1 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES LE ID E D IR EI TO PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU AU TO R AL 7Wi AVM – FACULDADE INTEGRADA PE LA O TEATRO COMO RECURSO CAPAZ DE ESTIMULAR A ATENÇÃO E A MEMÓRIA DA PESSOA COM Marisi da Costa Santos D O C U M EN TO PR O TE G ID O NECESSIDADE DE EDUCAÇÃO ESPECIAL ORIENTADORA: Profª Marta Pires Relvas Rio de Janeiro 2014 2 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES AVM – FACULDADE INTEGRADA PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU O TEATRO COMO RECURSO CAPAZ DE ESTIMULAR A ATENÇÃO E A MEMÓRIA DA PESSOA COM NECESSIDADE DE EDUCAÇÃO ESPECIAL Apresentação de monografia à AVM Faculdade Integrada como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Neurociência Pedagógica. Por: Marisi da Costa Santos Rio de Janeiro 2014 3 AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus, à minha mãe e ao meu pai, o amor, o carinho, os esforços, os exemplos de fé e a determinação, referências para toda a minha vida. 4 DEDICATÓRIA Dedico este trabalho a Felipe, Flávia, João Paulo, Jonatha, Marcelly, Pedro, Taís Pereira, Tamyris e Thaís Pinho, jovens portadores de deficiência intelectual, que me inspiraram à buscar no teatro formas alternativas para desenvolver habilidades e competências e me fizeram descobrir que limitações físicas e intelectuais podem ser superadas com emoção, atenção e amor. 5 RESUMO O teatro exerce um fascínio indiscutível sobre crianças, jovens e adultos. Pouco utilizado como ferramenta pedagógica, mas é inegável a sua capacidade de envolver e emocionar atores e espectadores, direcionando a atenção num único foco de interesse, eliminando elementos distratores, e considerando apenas o que diz respeito ao foco atencional. Assim, com a percepção aguçada registra-se na memória, fatos ou ideias a ele associados, auxiliando na constituição, consolidação e resgate de memórias. A atividade teatral é extremamente útil no trabalho com pessoas que necessitam de educação especial, pois, favorece a expressão verbal, auxilia na consciência corporal, fortalece a autoestima e estimula a interação social. Torna-se necessário destacar que muitos alunos necessitam de referências que lhes permitam compreender, assimilar conceitos e realizar associações, para tanto precisam vivenciar experiências ou resgatar memórias, realizar associações que facilitem o processo de compreensão de conceitos e transferências de aprendizagem. A Neurociência auxilia na compreensão de como a atividade teatral pode estimular o funcionamento das áreas cerebrais, propiciando a ocorrência de fenômenos neurobiológicos responsáveis pela produção de neurotransmissores, especialmente aqueles envolvidos na atenção, na constituição, consolidação e resgate de memórias. A atividade teatral apresenta-se como recurso pedagógico importante para o trabalho com pessoas que necessitam de educação especial, atuando nas áreas de desenvolvimento humano e colaborando para a superação de dificuldades e inclusão social. Palavras-chave: Teatro, atenção, memória, educação especial, expressão verbal, consciência corporal, autoestima, interação social, Neurociência, neurotransmissores, inclusão social. 6 METODOLOGIA Considerando a importância do teatro na educação, esta pesquisa bibliográfica fundamenta-se em autores que reconhecidamente aliaram seus conhecimentos teóricos à prática teatral como Vic Granero e Ricardo Japiassu. Além das experiências teatrais relatadas pelos autores citados, somam-se experiências de campo da autora desta pesquisa. Para compreender o funcionamento das áreas cerebrais e dos mecanismos neurológicos acionados a partir dos estímulos sensoriais presentes na atividade teatral, buscamos as contribuições da neurociência, através de autores como: Roberto Lent, Ramon M. Cosenza, Leonor B. Guerra, Marta Pires Relvas, Suzana Herculano Houzel, Daniel Chabot e Michel Chabot e Ivan Izquierdo. 7 SUMÁRIO INTRODUÇÃO 08 CAPÍTULO I – Uma Habilidade Chamada Atenção 14 CAPÍTULO II – Memória: Uma Rede de Associações 19 CAPÍTULO III – O Teatro como Ferramenta Pedagógica 28 CONCLUSÃO 37 BIBLIOGRAFIA 38 ÍNDICE 39 8 INTRODUÇÃO De acordo com o DSM V (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais 4ª. Ed. Texto revisado) o diagnóstico de Deficiência Intelectual é embasado em três critérios essenciais; Critérios: QI- Quociente de Inteligência abaixo de 70; Critério B: Limitações significativas no funcionamento adaptativo em pelo menos duas das seguintes áreas de habilidades: comunicação, autocuidados, vida doméstica, habilidades sociais/interpessoais, uso de recursos comunitários, autossuficiência, habilidades acadêmicas, trabalho, lazer, saúde e segurança; Critério C:ocorrer antes dos dezoito anos. Trabalhar com pessoas que tenham necessidade de educação especial requer olhar para suas necessidades, seus interesses e motivações. Perceber habilidades desenvolvidas e à desenvolver, objetivando construir competências. Para tanto, torna-se necessário observar vivências, realizar interferências planejadas, oportunizar experiências que possibilitem a pessoa conhecer-se e ser reconhecido como capaz de expressar seus sentimentos, opiniões , assimilar conhecimentos e transferir aprendizagens. O teatro surge então, como importante ferramenta pedagógica, que através de suas múltiplas linguagens, desperta o interesse, estimula a expressão oral, a comunicação, o autoconhecimento , a autoestima positiva, a compreensão e assimilação de conceitos. De acordo com Relvas (2012): A aprendizagem se dá em um clima estruturadamente afetivo, estimulando todas as possibilidades de linguagem, promovendo a diversificação das sensações, por meio de atividades lúdicas, das artes e das interações sociais que terão como objetivo o desenvolvimento cognitivo e a otimização do próprio processo de aprendizagem (RELVAS, 2012, p.148). Segundo a Neurociência, a emoção e o prazer possibilitam a ativação de áreas cerebrais e a produção de neurotransmissores capazes de mobilizar a atenção, auxiliando nos processos de formação, consolidação e evocação de memórias e, colaborando no desenvolvimento e aprendizagem. 9 No capítulo I explica-se que a atenção é a habilidade de eliminar estímulos distratores, e focar o pensamento em um único objeto e em tudo que a ele diz respeito. .O foco da atenção relaciona-se a mecanismos automáticos e voluntários .Ela pode estar voltada a estímulos sensoriais ou a objetivos internos, auxiliando no processo de memorização. No capítulo II, a memória é a capacidade de adquirir, armazenar informações que possam ser recuperadas e utilizadas futuramente. As memórias podem ser classificadas segundo sua função, tempo de duração e conteúdo. E finalmente, no capítulo III, o processo de planejamento, montagem e representação de uma peça teatral envolve além da emoção, diferentes tipos de atenção e memória. Esta atividade proporciona a ativação de áreas cerebrais, favorecendo a ocorrência de sinapses, criando novas conexões neurais e auxiliando no desenvolvimento e inclusão social. 