Desafios da Exploração do Shale Gas: uma Comparação dos Casos do Brasil e da Argentina Renata Rodrigues de Araújo1 Laís Palazzo Almada2 Guilherme Moreira Loures da Costa3 Virginia Parente4 Resumo:O presente estudo examina se a experiência norte-americana com shale gas pode se repetir nos contextos brasileiro e argentino, analisando as situações de contorno envolvidas no desenvolvimento da produção local nesses dois países. Através da comparação de algumas características do mercado de gás americano e brasileiro, concluiu-se que, ao contrário dos Estados Unidos que já possui uma forte malha de gasodutos, o Brasil precisa investir em infraestrutura e desenvolver o mercado de gás natural doméstico, pois o país ainda se encontra numa etapa emergente. Ademais, não obstante a recente publicação de um marco regulatório no âmbito da ANP, regulando especificamente a matéria, os debates quanto à viabilidade ambiental dessas atividades têm ocasionado insegurança jurídica. Na Argentina, por outro lado, não são a falta de mercado ou de infraestrutura os fatores mais impeditivos. Nesse país é a profunda instabilidade do marco regulatório que faz do país um local de investimento de alto risco para capitais estrangeiros, ou mesmo nacionais, que queiram explorar as possibilidades do shale gas naquele território. Palavras-Chave: Gás natural; gás não-convencional; gás de folhelho; shale gas; geração de energia elétrica; gás natural veicular; energia; regulação; Argentina; Brasil; Estados Unidos 1 - Renata Rodrigues de Araújo, Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Energia do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo – IEE/USP. Fone: 55 11 99534-1441. E-mail: [email protected] 2 - Laís Palazzo Almada, Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Energia do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo – IEE/USP; Especialista em Regulação da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis. Fone: 55 11 2276-1337. E-mail: [email protected] 3 - Guilherme Moreira Loures da Costa, Especialista em Direito Administrativo pela Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro – EMERJ; Especialista em Regulação da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis. Fone: 55 21 2112-8453. E-mail: [email protected] 4 - Virginia Parente, Professora do Programa de Pós-Graduação em Energia do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo – IEE/USP. Fone: 55 11 3740-0464. E-mail: [email protected] Abstract :The present study examines if the American shale gas experience can be replicated in the Brazilian and Argentine contexts by analyzing the aspects involved in the local production within those countries. By comparing the United States and the Brazilian gas market, it can be verified that, unlike the United States, Brazil needs to invest in infrastructure and in the development of its domestic natural gas demand, which is still in an early stage. Moreover, in spite of the recent publication of the shale gas regulatory framework by ANP, the debate involving environmental viability of these activities has been causing legal uncertainty. In Argentina, on the other hand, it is the great instability of its regulatory environment that makes the country too risky opportunity for foreign and domestic investor. This situation keeps invertors, locals and foreigners, away from the shale gas opportunities in the Argentinian territory. Keywords: Natural gas; shale gas; non-conventional gas; electricity generation; automotive fuel; energy; regulation; Argentina; Brazil; United States. 1. Introdução Os EUA há pouco menos de uma década atrás estavam planejando expandir consideravelmente seus terminais de regaseificação de gás natural liquefeito (GNL) (Medlock III et al., 2011). Vários países produtores de gás também faziam investimentos maciços em estações de liquefação e na infraestrutura de transporte de GNL, visando exportar para o maior consumidor de gás do mundo, os EUA. Tal necessidade era justificada pelo fato de a oferta nacional apresentar tendência de queda e a demanda, tendência de crescimento (norteada, principalmente, pela expansão na demanda por energia elétrica). No entanto, este quadro foi modificado com o desenvolvimento doméstico de shale gas nos EUA, que possibilitou que o país passasse de um cenário de aumento da participação das importações para outro de tendência a autossuficiência, com perspectiva de exportação. Consequentemente, o GNL que seria destinado aos EUA pôde ser redirecionado a países europeus que buscavam maior diversificação de oferta, bem como a países asiáticos, como a China e a Índia, que precisavam expandir suas importações de GNL (Medlock III et al., 2011). Entretanto, não se deve descartar a possibilidade de desenvolvimento da produção local de gás não convencional em outros países. Isto se mostra possível, pois ao contrário das reservas de gás convencional, que estão fortemente concentradas geograficamente (em especial, em países da ex-URSS e do Oriente Médio), os recursos de shale gas estão distribuídos de forma mais diversificada. Sendo assim, uma vez que as tecnologias