Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas UniFMU CONTRATOS ELETRÔNICOS GRADUAÇÃO EM DIREITO VERIDIANA IBARRA DE ALMEIDA RA 440388-4 – TURMA 3209-I Tel. (11) 3868-2960/9634-3300 E-mail [email protected] Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas UniFMU CONTRATOS ELETRÔNICOS Graduação em Direito Monografia de Graduação apresentada à BANCA EXAMINADORA do UNIFMU – Centro Universitário FMU, como exigência para obtenção do título de Bacharel em Direito, sob orientação da Prof. Dr. Luiz Antônio Scavone Junior. VERIDIANA IBARRA DE ALMEIDA RA 440388-4 – TURMA 3209-I Tel. (11) 3868-2960/9634-3300 E-mail [email protected] São Paulo - 2004 Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas UniFMU CONTRATOS ELETRÔNICOS VERIDIANA IBARRA DE ALMEIDA Local: __________________________ Data: _____/_____/______ BANCA EXAMINADORA: ______________________________________ Prof. Dr. Luiz Antônio Scavone Junior ______________________________________ ______________________________________ DEDICATÓRIA Aos meus pais, por todo apoio e incentivo, no decorrer da minha vida pessoal e profissional. Ao meu esposo, Robson, pelo companheirismo e dedicação. À minha filha, Beatriz, pelos momentos de ausência, em que estive me dedicando aos estudos. Ao meu filho Matheus, que brevemente estará chegando, para completar a nossa felicidade. AGRADECIMENTOS Agradeço a Professor Dr. Luiz Antônio Scavone Junior, pelo apoio e auxílio para a conclusão deste trabalho. Aos demais professores do curso de Graduação em Direito da UNIFMU, cujos ensinos foram valiosos para a minha vida profissional e pessoal. SINOPSE A contratação pela via eletrônica é uma realidade dos tempos atuais, em que tudo se pode adquirir através dos meios eletrônicos, de produtos a serviços; tais como, eletroeletrônicos, livros, completas listas de compras em supermercados, passagens aéreas, etc., e tudo isso a partir de um computador com conexão à Internet, que pode estar em qualquer parte do planeta. Para facilitar ainda mais os negócios, os bancos também investiram nessa tecnologia, proporcionando aos seus clientes a possibilidade de efetuar pagamentos e outras transações também através da Internet, o que tem sido a alavanca para que o comércio eletrônico venha crescendo de forma que há alguns anos, sequer imaginávamos. A consolidação da Internet como meio de comunicação, trabalho, lazer e negócios, trouxe uma inovação tecnológica sem volta. Se por um lado, trouxe grandes benefícios, por outro lado possibilitou a prática de novos tipos de delitos. Além dos hackers, que invadem os sistemas, trazendo prejuízos para empresas e demais usuários do sistema, há ainda a questão dos contratos, que, devido a rapidez com são realizadas as transações, acabam por ser ignoradas cláusulas de proteção ao consumidor, vigentes em nosso ordenamento jurídico. Muitos doutrinadores têm alertado sobre a necessidade da elaboração de normas específicas para a Internet, em virtude de sua natureza global, função que está sendo assumida, principalmente, pelo Direito da Informática, devido ao seu caráter transnacional. SUMÁRIO INTRODUÇÃO ................................................................................................. 01 1. O FENÔMENO DA INTERNET .................................................................... 06 1.1 – UM POUCO DE HISTÓRIA ..................................................................... 10 1.2 – AS NOVAS TECNOLOGIAS DA INTERNET .......................................... 14 1.3 – A CONVERGÊNCIA TECNOLÓGICA E A NOVA ECONOMIA .............. 16 1.4 – O COMÉRCIO ELETRÔNICO ................................................................ 19 1.4.1 – O Documento Eletrônico ...................................................................... 21 1.4.2 – Criptografia ........................................................................................... 25 1.4.3 – Assinatura Digital .................................................................................. 28 1.5 – O CONCEITO DE CONTRATO E A INTERNET ..................................... 34 1.6 – TIPOS DE CONTRATOS INFORMÁTICOS: HARDWARE, SOFTWARE E CONTRATOS DIGITAIS .......................................................... 38 1.7 – AUTORIDADE CERTIFICADORA ........................................................... 40 1.8 – ICP (INFRA-ESTRUTURA DE CHAVES PÚBLICAS) ............................. 42 1.9 – A INTERNET: O ESTADO E O DIREITO ................................................ 44 2. CONTRATOS ELETRÔNICOS .................................................................... 48 2.1 – DEFINIÇÃO ............................................................................................. 48 2.2 – CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS ELETRÔNICOS ......................... 49 2.3 – FORÇA PROBANTE DOS CONTRATOS ELETRÔNICOS .................... 53 2.4 – OS CONTRATOS ELETRÔNICOS E O NOVO CÓDIGO CIVIL ............. 54 2.4.1 – Responsabilidade dos lesantes e intervenção do Estado .................... 56 2.5 – ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DO CONTRATO ................................. 58 2.6 – CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS EM GERAL QUANTO AO REQUISITO FORMAL ...................................................................................... 61 2.7 – OS CONTRATOS ELETRÔNICOS E O PROJETO DE LEI BRASILEIRO .................................................................................................... 65 2.8 – OS CONTRATOS ELETRÔNICOS E O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR ................................................................................................. 