10 CAPÍTULO I UMA HABILIDADE CHAMADA ATENÇÃO Atenção: “Processo que consiste em focalizar certos aspectos da experiência de modo que se tornem relativamente mais vivos; admite-se um campo central de atenção e zonas marginais.” (MICHAELIS, Dicionário de Português). A atenção é influenciada por vários processos como: preferências, experiências anteriores, necessidades e estados emocionais. O cérebro, principal órgão do sistema nervoso central, é o centro da sensibilidade, das inteligências e das capacidades cognitivas e emocionais. Cabe a ele perceber no ambiente, estímulos importantes para a sobrevivência do indivíduo e da espécie. O cérebro processa a todo o momento estímulos significantes e aprendizagens decorrentes. Ele possui uma motivação intrínseca para aprender, porém só o faz em situações significativas para ele. Assim sendo,no contexto escolar uma forma que o professor tem para atrair a atenção é expor o conteúdo a ser estudado, de modo que os alunos o identifiquem como significativo, relacionando-o aos conhecimentos existentes, atendendo as expectativas ou que seja estimulante e agradável. Segundo Lent, a atenção é um mecanismo de focalização dos canais sensoriais, capaz de selecionar dentre inúmeros estímulos provenientes do ambiente, aqueles que são mais relevantes para o observador, facilitando a ativação de certas vias, regiões ou neurônios, colocando em primeiro plano sua operação e num plano secundário a de outras regiões que detêm aspectos irrelevantes para a situação. Considera-se atenção, a habilidade de eliminar estímulos irrelevantes, considerados distratores e focar o pensamento em um único objeto e em tudo que diz respeito a ele, através do pensamento cognitivo. 11 A todo instante diferentes estímulos sensoriais atuam sobre o ser humano, porém, a atenção será direcionada para aquele que de alguma forma, se mostrar mais interessante, de maior relevância ou interesse, promovendo um direcionamento automático do foco de atenção. Através das cadeias neuronais, informações são levadas ao cérebro. Porém, é essencial um estado de vigília, que permita ao cérebro manipular a atenção, focando a consciência no objeto. O mecanismo da atenção apresenta dois aspectos importantes: a criação de um estado de alerta, em que ocorre uma sensibilização, com a produção dos neurotransmissores adrenalina e cortisol e, um posterior estado de sensibilização sobre determinados processos mentais e neurológicos. A informação chega ao cérebro através de cadeias neuronais cujas estações sinápticas intermediárias podem ser inibidas, impossibilitando que ela alcance a região onde se tornaria consciente. Em razão da existência de centros nervosos reguladores desse processo, pode-se direcionar a atenção para determinado estímulo, em detrimento de outros. Mesmo quando estamos dividindo a atenção pela utilização de canais sensoriais diferentes, o desempenho não é o mesmo, e aspectos importantes da informação podem ser perdidos. Isso ocorre, principalmente, se a demanda de um dos canais é aumentada. Ao tentar dividir a atenção, o cérebro sempre processará melhor uma informação de cada vez. (CONSENZA & GUERRA, 2011, p.47) Há de se ressaltar que, a manutenção da atenção por um tempo maior necessita da ativação de circuitos neurais específicos, que depois de um certo período, o foco atencional tende a ser desviado por outros estímulos do ambiente ou por processos internos, como por exemplo, novos pensamentos. Torna-se imprescindível um nível de vigília que favoreça ao cérebro manipular a atenção, focalizando a consciência em diferentes modalidades sensoriais, em acontecimentos, objetos ou em algum aspecto importante para o indivíduo. 12 Deve-se considerar que um alto nível de ansiedade pode dificultar a atenção e o processo cognitivo. Cosenza & Guerra (2011) relatam a existência de um sistema funcional responsável pela regulação dos níveis de vigilância, assim descrito: O principal circuito desse sistema estrutura-se a partir de um grupo de neurônios que possuem um pigmento que dá a essa região uma coloração azulada. Esse grupamento denominado lócus ceruleus, (local azul), fica localizado no mesencéfalo, uma porção do encéfalo abaixo do cérebro. (COSENZA & GUERRA, 2011, p.43). Fonte: Neurociência e Educação, 2011, p. 43. A noradrenalina é o principal neurotransmissor produzido pelos neurônios dessa região, sendo responsável pela regulação do estado de alerta do organismo. Há evidências de que a dopamina está relacionada à manutenção da memória. 13 É importante destacar que o primeiro circuito neuronal que governa a atenção é o relativo à regulação da vigilância. A atenção pode ser regulada por estímulos periféricos, ou através do processamento cerebral, considerando estados internos do organismo. Pesquisas têm demonstrado que de alguma forma o foco atencional auxilia a resposta dos neurônios corticais. A seleção perceptual decorre de um mecanismo que auxilia nas respostas neuronais, ocorrendo nas áreas sensoriais e associativas. As áreas corticais recebem projeções principalmente, das áreas localizadas no lobo temporal e no córtex parietal posterior ,auxiliando o processo sináptico, para cada região onde direciona-se o foco da atenção, que poderá ser um local no espaço ou um elemento específico do objeto considerado. Estudos realizados por Posner comprovam que o indivíduo em estado de alerta, com a atenção fixa em um determinado objeto ( podendo ser visual, auditivo ou de qualquer outro sentido), quando impelido pela vontade ou estímulo direcionador, deixa o foco atencional do estímulo inicial, direcionando-se a um novo ponto, uma nova fixação da atenção, acompanhada ou não de movimentos oculares correspondentes. A respeito das pesquisas realizadas por Posner, (LENT, 2002, p.638) conclui “... a atenção deve consistir em um mecanismo de sensibilização ou facilitação das respostas perceptuais do córtex cerebral”. 14 1.1. Tipos de Atenção 1.1.1. Atenção Explícita ou Aberta A atenção explícita ou aberta têm o seu foco da atenção idêntico ao da fixação visual. Os movimentos oculares estão direcionados ao foco da atenção. De modo geral, a atenção é direcionada aquilo que se fixa o olhar, geralmente posicionados no centro da fóvea. Lent (2002) dispõe que: A atenção explícita tende a ser automática: sem nos darmos conta, vamos movimentando o foco atencional pelo ambiente à medida que movimentam os olhos. O controle voluntário é o mesmo do olhar; o foco atencional segue junto com ele (LENT, 2002, p.629). 