utilizadas na exploração de shale gas em território americano possam ser utilizadas em outras regiões, é possível que a oferta de gás no mundo mude consideravelmente. Para alguns países, o desenvolvimento da produção deste recurso energético pode ser um forte incentivo, tanto em termos de aumento da segurança de oferta quanto de diversificação de fontes de energia. Além disso, há o potencial para criação de novos empregos, o que induziria o aumento de rentabilidade e contribuiria desta forma, para impulsionar a instável economia internacional, como vem ocorrendo nos EUA. No entanto, a existência de reservas de shale gas e de tecnologias para explorá-lo não significa que estes recursos sejam economicamente viáveis. Ao redor do mundo surgem inúmeros questionamentos a respeito dos fatores de sucesso da produção de shale gas nos EUA, bem como se esta experiência pode ser replicável e factível em outros países (ERNST & YOUNG, 2012). Na América Latina, Brasil e Argentina possuem grande quantidade de recursos de shale gas e vislumbram a possibilidade de explorar este gás não convencional. Para isso, esses países ainda precisam vencer desafios e questionamentos quanto à viabilidade econômica, técnica e ambiental que rodeiam o futuro do shale gas como fonte de energia não convencional. O Brasil, um mercado gasífero emergente, também experimenta a evolução das novas fronteiras com a exploração do pré-sal. Nesse contexto, o desenvolvimento da indústria de shale gas possibilitaria um aumento significativo da oferta de energia e de insumos e, consequentemente, tornaria a indústria química e as empresas intensivas em energia mais competitivas frente a outros países do mundo. Na Argentina, a exploração do gás natural não convencional poderia reverter o crescente déficit energético e reduzir as importações de GNL. Para isso, entretanto a Argentina necessita atrair e reter investimentos estrangeiros. Alguns dos principais desafios e oportunidades do desenvolvimento do shale gas na Argentina e no Brasil são analisados a seguir. 2. Analise das perspectivas do Shale Gas na Argentina A Argentina em 2012 se destacou como maior produtor e consumidor de gás natural na América do Sul, mas a sua produção diminuiu mais de 10% em comparação aos níveis de pico atingidos no ano de 2006 (EIA, 2012a). O gás natural responde por 51,2% da matriz energética do país e por 50% da geração de energia elétrica do país (JACOMO, 2014). O país que já foi um exportador líquido de gás natural tornou-se um importador líquido em 2008. Uma das razões que ocasionou esta situação remonta ao ano de 2001, quando o controle de preços imposto para combater a inflação e ajudar os consumidores durante a crise econômica tornou o gás natural local relativamente barato para os padrões regionais. Analistas do setor afirmam que os preços congelados do gás natural impediram o investimento e a produção, estimularam o consumo e conduziram o país a depender de maiores volumes de importações deste recurso energético. Para reverter o declínio constante da Argentina na produção de petróleo e gás, atender a demanda interna e fornecer o suficiente para exportação, a possibilidade de extração e produção de gás de reservatórios não convencionais tem sido vista como uma alternativa. Inicialmente, a Administração de Informação de Energia (EIA, 2011) estimou que a Argentina possuísse 774 trilhões de pés cúbicos (Tcf) de recursos tecnicamente recuperáveis de shale gas - o que a colocaria na posição de terceira maior do mundo, atrás da China e dos Estados Unidos (EIA, 2011). Em 2013, o mesmo órgão revisou as reservas, passando a Argentina a ocupar o segundo lugar1 (EIA, 2013a). Há potencial nas bacias Golfo San Jorge e Austral-Magallanes, mas é a Bacia de Neuquén, situada no sudoeste da Argentina, que apresenta o maior potencial para o desenvolvimento de gás não convencional, contendo mais da metade dos recursos de shale gas do país. A Argentina atende a várias condições importantes para o rápido desenvolvimento de gás não convencional como: especialização em técnicas de extração e conhecimento prático da geografia local; infraestrutura estabelecida (rede de gasodutos); acesso à água potável (requisito para o fraturamento hidráulico). O país dispõe, por exemplo, de um robusto sistema de tubulação, cuja capacidade tornou-se parcialmente ociosa quando a produção de gás natural convencional no país foi reduzida. Além disso, a Bacia de Neuquén, onde os esforços preliminares de exploração de shale gas estão ocorrendo, é uma unidade de produção para a extração de gás natural convencional. Assim, a Argentina já possui a maioria da infraestrutura de transporte necessária para um possível desenvolvimento da produção de shale gas no país. O fornecimento de água fresca poderia ser feito a partir de vários rios, incluindo os rios Limay e Neuquén, que se encontram próximos à Bacia de Neuquén. Para adquirir a experiência e a tecnologia necessárias para a exploração dos seus recursos de shale gas, a Argentina provavelmente vai precisar que tanto empresas nacionais quanto estrangeiras participem na exploração. Na