2.9 – PRI NCÍ PI OS JURÍ DI COS APLI CÁVEI S AOS CONT RAT OS ELET RÔNI COS ................................................................................................ 71 74 2.9.1 – Princípio da Equivalência Funcional dos Atos Jurídicos produzidos por meios eletrônicos com os atos jurídicos tradicionais ................................. 76 2.9.2 – Princípio da neutralidade tecnológica das disposições reguladoras do Comércio Eletrônico ......................................................................................... 77 2.9.3 – Princípio da inalterabilidade do direito existente sobre obrigações e contratos ........................................................................................................... 78 2.9.4 – Princípio da Boa-Fé .............................................................................. 80 2.9.5 – Princípio da Autonomia Privada ........................................................... 81 2.10 – DA FORMAÇÃO E CONCLUSÃO DOS CONTRATOS ELETRÔNICOS ................................................................................................ 83 CONCLUSÃO .................................................................................................. 91 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFIAS .................................................................. 93 ANEXOS .......................................................................................................... 98 Anexo I – Medida Provisória n. 2.200-2 de 24 de agosto de 2001 ................... 99 Anexo II – Projeto de Lei n. 4.906-A de 2001 ................................................... 105 INTRODUÇÃO O objetivo da presente monografia é realizar uma análise dos principais aspectos jurídicos envolvendo direito e internet, com ênfase nos contratos eletrônicos, sem que, no entanto, pretendamos exaurir esse tema, cujos limites, aliás, sequer foram ainda totalmente delimitados pela doutrina e jurisprudência internacionais. O comércio eletrônico, na última década, alcançou níveis significativos da economia mundial, e a tendência é de incremento constante das operações mercantis no meio eletrônico, inclusive nos países em desenvolvimento, como o Brasil. O maior fenômeno tecnológico e também social do final do século passado, sem dúvida alguma foi o desenvolvimento vertiginoso da Internet no mundo. No Brasil não foi diferente. Mudou as formas de como as pessoas se comunicam, se relacionam comercialmente (compram e vendem) e se divertem. Além disso, democratizou o acesso a um dos principais ativos da economia ocidental globalizada: a informação. Esta popularização do uso da informática, seguida pela ainda mais rápida expansão da Internet, tornou comum a expressão documento eletrônico, termo que passou a integrar o vocabulário dos usuários de computador de língua portuguesa. Para o Direito, entretanto, o documento eletrônico ainda é algo um tanto difícil de compreender, por se tratar de um documento possível de ser alterado por terceiros, assim como poderia ser comparado ao documento tradicional, como o papel simplesmente datilografado de antigamente? A própria tecnologia responde esta pergunta. Descoberta em 1976, mas popularizada a partir de meados de 1994, com a distribuição gratuita, pela Internet, do programa Pretty Good Privacy (ou simplesmente PGP), uma técnica conhecida por criptografia assimétrica ou - como também é chamada - criptografia de chave pública, tornou possível a equiparação, para fins jurídicos, do documento eletrônico ao documento tradicional. A criptografia assimétrica, ao contrário da simétrica ou convencional (que pede a mesma chave tanto para cifrar como para decifrar a mensagem), utiliza duas chaves, geradas pelo computador. Uma das chaves denomina-se chave privada, a ser mantida em sigilo pelo usuário, em seu exclusivo poder, e a outra, a chave pública, que, como sugere o nome, pode e deve ser livremente distribuída. Estas duas chaves são dois números que se relacionam de tal modo que uma desfaz o que a outra faz. Encriptando a mensagem com a chave pública, gera-se uma mensagem cifrada que não pode ser decifrada com a própria chave pública que a gerou. Só com o uso da chave privada poderemos decifrar a mensagem que foi codificada com a chave pública. E o contrário também é verdadeiro: o que for encriptado com o uso da chave privada, só poderá ser decriptado com a chave pública. Maiores considerações sobre o que vem a ser criptografia serão feitas no decorrer desta monografia. Resumidamente, pode-se dizer que, com o uso da criptografia assimétrica, é possível gerar assinaturas pessoais de documentos eletrônicos. Isto é feito cifrando a mensagem com a chave privada; após, com o uso da chave pública, é possível conferir a autenticidade da assinatura, mas não é possível gerar uma assinatura com esta chave. As assinaturas digitais assim produzidas ficam de tal sorte vinculadas ao documento eletrônico "subscrito" que, ante a menor alteração, a assinatura se torna inválida. A técnica não só permite demonstrar a autoria do documento, como estabelece uma "imutabilidade lógica" do seu conteúdo. Por "imutabilidade lógica" pode-se dizer que o documento continua podendo ser alterado; entretanto, a posterior alteração do documento invalida a assinatura, o que faz com que o documento deixe de ter valor como prova. Convém salientar que a assinatura gerada por um sistema de criptografia assimétrica em nada se assemelha, no aspecto visível, a uma assinatura manuscrita. A assinatura digital é, na verdade, um número, resultado de uma complexa operação matemática que tem como variáveis o documento eletrônico e a chave privada, detida pelo signatário com exclusividade. Como a chave privada se encontra em poder exclusivo do seu titular, somente ele