. Ele é considerado animal, ou
planta, vivo, conforme CPC 29, norma correlata a IAS 41. Isto significa que as empresas
rurais deverão destacar em seus relatórios contábeis, as contas e valores efetivamente
registrados na atividade agropecuária, separando de outros ativos rurais, podendo agora os
usuários da contabilidade identificarem facilmente tais empresas. A norma afirma que seu
reconhecimento deve ser quando e, somente quando: i) a empresa controle o ativo como
consequência de acontecimentos passados; ii) seja provável que benefícios econômicos
associados ao ativo fluirão para a empresa; e iii) o justo valor ou custo do ativo possa ser
fiavelmente mensurado. A evidenciação dos bens rurais, especificamente os animais ou
plantas vivos, como ativo biológico promoveu algumas alterações importantes na
contabilidade, posto que estes passaram a poder serem avaliados pelo valor justo, em
substituição ao custo histórico, tradicionalmente utilizado para valoração destes bens.
Neste sentido, estudo realizado por Argilés, Garcia-Blandon e Monllau, (2011) em
fazendas espanholas sobre a valoração dos ativos biológicos através de cálculos do valor
histórico e valor justo, não encontraram diferenças significativas entre os dois métodos de
avaliação quando da validação dos fluxos de caixa futuros.
Outro estudo, realizado por Cairns et al., (2011) analisando a utilização do valor justo
em empresas do Reino Unido e Australia, quando da adoção às normas IFRS, identificaram
um efeito mais fraco para os ativos biológicos, relativos aos requisitos obrigatórios das
normas.
Já Azevedo, (2004) estudou o setor vitivinícola português e analisou a IAS 41 e o seu
processo de desenvolvimento naquele setor. Após
estudo empírico, considerou a
aplicabilidade da norma relevante para o setor.
Um outro artigo, elaborado por Peng e Bewley, (2010) identificou diferenças quanto à
forma de avaliação dos ativos biológicos, especificamente quanto da implementação do valor
justo, ao analisarem as divergências das normas IFRS com as GAAP-China.
Também no Brasil a pesquisa sobre o ativo biológico tem se desenvolvido.
Paulo, Carvalho, Sales e Ikuno., (2011) estudaram a adoção por parte das empresas
cotadas no Brasil, da aplicação das normas sobre a publicação de informações sobre o ativo
biológico, quando concluíram que 100% das empresas analisadas apresentaram tanto no
Balanço Patrimonial, como nas notas explicativas especificas, informações sobre o ativo
biológico de cada uma delas. Além deste trabalho, destacamos os trabalhos de Filho,
Machado e Machado, (2012); Lima e Pereira, (2011); Paulo et al., (2011).
Tais estudos demonstram a importância crescente que vem sendo identificada, para a
melhor compreender os registros dos ativos biológicos, pelos diversos pesquisadores, em
diferentes empresas e países.
3 – DESENVOLVIMENTO DAS HIPÓTESES
Estudos anteriores pesquisaram se
empresas cotadas brasileiras praticam o
conservadorismo. Destacam-se os trabalhos de Santos, Lima, Freitas e Lima., (2011), que
pesquisaram empresas brasileiras cotadas não financeiras, utilizando o modelo de Basu
(1997), no período do primeiro trimestre de 2005 ao terceiro trimestre de 2009, avaliando se a
adoção das normas IFRS, tiveram algum impacto no conservadorismo das empresas. A
6 pesquisa não inferiu se as novas regras tiveram algum efeito no grau de conservadorismo das
empresas. Já Almeida, Scazer e Costa., (2008), aplicando o modelo de Basu (1997) nas
empresas cotadas brasileiras, entre os anos de 2000 a 2004, analisando o nível diferenciado de
governança corporativa, confirmaram a existência de assimetria de reconhecimento das
noticias boas e noticias ruins, no mercado brasileiro. Outras pesquisas também estudaram o
conservadorismo no contexto brasileiro (Rangel e Teixeira, 2003; Costa, Costa e Lopes,
2006), porém nenhuma delas concentrou atenção nas empresas com ativos biológicos cotadas
no BMF&BOVESPA. Assim, levantamos a primeira hipótese deste artigo:
H1: Os resultados contábeis apresentados pelas empresas cotadas que possuem ativo
biológico apresentam atributos do conservadorismo condicional.