Bacia de Neuquén, significativos programas de exploração e produção comercial em estágio inicial estão em andamento. Tais programas são realizados pelas empresas: Apache, EOG, ExxonMobil, Total, Yacimientos Petrolíferos Fiscales (YPF) e empresas de menor dimensão (EIA/ARI, 2013). Notavelmente, a geologia da Bacia de Neuquén parece semelhante à de várias bacias dos EUA, facilitando a adaptação de técnicas de extração atuais. Os principais obstáculos a serem vencidos pela Argentina estão, sobretudo, relacionados aos aspectos financeiros. O país possivelmente necessitará incentivar empresas estrangeiras a investir no desenvolvimento da produção local de gás não convencional. No entanto, a atração e 1 A revisão não só aumentou ligeiramente as reservas Argentinas para 802 Tcf, como reduziu as reservas norte americanas de 827Tcf para 482 Tcf (MARES, 2013, Apud JACOMO, 2014). a retenção de investimento estrangeiro têm sido dificultadas devido a políticas governamentais populistas e nacionalismo de recursos. A Argentina mantém o mercado de energia sob controle restrito do governo e apresenta um ambiente regulatório volátil, transformando o país em uma oportunidade de risco para as empresas estrangeiras que poderiam fornecer o investimento tão necessário ao desenvolvimento da produção de gás não convencional. Em 2012, o governo argentino decidiu declarar a exploração e produção de hidrocarbonetos como de “interesse público nacional” e expropriou 51% da empresa YPF. A empresa espanhola Repsol, a partir 16 de abril de 2012 passou a controlar 20% da YPF, em vez dos anteriores 57,4%. Além disso, os preços baixos de consumo reduziram as receitas das empresas de energia, e no caso da YPF, a empresa foi autorizada a retornar 90% dos seus lucros aos acionistas, restando pouco para o investimento em mais exploração no momento em que a produção nacional estava em declínio. Considerando que a demanda superava a produção, o governo foi forçado a subsidiar o gás natural e óleo combustível para garantir que a demanda interna fosse atendida. Este pretende manter os preços dos combustíveis baixos no mercado interno, enquanto força as empresas a aumentar a produção de energia. Buenos Aires pode estar disposta a fornecer algum dinheiro para conseguir esse objetivo, mas a maioria da tecnologia e do financiamento terá de vir de fontes externas, incluindo a YPF. Os acontecimentos recentes são promissores. Embora com cautela, os investidores estão se apresentando e fechando importantes acordos com a Argentina para o setor de gás e petróleo. Em julho de 2013, a empresa YPF e a Chevron fecharam um acordo para investir no bloco “Loma Campana” (5.000 hectares) um investimento de 16,5 bilhões de dólares (Legislatura Província de Neuquén, 2013). A Joint venture formada por essas duas empresas pretende produzir cinquenta mil barris de shale oil e 3 milhões de metros cúbicos de shale gas, perfurando para tal 1.500 poços na região de Vaca Muerta, província de Neuquén (BLOOMBERG, 2014). Em setembro de 2013, a YPF e a Dow Chemical fecharam um acordo de US$ 188 milhões em um projeto piloto para explorar shale gas no bloco “El Orejano” (10.131 hectares) (Hall, 2013). Alguns dias mais tarde, a empresa de propriedade da Província de Neuquén (Gás & Petróleo del Neuquén) e a alemã Wintershall, braço de petróleo e gás do grupo químico BASF, fecharam um acordo de US$ 3,3 bilhões dólares envolvendo o bloco “Aguada Federal” (23.969 hectares) (Dinkloh, 2013). Finalmente, uma joint venture foi formada pela Wintershall, a francesa Total e a argentina PAE fecharam um investimento de cerca de US$ 2 bilhões ao longo de campos de gás off-shore (737.361 acres) (Dinkloh, 2013). A instabilidade regulatória da Argentina criou uma atmosfera de conjecturas em relação aos acordos firmados. No que se refere especificamente ao acordo firmado entre YPF e Chevron, afirma-se que os termos do contrato foram mantidos em sigilo, e a sua divulgação tornou-se objeto de demanda judicial (INFOBAE, 2014). Embora a YPF tenha negado que haja cláusulas secretas no contrato (CLARIN, 2013), questões sobre leis aplicáveis e tribunais para solução de controvérsias, e ainda, a possível retirada da Chevron do país com a manutenção de recebimento de lucros líquidos sobre a produção dos poços por ela perfurados vêm sendo objeto de notícias e especulações (THE NEW YORK TIMES, 2013; INFOBAE, 2014).Muitos outros investimentos e acordos serão necessários para satisfazer a “sede” da “Vaca Muerta” de US$ 25 bilhões em investimentos por ano necessários para o desenvolvimento da produção de shale gas em escala comercial (YPF, 2014). No quadro atual, destaca-se a incerteza legislativa e regulatória. Além das sucessivas reformas em matérias de hidrocarbonetos na Argentina, com destaque para mudanças constitucionais e a privatização da YFP, alguns pontos merecem destaque. Primeiro, após a reforma constitucional de 1994 as províncias passaram a possuir competência legislativa complementar em relação às leis de caráter geral emanadas do governo federal sobre a exploração e produção de hidrocarbonetos. Desta forma, houve