poderia ter chegado no número representado pela assinatura. A assinatura digital de uma mesma pessoa será diferente, para cada documento assinado, pois, sendo este uma das variáveis da função matemática, o seu resultado (assinatura), será diferente para cada documento. Isso evita que uma mesma assinatura possa ser utilizada para outros documentos. Diversamente do que ocorre com a assinatura manual, que contém traços sempre semelhantes, e assim é conferida, a conferência da assinatura digital é feita com o uso da chave pública, utilizando o documento "subscrito" também como variável: se, com a chave pública, pudermos decifrar a assinatura e relacioná-la ao documento, isto significa que foi a chave privada que a produziu para aquele documento, que não foi alterado desde então. A evolução das Tecnologias de Informação traz enormes avanços para a sociedade (indivíduos e empresas), de outra forma traz o desafio para os operadores do direito de enfrentar novas condutas penais, tanto no âmbito dos crimes contra o patrimônio, contra a honra e contra a pessoa e sua dignidade, agora perpetrados no “mundo virtual”. Por isso, a necessidade de um estudo aprofundado, que leve ao entendimento sobre os principais aspectos sobre o que envolve a tecnologia utilizada na Internet, a fim de chegarmos a um consenso e colaborarmos para o aperfeiçoamento e adequação de nossas leis, de forma que a proteção dos direitos fundamentais do homem ocorra de forma eficaz, também nas “relações virtuais”. Enquanto nossa legislação não se atualiza, vemos inúmeros casos de desrespeito aos consumidores, uma vez que muitas empresas que comercializam seus produtos ou serviços na Internet, sequer indicam o endereço físico, dados cadastrais e telefones para contato, para que o consumidor possa contatá-lo. É que muitas empresas se dizem apenas “virtuais”, não funcionando na forma do comércio tradicional. Por “Comércio eletrônico”, num sentido mais amplo, há que se referir não só às transações que visam à prática de atos comerciais ou que dela resultam, como também a todas as transações eletrônicas, ainda que fora do âmbito das relações comerciais, tais como aquelas de natureza civil e até mesmo as abrigadas pelo direito administrativo. Os números do comércio eletrônico são assombrosos e evidenciam uma intensa e crescente atividade por seu intermédio. Devido à falta de regulamentação legal, as empresas buscam proteger-se e criar um certo nível de segurança para si e para seus consumidores, adotando certificados digitais em seus sites, a exemplo do que fazem os bancos e as principais lojas virtuais, a exemplo da Americanas.com e da Submarino.com. É nesse cenário em que nos encontramos hoje em dia. Atividade crescente. O comércio eletrônico é uma realidade, desafiando o legislador, que deixou-se dominar pelo turbilhão da globalização, sem se dar conta do quanto a sua inércia pode prejudicar a economia nacional e os interesses da sociedade. Assim sendo, devemos enfrentar a realidade e começarmos a agir, investigando a respeito da legalidade da prática de atos através dos meios eletrônicos, seja por intermédio de uma breve e simples reflexão, como a presente monografia, seja pela via de integração da norma, modo pelo qual o estado-juiz supre as lacunas deixadas pelo legislador. Para isso, dividiremos este trabalho em dois capítulos, que buscarão efetuar uma abordagem técnica de informática e Internet para, depois, passar pela conceituação de contratos eletrônicos em seus diversos aspectos, bem como o tratamento que vem recebendo do legislador pátrio brasileiro. 1. O FENÔMENO DA INTERNET1 A Internet apresenta-se como a maior ferramenta de comunicação e revolução tecnológica das últimas décadas. A comunicação entre pessoas se dá instantaneamente, onde quer que esteja qualquer uma delas. Conectado na Internet, o indivíduo não terá dificuldade na comunicação com qualquer outra pessoa no globo, que também esteja conectado na rede. A Internet possui três serviços básicos: correio eletrônico, conexão remota por login e transferência de arquivos. • Correio eletrônico: é um meio de comunicação baseado no envio e recepção de mensagens através de uma rede de computadores, possuindo cada usuário um endereço eletrônico para se corresponder. É um sistema que permite a emissão de documentos privados a um ou mais destinatários determinados pelo remetente. Ainda não se encontra definida sua natureza jurídica, havendo divergências quanto ao cabimento da equiparação à correspondência ou à transmissão de dados. A importância da distinção decorre da diversidade de conseqüências legais advindas pela interpretação adotada; • Conexão remota por login: permite acessar programas e aplicações disponíveis em outro computador; 1 Rede Mundial de Comunicação. • Transferência de arquivos ou download: pode ser utilizada na transmissão de documentos, software, imagens, planilhas e som. O mundo passa a viver, então, na Era da Sociedade Digital ou Era da Informação (como ficou conhecido o período dos últimos 30 anos, devido ao desenvolvimento tecnológico proporcionado pela informática e Internet, que facilitou grandemente a comunicação). O montante de informação veiculada na rede, que corre o mundo em segundos é surpreendente. Segundo Rodrigo Benevides de Carvalho: É extraordinário pensarmos que a Internet, inicialmente concebida e voltada exclusivamente a finalidades militares, tendo servido logo após também como meio eficaz para se interconectarem universidades e centros de pesquisa, possa atualmente se apresentar como um mercado global, de potencial quase que incomensurável, freqüentado incessantemente por consumidores e empresários de todas as ordens.2 Com o surgimento da Internet, surgiu também uma nova comunidade virtual, composta pelos seus usuários, que usam a rede para lazer, pesquisa, trocam informações e fecham negócios. Inicialmente, a Internet era utilizada como interconexão entre as empresas, possibilitando a comunicação eletrônica para a realização e a confirmação de pedidos, que mais tarde se tornaria o business-to-business (B2B) e o business-toconsumer (B2C). 