A Responsabilidade Socioambiental das Empresas Estrangeiras no Brasil: Uma Comparação com as Empresas de Capital Nacional Autoria: Kelly Roman Pavan, Tobias Coutinho Parente, Talita Rosolen, Felipe Mendes Borini, Moacir de Miranda Oliveira Junior RESUMO A proposta deste artigo é verificar se, no Brasil, as empresas estrangeiras possuem práticas de RSA mais consolidadas que as empresas brasileiras. Adicionalmente, espera-se identificar os impactos de aspectos intervenientes sobre a RSA dessas empresas (tanto estrangeiras quanto brasileiras), quais sejam: o tamanho e o tempo de atuação. A metodologia de pesquisa é quantitativa, sendo utilizados dados secundários de domínio publico da pesquisa das Melhores Empresas para Você Trabalhar, de 2012, publicada pelo Guia Você S/A Exame. Os resultados demonstram que, no Brasil, as empresas estrangeiras têm práticas de RSA mais consolidadas, assim como, as empresas de grande porte. 1 1 INTRODUÇÃO A Responsabilidade Socioambiental (RSA) já faz parte do planejamento estratégico de muitas empresas, que percebem a viabilidade de conciliar o alcance de sua finalidade última, a obtenção de lucros, com a promoção de práticas que contribuam para a mitigação dos impactos socioambientais inerentes as suas atividades. A percepção da oportunidade de ganhos de vantagens competitivas no mercado de atuação, através das práticas de RSA, é um fator importante que impulsiona as empresas a adotarem práticas socioambientais responsáveis (PORTER; VAN DER LINDE, 1995). Essa forma de conceber a RSA está atrelada à idéia da criação de valores comuns, partilhados pela sociedade e pelas empresas. Ou seja, a empresa passa a ver geração de valor em atividades em que a sociedade enxerga oportunidade de atingir o bem-estar social. Há, portanto, uma convergência de interesses entre as empresas e a sociedade (PORTER; KRAMER, 2006). Essa percepção, da convergência de interesses entre as empresas e a sociedade, é particularmente importante para as empresas multinacionais, que têm a adoção de práticas de RSA como uma via de legitimação nos mercados dos países em que se propõem a atuar (DAMKE; SOUZA, 2005; CAMPBELL; EDEN; MILLER, 2012). As empresas oriundas de países estrangeiros sofrem, nos países hospedeiros, um tipo de resistência, nomeado na literatura como liability of foreigness (responsabilidade dos estrangeiros) (KOSTOVA; ZAHEER, 1999; DENK; KAUFMANN; ROESCH, 2012) e que implica em que a empresa despenda redobrados esforços em tentar se legitimar no novo mercado. Nesse sentido, quanto mais diferentes, em termos de suas instituições, forem os países de origem e hospedeiro, maior será a dificuldade da empresa de se adaptar e superar essa resistência (BERRY; GUILLÉN; ZHOU, 2010). A RSA funciona, portanto, como uma facilitadora do processo de legitimação das empresas multinacionais nos países estrangeiros em que operam, uma vez que viabiliza a identificação de traços comuns nos objetivos dessas empresas com os objetivos da sociedade e aproxima as empresas de um diálogo mais eficiente com os seus principais stakeholders (partes interessadas) naqueles países. A interação com a comunidade local, proveniente de uma atuação social e ambiental ativa da empresa, pode trazer benefícios para a imagem da empresa, benefícios esses que vão mesmo além da licença para operar, gerando ganhos na reputação corporativa (MACHADO FILHO; ZYLBERSZTAJN, 2004; MELO; GARRIDO-MORGADO, 2012). Dessa forma, a empresa tem a possibilidade de aumentar a capacidade de negociar contratos mais atrativos, atrair potenciais funcionários, cobrar preços superiores para os seus produtos, e, assim, reduzir o seu custo de capital (GARDBERG; FOMBRUN, 2006). Ademais, ingressando em mercados fortemente internacionalizados e competitivos, as empresas procuram, cada vez mais, avaliar critérios de globalização e localização para a conformação de suas estratégias, inclusive as estratégias de RSA (MULLER, 2006). Para serem efetivas, as práticas de RSA devem refletir traços estratégicos comuns em todas as unidades, de modo a assegurar a unidade da empresa, mas ao mesmo tempo serem flexíveis para se adaptarem as mais diversas circunstâncias existentes nos locais onde as empresas multinacionais instalam suas subsidiárias (MULLER, 2006). Isso implica em que as empresas multinacionais tenham disposição em atender aos anseios e demandas de seus principais stakeholders locais por um comportamento mais responsável com a sociedade e com as questões ambientais (ALMEIDA, 2006), compatibilizando-os à estratégia de RSA de toda a corporação. Assim, o objetivo do presente artigo é identificar se as empresas estrangeiras que atuam no Brasil possuem práticas de RSA mais consolidadas do que as empresas de capital nacional (brasileiro). A hipótese central defendida é que as empresas multinacionais empenham 2 maiores esforços em práticas de RSA nos países estrangeiros como via de legitimar sua atuação nesses países. Ademais, o artigo também investiga o efeito interveniente do tamanho e do tempo de operação nas práticas de RSA. O artigo está estruturado da seguinte maneira: no início, são apresentadas as quatro dimensões de RSA aqui investigadas, a saber, estratégica, ética, social e ambiental. Em seguida, são formuladas as hipóteses para a relação principal do artigo, entre RSA e capital de origem da empresa, e as secundárias, relacionadas ao tamanho e ao tempo de operação. A metodologia apresenta as fontes de dados e o tratamento dos mesmos dados. Os resultados testam as hipóteses e tecem as reflexões acerca dos achados, sendo que a conclusão pontua a contribuição do artigo, sugestões e limitações. 