uma “proliferação legislativa” quanto à matéria (JACOMO, 2014). A par disto, não há no âmbito federal arcabouço normativo próprio para a produção de hidrocarbonetos em reservatórios não convencionais. Por fim, no que diz respeito aos recursos hídricos, estes constituem, na Argentina, propriedade da nação. Sua utilização depende de autorização do governo argentino, por meio de concessão ou permissão a cargo das províncias, e sofre restrições legais de utilização do recurso em outras províncias. Neste ponto, ainda de acordo com a Constituição daquele país, as províncias poderão editar normas específicas em caráter complementar sobre a utilização dos recursos hídricos. Contudo, somente a província de Neuquén possui normas mais robustas no que se refere à exploração de recursos não convencionais (JACOMO, 2014). 2.1. Implicações regionais Não é possível prever se a Argentina poderá superar o seu próprio ambiente regulatório e produzir shale gas em grande escala. Se for bem sucedida, as implicações para o país e para a região serão extensas. O shale gas tem o potencial de eliminar o déficit de gás natural da Argentina, o que significa que o país sul-americano poderia retomar a exportação de seu gás natural - se puder reunir o investimento suficiente para ir além da fase atual de exploração básica. A Argentina precisaria produzir ao menos 6 bilhões de metros cúbicos (bcm) adicionais por ano para retornar aos níveis de pico (aproximadamente 45 bmc/ano). Considerando que a produção de shale gas nos EUA aumentou de menos de 10 bcm, em 2000 para 260 bcm, em 2012 (IEA, 2013), a Argentina teria que produzir menos de 10%, que os EUA para recuperar o status de exportador. O Chile e o Brasil, por sua vez, são ambos importadores de gás natural, e grande parte do gás natural que importam provém da Bolívia e da Argentina. Dado o declínio da Argentina na produção e a nacionalização do setor de gás natural na Bolívia em 2007, Brasil e Chile têm complementado suas importações de gás natural com gás natural liquefeito (GNL) a partir de mercados globais - uma operação muito mais cara do que o fornecimento de gás natural via gasoduto. Estes países seriam beneficiados se pudessem negociar o gás nacional a preços mais baixos decorrentes de um possível aumento da produção de shale gas na Argentina. Considerando que a Argentina venha a produzir shale gas em quantidade suficiente para superar as suas próprias exigências e as demandas na região, a Argentina poderia olhar para o mercado mundial de GNL. O país já tem dois terminais de importação, que podem ser expandidos para incluir capacidades de exportação com o tempo, planejamento e dinheiro. A oportunidade para a expansão global pode ser importante na busca de atração de capital estrangeiro. 3. Analisando as perspectivas do Shale Gas no Brasil A Agência Internacional de Energia (EIA) classifica o Brasil como a décima maior reserva de shale gas no mundo, analisando apenas o potencial da bacia do Paraná (EIA, 2013). Estas reservas estão estimadas em 245 trilhões de pés cúbicos (Tcb), equivalentes a aproximadamente 7 trilhões de metros cúbicos (BP, 2013). Segundo a EIA (2013), há indícios de recursos de gás não convencional nas bacias sedimentares terrestres no Vale do Parnaíba (MG); Parecis (MT); Recôncavo (BA) e na Amazônia. Contudo, os reais números, bem como a viabilidade comercial da exploração das reservas só poderiam ser comprovados com perfuração, processo que ainda não foi iniciado no Brasil. Com base em estimativas preliminares da ANP, considerando fator de recuperação médio de 70% das reservas, em cinco das sete bacias cujos blocos foram ofertados no leilão, o volume a ser explorado pode chegar a 10,1 trilhões de metros cúbicos de gás natural. Este número só ficaria abaixo de Rússia, Irã, Qatar, Turcomenistão e Estados Unidos e representaria um imenso salto no ranking, visto que, segundo dados da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), o Brasil possuía a 32ª maior reserva provada de gás no mundo em 2012, com 434 bilhões de metros cúbicos (ABEGAS, 2013). O desenvolvimento do shale gas em território brasileiro, aliado à produção proveniente do pré-sal, tende a provocar uma forte expansão da oferta de gás e, paralelamente, estimularia a competição e a queda dos preços. Entretanto, para que isto se concretize, o Brasil precisa vencer muitos obstáculos. No caso do pré-sal, a maior parte do gás está associada a óleo e a CO2, o que requer separação na plataforma e reinjeção. Este processo é possível, mas custoso. O transporte do insumo para a costa (até 300 km de distância) também demanda investimento em infraestrutura. Já os entraves para o shale gas incluem: falta de infraestrutura, tamanho do mercado e preços praticados, incertezas em relação à quantidade de reservas e as características das jazidas brasileiras, e, mais recentemente, a insegurança jurídica em função da expedição de liminares judiciais impedindo a exploração de reservatórios não convencionais. A infraestrutura de escoamento do gás é um fator crítico. Os EUA apresentam significativa rede de gasodutos, infraestrutura