Com a finalidade de perceber alterações nas publicações das empresas, comparando
períodos, estudos fizeram alterações no método de Basu (1997) com a inclusão de outras
variáveis. Andre e Filip, (2012) modificaram o modelo de Basu (1997) para examinar se
houve impacto no nível de conservadorismo contábil nos relatórios de empresas de 16 países
europeus, após a mudança obrigatória para as normas IFRS em 2005. Além de avaliar que
houve diminuição da prática do conservadorismo condicional após a adoção,
comparativamente com um período anterior, identificaram fatores que contribuíram para esta
redução. Outros autores também modificaram o modelo de Basu (1997) para comparação
entre períodos diferentes, identificando também uma redução do conservadorismo após a
adoção das IFRS. (Ahmed, Neel, e Wang, (2012); Manganaris, Floropaulos, e Smaragdi,
(2011)) ou efetuaram a modificação no modelo para comparação de tipos de empresas
diferentes, num mesmo período. (Almeida et al., 2012; Almeida, Neto, Bastianello e
Moneque, 2008). Nesse mesmo sentido, um outro aspecto importante que se refere a adoção
das IFRS no Brasil é se tal adoção diminuiu o nível de conservadorismo nas empresas, assim,
analisar se a adoção das IFRS nas empresas cotadas que possuem ativo biológico diminuiu a
prática de conservadorismo condicional, deriva a segunda hipótese deste artigo:
H2: Os resultados contábeis divulgados pelas empresas cotadas que possuem ativo biológico
após a adoção das IFRS apresentam menor grau do conservadorismo condicional, do que
quando divulgados antes da adoção IFRS.
4 - METODOLOGIA
Para a identificação das empresas partiu-se da base de dados da BM&FBOVESPA,
pois é a única bolsa de valores, mercadorias e futuros em operação no Brasil, além se ser a
principal instituição brasileira de intermediação para operações do mercado de capitais. A
partir da listagem geral divulgada pela Bolsa, foram identificados os setores que poderiam
conter empresas que possuíam ativos biológicos, além de identificar outras empresas em
todos os setores, com possibilidade de apresentar tal informação. Foram consultadas tanto as
Demonstrações Financeiras Padronizadas-DFP, como as notas explicativas à procura de
informação sobre ativos biológicos. Foram identificadas inicialmente 29 empresas. Destas,
foram excluídas: i) uma que, por decisão da administração, não mensurou o ativo biológico
por considerar que somente após a maturação (10 dias antes da colheita) seria possível
valoriza-lo; ii) duas por serem controladas por outras empresas que fazem parte da amostra;
iii) três por não apresentarem todos os relatórios no período analisado. Assim, foram
identificadas 23 empresas no total, de entre todos os segmentos que apresentaram informações
7 sobre ativos biológicos nas suas notas explicativas e nas DFP, no período de 2006 a 2012.
Uma vez que para aplicação do modelo proposto para o estudo, o modelo de Basu (1997),
necessitamos de informação do ano anterior, foram considerados seis anos, relativos de 2007
a 2012, perfazendo um total de 138 observações empresas-ano. A recolha dos dados foi
realizada no período de 10 a 30 de junho de 2013.Quando alguma informação não estava
disponível no sitio da BM&FBOVESPA, foram consultados os sítios das próprias empresas,
ou mesmo quando necessário, enviados emails solicitando informação complementar.
O Modelo de Basu
Para avaliar a existência de conservadorismo nos relatórios das empresas listadas na
BM&FBOVESPA que possuem ativos biológicos foi utilizado o modelo de Basu (1997), que
mede o conservadorismo condicional. Considerando o pressuposto da existência do
conservadorismo, o modelo contábil adotado seria mais oportuno para se reconhecer as
“más notícias” do que reconhecer às “boas notícias”, visto que o retorno positivo de ações
são considerados “boas notícias” e retorno negativos, “más notícias”. Ou seja, esta premissa
considera que a expectativa dos utentes em relação ao futuro da empresa, seria um reflexo do
comportamento das ações, onde “boas noticias” gerariam retornos positivos da ação e “más
noticias”, retornos negativos. Assim, para o modelo contábil que avalia o conservadorismo,
seria mais oportuno o reconhecimento das “más noticias”, em comparação com às “boas
notícias”. Este modelo parte da premissa de que, no momento do reconhecimento de uma
futura perda econômica contida no lucro de uma determinada entidade, o mercado reconhece
essa perda oportunamente no retorno das ações. O modelo, ao inserir um variável Dummy,
interagindo com outros variáveis, busca captar o grau de ligação entre o retorno da ação e o
resultado contábil, externando a diferença das empresas que tiveram retornos negativos das
que tiveram retornos positivos.