2 Referencial Teórico 2.1 Dimensão Estratégica da RSA Na academia, alguns autores estão se dedicando a entender a relação entre a gestão estratégica e a RSA. Autores europeus vêm refletindo sobre essa perspectiva (WHITTINGTON et al., 2003; HANKE; STARK, 2009) e, nos EUA, cresce a preocupação dos acadêmicos da área de estratégia com a temática (FREEMAN; McVEA, 2001; McWILLIAMS; SIEGEL; WRIGHT, 2006; PORTER; KRAMER, 2006). No Brasil, esse movimento começa a florescer, porém, ainda de forma incipiente. Não existe um posicionamento claro por parte da academia, mas os trabalhos de Coutinho e Macedo-Soares (2002); Faria e Sauerbronn (2008) e Sousa et al. (2010) contribuem para o debate. Pereira e Campos Filho (2007) destacam a existência da escola denominada Social Issues Management (gestão de temas sociais) que trata os problemas sociais como variáveis a serem consideradas na gestão estratégica. De acordo com Faria e Sauerbronn (2008), essa escola surgiu já há algum tempo, no início dos anos 1980, procurando dispor de ferramentas de gestão para maximizar o desempenho ético e moral das organizações, visando transformar a sensibilidade corporativa em vantagem competitiva. Assim, no longo prazo, o que é benéfico para a sociedade é bom também para as empresas, deixando transparecer que o que é bom para a empresa acaba, por fim, sendo também bom para a sociedade (PEREIRA; CAMPOS FILHO, 2007). Faria e Sauerbronn (2008) acrescentam que o foco da maioria dos estudos que contemplam essa área está na CSP — Corporate Social Performance (performance social corporativa), sendo a principal preocupação explicar como a responsabilidade social leva a maiores retornos sobre o investimento. Nesse sentido, Coutinho e Macedo-Soares (2002) revisaram a literatura referente à RSA e à estratégia e propuseram um modelo para implantar a responsabilidade social estratégica. Os autores mostram que “é fundamental que os objetivos de responsabilidade social estejam espelhados nas dimensões de desempenho, para que possam ser alcançados” (p. 88). Contudo, Lantos (2001) lembra que a evidência empírica da abordagem estratégica da RSA não é completamente comprovável. Assim, o autor sugere esforços de pesquisa nessas duas frentes, com o objetivo de identificar quais os limites da performance social corporativa. 2.2 Dimensão Ética da RSA É amplamente aceita a idéia de que a atividade de negócios possui uma dimensão ética, complementar às suas dimensões econômica e legal. No entanto, não há um consenso sobre a natureza da dimensão ética e quem seria o responsável pela mesma dimensão. Assim, o debate fica polarizado entre os que acreditam na visão dos stockholders (Friedman, 1970), em que a única responsabilidade social dos gestores é incrementar o retorno sobre o capital investido pelos donos do negócio; e aqueles que defendem a visão dos stakeholders (Freeman, 1984), para quem os gestores devem contemplar os diversos grupos – clientes, consumidores, 3 fornecedores, empregados, comunidade, uma vez que, todos eles são afetados pelas decisões da firma (MACHADO FILHO; ZYLBERSZTAJN, 2004). Tal discussão acerca das finalidades das organizações cria a escola Business Ethics (ética nos negócios), considerada um campo que proporciona o diálogo entre os campos da filosofia e da administração (DE GEORGE, 1987). Kreitlon (2004) observa essa escola como a precursora de todas as escolas da RSA, sendo caracterizada por sua natureza normativa, onde se propõe uma abordagem filosófica centrada em valores e julgamentos morais. Pena (2003) corrobora essa visão e destaca que, na construção da Business Ethics, busca-se valorizar a dimensão do negócio, tentando transformar a ética em uma variável gerenciável. Essa busca do gerenciamento das questões éticas a escola tem como intuito fazer com que a perspectiva ética não se dilua e se perca em meio aos processos administrativos. Portanto, criam-se códigos, missões, crenças e princípios que pautam a atuação empresarial (PENA, 2003). Porém, ressalta-se que os códigos de ética, por si só, não são capazes de estabelecer uma relação ética dentro da organização, sendo somente um dos influenciadores da mesma. Nesse sentido, Stevens (2008) os códigos de ética se tornam mais efetivos, quando existe inserção do código na cultura organizacional, líderes que incentivam a ética e comunicação do código de forma estratégica. Quanto à RSA, Pena (2003) argumenta que a Business Ethics abrange a RSA, sendo, portanto, uma relação necessária. Entretanto, o contrário não seria verdadeiro. O autor defende que a empresa socialmente responsável não necessariamente é uma empresa ética, pois ela necessita de mais requisitos. A associação da RSA à ética empresarial, por sua vez, é um esforço de ampliação do conceito. 