2 CARVALHO, Rodrigo Benevides de. In SCHOUERI, Luís Eduardo. Internet – O Direito na Era Virtual, 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 95. O business-to-business (B2B) trata-se do comércio eletrônico praticado, a princípio, entre empresas, envolvendo a comercialização de produtos e prestação de serviços entre produtores, fabricantes, fornecedores e importadores, sem a participação direta do consumidor final. Atualmente, é o grande fomentador do comércio eletrônico, que deixou de ser restrita apenas à grandes empresas, passando a estar acessível para milhares de pessoas, o que tem gerado grande interesse ao setor empresarial. 3 Já o business-to-consumer (B2C) refere-se aos negócios efetuados através da Internet entre empresas, na qualidade de produtoras, fabricantes, fornecedoras, etc., tendo o consumidor final como último destinatário dos respectivos produtos e serviços. É o varejo eletrônico, ou e-retail, que tem impulsionado investimentos gigantescos. 4 Observa Rodrigo Benevides de Carvalho, que: A cultura do uso do comércio eletrônico pelos consumidores ainda não está consolidada, notadamente pela falta de costume da utilização desse método, sobretudo em nosso país, onde sequer mesmo a compra através de catálogo encontrou bom desenvolvimento. Em alguns casos, v.g., o consumidor considera indispensável o exame e o manuseio da mercadoria a ser adquirida, recusando-se a proceder à simples encomenda, sem vistoria.5 O comércio eletrônico, quando realizado de forma adequada e legítima é extremamente benéfico tanto para fornecedores quanto para os consumidores. Além da agilidade, oferece comodidade, pois o consumidor pode realizar negócios 3 CARVALHO, Rodrigo Benevides de. In SCHOUERI, Luís Eduardo. Op. cit., p. 96. Ibid., p. 97. 5 Ibid., p. 99. 4 de sua própria casa, pesquisando em diversos web sites6 o preço e demais condições para os produtos. A Internet é extremamente dinâmica, apresentando características como a interatividade em tempo real, o que a torna um canal para disponibilização de informações e publicidade por parte das empresas, permitindo um diálogo efetivo entre as partes. Todavia, esta interatividade e agilidade também têm gerado vários problemas, uma vez que expõe “o consumidor a fornecedores situados a grandes distâncias e, muitas vezes, imbuídos de má fé, a fraudes, a atividades comerciais ilegais, e mesmo a produtos perigosos ou ainda não testados”.7 Também pode ocasionar problemas relacionados à intimidade e ao direito de privacidade do consumidor, por possibilitar ao fornecedor a coleta de informações e dados sobre seus consumidores “através da implantação de arquivos no computador do consumidor “cookies”, que coletam e armazenam informações, transmitindo-as ao fornecedor quando da próxima visita ao respectivo web site.”8 Tais informações poderão ser utilizadas para a promoção de atividades de marketing direto, ou vendê-las a outros fornecedores, empresas de marketing ou pesquisa. 6 Website, de acordo com a NRPOL é a localização na Internet que pode ser visitada e com a qual se pode estabelecer uma comunicação, obtendo ou fornecendo dados. O website pertence e é gerenciado por uma Organização ou indivíduo para a realização de suas atividades na Internet. O usuário, por sua vez, é definido como o “indivíduo que tem acesso ao website da Organização. Este indivíduo fornece ou tem suas informações pessoais ou de sua empresa coletadas para qualquer finalidade, desde o simples acompanhamento de sua sessão no ambiente online até o preenchimento de formulários para realização de compras ou para obtenção de serviços” Caderno Jurídico – julho/02 – nº 4 – ESMP, p. 183. (NRPOL – Norma de Referência da Privacidade OnLine). 7 CARVALHO, Rodrigo Benevides de. In SCHOUERI, Luís Eduardo. Op. cit., p. 98. 8 Ibid., p. 98. O grande problema é que a obtenção e tais informações podem ser interpretadas como ofensivas ao direito de privacidade e intimidade, embora também possam ser benéficas aos próprios consumidores, uma vez que, através delas, as empresas têm maiores possibilidades de oferecer produtos e serviços mais próximos da necessidade do cliente. 1.1 – UM POUCO DE HISTÓRIA A Internet é uma rede pública de âmbito mundial, que oferece uma série de serviços de comunicação e informação padronizados e difundidos publicamente. A Internet é uma rede virtual formada por um conjunto de redes menores. Cada rede individual é mantida e sustentada em separado por instituições educacionais, companhias de telecomunicações, organizações ligadas ao governo ou instituições privadas, com ou sem fins lucrativos. A Internet é uma rede antiga. Tem mais de 30 anos de idade. Surgiu na época da chamada “guerra fria” entre os Estados Unidos (bloco ocidental) e a extinta União Soviética (bloco oriental). Os Estados Unidos tinham passado por uma possibilidade real de ataque nuclear depois da instalação de mísseis russos em Cuba e a interligação das instalações militares em rede foi uma estratégia militar para proteger a comunicação em caso de ataque. Esta rede, com fins militares, ligava computadores diferentes entre si através de linhas de comunicação redundantes de maneira que, mesmo que uma ou várias bases fossem reduzidas a pó, as outras estações ainda conseguiriam se comunicar entre si. Então, foi criada a rede ARPANET (Advanced Research Projects Agency