O modelo é descrito a seguir:
Xit /Pit-1 = α0 + α1DRit + β 0Rit + β 1RitDRit +
it
(equação 1)
Onde:
Xit é o lucro por ação da empresa i no ano t;
Pit-1 é o preço por ação no inicio do ano;
Rit é o retorno da empresa i no ato t, calculado da seguinte forma: Pit - Pit-1;
DRit é uma variável Dummy que assume valor 1 quando Rit <0 e 0 em outras situações;
it é o erro da regressão.
Na equação, espera-se que o coeficiente α1 seja negativo, pois identifica a velocidade
do reconhecimento do retorno econômico pelo resultado do lucro contábil. (Basu, 1997); O
coeficiente β0 mede a oportunidade do lucro contábil em capturar o efeito de boas e más
notícias, considerando que o reconhecimento assimétrico de perda econômica em relação aos
ganhos representa o conservadorismo condicional, ou seja, reflete a oportunidade do lucro
contábil – o reconhecimento do retorno econômico pelo lucro contábil. Espera-se que β1 seja
positivo e significante, considerando que a informações negativas das empresas são
divulgadas mais rapidamente que as informações positivas, caracterizando o resultado como
conservador. Quanto maior o valor de β1, maior é o grau de conservadorismo. Não há
previsão para o comportamento do coeficiente α0. (Basu, 1997; Lara, Osma, e Penalva, 2007;
He, El-Masry e Wu, 2008; André e Filip, 2012);
8 Para a comparação entre os períodos antes e após a implantação, o modelo de Basu
(1997) foi modificado para a inclusão da variável dummy DLEI, assumindo “1” para os anos
posteriores a 2010 inclusive, e “0” para os anos anteriores a 2010. Outros pesquisadores
realizaram alterações em modelos de avaliação do conservadorismo, para ampliar o estudo,
com inclusão de variável dummy. (Andre e Filip, (2012); ; Ahmed, Neel, e Wang, (2012);
Manganaris, Floropaulos, e Smaragdi, (2011); Almeida, Scalzer e Costa, (2008); Paulo e
Cavalcante, (2012)).
Assim, o modelo modificado, a partir de Basu (1997) fica:
Xit /Pit-1 = α0 + α1DRit + β 0Rit + β 1Rit * DRit + β 2 DLEI + β3 DLEI * DRit + β 4 DLEI *
Rit + β 5 DLEI * Rit * DRit +
(equação 2)
it
Onde:
Xit é o lucro por ação da empresa i no ano t;
Pit-1 é o preço por ação no inicio do ano;
Rit é o retorno da empresa i no ato t, calculado da seguinte forma: Pit - Pit-1;
DRit é uma variável Dummy que assume valor 1 quando Rit <0 e 0 em outras situações;
DLEI é uma variável Dummy que assume valor 1 quando o ano for posterior a 2010, inclusive, e assume 0 para
os anos anteriores a 2010.
it é o erro da regressão.
Em relação aos coeficientes anteriores, α0, α1, β0 e β1, constante da equação 1, se
mantém as mesmas previsões comentadas para a equação 1. Já para o coeficiente β2, esperase que seja positivo e significante, considerando que após a adoção das IFRS no Brasil, as
empresas passaram a ser mais conservadoras. Já para o coeficiente β5 espera-se que ele
também seja significante e positivo. Levando-se em consideração o objetivo deste trabalho,
não foram realizadas predições para os coeficientes β3 e β4 .
A técnica estatística adotada nesta pesquisa foi a de análise de regressão em painel,
utilizada em diversas pesquisas sobre o conservadorismo .(Basu, 1997; Santos, 2009; Neto,
Rodrigues, e Almeida, 2010; Castro, 2011). Segundo Gujarati e Porter, (2011), para a escolha
do melhor modelo de análise de painel, entre os modelos Polled, Efeitos Fixos e Efeitos
Aleatórios, os testes de Hausman e o Teste de Breusch-Pagan podem ser utilizados, pois
indicam qual é o mais adequado. Em cada cálculo realizado é especificado, a partir destes
testes, qual foi o modelo utilizado em cada análise. Para tratamento dos dados, foi utilizado o
software Gnu Regression, Econometrics and Time-series Library - GRETL 1.9.8.