2.3 Dimensão Social da RSA Segundo Ashley (2005), os argumentos a favor da atuação social das empresas partem, principalmente, da área acadêmica conhecida como Business & Society (Negócios e Sociedade), que preconiza uma abordagem contratual entre empresa e sociedade, onde ambas formam uma rede de interesses permeada pela busca de legitimidade (PEREIRA; CAMPOS FILHO, 2007). Posteriormente, o ritmo avançado do processo expansionista e da globalização do setor empresarial chamou a atenção para a consequente intensificação dos impactos causados pelas operações das grandes empresas. Observou-se a pró-atividade de alguns líderes empresariais na busca de provocar mudanças na postura do setor e promover práticas que refletissem compromisso com aspectos sociais e ambientais, além dos econômicos. Foi criado, em 1992, o Conselho Mundial Empresarial para o Desenvolvimento Sustentável (WBCSD). O WBSCD passou a disseminar a noção de que uma estratégia coerente de RSA, baseada em ética sólida e em valores fundamentais, oferece benefícios claros ao negócio, que derivam da adoção de uma visão mais abrangente. Essa estratégia possibilita que as empresas monitorem mudanças nas expectativas sociais e ajuda a controlar riscos e identificar oportunidades de mercado, além de alinhar valores corporativos e societários, o que resulta em uma melhor imagem para a companhia (WBCSD, 1999). Assim, as empresas começaram a desenvolver ações de responsabilidade social com o envolvimento dos stakeholders. Mueller (2003) argumenta que a atuação social da empresa deve envolver o público interno, como por meio do investimento em melhorias na qualidade de vida dos funcionários e seus familiares e em programas de diversidade social, racial e de gênero, mas também o público externo, como em projetos sociais na comunidade e no desenvolvimento de ações voluntárias dos funcionários em escolas, asilos, entre outros. 2.4 Dimensão Ambiental da RSA 4 A dimensão ambiental passou a ser amplamente disseminada, no final da década de 1980, com o conceito de desenvolvimento sustentável proposto pelo relatório Our Common Future. Também foi um marco para consolidação da relevância do tema a Agenda 21, documento construído na Eco-92, evento ocorrido em 1992, no Rio de Janeiro, cujo principal objetivo era encontrar maneiras de conciliar o desenvolvimento socioeconômico com a conservação e a proteção ambiental (BATISTA; CAVALCANTI; FUJIHARA, 2005). Outro marco no desenvolvimento sustentável foi conceito de Triple Bottom Line, que aproximou a relação entre os aspectos do desenvolvimento sustentável e a atuação das empresas. Essa abordagem se contrapõe à visão de que as empresas apenas devem se preocupar com seu desempenho financeiro e propõe que a estratégia empresarial deve englobar a análise tríplice de resultados: resultados econômicos, resultados ambientais e resultados sociais adicionados ou destruídos no processo de criação de riqueza no curto, médio e longo prazos. (ELKINGTON, 1998). Damke e Souza (2005) afirmam que, principalmente com o objetivo de melhoria de imagem, ações voltadas à preservação e valorização do meio ambiente passaram a ocupar posição estratégica para muitas empresas globalmente. Práticas como a separação e a reciclagem do lixo, programas de controle e compensação de emissão de gases do efeito estufa e campanhas de preservação do meio ambiente são alguns exemplos de como as empresas passaram a abranger a dimensão ambiental. Almeida (2006) afirma que as pressões para a aderência das organizações à visão da sustentabilidade estão essencialmente ligadas à necessidade de uma abordagem capaz de gerar riquezas de maneira contínua, garantindo o sucesso de longo prazo e alinhando seus processos e estratégias à integração de três objetivos que devem seguir juntos: crescimento econômico, preservação ambiental e equidade social. Desse modo, seria alcançado o objetivo de satisfação das necessidades da sociedade atual, bem como das gerações futuras, corroborando o conceito de desenvolvimento sustentável. 3 Hipóteses 3.1 RSA e a Internacionalização Diante da intensificação do fenômeno da internacionalização de diversas empresas, têm sido dedicados esforços à discussão das interconexões entre a internacionalização de empresas e a RSA. Essa discussão tem se dado, essencialmente, acerca da legitimidade da empresa internacionalizada nos países hospedeiros. É preciso destacar que a busca pela legitimidade é um assunto ainda bastante delicado para as empresas multinacionais. É sabido que as empresas multinacionais sofrem, nos países hospedeiros, uma espécie de resistência inicial, denominada “liability of foreigness” (KOSTOVA; ZAHEER, 1999; DENK; KAUFMANN; ROESCH, 2012) e derivada da falta de conhecimento que o país hospedeiro tem em relação a essas empresas. Ela consiste, essencialmente, no custo adicional que as empresas multinacionais têm para operar em mercados estrangeiros, quando comparadas às empresas concorrentes locais (DENK; KAUFMANN; ROESCH, 2012). Dessa forma, é comum que as empresas multinacionais enfrentem problemas de legitimação, ou seja, encontrem dificuldades para adquirir sua licença para operar (KOSTOVA; ZAHEER, 1999) nos novos mercados para os quais se internacionalizam. Elas serão julgadas diferentemente das empresas locais e poderão sofrer a atribuição de estereótipos que as coloquem em desvantagem em relação às concorrentes locais (CAMPBELL; EDEN; MILLER, 2012). A forma de superar essa rejeição inicial e conquistar os novos mercados, tanto seus consumidores, quando importantes parceiros comerciais, é