Network), precursora da Internet. A rede interligou vários computadores em algumas universidades e centros de pesquisa envolvidos com projetos militares. Na época, computador ainda era equipamento rara. Computador em rede, mais raro ainda. Os primeiros usuários (cientistas) usavam a rede para trocar mensagens de correio eletrônico e ligarem-se remotamente a computadores distantes. O serviço tornou-se tão útil, que as universidades envolvidas começaram a ligar seus departamentos, mesmo os que não tinham nada a ver com os projetos militares. A Internet começou a crescer de forma explosiva em 1992, com o surgimento da WWW (World Wide Web), sua poderosa interface gráfica. A Web conseguiu finalmente organizar as informações da Internet através do hipertexto, com a utilização dos navegadores gráficos (browsers). Pouco depois surgiram versões de browser para Windows e Macintosh, que trouxe a grande massa de usuários domésticos para dentro da rede. Os provedores de acesso e informação (conteúdo) comerciais se multiplicaram, oferecendo às pessoas comuns o mesmo acesso que antes só tinham as grandes organizações e o meio acadêmico. O mais surpreendente é notar que não existe um centro de controle na Internet, um governo. Todo os fluxo de informações acontece por rotas livres, estabelecidas entre os inúmeros computadores conectados à rede. O Comitê Gestor Internet do Brasil – criado pela Portaria Interministerial MC/MCT 147/95, publicada no D.O.U de 31 de maio de 1995, que delegou competência para a realização do serviço de registro (www.registro.br), através da Resolução 001 de 15 de abril de 1998, publicada no D.O.U de 21 de maio de 1998, à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP,9 e no seu primeiro artigo define o campo de atuação do Comitê: Art. 1º Criar o Comitê Gestor Internet do Brasil que terá como atribuições: 1. acompanhar o provimento de serviços INTERNET no País; 2. estabelecer recomendações relativas a: estratégia de implantação e interconexão de redes, análise e seleção de opções tecnológicas, e papéis funcionais de empresas, instituições de educação, pesquisa e desenvolvimento (IEPD); 3. emitir parecer sobre a aplicabilidade de tarifa especial de telecomunicações nos circuitos por linha dedicada, solicitados por IEPDs qualificados; 4. recomendar padrões, procedimentos técnicos e operacionais e código de ética de uso, para todos os serviços INTERNET no Brasil; 5. coordenar a atribuição de endereços IP (INTERNET PROTOCOL) e o registro de nomes de domínios; 6. recomendar procedimentos operacionais de gerência de redes; 7. coletar, organizar e disseminar informações sobre o serviço INTERNET no Brasil; e 8. deliberar sobre quaisquer questões a ele encaminhadas. Portanto, as atribuições do Comitê Gestor da Internet do Brasil, estão, na sua maioria, relacionadas com o desenvolvimento estratégico da Internet no país, e uma de suas incumbências operacionais de maior relevância é a padronização e manutenção do serviço do registro nacional de todos os nomes de domínios no Brasil. Assim, mantém uma base de dados que é capaz, em última instância, de 9 www.registro.br e www.cg.org.br. transformar nomes de domínios em endereços IP10 e vice-versa, para os domínios registrados no Brasil. Segundo Ana Amélia M. B. de Castro Ferreira: A Portaria nº 148/95 do Ministério das Comunicações, define a Internet como o nome genérico que designa o conjunto de redes, os meios de transmissão e comutação, roteadores, equipamentos e protocolos necessários à comunicação entre computadores, bem como o software de dados contidos nestes computadores.11 Para Liliana Minardi Paesani, a Internet não pode ser definida de forma clara nem completa, e diz: Sob o ponto de vista técnico, a Internet é uma imensa rede que liga elevado número de computadores em todo o planeta. As ligações surgem de várias maneiras: redes telefônicas, cabos e satélites. Sua difusão é levemente semelhante à da rede telefônica. Existe, entretanto, uma radical diferença entre uma rede de computadores e uma rede telefônica: cada computador pode conter e fornecer, a pedido do usuário, uma infinidade de informações que dificilmente seriam obtidas por meio de telefonemas.12 A Internet pode ser definida como uma rede pública de zona de dados, com estrutura aberta, descentralizada e naturalmente desregulamentada, com características próprias, tais como; agilidade, independência, liberdade de expressão e instantânea difusão de informação. Esta interação representa uma evolução dos modelos tradicionalmente conhecidos, sem parâmetros de similaridade. 10 IP, Internet Protocol é o método ou protocolo pelo qual dados são transmitidos entre computadores na Internet 11 FERREIRA, Ana Amélia Menna de Castro. Uso do Correio Eletrônico no Ambiente de Trabalho, Belo Horizonte: Décio Freire & Associados, 2002, p. 1. 12 PAESANI, Liliana Minardi. Direito e Internet – Liberdade de Informação, Privacidade e Responsabilidade Civil, São Paulo: Atlas, 2000, p. 27. Existem aspectos importantes na Internet: a gigantesca quantidade de informações destinadas ao navegador da Internet, que é uma pessoa. Portanto, a rede telemática favorece o encontro, confronto, troca de opiniões, crescimento de relações interpessoais, com todas as vantagens e os riscos das relações sociais. Por outro lado, o verdadeiro problema enfrentado pelos internautas é a solidão, comprovada por numerosas pesquisas médicas que afirmam que a utilização solitária e prolongada da Internet provoca uma espécie de dependência semelhante ao uso de drogas, embora ainda haja contestações a esse respeito.13 1.2 – AS NOVAS TECNOLOGIAS DA INTERNET Apesar de ter surgido inicialmente como um serviço disponível em uma rede de computadores, a Web tem hoje um papel muito mais importante. Ela é confundida com a própria Internet, da qual faz parte. Para publicar informações através dela, não é preciso saber nada sobre programação ou redes. Tecnologias recentes como os telefones celulares com navegadores embutidos e adaptados para operarem com protocolo WAP14 e os PDAs,15 com serviços de dados tornam a Internet móvel uma realidade, uma nova revolução que mudará os hábitos das pessoas e a forma de muitas empresas fazerem negócios. 