1.1.2. Atenção Implícita ou Oculta A atenção implícita ou oculta permite que o foco da atenção esteja fora do eixo da fóvea, isto é, o olhar pode estar focalizado em um determinado objeto, porém, a atenção está direcionada a outro elemento do ambiente. Considerando a atenção implícita Lent (2002) afirma: Os mecanismos neurais que permitem a seleção dos objetos a serem percebidos, neste caso operam nas regiões vizinhas à representação do eixo visual, na periferia não são selecionados apenas pelo local onde tendem a aparecer, mas também por outros parâmetros (LENT, 2002 p, 638). 1.1.3. Atenção Sensorial ou Percepção Seletiva A atenção focada em estímulos sensoriais é chamada de Atenção Sensorial ou Percepção Seletiva. A todo o momento diferentes estímulos sensoriais atuam sobre o indivíduo, buscando mobilizar sua atenção.Porém, esta será direcionada aquele que se mostrar de maior interesse, e relevância, promovendo um 15 direcionamento automático da atenção. Os órgãos dos sentidos enviam as informações relevantes ao cérebro através de circuitos neuronais. Um estímulo com importante valor emocional ao ser captado, mobiliza a atenção, atingindo regiões corticais específicas, sendo percebido, identificado e torna-se consciente. Segundo Relvas (2012, p.38), “A emoção ativa a atenção (o componente primário). Estas informações sensoriais podem ser neutras, ou acompanhadas de um sentimento positivo ou negativo”. 1.1.4. Atenção Mental ou Cognição Seletiva Na Atenção Mental também chamada de Cognição Seletiva, os objetivos internos como sensação, ação ou planejamento podem levar a um direcionamento voluntário da atenção, considerando a vontade do sujeito. A atenção mental implica em focar a atenção em um processo mental, que, segundo Lent (2002), pode ser, por exemplo, um cálculo matemático, uma lembrança, ou qualquer outro pensamento. Na atenção cognitiva são considerados os estados internos do organismo e escolha pessoal, atendendo a um objetivo ou contexto específico.Pode ser exemplificada através da procura de um objeto em uma gaveta. Este será encontrado mais facilmente ao se manter a atenção concentrada no objetivo. Pode-se afirmar então que o foco da atenção relaciona-se a mecanismos automáticos e voluntários da atenção. A atenção pode ser considerada como uma atitude psicológica, em que direciona-se a atividade psíquica a um determinado estímulo , seja ele, uma percepção, uma sensação, representação, objetivo de formar conceitos e auxiliar o raciocínio. afeto, ou desejo, com o 16 1.2. Estruturas Cerebrais Responsáveis pela Atenção Segundo Houzel, ao focarmos a atenção em um determinado objeto, acionamos ao mesmo tempo diferentes regiões do cérebro. Elas são: • O colículo superior, localizado no mesencéfalo, utilizando informação visual e auditiva, promovendo o redirecionamento automático dos olhos para o objeto externo de interesse; • O campo ocular frontal, no córtex pré-motor, é que controla o colículo superior e impede o redirecionamento automático dos olhos, provocando movimentos voluntários dos olhos para o próximo foco de atenção; • O córtex pré-frontal, capaz de representar objetos internos, modular o funcionamento das outras regiões do cérebro relacionadas ao controle atencional; • O córtex parietal posterior, que detecta a posição espacial do objeto, foco da atenção em relação ao corpo e dá preferência ao seu processamento; • O lócus ceruleus, situado no tronco encefálico, responsável por liberar noradrenalina sobre estruturas do encéfalo tanto na vigília, em situações esperadas ou em acontecimentos importantes.A noradrenalina lançada sobre o córtex aumenta a capacidade de detecção de estímulos e a rapidez de respostas. (www.cerebronosso.bio.br/ateno) Fonte: http://www.brainexplorer.org 17 1.3. Mecanismos Cerebrais Envolvidos na Atenção Pesquisas relacionadas aos mecanismos cerebrais relativos à atenção indicam a existência de dois sistemas ou circuitos diferentes, responsáveis pela atenção. Primeiramente, existe um circuito orientador, situado no córtex do lobo parietal, que torna possível o desligamento do foco atencional de um alvo selecionado e o seu direcionamento para outro ponto, assim como o ajuste fino, objetivando que os estímulos sejam melhor percebidos. Esse circuito possibilita que o foco da atenção seja direcionado a outros sistemas sensoriais, dando maior ênfase a algum desses sistemas. O outro circuito denominado circuito executivo, permite manter a atenção de maneira prolongada, impossibilitando estímulos distratores. O centro mais importante, situa-se em uma área do córtex frontal: a porção mais anterior do giro do cíngulo, localizado na parte interna do hemisfério central.Deve-se ressaltar que, ela está envolvida com os mecanismos de autorregulação , isto é, a capacidade de modular o comportamento segundo as demandas cognitivas, emocionais e sociais, conforme a situação. Ela é importante para a aprendizagem consciente e tem valor significativo no controle cognitivo e no emocional. O giro do cíngulo apresenta duas áreas. Uma delas regula a atenção aos processos emocionais e a outra tem conexões que possibilitam coordenar a atenção dirigida aos processos cognitivos.Estudos revelam que a atividade em uma dessas áreas pode impedir o funcionamento da outra.Sabe-se que emoções negativas fortes podem prejudicar a atenção ao processo cognitivo. Ao dividirmos a atenção utilizando canais sensoriais diferentes, o desempenho poderá ser prejudicado principalmente, se aumentarmos a demanda de um dos canais, isto porque, o cérebro processa melhor uma informação de cada vez. 18 Fonte: Neurociência e Educação, p. 46, 2011. As regiões delimitadas com as letras A e B pertencem ao giro do cíngulo onde se localiza um circuito envolvido na manutenção da atenção. A área A relaciona-se com os processos relativos a emoção, e a área B diz respeito a tarefas cognitivas. 19 CAPÍTULO II MEMÓRIA: UMA REDE DE ASSOCIAÇÕES O termo memória tem sua origem etmológica no latim e significa a faculdade de reter e/ou readquirir ideias, imagens, expressões e conhecimento. É o registro de experiências e fatos vividos e observados, podendo ser resgatados quando preciso (RELVAS, 2009, p.60). “Memória é a capacidade que tem o homem e os animais de armazenar informações que possam ser recuperadas e utilizadas posteriormente.” (LENT, 2011, p.644) “Memória” significa aquisição, formação, conservação e evocação de informações.”” (IZQUIERDO, 2011, p.11) A todo instante, um universo de informações é recebido. .Algumas carregadas de sentimentos, outras nem tanto. Guardamos algumas, descartamos outras ou, simplesmente as esquecemos. Porém, se elas de alguma forma foram significativas, causando surpresa, impacto ou foram associadas a outros fatos vivenciados, ficarão retidos na memória e poderão no futuro, por algum estímulo, serem evocadas ou lembradas, auxiliando no raciocínio lógico e no processo cognitivo. A memória humana utiliza diversas áreas cerebrais, como os lobos temporais, de conhecida relevância no arquivamento de eventos passados, o hipocampo, localizado entre os lobos temporais, cuja função é selecionar fatos e eventos que serão armazenados, as amígdalas cerebrais que ativadas por estímulos sensoriais produzem uma memória emocional e córtex pré-frontal ,importante na elaboração do pensamento, planejamento, programação de necessidades individuais e emoções. 