a ampliação da legitimidade social 5 dessas empresas multinacionais. Uma das formas de se fazer isso é aumentando o comprometimento com o país hospedeiro, através de sua RSA (CAMPBELL; EDEN; MILLER, 2012). Nesse sentido, a RSA passou a ser um elemento que compõe a estratégia de legitimação das empresas nos países hospedeiros. Contudo, tal estratégia não é fácil para a multinacional, pois existem duas forças que podem ser antagônicas na determinação das estratégias de RSA das multinacionais, as diretrizes de RSA globais versus as locais. A determinação dessas estratégias requer um balanceamento adequado para incrementar a legitimidade local e não afetar a legitimidade global. Um caminho para facilitar o processo de legitimação de uma empresa multinacional e que está diretamente ligado a RSA é a criação de valores globais atrelados ao atendimento de questões específicas de cada país hospedeiro. Conforme indicado por Muller (2006), esse caminho consiste na capacidade de criar diretrizes globais de RSA da corporação aliadas ao atendimento particularizado das comunidades locais de cada país. Trata-se de uma linha tênue para a conquista da legitimidade, na medida em que uma estratégia global, centralizada, partindo da matriz, pode conduzir à falta de legitimidade no nível local, pois pode não haver a identificação dos stakeholders locais com tais práticas estrangeiras. As estratégias locais, por sua vez, seriam mais responsivas aos problemas locais, às necessidades específicas suscitadas por determinado contexto, por determinada população, mas podem, também, ser fragmentadas, diferindo de subsidiária a subsidiária, e colocando em risco os padrões mínimos de RSA pleiteados pela empresa matriz (MULLER, 2006). Claro está que nem todas multinacionais conseguem esse balanço entre as duas estratégias. Porém, quando comparadas às empresas nacionais, parece existir mais fatores motivadores para que as multinacionais exerçam práticas de RSA. Na busca da legitimidade no país hospedeiro, a multinacional é impulsionada ora a atender aos padrões locais e ora aos padrões globais. Por sua vez, as companhias nacionais, ainda que direcionadas para estratégias de RSA, não podem se valer de parâmetros globais de atuação. Em especial, se o local em questão for um país emergente, menores serão as pressões para que as práticas de RSA sejam cumpridas, em razão das lacunas institucionais que permeiam esses países (KHANNA; PALEPU; BULLOCK, 2010). Por outro lado, é bem verdade que as empresas nacionais podem entender melhor as condições prementes dos aspectos sociais e ambientais do país de atuação, mas não podem comparar essas práticas com outras filiais ao redor do mundo e se valer do exercício da transferência de práticas de RSA (BORINI; OLIVEIRA JR.; CHUEKE, 2012) para incrementar suas estratégias nessa área. Logo, com base no exposto, é possível propor que, buscando superar as dificuldades de legitimação por operarem em um país estrangeiro, as empresas estrangeiras instaladas no Brasil possuem mais RSA do que as empresas brasileiras, que não enfrentam semelhante dificuldade de legitimação, por serem nativas do país. Apresentadas as considerações acima, sugere-se a seguinte hipótese: H1: As empresas estrangeiras têm práticas de RSA mais consolidadas que as empresas brasileiras. 3.2 Aspectos Intervenientes: o tamanho e o tempo de atuação da Empresa Além do impacto da internacionalização sobre o desenvolvimento de práticas de RSA em uma empresa, é possível destacar outros fatores que também podem influenciar a evolução de uma organização neste sentido, tais como seu tamanho e seu tempo de existência. Há pesquisadores que argumentam que o tamanho de uma empresa influencia positivamente o desenvolvimento de práticas de RSA, ou seja, quanto maior a empresa, mais consolidadas serão suas práticas sociais e ambientais. Stanwick e Stanwick (1998) encontraram, em suas pesquisas, resultados que demonstram que o tamanho da organização, bem como sua 6 performance financeira e ambiental têm relação positiva com sua performance em RSA. Os autores defendem que a influência do tamanho sobre o desenvolvimento de ações sociais e ambientais pode ocorrer por conta da importância da reputação para empresas que ocupam posição de maior destaque na sociedade. Assim, as grandes empresas são impulsionadas a se comprometer com um papel de liderança em questões sociais e ambientais, não somente em decorrência de sua maior disponibilidade de recursos, mas também por conta de pressões de seus stakeholders. Em contraposição, Orlitzky (2001) encontrou resultados divergentes em sua pesquisa sobre a relação entre desempenho financeiro e desempenho de RSA. Ao inserir a variável tamanho da organização para avaliar se este fator influenciaria na relação entre os dois fatores, encontrou que o tamanho não possui influência relevante e, portanto, poderia ser considerado um aspecto neutro em relação ao desempenho de RSA de uma organização. O autor destaca a discussão acadêmica de que a influência positiva apresentada entre os resultados financeiros de uma empresa e sua performance em RSA poderia ser explicada pelo tamanho da empresa e refuta esta idéia com os resultados de sua meta-análise, mostrando que a maior influência ainda seria do desempenho financeiro de uma companhia ao invés de seu