13 PAESANI, Liliana Minardi. Direito e Internet – Liberdade de Informação, Privacidade e Responsabilidade Civil, p. 27. 14 WAP (Wireless Application Protocol) é o protocolo de comunicação para aplicações sem fio. É uma padrão técnico aberto – especificado por um comitê internacional, denominado Wap Forum (www.wapforum.org) – que permite a conexão de aparelhos portáteis, como telefones celulares, a Internet. 15 Os termos PDA (Personal Digital Assistant), Handheld PC e Palmtop são sinônimos e servem para designar genericamente os “computadores de mão”, pequenos aparelhos portáteis com capacidade de processamento. Alguns deles oferecem uma variação do sistema operacional Microsoft Windows, denominado Windows CE (Compact Edition). Em São Paulo, no final de 2001, foi lançado os serviços da geração 2,5 de telefonia móvel, inédito na América do Sul. Trata-se de um conjunto de serviços de transmissão de dados de alta velocidade (até 144 Kbps16), que permite o acesso móvel e transparente à Internet a partir de laptops ou PDAs conectados com cartões PCMCIA,17 ou com um cabo ligado ao celular de nova geração. As redes de TV a cabo através do WebTV, recurso que integra a Internet com os aparelhos de TV atuais, mostram que a Web está destinada a preencher todos os espaços da mídia de difusão, não se limitando àqueles que possuem um computador. No Brasil, a WebTV já é uma realidade, algumas operadoras de TV a cabo já oferecem a primeira versão do serviço, incluindo e-mail e acesso aos bancos via Internet, e todas prometem lançamentos de novos serviços em breve. Igualmente, os bancos e as concessionárias de serviços de telecomunicações anunciam acordos para levar aos seus clientes, via telefone celular, informações financeiras e notícias de última hora. Diferente dos meios tradicionais de comunicação de massa, a World Wide Web é uma mídia democrática (isto é demonstrado pelo fracasso das tentativas de controle da informação por governos totalitários). O participante da comunidade virtual não precisa possuir uma estação difusora, uma concessão, uma gráfica para poder publicar sua informação e influenciar sua audiência, já que existem provedores de acesso e hospedeiros de informações que nada cobram. Todos 16 Kbps – Kilo bits por segundo. Cartão PCMCIA (Personal Computer Memory Card International Association) é um padrão de placa de circuito integrado – do tamanho de um cartão de crédito – especialmente desenvolvido para aparelhos móveis (notebooks e PDAs). Os melhores exemplos destes cartões são as expansões de memória e os modens para acesso a Internet. 17 podem receber as informações de todos. Qualquer um pode prover informação. O poder da informação está nas mãos de todos os que puderem ter um espaço na “Teia”, e não mais apenas com aqueles que controlam os meios de difusão tradicionais. Estas tecnologias não são fruto de futurologia, todas estão disponíveis e mostram que a Web possui um potencial inigualável na história das telecomunicações. É capaz de servir de porta de entrada não só a todos os serviços da Internet, também invadir o espaço dos tradicionais serviços de voz (telefone), televisão, rádio e mídias impressas, sem falar do impacto que está tendo diretamente nos hábitos da sociedade, mudando as regras do comércio e das relações humanas, tão importante para as Ciências Jurídicas. Tendo em vista que a legislação vigente não acolhe todas as circunstâncias criadas pela arquitetura da Rede, torna-se incapaz de enfrentar e dirimir as questões advindas pela utilização das novas tecnologias. O vácuo legislativo, em conseqüência, provoca extensa controvérsia na interpretação doutrinária e jurisprudencial, como será visto em capítulo à parte. 1.3 – A CONVERGÊNCIA TENOLÓGICA E A NOVA ECONOMIA O renomado futurólogo Alvin Toffler, autor dos best sellers: A Terceira Onda, Choque do Futuro e PowerShift – Mudança de Paradigma, divide a evolução social e econômica da humanidade em três grandes ondas ou fases: na primeira, a agricultura era a principal atividade e a terra era a fonte de poder e riqueza; na segunda onda, inaugurada com a revolução industrial, também denominado pelo autor com a era das chaminés, em alusão as fábricas, o poder passa a ser exercido pelos proprietários dos meios de produção; e finalmente a era da informação, onde o diferencial competitivo das nações, empresas e mesmo das pessoas está no conhecimento. Uma das características mais importantes da era do conhecimento é o que Nicholas Negroponte, em A Vida Digital18, chama de migração do modelo de átomos para os bits. Antes da revolução da Internet todo o conhecimento da humanidade e, conseqüentemente, toda riqueza, estava circunscrita ao mundo dos átomos: livros, jornais, revistas, enciclopédias, projetos industriais e de pesquisa. Hoje, assistimos a migração de todo este conhecimento e riqueza para o mundo dos bits. Um volume incalculável de informações é diariamente armazenado na Web. Arriscamos dizer que em breve todo o conhecimento da humanidade estará digitalizado e “webizado”, ou seja, convertido e armazenado em mídias digitais e disponível na Internet. A previsão do eminente professor do MIT19 só foi possível se concretizar, com o largo desenvolvimento das tecnologias de processamento, armazenamento