20 2.1. Estímulos Cerebrais da Memória A memória envolve um conjunto de estruturas que funcionam harmonicamente, estando localizadas em diversas áreas cerebrais. O lobo frontal, situado abaixo do osso temporal, é uma importante região do cérebro para a memória. Pesquisas revelam que essa região está, relacionada ao armazenamento de acontecimentos passados. No lobo temporal, está contido o neocórtex temporal. Evidências apontam o seu envolvimento com a memória de longo prazo. Nessa região, um grupo de estruturas interligadas, parece estar relacionada a função da memória para fatos e acontecimentos (memórias declarativas). Dentre elas destaca-se o hipocampo, parte adjacente do córtex temporal, que se encarrega de selecionar onde detalhes importantes serão armazenados, está relacionado ao reconhecimento de novidades e relações espaciais. A amígdala cerebral ou núcleo amigdaloide apresenta-se como responsável pelo controle das emoções e dos processos motivacionais. Ela é formada por um conjunto de neurônios, e possuindo múltiplas conexões com algumas áreas do sistema nervoso. Ao interagir com o córtex cerebral, favorece a identificação da emoção, podendo gerar o surgimento e a persistência de um estado de humor. Os estímulos sensoriais provenientes do ambiente são transpostos em sinais elétricos e acionam um circuito na amígdala relacionado à memória e que depende de conexões entre a amígdala e o tálamo. As respostas emocionais provavelmente tem origem nas conexões entre a amígdala e o hipotálamo e possibilitam que as emoções influenciem a aprendizagem, pois elas acionam outras conexões da amígdala para as vias sensoriais. 21 Córtex pré-frontal região cerebral relacionada ao planejamento de comportamentos, tomada de decisões, resolução de problemas, na memória de trabalho e retenção de curta duração. O córtex pré-frontal está interligado com o lobo temporal e o tálamo, motivo pelo qual se acredita que ele esteja relacionado à memória. 2.2. Mecanismos Neurais da Memória Os mecanismos utilizados pelo sistema nervoso central para formar e armazenar cada tipo de memória não são iguais. Sabe-se que o cérebro codifica a realidade e emprega esse mesmo código para evocá-la. Este processo de tradução da realidade na aquisição e evocação da memória emprega ampla rede de neurônios. A formação das memórias ocorre na fase chamada aquisição. Nela,os estímulos sensoriais são captados por diferentes áreas cerebrais. Os neurônios transformam essas informações sensoriais em um código de sinais elétricos e bioquímicos e são direcionados a determinadas áreas do cérebro que as utilizam na formação e evocação da memória. Na evocação, ao trazerem uma informação os neurônios reconvertem sinais bioquímicos e estruturais em sinais elétricos, de modo que, mais uma vez os sentidos e a consciência possam interpretá-los, como algo vivenciado. É importante ressaltar que, a memória não retrata, verdadeiramente, a realidade, sofrendo alterações, em função do contexto em que é resgatada. Uma informação relevante ao mobilizar a atenção, estimula a ativação de neurônios, caracterizando a memória operacional. Considerando a importância da informação ou da experiência, elas poderão produzir em circuitos nervosos específicos, alterações estruturais tornando as sinapses mais eficientes, possibilitando o aparecimento de um registro. 22 Para que este registro se torne permanente, pesquisas na área de psicologia cognitiva apontam a necessidade dos processos de repetição, elaboração e consolidação. A repetição da informação recém-adquirida e sua associação com os registros antigos favorece a consolidação da memória, mantendo-a por um período maior. Quanto maior o número de associações e vínculos entre informações recentes e anteriores, maior será a possibilidade desse registro permanecer de forma mais duradouras, em função do maior número de redes neurais envolvidas. Nesse processo de repetição e elaboração é importante utilizar diferentes canais sensoriais para que se estabeleçam registros fortes, que se mantenham ao longo do tempo e mediante possíveis alterações do funcionamento cerebral. Os estímulos recebidos favorecerão um nível de ativação de informações conhecidas e sobre determinado assunto que poderão se tornar conscientes, se preciso for. Segundo Consenza e Guerra (2011): Na consolidação ocorrem alterações biológicas nas ligações entre os neurônios, por meio das quais o registro vai se vincular a outros já existentes, tornando-se mais permanentes. Essas alterações envolvem a produção de proteínas e outras substâncias que são utilizadas para o fortalecimento ou a construção de sinapses nos circuitos nervosos, facilitando a passagem do impulso nervoso (CONSENZA & GUERRA, 2011, p.63). O processo de consolidação de memórias demanda algum tempo, porém o seu esquecimento torna-se mais difícil, quando comparado as memórias recentes. Pesquisas têm demonstrado que mecanismos eletrofisiológicos e moleculares presentes na formação das sinapses mais estáveis estão em 23 funcionamento durante o sono, favorecendo o fenômeno da consolidação da memória. O hipocampo e partes adjacentes do córtex temporal são essenciais na consolidação das memórias. Diferentes aspectos de uma informação são armazenados em sistemas e circuitos situados em diferentes regiões do cérebro. Ao evocarmos uma memória ativamos esses circuitos trazendo à mente uma imagem unitária do que dele conhecemos. As informações na memória explícita são organizadas sob a forma de redes. Um determinado estímulo ou pista trará à consciência os registros de que necessitamos, além de ter o potencial de se espalhar, trazendo a um nível de ativação mais alto outros registros em rede relacionados (COSENZA & GUERRA, 2011, p.68). A memória implícita ocorre de forma alheia à vontade. Esse tipo de memória se manifesta em nosso cotidiano através de habilidades motoras adquiridas e procedimentos aprendidos e executados automaticamente. É o que chamamos memória de procedimentos. Ela é sensório-motora e se constitui através de um processo de repetição, utilizando circuitos específicos. A estrutura cerebral responsável pela memória de procedimento é o corpo estriado. A memória implícita ocorre de forma alheia à vontade.Esse tipo de memória se manifesta em nosso cotidiano através de habilidades motoras adquiridas e procedimentos aprendidos e executados automaticamente.