tamanho. Borba (2005), por sua vez, também concluiu em suas pesquisas que o tamanho da organização não possui influência significativa sobre o desempenho empresarial em RSA, corroborando os resultados de Orlitzky (2001) e confrontando os indícios encontrados por Stanwick e Stanwick (1998). Brammer e Millington (2006) encontraram resultados que confirmam a relação de influência entre o tamanho da empresa e a evolução de suas práticas em RSA, porém apontam relação também com a questão da visibilidade da empresa. Argumentam, então, que este fator é provavelmente mais responsável pelos investimentos em ações sociais e ambientais do que o fator tamanho da organização. Corroborando em parte essa constatação, Beltratti (2005) argumentou que as empresas que praticam RSA são as mais valiosas e respeitadas. Observando a discussão acima, fica evidente que não existe um consenso do quão influenciador é o tamanho da empresa para as ações de RSA. Porém, fica claro que, por conta da manutenção do capital reputacional, as empresas que possuem uma melhor condição financeira tendem a ter um maior desenvolvimento de práticas de RSA. Isso, por sua vez, leva a crer que empresas que possuem melhores condições de investimento tendem a ser as grandes empresas, por isso, este estudo sugere a seguinte hipótese: H2a: As empresas de maior porte têm práticas de RSA mais consolidadas. Já em relação ao tempo de existência de uma organização e sua influência no desenvolvimento de RSA, não há muitas pesquisas desenvolvidas. Cochran e Wood (1984) encontraram resultados que apontam que a idade dos ativos de uma empresa tem influência negativa sobre seu desempenho social. Wagner (2011) incluiu esta variável ao pesquisar os fatores que influenciam o desempenho ambiental de uma organização relacionando-o com a pressão de seus stakeholders. O autor também concluiu que empresas mais antigas tendem a ter desempenho ambiental menos favorável, uma vez que necessitam de investimentos mais altos para adequar suas fábricas e equipamentos a padrões ambientais mais exigentes, ao passo que empresas mais jovens dispõe de instalações mais modernas e eficientes com investimentos menores. No entanto, Brammer e Millington (2011) sugeriram que o ciclo de vida da indústria pode desempenhar um papel positivo como uma contingência na relação entre desempenho socioambiental e financeiro. Por isso, os autores sugeriram estudos futuros para investigar a importância do tempo na RSA, dada a fraca percepção das novas empresas em relação à temática da RSA. Além disso, Beltratti (2005) assegurou que empresas que possuem um alto 7 nível de RSA tendem a ser as mais respeitadas e valiosas, o que contribui para a longevidade das mesmas. Mesmo havendo um impasse na literatura, acredita-se que empresas mais antigas tendem a ter práticas de RSA mais consolidadas do que as mais jovens. Empresas que estão operando há mais tempo devem estar mais consolidadas no mercado, podendo, então, despender esforços para outras frentes como a RSA, enquanto as mais jovens precisam primeiro se estabelecer no mercado para depois destinarem esforços para RSA. Assim, este trabalho levanta a seguinte hipótese: H2b: As empresas com maior tempo de atuação têm práticas de RSA mais consolidadas. 4 Metodologia Este artigo foi elaborado com base na análise quantitativa de dados secundários. Os dados secundários são de domínio público e foram obtidos juntamente à Fundação Instituto de Administração, sendo eles parte dos dados coletados a título da elaboração da lista das Melhores Empresas para Você Trabalhar, edição de 2012, divulgada pelo Guia Você S/A Exame. Os dados consistiam nas respostas das 428 empresas participantes para aquelas perguntas relativas a sua RSA, seu tamanho e seu tempo de operação. Para o procedimento dos testes estatísticos, foram criadas escalas que permitissem o agrupamento dos dados, de modo a tornar os resultados inteligíveis. Vale lembrar que os dados foram coletados no início do ano de 2012, mas se referem à atuação das empresas no ano de 2011. Das 428 empresas, 105 são de origem estrangeira e 323 brasileiras. Em relação ao tempo de operação e ao tamanho (nº de empregados), os dados podem ser vistos na tabela 1: Tabela 1: Perfil da amostra por tempo de Operação e Número de Empregados Tempo de Operação Até 12 anos De 13 a 24 anos De 25 a 36 anos De 37 a 60 anos Mais de 60 anos Nº de Empregados Até 250 De 251 a 500 De 501 a 1000 De 1001 a 2500 Mais de 2500 Brasileiras 35 85 69 102 32 Brasileiras 80 69 48 62 64 Estrangeiras 15 32 14 22 22 Estrangeiras 18 13 16 20 38 Total 50 117 83 124 54 Total 98 82 64 82 102 Fonte: autores Para atender aos objetivos deste estudo, foram consideradas as seguintes variáveis independentes (ou explicativas): o tamanho das empresas, o tempo de operação de cada empresa e, finalmente, a origem das empresas. Enquanto a variável dependente era o índice de RSA (Figura 1). O escalonamento das respostas e a composição do índice foram feitos conforme explicitado a seguir. Figura 1. Variáveis em estudo Origem H1 Tempo de Atuação Tamanho H2a H2b RSA Fonte: Autores. 