de armazenamento e processamento de gás próximo a uma grande parte da produção de shale gas, bem como a usuários finais deste energético. No Brasil, a malha de gasodutos está concentrada no litoral, enquanto que as potenciais reservas de gás não convencional encontram-se espalhadas no interior do país. A construção de gasodutos nestas regiões encarece o projeto e coloca em risco sua viabilidade econômica. No entanto, pode-se optar por alternativas como a construção de termoelétricas ou de unidades de fertilizantes próximas a estas regiões para o escoamento e aproveitamento do gás produzido. O problema é que a extração de shale gas envolve a perfuração de muitos poços e a fase de arranque da produção é relativamente lenta (ENVI, 2011). Assim, a necessidade de criar nova e importante infraestrutura, nos estágios introdutórios, pode ser um obstáculo ao desenvolvimento da produção de shale gas. Esta falta de estrutura reflete um mercado de gás natural ainda emergente no Brasil. A indústria e a geração de energia consomem a maior parte do gás natural oferecido. Em 2010, o país consumiu 26,5 bilhões de m3/ano, sendo que 12,65 bilhões de m3 foram importados, principalmente da Bolívia (MME, 2011), com quem o Brasil mantém contrato até 2019. O gás natural representa 10% da matriz energética brasileira e 25% da matriz energética americana. Em 2010, o consumo de gás nos EUA foi de cerca de 687 bilhões de m3/ano (IEA, 2012). O mercado de gás natural americano é mais de vinte vezes maior que o brasileiro. É importante ressaltar que o desenvolvimento do shale gas nos EUA ganhou força a partir de 2007-2008, quando os preços eram relativamente altos (US$ 8-9/mmBtu). Em outubro de 2012, o preço era de US$3,20/mmBtu, mas já chegou a ser de US$2,00/mmBtu. Enquanto no Brasil, o custo é de US$16,00/mmBtu. Segundo previsões da EIA publicadas no Annual Energy Outlook (2011), o preço do gás natural na cabeça do poço (wellhead) deve sofrer um aumento médio de 2,1% ao ano e atingir o valor de US$ 6,26mmBtu, em 2035. Já os preços do Henry Hub devem aumentar 2,3% ao ano e serão de US$ 7,07mmBtu, em 2035 (EIA, 2011). Projeções indicam que nem o preço do Henry Hub e nem a média do preço do gás natural na cabeça de poço ultrapassarão US$ 5,00/mmBtu, até 2020 e 2024, respectivamente (EIA, 2011). Além de mais competitivo, o mercado americano de gás é mais descentralizado que o brasileiro, visto que o preço do gás nos EUA não está ligado ao preço do petróleo, como no Brasil. Além disso, as inovações tecnológicas que permitiram a exploração do shale gas nos EUA foram feitas por pequenos empreendedores, não pelas grandes empresas. A Shell, por exemplo, só entrou no negócio depois do surgimento da combinação das técnicas de perfuração horizontal e fraturamento hidráulico. No Brasil, as decisões e as mudanças no setor ainda dependem muito da Petrobras. O resultado é que o preço do gás no Brasil é cinco vezes o praticado nos EUA. Com isso, segmentos como da indústria química, vidro, cerâmica, que apresentam alto consumo do combustível, vêm perdendo competitividade. Isto gera também uma redução de investimentos no aumento da produção, beneficiando a importação. Neste cenário, aqueles que se dispõem a atuar no marcado de gás natural buscam alternativas para garantir o consumo e o fornecimento. Este foi o caso bem sucedido dos campos Gavião Real e Gavião Azul, na Bacia do Parnaíba, no nordeste do Brasil, cujo projeto incluía a construção de complexo Termoelétrico interligado à produção dos campos (ENEVA, 2012). Inicialmente desenvolvido pela OGX Maranhão e atualmente com participação da ENEVA (18%), da E.ON (9%), e do Cambuhy, (73%) (ENEVA, 2013). O complexo, quando concluído terá capacidade de geração de 1.425 MW. Atualmente, a geração já pode chegar a 908MW (ENEVA, 2015). Solução semelhante foi concebida pela empreendedora Bolognesi para participar do Leilão de Energia Nova A-5, ocorrido em novembro de 2014 2 e desenvolver o marcado de gás natural. A empresa divulgou sua intenção de construir dois terminais de regaseificação de GNL no Brasil para abastecer às suas usinas, um no Rio Grande de Sul e outro em Pernambuco (REUTERS, 2014). Em entrevista à Reuters, o diretor da Bolognesi, Paulo Cesar Rutzen afirmou: Pelo modelo regulatório atual, entendemos que não é possível simplesmente construir um terminal de GNL para venda de gás natural ou prestar o serviço. Por isso formaremos o primeiro mercado através do consumo da própria usina termelétrica, que será instalada junto ao terminal de regaseificação. Depois, naturalmente, vem a expansão do mercado e o atendimento da demanda reprimida", disse Rutzen, à Reuters. (REUTERS, 2014). A questão ambiental é outro fator importante a ser abordado. Considerando que as técnicas emergentes usadas para a recuperação de shale gas, como o fraturamento hidráulico, ainda estão em processo de desenvolvimento, a sua prática ainda não pode ser suficientemente controlada através do processo de licenciamento geral, como a 2 O consórcio formado pela BOLOGNESI encontra-se no rol de empresas vencedoras do Leilão de Energia Nova A-5 