É o que chamamos memória de procedimentos.Ela é sensório-motora e se constitui através de um processo de repetição, utilizando circuitos específicos.A estrutura cerebral responsável pela memória de procedimento é o corpo estriado. A memória de procedimentos é essencial para algumas atividades humanas que necessitem de habilidades motoras como: dança, esportes, cirurgias, dentre outras. 24 Uma memória pode ser recuperada através de fragmentos, relativos ao registro feito, como também pelos sentidos, por meio das sensações experimentadas. Pesquisas utilizando técnicas de neuroimagem constataram que a recuperação de informações é feita ativamente e esta relacionada ao funcionamento da região pré-frontal. É importante considerar que a eficiência dessa recuperação de informações está diretamente ligada ao processo de elaboração, no que diz respeito à quantidade de vínculos ou conexões criadas com os registros já existentes, favorecendo o resgate de memórias. Com relação à evocação de uma memória Izquierdo (2011) dispõe que No momento da evocação, o cérebro deve recriar, em instantes, memórias que levaram horas para serem formadas. Às vezes, a evocação está inibida por mecanismos variados, mas quando eventualmente essa inibição é superada, a evocação ocorre rapidamente, as vezes em forma muito mais detalhada.(IZQUIERDO, 2011, p.80) A prática permite a elaboração de novas conexões sinápticas e o cérebro retêm o que se repete com frequência e esquece o que não se utiliza ou não se realiza com frequência. Os conhecimentos trazidos pela psicologia cognitiva e a neurobiologia atestam que para uma aprendizagem eficaz, é necessário observar os mecanismos de funcionamento do cérebro. “A memória não está localizada em uma estrutura isolada no cérebro; ela é um fenômeno biológico e psicológico envolvendo uma aliança de sistemas cerebrais que funcionam juntos” (RELVAS, 2012, p.232) 2.3. Tipos de Memórias As memórias podem ser classificadas segundo sua função, tempo de duração ou conteúdo. 25 2.3.1. Memória Declarativa ou Explícita A memória declarativa é constituída de conhecimentos adquiridos, lembrados e conscientemente utilizados. Este tipo de memória apresenta dois subtipos: • Memória Episódica informações sobre ou a autobiográfica própria acontecimentos relativos a ela. vida compõe-se do sujeito de ou É responsável pela memorização de fatos ou eventos datados. • Memória Semântica constitui-se de informações a respeito do ambiente e daquilo que se lembra, porém sem precisar, como, quando e/ou onde foram adquiridas. As memórias episódicas e semânticas utilizam sistemas cerebrais diferentes e podem ser modificadas separadamente. A memória procedimental é composta por informações de acesso inconsciente, de comportamentos automáticos e respostas decorrentes de condicionamentos e habituações. È uma memória sensório-motora que se apresenta ao realizarmos procedimentos ou habilidades cotidianos. A sua aquisição ocorre principalmente por repetição, aperfeiçoamento ou reforço de circuitos específicos. A estrutura cerebral responsável pela memória procedimental é o corpo estriado, neurônios localizados profundamente nos hemisférios cerebrais, responsáveis também pela regulação da motricidade. 2.3.2. Memória Não Declarativa A memória não declarativa envolve procedimentos e habilidades.Ela pode ser de Procedimentos referentes às habilidades e hábitos ou de Dicas, ao ser evocada, através de pequenas informações, que favoreçam o resgate da memória. 26 2.3.3. Memória Associativa e Não Associativa A memória associativa estabelece uma relação entre um comportamento e um fato. Por sua vez, a memória não associativa é resgatada através de estímulos repetitivos. 2.3.4 Memória de Trabalho ou Operacional A memória de Trabalho ou Operacional é sustentada pela atividade elétrica dos neurônios do córtex pré-frontal e sua interação com o córtex entorrinal, o hipocampo e a amígdala. A memória de trabalho serve para administrar a realidade, situar o sujeito no contexto, assim como verificar se a informação adquirida é nova e deve ser arquivada ou se é conhecida e deve ser descartada. Ela possibilita o armazenamento de informações úteis para o raciocínio imediato e o planejamento do comportamento, mas que são descartadas ou esquecidas após serem utilizadas. Izquierdo (2011) sustenta que a memória de trabalho não produz arquivos e “não deixa tacos neuroquímicos ou comportamentais.” (IZQUIERDO, 2011, p.27). Ela mantêm por alguns segundos , ou minutos a informação. A ocorrência de uma aprendizagem, em face de uma situação nova está diretamente ligada à memória de trabalho e suas conexões com outros sistemas mneumônicos. Os principais neurotransmissores moduladores da memória de trabalho no córtex pré-frontal anterolateral são: acetilcolina (atuando sobre receptores muscarínicos) e dopamina (agindo dobre receptores de D1). 2.3.5 Memória de Curta Duração A memória de curta duração compreende os segundos iniciais a aquisição do aprendizado até 3 a 6 horas. Para Izquierdo (2011), “o tempo que 27 leva a memória de longa duração para ser efetivamente construída.” (IZQUIERDO, 2011, p.68). O referido autor dispõe sobre a função da memória de curta duração O papel da memória de curta duração é, basicamente, o de manter o indivíduo em condições de responder através de uma “cópia” efêmera da memória principal, enquanto esta ainda não tenha sido formada. Serve, em si, para ler (chegando à página 3 de um escrito devemos recordar as páginas 1 e 2), para dar sequência a epidios, e certamente para manter conversas (IZQUIERDO, 2011, p.72). As bases da memória de curta duração são principalmente bioquímicas, e o seu processo de aquisição depende de informações sensoriais. 2.3.6 Memória de Longa Duração O processo de formação de memória de longa duração é lento e frágil, podendo sofrer interferências internas ou externas, prejudicando ou anulando a gravação da informação recém-adquirida. Esse processo se estabelece em etapas, subordinadas a mecanismos moduladores como, vias provenientes da amígdala e axônios GABAérgicos e colinérgicos do núcleo medial do septo modulam inicialmente a formação de memórias no hipocampo.Essas vias estão ligadas ao nível de alerta, ansiedade e estresse e são reguladas pelos corticoides e epinefrina; a ativação moderada dessas vias e a hiperestimulação impossibilita a consolidação e a expressão de memórias.As vias referentes a avaliação afetiva e os estímulos de humor e (dopaminérgicas, noradrenérgicas e serotoninérgicas ativadas pela aquisição de uma experiência nova ou pela evocação de um registro anterior, regulam a adenililciclase PKA/CREB/síntese proteica, em que se apoia a consolidação duradoura de 3 a , 6 horas , após seus arquivos. Segundo estudos realizados por Lent (2013, p. 249) e equipe, constatou-se que ”a estimulação intensa da via serotoninérgica ou a inibição das vias dopaminérgicas e/ou noradrenérgica, por exemplo, podem cancelar a formação definitiva de uma memória horas após a sua aquisição.” 