8 Compondo o eixo central da análise deste artigo, a variável independente origem da empresa foi classificada em dummy 0, para as empresas nacionais, e dummy 1, para as empresas estrangeiras. O tamanho das empresas, classificado em uma escala de 1 a 5, segundo o número de funcionários, sendo as empresas de até 250 funcionários classificadas como empresas da categoria 1; empresas de 251 até 500 funcionários como empresas da categoria 2; empresas de 501 até 1000 funcionários como empresas da categoria 3; empresas de 1001 até 2500 funcionários como empresas da categoria 4; e, finalmente, empresas com mais de 2500 funcionários classificadas como empresas da categoria 5. O tempo de operação de cada empresa, classificado em uma escala de 1 a 5, de acordo com o número de anos de operação da empresa sendo as empresas de até 12 anos classificadas como empresas da categoria 1; empresas de 13 a 24 anos como empresas da categoria 2; empresas de 25 a 36 anos como empresas da categoria 3; empresas de 37 a 60 anos como empresas da categoria 4; e, finalmente, empresas de mais de 60 anos classificadas como empresas da categoria 5. A variável dependente, ou seja, o índice geral de RSA das empresas em estudo, foi também construída com base nos dados constantes no questionário respondido por essas empresas, no âmbito da pesquisa original. Na oportunidade da pesquisa, as empresas eram questionadas com relação à sustentabilidade do ponto de vista estratégico, de seus princípios éticos, de suas posturas e iniciativas sociais, e de suas iniciativas ambientais. Observe-se que essas dimensões, que participaram na composição da variável dependente, são, também, as dimensões amparadas pela literatura. Portanto, atribui-se credibilidade e robustez ao índice geral de RSA criado pelos autores. A pergunta, do ponto de vista estratégico, era: a Empresa considera a sustentabilidade como parte do planejamento estratégico? As respostas consideradas foram: 1) sim, e dissemina valores que favorecem a sustentabilidade, como colaboração, apoio mútuo, pensamento no coletivo, abertura para aprendizado, entre outros; 2) sim, e há um suporte da área de RH às lideranças para que os princípios de sustentabilidade sejam disseminados aos empregados; 3) sim, e possui estruturas e processos produtivos sustentáveis; 4) sim, e há métricas para averiguar se a empresa está se tornando mais sustentável; e 5) sim, e faz seleção de fornecedores ou demais elos da cadeia de valor baseada em princípios da sustentabilidade. A pergunta, do ponto de vista ético, era: a Empresa elaborou e disseminou um código de ética e/ou de conduta para orientar o comportamento de seus empregados? As respostas consideradas foram: 1) sim, e os empregados tiveram oportunidade de questionar, criticar e ou contribuir com a composição das cláusulas do código de ética; 2) sim, e a empresa divulga formalmente o código de ética por meio de comunicação interna, como jornais, revistas, intranet, murais; 3) sim, e a empresa divulga formalmente o código de ética por meio de atividades interativas como reuniões, palestras, ou treinamento formal; 4) sim, e os gestores foram formalmente treinados ou orientados sobre como disseminar o código de ética; 5) sim, e a Empresa adota programas ou ações formais de prevenção de ocorrências de assédio moral ou sexual; e 6) sim, e há um programa formal de monitoramento do cumprimento das cláusulas do código de ética. A pergunta, do ponto de vista social, era: a empresa desenvolveu ações de responsabilidade social em 2011? As respostas consideradas foram: 1) sim, e as ações envolveram os empregados; 2) sim, e as ações envolveram os familiares dos empregados; 3) sim, e a empresa adota programas ou ações formais visando a diversidade social, racial ou de gênero; 4) sim, e a empresa estimula e apóia periodicamente as ações de voluntariado dos empregados; 5) sim, e a empresa estimula e apóia periodicamente ações de voluntariado dos familiares dos 9 empregados; 6) sim, e as ações envolveram as comunidades do entorno das instalações da empresa; e 7) sim, e a empresa adota mecanismos formais de avaliação dos resultados do programas e ações de responsabilidade social. A pergunta, do ponto de vista ambiental, era: a Empresa tem uma atuação organizada para a preservação do ambiente? As respostas possíveis eram: As respostas consideradas foram: 1) sim, e há programa de separação do lixo e reciclagem de material; 2) sim, e há campanhas internas para preservação do meio ambiente; 3) sim, e há programa de controle de emissão de CO2; 4) sim, e há controle da destinação do lixo e de resíduos; 5) sim, e há apoio financeiro a ações da sociedade civil para preservação do meio ambiente; e 6) sim, e há apoio e estímulo às ações sociais dos empregados visando a preservação do meio ambiente. Diante das múltiplas alternativas de resposta, a cada resposta positiva era computado um ponto de acordo com cada dimensão. O score final foi ponderado numa escala de cinco pontos, uma vez que, foram ajustadas para dimensão com o menor numero de perguntas no caso, a dimensão do ponto de vista estratégico. Para compor, portanto, o índice geral de RSA das empresas participantes do estudo, os quatro constructos foram submetidos a uma análise fatorial, para verificar se as quatro dimensões poderiam ser reduzidas para um único fator de RSA. No caso, as quatro dimensões de RSA descritas anteriormente foram submetidas à análise fatorial. Quanto ao tamanho da amostra, apresenta-se superior a dez observações por variável, conforme indicação