e transmissão de dados. O acelerado avanço tecnológico, principalmente nas duas últimas décadas do século XX, faz surgir o fenômeno da convergência tecnológica, onde um conjunto de tecnologias mescladas produz um novo ambiente, possibilitando novas aplicações. A convergência tecnológica no processo de transmissão de voz fez evoluir os sistemas de comunicação analógicos para os sistemas digitais e hoje em dia consolidam-se, em escala comercial, os primeiros produtos e serviços baseados em portal de voz, que incorporam funcionalidades de reconhecimento de voz (comandos) e sintetizadores de voz (text to speech20). O mesmo fenômeno se repete com as tecnologias utilizadas no processamento e transmissão de dados, incluindo nesta categoria textos e imagens, o telex foi aposentado pelo fax, este último já integrado nos placas fax/modem dos microcomputadores e atualmente na era da banda larga nos preparamos para a fase seguinte, vídeo sob demanda em larga escala que tornará possível uma nova geração de aplicações, entre as mais promissoras a TV Interativa e a videoconferência primeiramente nos desktops e posteriormente nos aparelhos portáteis (celulares e PDAs). A evolução científica e a tecnologia digital, nos dizeres de Fernando de Souza Meirelles21: (...) são os agentes do processo de transformação para a sociedade de informação. A informação é o combustível estratégico para a empresa moderna que, por meio da tecnologia da informação, pode processá-la e interagir com o mundo exterior. É esta convergência tecnológica, resultado da integração de várias tecnologias, como as telecomunicações, televisão e computador, além da digitalização de tecnologias antigas (som e imagem) que nos lança na era da sociedade da informação. Também a convergência destas tecnologias, agora digitalizadas, permite uma total redefinição de produtos e serviços e criam a possibilidade para o surgimento do comércio eletrônico e, conseqüentemente, novas relações entre pessoas e empresas surgem, é a nova economia digital. 18 NEGROPONTE, Nicholas. A vida digital. 2ª ed. Companhia das Letras, 1995. Massachusetts Intitute of Technology. 20 Sistemas capazes de converter texto e dados armazenados em computadores em discurso, sintetizando voz eletronicamente. 19 O desenvolvimento científico e tecnológico traz enormes benefícios para o mundo moderno, o desenvolvimento da física nuclear e da química significou considerável avanço no combate as doenças, porém possibilitou a invenção de novos tipos de armas de destruição global, como a bomba atômica e as armas químicas. Com as novas tecnologias da Informação não é diferente, se de um lado a Internet quebra barreiras geográficas, democratiza o acesso à informação, facilita a comunicação entre pessoas e empresas, de outro lado se transforma numa poderosa arma na mão de mentes brilhantes que podem se devotar ao crime. 1.4 – O COMÉRCIO ELETRÔNICO O comércio eletrônico é a melhor expressão e exemplo de aplicação de tecnologias convergentes na nova economia digital. Pode ser definido, de forma bastante simples, como sendo a compra e a venda de informações, produtos e serviços através da Internet. A rede oferece a infra-estrutura de comunicação de fácil acesso e uso, com custo compatível com o cliente final do varejo, são as transações B2C22. Podemos incluir nesta categoria de transações os populares Internet Banking Systems, que são oferecidos pela quase totalidade dos bancos de varejo à seus clientes e que permitem todo tipo de movimentação financeira. As empresas vêem no emprego das tecnologias emergentes, produto da convergência, a oportunidade para alcançarem vantagem competitiva sob suas 21 MEIRELLES, Fernando de Souza. Informática - Novas aplicações com microcomputadores, ª 2 edição, São Paulo: Makron Books, 1994. 22 Business to consumer ou negócio-a-consumidor. concorrentes. Buscam com as novas aplicações de comércio eletrônico B2B23, mais agilidade e reduções de custos, pela otimização e integração de seus processos dentro da sua cadeia produtiva, requisitos sem os quais não sobrevivem na nova economia digital globalizada. O comércio eletrônico é o fundamento para o entendimento do conceito de ebusiness. Hoje as corporações estão utilizando a Web para, além de comprar e vender, integrar sua cadeia de fornecedores, parceiros de negócios e sua força de vendas. Além das tradicionais transações de compra e venda, o e-business permite outros processos, tais como: esforços pré e pós-vendas, pesquisa de mercado, suporte ao cliente, recrutamento, relações públicas, treinamento e todo tipo de atividade colaborativa. A explosão do Comércio eletrônico no Brasil pode ser evidenciada pelo lançamento de grandes sites, podemos destacar: • www.amelia.com.br – site do grupo pão de açúcar; • www.americanas.com.br – site da tradicional rede de lojas de varejo; • www.livrariacultura.com.br – site da tradicional livraria; • www.submarino.com.br – site de vendas no varejo; • www.saraivajur.com.br – site de conteúdo jurídico. A esta lista podemos adicionar os sites de todas as principais empresas do mercado financeiro brasileiro, incluindo: bancos, financeiras, operadoras de 23 Business to business ou negócio-a-negócio. cartões de crédito, seguradoras e corretoras, que disponibilizam para seus clientes, via ambiente Web seguro, todo tipo de movimentação financeira. O comércio eletrônico, da mesma forma que o comércio tradicional exige a troca de várias informações e documentos, durante as fases de oferta, pesquisa, contratação, e pagamento. Os documentos e contratos, em formato eletrônico devem ser garantidos quanto à autenticidade do seu autor e integridade do seu conteúdo. No caso de ativos digitais, tais como: músicas, softwares, vídeos, games, etc., inclusive a tradição da mercadoria (entrega) poderá também ser feita por meios eletrônicos. 