28 CAPÍTULO III O TEATRO COMO FERRAMENTA PEDAGÓGICA Ao participar de atividades teatrais, o indivíduo tem a oportunidade de se desenvolver dentro de um determinado grupo social de maneira mais responsável, legitimando os seus direitos dentro desse contexto, estabelecendo relações entre o individual e o coletivo, aprendendo a ouvir a acolher e a ordenar opiniões, respeitando as diferentes manifestações com a finalidade de organizar a expressão de um grupo (Parâmetros Curriculares Nacionais, 1997, p.83). Desde os primórdios da humanidade, representar atrai os homens. Representar- se, representar o outro, o desconhecido, os sentimentos, seja qual for o “objeto”, o ato de representar se faz presente. A criança no seu desenvolvimento, através de suas brincadeiras representa aqueles que com ela interagem e lhe servem de modelo. Esse processo de representação simbólica, desperta grande interesse e fascínio. O teatro surge então, como importante ferramenta para o trabalho com as pessoas que necessitam de educação especial, sendo capaz de despertar interesse, levando-os a utilizar a linguagem teatral como forma de comunicação, ampliando a sua capacidade de expressão, compreensão e assimilação de conceitos. Esse processo pode ser visto em decorrência de diferentes estímulos gerados pela atividade teatral que atuam sobre áreas cerebrais ativando a produção de neurotransmissores, responsáveis pela atenção e memória. O teatro no ensino fundamental proporciona experiências que contribuem para o crescimento integrado do aluno sob vários aspectos. No plano individual, o desenvolvimento de suas capacidades expressivas e artísticas. No plano coletivo, o teatro oferece, por ser uma atividade grupal, o exercício das relações de cooperação, diálogo, 29 respeito mútuo, reflexão sobre como agir com os colegas, flexibilidade de aceitação das diferenças e aquisição de sua autonomia com resultado do poder agir e pensar sem coerção. (Parâmetros Curriculares Nacionais, 1997, p.84) A atividade teatral como recurso didático quer sob o caráter contextualista, auxiliando na assimilação de conteúdos disciplinares ou, sob a ótica essencialista, utilizando sistemas semióticos de representação, desperta grande interesse por parte dos jovens participantes, estimulando em princípio a criatividade e a interação social. A atividade teatral contribui para o desenvolvimento global do aluno, através de um processo consciente e crítico, baseando-se numa convivência democrática. A formação de grupos para a execução dessa atividade favorece a integração de seus elementos, trazendo a conscientização da importância de existir uma colaboração entre eles para a execução da tarefa. A necessidade dessa colaboração torna consciente uma relação de convivência pautada no respeito, na adequação da fala, no ouvir, ver, observar e atuar. Antes da proposta de uma atividade teatral, o professor pode oferecer estímulos através de jogos preparatórios, com o objetivo de desenvolver habilidades necessárias para o teatro como: atenção, observação, concentração e propor temas que incentivem no aluno a criação e o domínio da linguagem teatral. Todavia, é necessário ter a consciência da importância do teatro para a aprendizagem e desenvolvimento do aluno e, não apenas como transmissão de uma técnica. À princípio, a atividade teatral tem seu interesse na relação entre os participantes e no prazer da representação. 30 O processo de preparação para a montagem de uma peça teatral segundo Granero compõe-se de seis etapas, descritas a seguir. Na etapa inicial, o aluno é levado a reconhecer a importância do Espaço em que está inserido, fazendo o relato de experiências pessoais, considerando passeios ou lugares frequentados, associando-os as emoções vivenciadas, trazendo à consciência o prazer e o medo, construindo a ideia do Espaço Emocional. Nesse processo de resgate de memórias, percebe-se o papel da emoção. Sabe-se que quanto maior o peso emocional, maior a chance de lembrar o fato ocorrido. “Os acontecimentos mais carregados de emotividade inscrevem-se com mais força em nossa memória declarativa” (CHABOT, 2005, p.68). A segunda etapa consiste na leitura de partes da peça pelos alunos., momento em que são apresentados os personagens, suas características físicas e psicológicas. Em seguida, a terceira etapa realizada é a Repetição da Leitura pelos alunos, buscando adaptar altura da voz, dar ritmo e fluência ao texto. A Neurociência destaca a importância do processo de repetição das informações adquiridas, assim como o uso de diferentes canais sensoriais de acesso ao cérebro para a consolidação da memória. Na atividade teatral, observa-se esta repetição, através dos ensaios, onde os diálogos são repassados com frequência repletos de emoções e utilizando diferentes canais sensoriais. A relevância da informação favorece sua manutenção por mais tempo na consciência. Desta forma, a leitura do texto, os exercícios de busca de voz para personagens, pronúncias, entonações, e demais recursos de expressão oral fortalecem ainda mais o sistema de repetição, auxiliando no processo de formação de memórias. O Aprofundamento é a quarta etapa, direcionado a pesquisa de aspectos espaciais e geográficos da região onde se desenvolve a história. 31 Observa-se a necessidade de contextualizar o texto, destacar as características do ambiente, o local e a linguagem dos personagens, características regionais ou específicas dos personagens. associando-os com os conceitos já trabalhados . Ao construir um personagem, seja ele, pessoa, animal ou ser inanimado, o aluno busca em sua memória informações já adquiridas e novas informações, através de conversas, leituras sobre o assunto, pesquisas. Essas atividades trarão repetidamente, conhecimentos ou registros já existentes no cérebro para um nível de ativação, tornando-os disponíveis para a memória operacional e, permitindo que outras informações sejam agregadas ao conjunto. Todas essas informações estarão ligadas a uma rede de informações no cérebro, relacionadas ao personagem a ser representado. A elaboração, ou seja, a associação de informações novas com os registros anteriores fortalece o traço de memória e o torna mais durável. É importante considerar que, o registro se tornará mais forte ao se criar vínculos, relacionando novos conhecimentos aos já existentes, estabelecendo um maior número de redes neurais. O trabalho com educação especial impõe a necessidade de contextualização e o resgate constante de registros anteriores, tornando a aprendizagem significativa e