de Hair Jr. et al. (2005). A matriz de correlações entre as variáveis (Tabela 2) mostra que existem valores significativos e altos para a utilização da técnica (FAVERO et al., 2009). Ademais, o teste de esfericidade de Bartlett apresenta valor significativo (p<0,01) e com valor de KMO de 0,811, que é considerado bom (FAVERO et al., 2009). Tabela 2: Matriz de Correlação e Anti-Imagem Matriz de Correlação 1 2 3 4 Estratégico Ético Social Ambiental ** p < 0,01 Média 2.70 2.31 2.54 2.81 Desv. Pad. 1.72 1.63 1.53 1.57 1 2 3 4 1 0,546** 1 0,641** 0,583** 1 0,713** 0,531** 0,629** 1 Matriz Anti-imagem 1 ,783a -172 -277 -482 a = MSA. 2 3 4 ,863a -311 -141 ,827a -258 ,788a Fonte: Autores. Na mesma Tabela 2, pode ser observada a matriz anti-imagem e é possível verificar que os valores de MSA (diagonal principal) são altos e não inferiores aos demais valores fora da diagonal, mais uma vez atendendo aos requisitos para a aplicação da técnica (FAVERO et al., 2009). O método de extração dos fatores usado foi a análise de componentes principais, resultando em um fator (eignvalue) maior que um, cuja porcentagem de explicação da variância é de 70,62%. Por meio da rotação Varimax, foi obtido o fator único que passa a ser denominado de RSA das empresas. Na Tabela 3, apresentam-se as cargas fatoriais consideradas significantes (p<0,05) para o tamanho da amostra de 428 empresas. Ademais, na última coluna da Tabela 3, é possível verificar o Alpha de Cronbach do construto competências organizacionais, que é considerado alto (MAROCO, 2010). Tabela 3:Fator Retido e Carga Fatorial 10 Variáveis Estratégico Ético Social Ambiental Carga Fatorial .868 .859 Alpha de Cronbach fator .851 .781 RSA 0.860 Fonte: Autores. Assim, o fator obtido pelo método de cálculo de escores Bartlett (MAROCO, 2010) passa a constituir o construto dependente do modelo de análise de variância two-way, para determinar a influência da origem e das demais variáveis intervenientes (tamanho e tempo de atuação) na adoção da RSA pelas empresas. 5 Resultados Para a análise dos resultados foi usada a técnica de análise de variância two-way, pois o modelo proposto apresenta um construto dependente contínuo e três variáveis independentes nominais (origem, tamanho e tempo de existência). A análise de variância one-way não teria como explicar o fator de interação das variáveis independentes exposto acima, no referencial teórico. Na Tabela 4, apresenta-se o resultado do modelo linear generalizado da análise de variância two-way. Os resultados mostram que é possível afirmar que a origem de capital exerce impacto significativo nas práticas consolidadas de RSA da empresa. O resultado do teste mostra que a origem de capital tem um efeito estatisticamente significativo (F =9.814; p < 0,01) (MAROCO, 2010), tendo um poder de explicação de aproximadamente 20% (R quadrado ajustado = 0,204). Dessa forma, a hipótese H1 é confirmada: as empresas estrangeiras têm práticas de RSA mais consolidadas que as empresas brasileiras. Tabela 4: Modelo Linear Generalizado da Análise de Variância Two-Way Variável Dependente: RSA Type III Modelo 125.426a 3.875 7.809 10.589 2.245 4.024 4.491 12.619 11.797 df 48 Intercept 1 Origem 1 tamanho 4 tempo 4 Origem * tamanho 4 Origem * tempo 4 tamanho * tempo 16 15 Origem * tamanho * tempo a. R Quadrado = ,294 (R Quadro Ajustado = ,204) Média 2.613 F 3.284 Sig. .000 Dimensão do Efeito DE .294 3.875 7.809 2.647 .561 1.006 1.123 .789 .786 4.869 9.814 3.327 .705 1.264 1.411 .991 .988 .028 .002 .011 .589 .283 .230 .465 .467 .013 .025 .034 .007 .013 .015 .040 .038 Poder do Teste PT 1.000 .595 .878 .841 .228 .396 .439 .675 .652 Fonte: Autores. O resultado, na Tabela 4, também, mostra que as empresas de grande porte (F=3.327; p<0.05) têm práticas mais consolidadas de RSA que as de pequeno porte. Esse resultado suporta a hipótese H2a: as empresas de grande porte têm práticas de RSA mais consolidadas. Contudo, é bom lembrar que as empresas de grande porte apresentavam-se divididas em cinco classes. Assim foi analisado o teste post hoc de scheffe para o tamanho. O resultado, cuja ilustração representativa pode ser observada na Figura 2, mostra que existe uma diferença significativa da consolidação das práticas entre três grupos. No grupo 1 (número 1 no eixo horizontal), das 11 empresas com menos de 250 empregados, é onde há menos práticas de RSA consolidadas. O grupo 2 (número 2 e 3 no eixo horizontal), com as empresas entre 250 e 1000 empregados, é o intermediário, sendo as grandes empresas (número 4 e 5 no eixo horizontal) as que apresentam maior consolidação das práticas de RSA. Figura 2: Comparação das Práticas de RSA vs Tamanho Práticas de RSA Grupo 3 Grupo 2 Grupo 1 Tamanho Fonte: Autores. Em relação ao tempo de atuação, o resultado não se mostrou significativo. Assim, não é possível dizer que as empresas com mais tempo de atuação têm práticas de RSA mais consolidadas. O resultado mostra, também, que as variáveis tamanho e tempo não são significativas como variáveis intervenientes, ou seja, não é possível dizer, para os aspectos tamanho e origem, que as maiores estrangeiras tem práticas de RSA mais consolidadas. O mesmo valendo para o tempo de atuação. Assim, a principal hipótese desse estudo, que foi confirmada, H1, estabelece que: as empresas estrangeiras têm práticas de RSA mais