Educação de Essencialidades
O Preço da Liberdade
Ego- Parte consciente da personalidade – O
eu.
Hoje, certamente a média dos seres humanos é
menos corajosa do que antigamente sob todos
os aspectos, física e emocionalmente. A vida é
organizada para ser a mais fácil possível. Se
você fica doente ou sente dores, existem
inúmeros remédios que curam em poucos dias,
mas para aqueles que têm uma vida meio
difícil e procuram uma Via considerada
“espiritual” bem que gostariam que essa Via
fosse tão rapidamente eficaz quanto a
medicina, e que se possa usar analgésico
sempre que for doloroso.
A verdade obriga a dizer que não é assim e
para aqueles que buscam o caminho de
transformação interior nunca será assim, as
dificuldades serão inevitáveis. Haverão
provas interiores, momentos de desânimo e
de morte para si mesmo, onde não nos
reconhecemos mais.
Achamos normal correr riscos praticando
esportes, ou acidentes em cirurgias, ou
qualquer outro tipo de acidente, mas no que
diz respeito ao auto conhecimento, bem
poucos estão dispostos a aceitar que estão
indo ao encontro de um grande número de
provas e crises, uma desordem que faz com
que nunca mais voltem a ser o que eram.
Não é fácil romper os grilhões da ignorância.
São necessárias uma vontade muito poderosa
e uma busca total da Verdade e do Auto
Conhecimento.
Cada um terá que enfrentar sua nulidade,
suas incapacidades, encarar terríveis
contradições e passar por muitas dores,
descer profundamente dentro de si mesmo e
desesperar-se com o vazio em si.
No inconsciente, os arquétipos, providos de uma
relativa mas poderosa autonomia, fissuram o
ambiente. A personalidade vai sofrer o suplicio do
desmembramento? Eclodem tendências
esquizofrênicas; elas levam a pressentir a morte do
ego, primeiro por sua dissociação. Estanhos
pânicos submergem a consciência. Expressos em
símbolos, eles constroem um psicodrama onde se
realizam terríveis contestações. A Realização do
Ser é a recompensa, ou pelo menos sua redenção
através de um novo nascimento.
As asas não crescem no dorso das lagartas, a
natureza nos ensina a trans formação que no
mundo animal, corresponde à crisálida.
Antes de ganhar, temos muito a perder. Essa
transformação implica em compreender que
a forma atual, a maneira como penso ser,
como me concebo e concebo o mundo a
minha volta deverá desaparecer antes que
uma outra realidade se revele.
Antes de encher o copo de vinho é preciso tirar a
água e antes de virar borboleta é preciso ser
crisálida. A lagarta desapareceu totalmente antes
que a borboleta começasse a aparecer. E de uma
forma ou de outra, todos temos de passar por esta
meta- morfose, esta trans- formação. E nessa trans
– formação, não seremos mais nós mesmos, mais
nada de nosso universo habitual, nossos pontos de
referencias desaparecerão, nossos hábitos mentais
nos serão tirados, não saberemos mais quem
somos, nem onde estamos e nem para onde vamos.
É por isso que necessitamos de um instrutor, de um
guia ( EAL) que possa nos acompanhar até o limiar
das grandes transformações interiores mas que
temos que viver sozinhos, armados com o
Ensinamento que recebemos, com as experiências
que já vivemos, com as convicções que já
adquirimos. Chega inevitavelmente um momento
em que o mundo comum, o mundo da dualidade, o
mundo do ego, do qual se trata de ficar livre, hesita,
vacila e ainda não estamos na Plenitude. Chega um
momento em que é preciso perder tudo, ou dar
tudo, exceto, naturalmente , a própria Essência.
O que pode significar a expressão: “morte do
ego” ou “desaparecimento do ego”? O que
pode significar “ir além da dualidade”? Para
quem toda consciência se baseia unicamente
na dualidade? O que pode significar “ir além
da causa e do efeito” para quem toda a
consciência é feita exclusivamente do jogo
das causas e efeitos?
Todas as lendas, mitos e certos contos de
fadas, contam como o herói deve se
submeter a uma série de provas. E para quem
se engajou no Caminho de sua própria
transformação, esses mitos são ricos ao
extremo. Eles dizem principalmente que
dragões e monstros se dissipam como se
nunca tivessem passado de uma ilusão, desde
que o herói os enfrente com destemor.
E dizem também que os dragões, a partir do
momento que são subjugados pelo herói,
longe de serem seus inimigos, viram seus
servos: cada medo, cada terror que trazemos
em nós, se vistos sem receio e se forem
inteiramente assumidos, ao invés de
obstáculos tornam-se uma nova força; a
energia que estava investida no medo e na
necessidade de negá-lo torna-se disponível e
o que era uma fraqueza transforma-se em
força.