possibilitando associações com novos conceitos. O cérebro se dedica a aprender aquilo que ele percebe como significante e, portanto, a melhor maneira de envolvê-lo é fazer com que o conhecimento novo esteja de acordo com suas expectativas e que tenha ligações com o que já é conhecido e tido como importante para o aprendiz. (CONSENZA & GUERRA, 2011, p.58) É essencial que o professor crie oportunidades para que o mesmo assunto possa ser analisado várias vezes, em diferentes contextos, auxiliando no processo de construção de novas conexões neurais. Com relação à recuperação da memória, a Consenza e Guerra (2011), destacam que: 32 A recuperação da informação será mais eficiente dependendo da maneira como ela foi armazenada. Se o processo de elaboração foi complexo, criando muitos vínculos com as informações existentes haverá uma rede de interconexões mais extensa, que poderá ser acessada em múltiplos pontos, tornando o acesso mais fácil (CONSENZA & GUERRA, 2011, p.72). A quinta etapa descrita por Granero diz respeito à Pesquisa, utilizando recursos materiais que favoreçam a ambientação do aluno, necessária a sensibilização e à representação da peça. Desta forma, são apresentados elementos que auxiliem na elaboração de novos registros e na associação destes com os já existentes. A pesquisa permite que o aluno faça uma associação com os registros já existentes, num processo que a Neurociência descreve como associação, e que possibilita o fortalecimento do traço de memória, tornando-a mais durável. Observa-se que quanto mais se repetir essas informações e quantas mais ligações forem formadas, com as disponíveis no cérebro, o registro tende a se tornar mais forte, de forma mais permanente, e o acesso a essa memória se fará de forma mais rápida. O teatro, no processo de formação da criança cumpre, não só função integradora, mas dá oportunidade para que ela se aproprie crítica e construtivamente dos conte dos sociais e culturais de sua comunidade, mediante troca com os seus grupos (Parâmetros Curriculares Nacionais, 1997, p.84). Finalizando as etapas, Granero destaca a Leitura e Releitura do Texto, em que são propostos jogos dramáticos e sonoros para apresentar o texto, como o recitando rapidamente, devagar e cantarolando, em câmara lenta. Granero dispõe que desta forma, o aluno memoriza as falas, adquirindo vivência de se comunicar com um texto pela exploração da fala. Novamente, observa-se o sistema de repetição contribuindo na consolidação da memória. Durante todo o processo de planejamento, montagem e representação da atividade teatral, é essencial destacar o papel do incentivo, 33 para a melhoria e desempenho do aluno, valorizando seu sentimento de competência, contribuindo para sua autoestima. A respeito da importância do incentivo, Relvas (2012) considera, O incentivo, portanto, é fundamental para a progressão e melhoria do desempenho geral do indivíduo. Em síntese, é preciso garantir que o indivíduo tenha percepção integrada de si mesmo com o objetivo de interpretar adequadamente os sinais sociais, promovendo então a básica capacidade de confiar no outro e aceitar transitoriamente a dependência para o desenvolvimento (RELVAS, 2012, p.33). 3.1. No Palco: Emoção, Atenção e Memória O ato de dramatizar está potencialmente contido em cada um, como uma necessidade de compreender e representar uma realidade. Ao observar uma criança em suas primeiras manifestações dramatizadas, o jogo simbólico, percebe-se a procura na organização de seu conhecimento do mundo de forma integradora. A dramatização acompanha o desenvolvimento da criança como uma manifestação espontânea, assumindo feições e funções diversas, sem perder jamais o caráter de interação e de promoção de equilíbrio entre ela e o meio ambiente. Essa atividade evolui do jogo espontâneo para o jogo de regras, do individual para o coletivo (Parâmetros Curriculares Nacionais, 1997, p.83). Ao representar um personagem a pessoa que necessita de uma educação especial, tem a oportunidade de assumir suas características físicas e psicológicas, vivenciar diferentes contextos, interagir, envolver-se em situações improváveis, experimentar sensações, sentimentos, emocionar-se e adquirir memórias inesquecíveis. Sabe-se que o sucesso da criança na aprendizagem de fala,escrita e leitura dependem do amadurecimento neurofisiológico das células, bem como das estruturas emocionais e dos estímulos sociais .O brincar e as brincadeiras são indissociáveis do uso das diversas formas de linguagem (RELVAS, 2012, p.29). Na técnica dos jogos teatrais ou psicodrama pedagógico, o aluno, no papel de protagonista, tem a oportunidade de escolher os personagens necessários, criar espaços, utilizando acessórios disponíveis, relatar o tema a ser encenado, determinar a cada participante uma tarefa, como: recitar 34 poesias, fazer um comentário ou criar uma frase, ao mesmo tempo em que utiliza a expressão corporal, processo observado e repetido a cada novo participante. A respeito dos jogos teatrais Granero (2011) observa que: “Esse é um exercício envolvendo atenção, memorização de textos e de postura corporal, vivências criativas, observação de regras, pesquisa de material.” (GRANERO, 2011, p. 36) O desafio de participar de jogos teatrais, incentiva o aluno a experimentar situações novas, elaborar novos conceitos, associar ideias, estabelecendo, principalmente, novas conexões neurais que, facilitarão o processo de resgate dessas memórias. A atmosfera cênica composta a partir de recursos, como: cores, formas, texturas, ruídos, silêncios, luzes, sombras, ritmos , mobiliza os sentidos, e favorecendo a percepção seletiva, focada nos estímulos sensoriais. A respeito da representação teatral, Japiassu (2012) considera que: O aluno experimenta sua capacidade de uso consciente de sistemas complexos de representação semióticos que envolvam tanto o uso da palavra como o uso do corpo. Do engajamento ativo do aluno na área de jogo, ser-lhe-á possível tecer novas e infinitas possibilidades de significação da palavra na prática discursiva e ele será levado a considerar relevantes a entonação, os movimentos corporais, os gestos significativos (comunicação não verbal) e a dialogia subjacentes a todos os enunciados humanos. (JAPIASSU, 2012, p.220) Ao assistir a apresentação de uma peça observa-se o direcionamento voluntário do foco de atenção a um objeto específico, seja na compreensão de uma fala ou de um determinado aspecto representado, observamos a utilização atenção mental ou cognição seletiva. É inegável que compartilhar uma atividade lúdica e criativa, baseada na experimentação e na compreensão estimula o prazer, sendo um estímulo para a aprendizagem. 