consolidadas que as empresas brasileiras. Parte desse resultado pode ser entendido pelo liability of foreigness, derivado da falta de conhecimento que o país hospedeiro tem em relação a essas empresas, o que acarreta um custo adicional para as multinacionais (DENK; KAUFMANN; ROESCH, 2012; KOSTOVA; ZAHEER, 1999). Para superar tal desconfiança e legitimar sua atuação, as empresas acabam por desenvolver práticas mais consolidadas de RSA. Nesse sentido, a RSA passou a ser um elemento que compõe a estratégia de legitimação das empresas nos países hospedeiros, podendo se tornar fonte de vantagem competitiva (BRANCO; RODRIGUES, 2006). Compreende-se, então, que boa parte da atuação mais consolidada em RSA pode ser explicada pela questão da legitimidade. A empresa multinacional utiliza a RSA como uma licença para operar no país hospedeiro. Outro ponto relevante descrito na literatura é se a empresa utiliza uma estratégia global ou local de RSA (JAMALI, 2010). Ambos os casos podem levar as multinacionais a terem maior RSA em países estrangeiros. Uma estratégia global denota uma importação de um modelo já utilizado em outro país (no caso da amostra desta pesquisa, a maioria das empresas é proveniente de países mais desenvolvidos socioeconomicamente que Brasil). Assim, o modelo de RSA pode ser mais consolidado por ter sido desenvolvido em um ambiente institucional mais exigente e influente. Por outro lado, a estratégia local permite que a empresa possa adaptar a sua atuação 12 conforme as exigências do ambiente em que ela esteja atuando e, assim, estabelecer ações que possam superar a desconfiança do país hospedeiro. Percebe-se, então, que a questão da legitimidade pode ser o principal motivo para que as empresas multinacionais tenham ações mais consolidadas de RSA do que as empresas brasileiras, no Brasil. Contudo, apesar dos resultados encontrados, esta pesquisa não consegue estabelecer uma relação direta da atuação mais consolidada em RSA das estrangeiras com a questão da legitimidade. O que existem são indícios apontados pela literatura, como sendo essa uma das principais razões. A confirmação da hipótese H2a, as empresas de grande porte têm prática de RSA mais consolidadas, corrobora a constatação de outros autores que propuseram esta relação positiva, como Stanwick e Stanwick (1998) e Brammer e Millington (2006). Possíveis explicações para esse fenômeno são a questão de maior disponibilidade de recursos para investimento em ações de RSA, bem como a importância que a visibilidade e o capital reputacional apresentam para as grandes empresas. Por outro lado, colocam-se em questão as conclusões de Orlitzky (2001) e Borba (2005) de que o tamanho da organização não apresenta influência relevante sobre o desempenho da empresa em RSA, seja positiva ou negativa. 6. Conclusão Este trabalho teve como principal objetivo investigar a relação entre o desenvolvimento de práticas de Responsabilidade Socioambiental e o país de origem da empresa, com a hipótese de que, no Brasil, as empresas estrangeiras apresentam práticas de RSA mais consolidadas do que as empresas brasileiras. Secundariamente, buscou-se identificar o impacto de outros aspectos, como o tamanho da empresa e seu tempo de atuação, sobre as praticas da RSA, com a hipótese das empresas de maior porte sendo confirmada. Assim, a importância deste estudo se encontra no propósito de analisar um tema de crescente relevância na academia e na sociedade em geral, que é o desenvolvimento de práticas de RSA e sua relação com a questão da internacionalização das empresas, mais especificamente, a atuação de empresas estrangeiras em comparação à atuação das brasileiras, no Brasil, entre outros aspectos. Assim, pretende-se contribuir para a evolução de pesquisas neste sentido, principalmente em países em desenvolvimento, e contribuir para o incentivo de uma atuação mais responsável social e ambientalmente por parte das empresas de origem nacional. Sugere-se que estudos futuros se dediquem a entender os motivos para a atuação responsável de cada empresa. Para tanto, pesquisas qualitativas seriam de grande valia, de modo que os pesquisadores poderiam perguntar para os responsáveis pela condução da RSA nas empresas, sobre o real motivo das mesmas empresas estarem adotando práticas de RSA. Com isso, poderia se constatar se de fato a questão da legitimidade é o fator mais determinante para que as multinacionais tenham práticas mais consolidadas de RSA, no Brasil, do que as próprias empresas brasileiras. Por fim, apresenta-se a limitação em relação à base de dados que constituiu uma amostra não probabilística. Além disso, por ser a amostra composta apenas por empresas que responderam à pesquisa das Melhores Empresas para Você Trabalhar, do Guia Você S/A Exame, é possível que esta apresente certo viés, uma vez que são empresas que já demonstram interesse e dão importância à RSA. Propõe-se que sejam realizadas pesquisas com bases de dados mais amplas e com uma amostra probabilística, de modo que seja possível verificar se os resultados desta pesquisa são aplicáveis ao total da população de empresas que atuam no país. REFERÊNCIAS ALMEIDA, M. F. L. Sustentabilidade corporativa, inovação tecnológica e planejamento adaptativo: dos princípios à ação. 2006. 259p. 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