IICT | bHL | blogue de História Lusófona | Ano VI | Junho 2011
A história dos países de expressão
portuguesa e espanhola
André Heráclio do Rêgo
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Universidade de Paris Ouest-Nanterre La Défense
Realizou-se entre os dias 18 e 21 de maio, nas instalações do Instituto
de Investigação Científica Tropical e do Centro Científico e Cultural de
Macau, o colóquio internacional “Pequena Nobreza nos Impérios Ibéricos de Antigo Regime”, para o qual fui convidado graças à generosidade de seus organizadores.
Desse colóquio participaram especialistas de expressão portuguesa e espanhola, para tratar em perspectiva e de forma comparada,
realidades históricas que dizem respeito a uma grande parte do mundo.
Com efeito, foram contemplados, no decorrer dos trabalhos, realidades históricas da América Portuguesa (Amazônia, Bahia, Pernambuco, São Paulo, Minas Gerais, Maranhão, Paraíba, Rio Grande do Norte,
etc.); da África Portuguesa (Moçambique, Cabo Verde, São Tomé e
Príncipe); da Índia Portuguesa (Goa); e do próprio Portugal (Açores,
Madeira).
Mas também – e esse fato é muito importante, pois dá a real dimensão que, a meu ver, esses estudos comparatistas devem possuir
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Doutor em Estudos Portugueses, Brasileiros e da África Lusófona, diplomata brasileiro, assessor de Cultura da CPLP e membro do Centre de Récherches Interdisciplinaires
sur les Pays Lusophones (CRILUS), da Universidade de Paris Ouest–Nanterre La Défense.
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André Heráclio do Rêgo
no âmbito da História da Península Ibérica e de suas áreas de influência
- da América Espanhola (Nova Espanha, México); da África Espanhola
(Ceuta); e da própria Espanha (Galícia, Castela).
Tal abrangência – que contempla 4 continentes – é bem significativa do crescente interesse em se abandonar qualquer tipo de atitude autárquica no estudo das histórias nacionais. Mais significativa ainda quando se observa a valorização do estudo das possíveis “continuidades” – a prudência recomenda que se coloquem todas as aspas possíveis neste substantivo -, mesmo após a desintegração política da
maior parte do Império Português, com a Independência do Brasil.
E isto porque, para se entender a história do Brasil – permitamme a adoção de uma perspectiva brasileira -, há que se entender a história de Portugal; a história dos países africanos de expressão portuguesa; a história dos povos indígenas que habitavam o Brasil quando
os portugueses por lá chegaram; a história da Índia Portuguesa, a história, parafraseando Gilberto Freyre, não do mundo que o português
criou, mas dos mundos que o português integrou.
Mas para se entender a história do Brasil é necessário entender
também a história de seus vizinhos de fala espanhola e da própria Espanha, numa visão integralizadora e comparativista.
Deve-se evitar assim qualquer atitude autárquica no estudo da
história desses países, que ocupam boa parte da Terra e abrigam
grande parte da humanidade.
Ainda uma paráfrase de um pensamento de um célebre filósofo
espanhol: a América Espanhola é a circunstância geográfica e histórica
da América Portuguesa; a Espanha é a mesma circunstância de Portugal; o Império Português e o Império Espanhol são a circunstância um
do outro. E essas circunstâncias são tão imanentes, são tão fortes, que
adquirem dimensões novas. Deixam de ser apenas circunstâncias, para
se transformarem na realidade histórica palpável, como se pode observar das comunicações apresentadas no decorrer do colóquio. Deixam
de ser apenas circunstâncias para dar margem à criação de uma consciência histórica importante, a de que não se pode entender a realidade dos diversos países – e comunidades – de origem ibérica sem um
esforço permanente de comparação entre o que os une e o que os separa.
E não poderia finalizar esse breve texto sem uma nota de homenagem a um personagem que, a meu ver, foi pioneiro dessa consciên-
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A história dos países
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cia: Manuel de Oliveira Lima, historiador brasileiro de origem e formação portuguesa capaz de escrever tanto sobre história do Brasil quanto
sobre história de Portugal. Ele foi o pioneiro na ideia de que se deve
estabelecer o estudo comparado da história da América Portuguesa e
da América Espanhola, em uma serie de conferências feitas nos Estados Unidos da América, realizadas em 1912 e publicadas em português
dois anos depois – edição que permaneceu a única e praticamente desconhecida até o ano passado, quando o Senado Federal do Brasil fez
uma nova edição, facsimilar.
Oliveira Lima foi também o primeiro não só a reabilitar a figura
histórica de Dom João VI, mas também a tratar um tema muito caro
aos historiadores da atualidade, e em torno do qual girou de certa forma o congresso em tão boa hora organizado pelo IICT: a circulação de
elites no espaço atlântico. Pois de que mais se trataria a emigração da
Corte Portuguesa para o Brasil – da qual o historiador brasileiro tratou
em seu clássico “Dom João VI no Brasil”, de 1908 - se não do maior
movimento de circulação de elites jamais visto em um espaço de tempo tão curto?
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