35 A sensação de prazer e satisfação são decorrentes da produção de neurotransmissores, dentre eles a dopamina. O circuito dopaminérgico (que utiliza a dopamina como neurotransmissor) tem sua origem em neurônios do mesencéfalo que se comunicam com muitas estruturas, mas têm como referência o núcleo acumbente, cujos neurônios se conectam com o córtex pré frontal.Estimulações dessa via provocam sensações de prazer e bem estar.Esse circuito está associado à motivação.Ela parece resultar de uma atividade cerebral que processa informações provenientes do meio interno e do ambiente externo, determinando comportamentos. A motivação envolve a aprendizagem e outros processos cognitivos. Ela promove a repetição de ações que trouxeram recompensa no passado ou a buscar situações próximas que tenham a possibilidade de oferecer a satisfação desejada. Assim, ela é essencial para a aprendizagem. A produção de dopamina em algumas regiões cerebrais parece estar vinculada a esse tipo de recompensa, que leva à aprendizagem. As emoções se traduzem por alterações na sua fisiologia e nos processamentos mentais, mobilizando os recursos cognitivos existentes como a atenção e a percepção. A Neurociência tem demonstrado que os processos cognitivos e emocionais estão relacionados no funcionamento do cérebro. As emoções envolvem respostas periféricas, percebidas fisicamente e modificações corporais internas, percebidas pelo sujeito. Essas respostas fisiológicas estão vinculadas a um sentimento emocional, associadas ao meio afetivo do organismo: euforia, desânimo, irritação, dentre outras. Determinado estímulo com valor emocional tem acesso ao cérebro pelas vias sensoriais. Chegando ao córtex cerebral, a informação é enviada à amígdala. O cérebro identifica o estímulo e avalia sua importância. Concomitantemente, uma segunda via nervosa, que seguindo as mesmas vias 36 sensoriais, segue direto à amígdala, antes de chegar ao córtex cerebral, desencadeando respostas emocionais periféricas, antes do córtex cerebral tornar consciente o estímulo. Observa-se que um mínimo elemento do ambiente, pode ser identificado como mobilizador, mesmo que seja despercebido pelos processos conscientes. Torna-se necessário prestar atenção nas emoções. O autoconhecimento emocional é uma habilidade que deve ser aprendida e aperfeiçoada. É importante destacar que durante todo o processo de planejamento, ensaios e representação observou-se a interação entre os jovens participantes. A cooperação na memorização de textos, a repetição de diálogos, as brincadeiras com as características dos personagens e falas específicas, resultantes de regionalismos, trouxeram para o cotidiano escolar uma atmosfera de alegria e cordialidade. A emoção e o prazer decorrentes da prática teatral favoreceu a produção de neurotransmissores como acetilcolina (ACh), responsável por controlar a atividade de áreas cerebrais relacionadas à atenção, à aprendizagem e à memória; a Noradrenalina, que induz a excitação física e mental e responsável pelo bom humor; o Ácido glutâmico ou Glutamato estimulador do SNC, cuja produção aumenta a sensibilidade aos estímulos de outros neurotransmissores, sendo essencial para criar vínculos entre neurônios que constituem a base da aprendizagem e da memória de longo prazo; a Dopamina, responsável por sensações de satisfação e prazer; a Serotonina, que regula o humor, o sono, a atividade sexual, o apetite, o ritmo circadiano, as funções neuroendócrinas, a temperatura corporal, sensibilidade a dor, atividades motoras e funções cognitivas. 37 CONCLUSÃO Considerado até algum tempo como atividade de pouca relevância, voltada principalmente aos momentos de lazer, o teatro vem se revelando um instrumento de grande valor pedagógico no trabalho com educação especial. A partir da necessidade de realizar um planejamento pedagógico que atenda aos interesses dos alunos, esta atividade pode ser considerada um recurso facilitador desse processo, auxiliando no direcionamento da atenção, na aquisição, consolidação e resgate de memórias. Os resultados positivos da representação teatral podem ser explicados pela Neurociência, ao considerar que informações relevantes mobilizam a atenção, estimulam a ativação de neurônios, produzindo em circuitos nervosos específicos, alterações estruturais que tornam as sinapses mais eficientes possibilitando o aparecimento de registros. A Neurociência considera fundamental, a repetição e a elaboração desses registros, associando-os a diferentes canais sensoriais, fortalecendo-os e facilitando o processo de resgate dessas memórias. Os conhecimentos disponibilizados pela Neurociência, relativos à atenção e a memória, contribuem de forma efetiva para o processo de aprendizagem e possibilitam à aquele que necessita de educação especial desenvolver sua autoestima, reconhecer-se e ser reconhecido com pessoa capaz de expressar suas ideias e sentimentos, favorecendo sua inclusão social. 38 BIBLIOGRAFIA BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: Arte. Secretaria de Educação Fundamental, Brasília: MEC,1997. CHABOT, Daniel; CHABOT, Michel. Pedagogia Emocional Sentir Para Aprender Como Incorporar a Inteligência Emocional às Suas Estratégias de Ensino. São Paulo: Editora Sá, 2005. COSENZA, M., Ramon; Guerra, B. Leonor. Neurociência e Educação. Porto Alegre: Artmed, 2011. GRANERO, Vic Vieira. Como usar o teatro em sala de aula. São Paulo: Contexto, 2011. IZQUIERDO, Ivan. Memória. 2ª ed., Porto Alegre: Artmed, 2011. JAPIASSU, Ricardo. Metodologia do Ensino do Teatro. 9ª ed., Campinas: Papirus, 2012. LENT, Roberto. Neurociência da Mente e do Comportamento. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013. _____________. Cem Bilhões de Neurônios: Conceito Fundamental Neurociência. 2ªed., Rio de Janeiro: Atheneu, 2002. RELVAS, Marta P. Fundamentos Biológicos da Educação. 4ª ed., Rio de Janeiro: Wak, 2009. ________________. Que cérebro é esse que chegou à escola? Rio de Janeiro: Wak, 2012. 39 ÍNDICE FOLHA DE ROSTO AGRADECIMENTOS DEDICATÓRIA RESUMO METODOLOGIA SUMÁRIO INTRODUÇÃO 02 03 04 05 06 07 08 CAPÍTULO I Uma Habilidade Chamada Atenção 1.1. Tipos de Atenção 1.1.1. Atenção Explícita ou Aberta 1.1.2. Atenção Implícita ou Oculta 1.1.3. Atenção Sensorial ou Percepção Seletiva 1.1.4. Atenção Mental ou Cognição Seletiva 1.2. Estruturas Cerebrais Responsáveis pela Atenção 1.3. Mecanismos Cerebrais Envolvidos na Atenção 10 14 14 14 14 15 16 17 CAPÍTULO II Memória: Uma Rede de Associações 2.1. Estruturas Cerebrais da Memória 2.2. Mecanismos Neurais da Memória 2.3. Tipos de Memórias 2.3.1. Memória Declarativa ou Explícita 2.3.2. Memória Não Declarativa 2.3.3. Memória Associativa e Não Associativa 2.3.4. Memória de Trabalho ou Operacional 2.3.5. Memória de Curta Duração 2.3.6. Memória de Longa Duração 19 20 21 24 25 25 26 26 26 27 CAPÍTULO III O Teatro como Ferramenta Pedagógica 3.1. No Palco: Emoção, Atenção e Memória 28 33 CONCLUSÃO BIBLIOGRAFIA 37 38 40