Cabe a cada um saber: o que estou
procurando? A verdadeira espiritualidade
nunca mandou prospectos pelo correio para
recrutar adeptos. Pelo contrário, todos os
mestres faziam tudo para tornar seu acesso
difícil e submeter os candidatos a duras
provas, de modo a conservar somente
aqueles que tivessem dado mostras da
determinação e coragem necessárias.
O ensinamento interior, aponta com precisão
sua razão de ser e sua meta: superar a
consciência comum para realizar a
Consciência Essencial, além da mente – ou
seja, além de tudo que você conhece. “
Estou, não sou. Como nos comportar diante
do adulto infanto?
Para transcender é preciso transcender eu mesmo.
Visitar outras dimensões é visitar o meu agir, é ir
além do desejo num aglomerado de sexualidade.
Por si só o homem não é. Então quem é ele
mesmo? O homem tem como tutor legal uma
inteligência distraída que está fundida com ele. O
homem não reproduz só corpos, mas reproduz dor,
dor, dor...” (Carlos 04/09). A experiência, a
realidade relativa mostram que grandes
dificuldades nos esperam: é a regra do jogo.
Qual é afinal o sentido da encarnação na Terra? Dr.
Godel chamou de “peregrinação rumo ao Centro”,
ou seja, o Caminho interior de um homem - de cada
homem. Mas quantos estão dispostos a viver a
experiência de morte do velho homem? Nunca
ninguém foi obrigado a se engajar no Caminho do
Auto Conhecimento, mas quem quer morrer para
renascer deve compreender que, antes de renascer é
preciso morrer. Seria fácil demais se o novo
começasse a revelar-se antes que perdêssemos o
antigo.
Uma frase do Gîta diz: “Em mil homens, um
Me procura; e, em mil que Me procuram, um
Me encontra”.
Não é desonesto, para ter mais discípulos,
dar a crer que será um Caminho fácil,
cômodo, que resolverá sem muito trabalho
de modo milagroso todos os problemas? A
grande maioria quer considerar, a qualquer
preço, que a Iluminação é para todos e de
graça, embora saibam perfeitamente que em
todos os outros domínios nada se obtém sem
um preço.
Nunca se considerou que qualquer americano
escolhido na rua pudesse embarcar para a lua e dela
voltar; para isso é necessário uma fantástica
seleção e não menos um fantástico treinamento da
NASA para formar os navegadores do espaço.
Basta olhar a nossa volta para saber que tudo tem
um preço, mas para a Espiritualidade, querem que
tudo seja dado e que o Caminho consista apenas em
“melhorar um pouquinho todos os dias”. Bem, terei
que me submeter às provas e concordo em
submeter-me.
Como é que você pode julgar? Muitas vezes
você tem a impressão de que alguém que se
engajou no caminho do auto conhecimento
ficou mais agressivo e mais egoísta do que
era antes; como é que você sabe quais
tendências indesejáveis, cuidadosamente
ocultas, virão à superfície a fim de poderem
se dissipar?
Exprima essa realidade em termos de
dragões e de arquétipos ou em termos de
medos e desejos impossíveis de assumir. Sua
própria realidade é uma selva. É esta floresta
cheia de espinheiros e animais selvagens que
o Príncipe Encantado deve atravessar antes
de chegar ao castelo onde dorme a bela
adormecida ( um dos contos de fadas mais
diretamente simbólicos da Busca).
Os guardiães do limiar estão em você, os
monstros estão em você; tudo que os mitos e
alegorias descrevem está em cada um de
vocês. É a totalidade do seu ser que está em
causa: psíquico, psicológico e fisiológico.
Inteligência, consciente e inconsciente...
deixar de andar em círculos nos mesmos
hábitos emocionais e mentais e no mesmo
terreno conhecido.
A viagem rumo ao Centro de si mesmo,
rumo à “caverna do coração” é uma viagem
de exploração. É preciso deixar sua casinha
comum, aquela dos pensamentos, das
emoções, das sensações habituais e da
consciência do ego( eu, tal como me conheço
e como me repito indefinidamente), para ir
rumo ao desconhecido e ao novo, rumo a
regiões interiores que nunca foram visitadas.
Isso é inevitável. E por que você, justamente
você seria exceção à regra?
Não só há porque se inquietar como se tem
alma de “herói”, é preciso, ao contrário,
regozijar-se e dizer: “Afinal eu quis isso , e
cá estou eu, é a minha construção. A
verdadeira atitude do discípulo é expressa
pelas palavras do Cristo:”Pai, afasta de mim
esse cálice, mas seja feita a Tua Vontade”.
Uma parte sua sente medo, como a lagarta deve
ficar com medo ao sentir que está virando crisálida;
e uma outra parte sua – o cavaleiro – é movida na
profundeza por essa necessidade: “ não posso não
continuar nesse Caminho”. Então não vá pela
metade. Vá até ele corajosamente, vá como herói,
embrenhe-se nas terras desconhecidas da
consciência que está no seu interior; perca seus
pontos de apoio habituais; enfrente bravamente os
períodos em que não se reconhece mais, não se
entende mais – e vá em frente, vá em frente.