Divulgado pela EPE. Mais informações em: http://www.epe.gov.br/leiloes/Documents/Leil%C3%B5es%202014/Resumo_Vendedor_20len_a5.pdf. perfuração de gás convencional. A experiência americana tem mostrado que o fraturamento hidráulico provoca impactos ambientais e de saúde pública significativos, requerendo a intervenção do governo por meio de legislação e regulamentação em nível federal, estadual e local. No entanto, atualmente, nos Estados Unidos, não há leis adequadas e regulamentos para o processo de recuperação de shale gas - em nível federal as normas são insuficientes e há diferentes graus de regulação em nível estadual. Esta falha regulatória requer reformas e atualizações para garantir que os regulamentos abordem suficientemente os impactos de fraturamento hidráulico (Zhou, Bei, 2011). A indústria do gás natural tem isenção de alguns aspectos de várias das principais leis ambientais federais destinadas a proteger o ar e da água nos EUA de produtos químicos radioativos e perigosos. No entanto, estas isenções foram influenciadas principalmente pelas atividades de lobby da indústria do petróleo e gás natural. A legislação inclui a Lei da Água Potável, a Lei da Água Limpa, a Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, a Lei de Recuperação e Conservação de Recursos, o Lei do Ar Limpo, a Lei de Compensação e Responsabilidade Ambiental, entre outras. Consequentemente, a Agência de Proteção Ambiental (EPA) possui capacidade limitada para regular o fraturamento hidráulico (Zhou, Bei, 2011).. Para lidar com o crescente número de incidentes relacionados com a saúde humana, que pode, eventualmente, estar relacionado ao processo de fraturamento hidráulico, o Congresso Nacional introduziu em 2009 a Lei de Responsabilidade do Fraturamento e Consciência de Produtos Químicos - twin bills - para alterar a Lei da Água Potável e dar à EPA autoridade sobre o processo de perfuração e fraturamento hidráulico (Zhou, Bei, 2011). Já no Brasil, as atividades de perfuração seguidas de fraturamento hidráulico em reservatório não convencional sujeitam-se atualmente à regulamentação pela Resolução ANP nº 21/2014, que tem como objetivo “estabelecer requisitos para a exploração de gás não convencional dentro de parâmetros de segurança operacional que assegurem a proteção à saúde humana e ao meio ambiente”. Publicada no Diário Oficial da União em 11/4/2014, a Resolução recebeu 150 comentários e sugestões enquanto esteve em consulta pública por 30 dias, a partir de 17 de outubro de 2013” (ANP, 2014a). Com a publicação da Resolução nº 21/2014, as empresas ficaram obrigadas a cumprir diversas exigências de segurança operacional específicas para realização deste tipo de exploração. Dentre as disposições desse texto normativo (ANP, 2014b), constam diversas obrigações imputadas aos Operadores, tais como: (i) elaborar um Sistema de Gestão Ambiental que contemple o controle dos efluentes gerados em razão da prática do fraturamento hidráulico em reservatório não convencional (art. 2º e 3º); (ii) garantir a proteção dos corpos hídricos e solos da região, evitando-se, ainda, que as fraturas provocadas alcancem distância menor que 200m em relação a quaisquer poços de água de uso humano (art. 4º e 7º, par. único); (iii) obter, junto aos órgãos competentes, tanto a licença para a execução de atividades de fraturamento hidráulico em reservatório não convencional, quanto a autorização para a utilização de recursos hídricos (art. 8º); e, ainda, (iv) elaborar um projeto de poço que identifique os riscos relacionados às atividades de fraturamento hidráulico em reservatório não convencional, permitindo o seu gerenciamento (art. 10). Dessa forma, em suma, para aprovação da perfuração e do fraturamento hidráulico em reservatório não convencional, a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) exigirá dos Operadores a “comprovação, por meio de testes, modelagens e estudos, que a atividade se dará sem prejuízo ao meio ambiente e à saúde humana” (ANP, 2014a). Em paralelo ao processo de elaboração e consulta pública da mencionada Resolução, em 28 de novembro de 2013, a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) realizou a 12ª. Rodada de licitação, oferecendo 240 blocos exploratórios terrestres com potencial para gás natural em sete bacias sedimentares, localizados nos estados do Amazonas, Acre, Tocantins, Alagoas, Sergipe, Piauí, Mato Grosso, Goiás, Bahia, Maranhão, Paraná, São Paulo, totalizando 168.348,42 Km² (ANP, 2013a). Tal certame foi motivado, em grande medida, pela intenção de fomentar as atividades de exploração e produção de óleo e gás em áreas que, até o momento, não haviam sido suficientemente estudadas. Nessa linha, pretendeu-se estimular a produção de conhecimento geológico acerca dessas bacias classificadas como de “nova fronteira”, tendo sido admitida, expressamente, a possibilidade de exploração de reservatórios considerados não convencionais – também aqui, no intuito de se incentivar o conhecimento e o aproveitamento de um recurso até então pouco explorado no cenário brasileiro. Para tanto, o modelo de Contrato de Concessão adotado