5 - ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS
Os resultados encontrados nos cálculos realizados com o modelo de Basu (1997),
equação 1, são demonstrados na tabela 1 abaixo.
Tabela 1 – Resultado da Regressão Utilizando o Modelo de Basu (1997) - equação 1
Xit /Pit-1 = α0 + α1DRit + β 0Rit + β 1RitDRit +
Coeficiente
α0
α1
β0
Valor
0.0314302
0.00544613
-0.00130545
it
Estatística t
0.7892
0.1047
-0.4360
P-valor
0.43141
0.91680
0.66357
9 0.00210421
β1
2
R : 0,25;
0.4648
P-valor(F): 0,08;
0.64284
Durbin-Watson: 1,915
Xit é o lucro por ação da empresa i no ano t;
Pit-1 é o preço por ação no inicio do ano;
Rit é o retorno da empresa i no ato t, calculado da seguinte forma: Pit - Pit-1;
DRit é uma variável Dummy que assume valor 1 quando Rit <0 e 0 em outras situações;
it é o erro da regressão.
Após realizados os testes, tanto de Hausman como o teste de Breusch-Pagan, foi
definido a análise de painel com efeito aleatório para este cálculo (Gujarati e Porter, 2011).
Percebe-se que nenhum dos coeficientes apresentaram significância, nem a 10%. O
coeficiente α1 apresentou-se positivo, diferentemente do esperado, que era negativo. Já o
coeficiente β0, que permite analisar a oportunidade da informação contábil (reconhecimento
do retorno econômico pelo lucro contábil) revelou um valor negativo, refletindo lucro
negativo. O coeficiente β1, apresentou-se positivo, mas sem significância estatística.
Portanto, não se pode afirmar que as informações negativas das empresas foram divulgadas
com uma maior rapidez que as informações positivas, não podendo se caracterizar o resultado
como conservador, pois se espera que quanto maior for β1, maior é grau de conservadorismo
(Santos, 2009). Tais resultados nega a hipótese H1, que esperava que as empresas cotadas
com ativo biológico no Brasil apresentassem resultados de conservadorismo condicional. O
resultado apresentando pelos coeficientes α1 e β1 corroboram os resultados encontrados pelos
pesquisadores Garbrecht, Trombelli, Colauto e Scherer (2012), quando analisaram o
conservadorismo contábil numa amostra de 169 empresas com valores cotados na
BM&FBOVESPA, no Brasil, e diferente dos encontrados por Costa, Lopes e Costa, (2006),
ao pesquisarem o conservadorismo em cinco países da América do Sul, inclusive o Brasil,
confirmando os resultados previstos por Basu (1997) sobre o conservadorismo condicional.
Para analisarmos a diminuição do conservadorismo após a convergência das IFRS no
Brasil, a partir do ano de 2010, conforme afirma a hipótese H2, foram realizados os cálculos,
a partir da utilização da equação 2, onde os resultados podem ser vistos na tabela 2, abaixo:
Tabela 2 – Resultado da Regressão Utilizando o Modelo de Basu (1997) - equação 2
Xit /Pit-1 = α0 + α1DRit + β 0Rit + β 1Rit * DRit + β 2 DLEI + β3 DLEI * DRit + β 4 DLEI * Rit +
Rit * DRit +
(equação 2)
it
Coeficiente
α0
a1
Valor
0.0944012
Estatística t
19.458
P-valor
0.05428
-0.0561133
-0.6835
0.49575
b0
-0.00474279
-13.545
0.17841
b1
0.00602695
10.858
0.27997
b2
-0.105661
-12.971
0.19735
b3
0.15455
12.542
0.21246
b4
b5
R2 : 0,27;
0.00143622
0.00631235
P-valor(F): 0,029;
0.1490
0.88185
0.5159
0.60698
Durbin-Watson: 1,9109
*
β 5 DLEI *
Xit é o lucro por ação da empresa i no ano t;
Pit-1 é o preço por ação no inicio do ano;
10 Rit é o retorno da empresa i no ato t, calculado da seguinte forma: Pit - Pit-1;
DRit é uma variável Dummy que assume valor 1 quando Rit <0 e 0 em outras situações;
DLEI é uma variável Dummy que assume valor 1 quando o ano for posterior a 2010, inclusive,
e assume 0 para os anos anteriores a 2010.
it é o erro da regressão.