Se a Consciência Real, a Inteligência estiver
aí como Testemunha, se ela está aí como
vigilância, você pode continuar, não está
arriscando nada.
O que morre nessa crise? O que é que está se
partindo? A mente. O que é que morre? O
ego. Mas você aspira à superação do ego. O
que é que morre? Sua experiência de você
mesmo e da vida na dualidade. Mas você
aspira a estar além da dualidade e a descobrir
o UM ou a Unidade. E o que é que não
morre? A Testemunha, a Inteligência.
Vincule-se à verdade: posso perder tudo,
porque o essencial não pode ser perdido; e
quando tiver perdido tudo serei livre – livre
de todas as identificações, de todos os
apegos, de todas as limitações de todas as
formas. “Transformação” quer dizer
superação, não apenas de uma forma, mas de
todas as formas.
O Caminho parece estreitar-se cada vez
mais; é preciso perder mais, perder mais
ainda, para ficar cada vez mais pobre, cada
vez mais nu, até passar, nem sequer pelo
buraco da agulha, mas por um ponto, o ponto
geométrico que não tem dimensão alguma. A
única Realidade que permanece é a
Consciência, despojada de todos os seus
invólucros.
Se você for até o fim, quando tiver dado
tudo, a Realidade se revela, o Despertar, a
Verdade se produz, o ego perdeu sua magia e
seu poder, e acabou: você está livre! Mas não
pode conservar nada... Se você quer ir, nesta
vida até o fim – e a Realização Suprema é o
até o fim – será preciso largar tudo- TUDO.
É esse “largar tudo” ou “dar tudo” –
verdadeiramente, não da boca para fora, mas
do fundo do coração, do fundo do corpo, do
fundo do inconsciente.
Mas isso é compreensível apenas por
poucos. Inúmeros homens e mulheres cuja
vida é uma luta desgastante contra
dificuldades, problemas, obstáculos e que
estão completamente submetidos a todas as
fontes de atrações, repulsas e conflitos, não
abandonam nada. Isso não quer dizer que
você tenha que se enterrar num monastério.
Não se equivoque quanto à palavra
“renunciar”.Você nunca será inteiramente
livre , se nem sequer levantar o dedo mínimo
para caminhar para essa liberdade.
Não feche mais os olhos e os ouvidos à
realidade desses ensinamentos e às suas
exigências. A própria força desse Caminho o
engaja muito rápido numa desorganização e
tudo começa a ser atacado. Todos os
sentimentos se agitam ao mesmo tempo;
milhares de desejos que teriam exigido
milhares de existências para se
manifestarem, passa a exigir todos juntos e
você não se reconhece mais, porque sua
rotina mudou completamente.
O que são todas essas exigências que eu
conseguira reprimir com tanto cuidado? Elas
teriam se manifestado mais tarde. E esses
medos que se levantam todos ao mesmo
tempo, simplesmente por que você foi
totalmente remexido? O que você considera
sua vida, sua alma, seu ser, sua realidade,
tudo é questionado. Muito bem. Você quis
isso.
Além dos sofrimentos, com uma enorme
esperança e uma calma alegria, sinta que é
uma graça e um privilégio ser mergulhado
nessa transformação interior. Você não veio
buscar a paz, mas a espada que vai separar o
Real e o irreal, o ego e a Inteligência, o
impermanente e o Eterno, ou você tem a
possibilidade de dar meia volta e se “pôr a
salvo” sempre que ficar um pouco difícil!
Mas lembre-se que o herói, o cavaleiro não
chega à meta o mesmo que era quando se
embrenhou na floresta. A caminho mediante
todas as provas da peregrinação, ele
alcançou aquela pobreza total na qual
insistem tanto os evangelhos, a pobreza de
espírito. Perder tudo, dar tudo.
Dar tudo para tudo receber, mas numa outra
Consciência. Devo realmente morrer para
mim mesmo. Se você pode morrer em alguns
minutos muito bem. Se precisa de anos de
coragem, de lutas, de esclarecimento, muito
bem também. Siga o próprio exemplo de
Cristo e sua Paixão: o abandono, a traição, a
humilhação a solidão extrema. Essa grande e
única aventura, cada um a vive para si .
Se você se engaja nesse Caminho decidido a
continuar o mesmo, se se aferra às suas
estruturas de lagarta, está condenado a
sofrer- será mesmo muito doloroso. Não será
mais uma “transformação”, será um
massacre, será uma carnificina interior, mas
se estiver disposto a morrer como a lagarta
para viver como borboleta, esse Caminho
nunca perderá o sentido; e nunca a
esperança o abandonará, mesmo nas
provações e dificuldades – nunca.
O que eu quero realmente?
Há vida interior e como vou descobri-la só
depende de mim.
Como viver sem dualidade e sem medida?
Autor: Arnaud Desjardins –“Para Além do
Eu”
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