para a 12ª Rodada de Licitações passou a prever tratamento próprio nos casos de atividades envolvendo reservatório não convencional, mediante a admissão de períodos exploratórios mais dilatados: a chamada “Fase Exploratória Estendida” (ANP, 2013b). No total, foram arrematados 72 blocos e a arrecadação com bônus de assinatura foi de aproximadamente R$ 165,2 milhões. A Petrobras arrematou, sozinha ou em consórcio, 49 blocos, sendo 43 como operadora. No total, doze empresas apresentaram ofertas vencedoras, sendo oito brasileiras e quatro estrangeiras. As outras vencedoras foram: Alvopetro, Bayar, Companhia Paranaense de Energia, Cowan, GDF Suez, Geopark, Nova Petróleo, Ouro Preto, Petra Energia, Petrobras, Trayectoria e Tucumann (ANP, 2013a). O resultado esperado pelo Governo brasileiro, todavia, foi um pouco diverso daquele alcançado. Isto porque, meses após a conclusão da 12ª Rodada de Licitações, na esteira dos recorrentes questionamentos – observados tanto no cenário brasileiro quanto no exterior – a respeito da utilização da técnica do fraturamento hidráulico para a exploração de reservatórios não convencionais, foram deflagradas diversas ações civis públicas visando a impedir o emprego desta técnica nos blocos arrematados no referido certame. Em linhas gerais, tais ações judiciais3 ressaltam as consequências ambientais que a utilização do fraturamento hidráulico em reservatórios não convencionais poderia vir a causar – citando desde o risco de contaminação de mananciais subterrâneos (aquíferos), até problemas decorrentes do descarte do efluente gerado, e, mesmo, a potencial indução de sismos –, e ao final, sustentam que a atividade em questão mereceria uma análise de viabilidade mais aprofundada, mediante prévia a avaliação técnica das bacias sedimentares brasileiras, bem como regulamentação por parte do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA). Por ora, no âmbito destas ações judiciais, foram expedidas liminares vedando a exploração de reservatórios não convencionais em blocos nos estados do Paraná, Piauí e São Paulo. Diante deste cenário, o anúncio do Pré-Edital da 13ª Rodada de Licitações exploração e produção de petróleo e gás natural não faz referência a recursos não convencionais, embora ofereça áreas em que se acredita que há potencial para tais recursos, tais como as bacias sedimentares do Amazonas, Parnaíba e Recôncavo (ANP, 2015). Por outro lado, cláusulas que traziam previsões específicas quanto à perfuração das rochas geradoras e à exploração dos recursos não convencionais, a exemplo da 3 Constam, até o momento, os processos: nº 5005509-18.2014.404.7005, distribuído à 1ª Vara Federal de Cascavel/PR, nº 5005610-46.2013.4.01.4003, distribuído à Vara Federal de Floriano/PI, e 000651975.2014.403.6112, distribuído à 5ª Vara Federal de Presidente Prudente/SP. chamada “Fase Exploratória Estendida” (ANP, 2013b), não foram reproduzidas na minuta de contrato da rodada a ser realizada em 2015 (ANP, 2015). Não se pode negar, todavia, um relativo avanço em matéria legal no que tange à exploração dos recursos não convencionais no país, haja vista a recente publicação do Decreto nº 8.437, de 22 de abril de 2015 (BRASIL, 2015), determinando caber ao IBAMA a expedição de licença ambiental para a exploração de hidrocarbonetos em reservatórios não convencionais no país. Ademais de afastar eventual insegurança jurídica que a descentralização dessa competência para os diversos estados poderia causar, tal iniciativa trouxe a mensagem de que o governo brasileiro não está disposto a abrir mão da exploração de recursos não convencionais, inobstante o revés sofrido em razão das aludidas ações judiciais. Uma dúvida, porém, pode ser suscitada no que tange ao referido Decreto. O Decreto afirma que o IBAMA licenciará as seguintes atividades em seu artigo 3º: VI - exploração e produção de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos nas seguintes hipóteses: (...) c) produção, quando realizada a partir de recurso não convencional de petróleo e gás natural, em ambiente marinho e em zona de transição terra-mar (offshore) ou terrestre (onshore), compreendendo as atividades de perfuração de poços, fraturamento hidráulico e implantação de sistemas de produção e escoamento; A alínea “c” refere-se apenas à produção dos hidrocarbonetos, enquanto o inciso VI faz referência à exploração e produção. Desta forma, restaria a dúvida em relação às atividades de exploração, se seria competência do IBAMA, ou dos órgãos ambientais. Uma interpretação teleológica e sistemática levaria a crer que o Decreto disse menos do que queria, ficando todas as atividades relacionadas à exploração e produção de reservatórios não convencionais a cargo do órgão federal, afastando-se assim a interpretação literal. Por enquanto, todavia, não há precedentes a indicar como a norma será interpretada. 