*, nível de significância a 10%.
Os testes realizados de Hausman e de Breusch-Pagan apontaram para o uso da
análise de painel com efeito fixo para este cálculo, conforme Gujarati e Porter, (2011). Nesta
equação, procurava-se identificar a existência ou não de um menor conservadorismo após a
adoção das IFRS no Brasil. Não foram identificados valores significativos para os coeficientes
principais, que poderiam sofrer variações e impactos do conservadorismo. Todos os demais
não apresentaram significância nem a 10%, a exemplo do que ocorreu com os valores
calculados na equação 1. Era esperado para o coeficiente β2 um valor positivo e significante,
mas este se apresentou negativo e sem significância. O mesmo se esperava do coeficiente β5,
mas, apesar de ser positivo, não foi estatisticamente significativo. Esperava-se que o após a
adoção das IFRS no Brasil, em 2010, os gestores das empresas com valores cotados, com
ativo biológico, adotassem uma postura menos conservadora, o que não se pode comprovar,
pelos cálculos realizados. Tais resultados diferem dos encontrados por Andre e Filip, (2012);
Ahmed, Neel, e Wang, (2012); Manganaris, Floropaulos, e Smaragdi, (2011), que
identificaram que após a adoção das IFRS, em diferentes países, houve uma redução do
conservadorismo condicional.
Assim, avaliando os resultados apresentados, concluímos que as empresas com valores
cotados na BM&FBOVESPA, e que possuem ativos biológicos, durante o período analisado,
não evidenciam práticas de conservadorismo contábil, nem a adoção das IFRS fez com que
os gestores passassem a adotar um postura menos conservadora contabilmente.
6 - CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Estudo do conservadorismo condicional já é bastante utilizado em diversos estudos,
procurando entender e identificar se as empresas adotam a prática de reconhecimento de boas
ou más noticias – ganhos ou perdas respectivamente, nos relatórios contábeis. Foi adotado
neste trabalho a metodologia desenvolvida por Basu (1997) para avaliar se nas empresas
brasileiras de com valores cotados na BM&FBOVESPA no Brasil, que possuem ativos
biológicos, adotam o conservadorismo condicional e se após a adoção das normas IFRS no
Brasil, em 2010, diminuiram o conservadorismo. Diferentemente de outros estudos, que
procuram identificar tais práticas, junto a empresas de diversos setores da economia, esta
pesquisa procurou identificar no segmento de empresas que produzem produtos
agropecuários, portanto reconhecendo na contabilidade ativos biológicos, um segmento
específico, mas importante por se tratar da produção de bens primários na economia. Além
dessa questão, considerando que o Brasil somente a partir de 2010 adotou as normas IFRS
plenamente para todas as empresas, fez com que esta pesquisa gerasse informações
diferenciadas para os utilizadores da contabilidade, notadamente os estrangeiros.
Assim, os resultados encontrados não permitem afirmar que as empresas brasileiras
desse setor
evidenciam nos seus relatórios contábeis práticas de conservadorismo
condicional, tal como encontrado no trabalho de Coelho e Lima, (2007) e nem que a adoção
das IFRS no Brasil, diminuiu a prática de conservadorismo condicional, fatos que
diferenciam de outros estudos, como os de Andre e Filip, (2012); Ahmed, Neel, e Wang,
(2012); Manganaris, Floropaulos, e Smaragdi, (2011), que identificaram redução do
11 conservadorismo após a adoção das IFRS, em diferentes países, refutando portanto as duas
hipóteses H1e H2 apresentadas no presente estudo.
Uma das limitações desse trabalho, concentra-se no número reduzido de empresas
utilizadas para o estudo, porque, mesmo sendo utilizado quase a totalidade das empresas
possuidoras de ativos biológicos que divulgam os seus relatórios na bolsa de valores
BM&FBOVESPA, considerando que foram eliminadas algumas empresas por não
preencherem todos os requisitos do estudo, ficamos com um reduzido número para análise.
Outras pesquisas podem ser desenvolvidas comparando as empresas com valores
cotados e empresas sem valores cotados, que possuam ativo biológico, bem como ampliando
a base para comparação com empresas de outros países, com a utilização inclusive de outras
métricas de estudos, elevando a base de empresas participantes da pesquisa e comparando
entre elas a prática do conservadorismo condicional.
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