4. Comparativo do Shale Gas: EUA, Brasil e Argentina Ao longo deste estudo foi apresentada uma série de fatores que contribuíram para o sucesso do desenvolvimento da indústria de shale gas nos EUA. Foi também possível observar que o mercado de gás da Argentina apresenta características e condições diferentes se comparados ao Brasil. Ambos os países ainda precisam vencer muitos desafios para que a experiência americana seja replicada localmente com o mesmo sucesso. A Tabela 1 resume algumas destas características e diferenças e as compara com a dos EUA. Tabela 1. Fatores de sucesso da produção de shale gas – comparativo entre EUA, Brasil e Argentina EUA 23,5 trilhões de m3 Brasil 7 trilhões de m3 Argentina 22 trilhões de m3 Infraestrutura/distância do mercado Malha de Gasodutos: 32 mil km de transferência conectando cerca de 500 mil poços; 489 mil km de transporte Malha de gasodutos: 9489 km Malha de gasodutos: 38 mil km Tamanho do mercado 722 bilhões de m3/ano 25% da matriz energética 29 bilhões de m3/ano 10% da matriz energética 47,3 bilhões de m3/ano 52% da matriz energética Preços no Citygate US$ 8-9 mmBtu (200708) US$ 4,93 mmBtu (2013) US$9,55 US$3,05 (preço produtor) Recursos de shale gas (2012) mmBtu no Mercado de gás natural Atração e retenção de ainda emergente, com investimentos pouca infraestrutura. estrangeiros. Incertezas em relação Volatilidade do às jazidas brasileiras. ambiente regulatório. Fonte: Elaboração própria, dados provenientes da BP, 2013; ANP, 2012; Martins, 2013. Principais desafios Conclusões Conforme visto, há poucas chances de que a “revolução do shale gas” tal qual ocorreu nos Estados Unidos venha a se repetir no Brasil. Isso porque o Brasil não apresenta infraestrutura bem desenvolvida e o mercado do gás natural ainda é pouco expressivo. A necessária construção de gasodutos e de termelétricas para o escoamento e o incremento da demanda do gás em território brasileiro tem representado barreiras à perspectiva de exploração. A necessidade de investimentos vultosos na infraestrutura nascente inevitavelmente tende a impactar o preço final do gás natural. Além disso, é importante considerar que não é viável aumentar o suprimento de gás natural, se o mercado não é capaz de absorvê-lo. No Brasil, o uso deste recurso energético limita-se, basicamente, a aquecimento de água e cocção, enquanto, nos EUA, por exemplo, o gás também é amplamente utilizado no aquecimento de ambientes e na produção de energia elétrica. Recentemente, inúmeras usinas termelétricas a carvão em território americano foram convertidas para gás natural, o que contribuiu para o crescimento da indústria local consumidora de gás natural. Tal indústria tem se beneficiado do baixo preço desta fonte de energia apresentando ganhos de produtividade. Isto não significa, entretanto, que o Brasil não possa explorar seus recursos de shale gas. O aumento da oferta de energia traz inúmeros benefícios a um país emergente, que depende dessa oferta para manter seu crescimento econômico. Mas, é preciso ponderar cautelosamente riscos e benefícios, e concatenar a exploração com o desenvolvimento da infraestrutura auxiliar, bem como do mercado consumidor. Não obstante a publicação da Resolução nº 21/2014 da ANP, a existência de demandas judiciais questionando a viabilidade ambiental da exploração de recursos não convencionais demonstra que o debate acerca das consequências desta atividade ainda persiste. A experiência americana mostrou que não basta estabelecer regulamentação e normas. É preciso monitoramento constante e efetivo a fim de mitigar os possíveis impactos ambientais. A Argentina, por sua vez, apresenta uma situação bem diferente. Neste país, o ritmo de exploração de shale gas será significativamente influenciado pelas políticas públicas relativas à nacionalização de recursos e do ritmo de crescimento do mercado interno da energia. Dada a geologia promissora e a existência de infraestrutura associada aos vastos recursos de shale gas da Argentina, a questão do ambiente regulatório instável apresenta-se como o mais significativo impedimento para que a produção de shale gas desenvolva-se rapidamente em larga escala. Se o país for capaz de contornar este obstáculo poderá mais uma vez alcançar a autossuficiência energética e, possivelmente, tornar-se um exportador líquido de gás natural. Agradecimentos Os autores agradecem pelo apoio recebido do Programa de Recursos Humanos da ANP através do Setor Petróleo e Gás (PRH04-ANP/MCT) da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP); à Petrobras; ao Núcleo de Pesquisa em Política e Regulação das Emissões de Carbono (NUPPREC/USP); ao Programa de Pós-Graduação em Energia (PPGE-USP); e à Universidade de São Paulo (USP). Referências ABEGAS. Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado. Entre os maiores do gás. 2013. Disponível em: http://www.abegas.org.br/Site/?p=30408. Acesso em 16 de abril de 2014. ANP. Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis. Anuário Estatístico, Rio de Janeiro, 2011. ANP. Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis. Preços do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis nos Mercados Nacional e Internacional. Boletim Anual. 2012. Disponível em: http://infopetro.files.wordpress.com/2012/03/59757-2.pdf. Acesso em: 10 de outubro de 2012. 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