1.4.1 – DOCUMENTO ELETRÔNICO Com a expansão da capacidade das empresas de telecomunicações, permitiu-se o rápido crescimento da Internet, eliminando a barreira da distância entre pessoas que dificilmente poderiam se encontrar. Há alguns anos, a possibilidade da realização de negócios através do computador era considerada um sonho impossível, mas, ao contrário disso, tornou-se, além de viável, algo relativamente simples e barato, estando ao alcance da grande maioria das pessoas, nas mais remotas partes do mundo. Conforme Luís Eduardo Schoueri: Hoje, música, livros, softwares e outros produtos estão chegando ao consumidor via cabos telefônicos. Com o mouse a pessoa clica num signo na tela de seu computador e passa a receber, durante algum tempo, uma seqüência de informações que, completa, será utilizada pelo seu computador para desenhar um livro, uma música, um software. Se tudo isso é uma surpresa para as pessoas comuns, mais ainda o é para o Direito Positivo.24 Para o autor, mesmo diante do atual contexto mundial denominado “Internet”, os produtos digitais podem ser considerados uma revolução à parte. Por outro lado, também têm surgido questões quanto a tributação desses produtos.25 A viabilização do comércio eletrônico está relacionada com a existência de uma tecnologia capaz de produzir uma forma segura de transmissão, via Internet, dos documentos e registros que representam um determinado negócio jurídico. As relações mercantis no mundo virtual são formalizadas através de mensagens eletrônicas, sendo necessário adotar um sistema de segurança de tamanha magnitude que atribua aos documentos eletrônicos força probante em juízo, ou seja, o mesmo nível de confiança que existe nos documentos materializados no mundo real. Nas palavras do Ministro do STJ Ruy Rosado de Aguiar: O consumidor deve ter conhecimento que existe um sistema moderno, já adotado em outros países, denominado criptografia, e só com ele é possível controlar a autenticidade e a veracidade de informações contidas nas cláusulas do documento eletrônico... Sem o uso de assinatura criptográfica, não se obtém documento eletrônico com força de prova em juízo. 24 26 SCHOUERI, Luís Eduardo. Op. cit., p. 281. SCHOUERI, Luís Eduardo. Op. cit., p. 281. 26 Citado na Agência Estado de Notícias, apud Eduardo de Lascio, Módulo e-security, seminário Assinatura e Certificação Digital no Brasil, São Paulo em 19/10/2000. 25 Existem dois requisitos básicos que todo documento eletrônico deve possuir para ter força probante, são eles: autenticidade e integridade.27 • Autenticidade é o registro que permite associar de maneira inequívoca o documento ao seu autor, afastando dúvidas quanto à autoria da manifestação de vontade consubstanciada nos termos do documento eletrônico. Nos documentos físicos a autenticidade é evidenciada pela firma, ou assinatura, que poderá ainda ser reconhecida por tabelião que passa a afirmar sua legitimidade. • Integridade é a certeza da inteireza do conteúdo do documento eletrônico, ou seja, a garantia de que o documento tem seu conteúdo preservado, integro durante sua transmissão. Além disso, o processo eletrônico que atribuir integridade a um determinado conteúdo, deve ser de tal forma estabelecido que permita identificar a ocorrência de violação do conteúdo original. Esses dois requisitos, certamente são evocados pelas leis de todos os países que regulamentam o regime jurídico dos documentos eletrônicos. A UNICITRAL – United Nations Commission on International Trade Law foi criada pela Assembléia Geral da ONU e produziu uma Lei Modelo28 que tem por objetivo 27 A Medida Provisória nº 2.200-2, de 24 de agosto de 2.001, “Art. 1º, Fica instituída a InfraEstrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, para garantir a autenticidade e a integridade e a validade jurídica de documentos em forma eletrônica, das aplicações de suporte e das aplicações que utilizem certificados digitais, bem como a realização transações eletrônicas seguras” (grifo nosso). 28 A Lei Modelo é uma referência, fornece diretrizes, não é uma lei propriamente dita. A finalidade da Lei Modelo é a de oferecer ao legislador nacional um conjunto de regras aceitáveis no âmbito internacional que lhe permitam eliminar alguns obstáculos, com vistas a criar um marco jurídico que permita um desenvolvimento mais seguro das vias eletrônicas de negociação designadas pelo nome de "comércio eletrônico". Os princípios firmados no regime da Lei Modelo ajudarão os usuários do comércio eletrônico a encontrar soluções contratuais adequadas para superar certos obstáculos jurídicos que dificultam esse emprego crescente do comércio eletrônico. servir de base à formulação das legislações nacionais, fazendo com que estas, na medida do possível, possam conviver harmoniosamente no ambiente globalizado. No seu Artigo 9o – Admissibilidade e força probante das mensagens de dados, propõe: 2) Toda informação apresentada sob a forma de mensagens eletrônica gozará da devida força probante. Na avaliação da força probante de uma mensagem eletrônica, dar-se-á atenção à confiabilidade da forma em que a mensagem haja sido gerada, conservada a integridade, a forma pela se haja identificado o remetente e a qualquer outro fator pertinente. (grifos nossos). No Brasil, para garantir a autenticidade, a integridade e a validade dos documentos em forma eletrônica, o Poder Executivo em 24 de Agosto de 2001, editou a Medida Provisória nº 2.200-2, instituindo a infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileiras – ICP Brasil.29 Em decorrência da MP 2.200-2, os documentos eletrônicos com certificação digital pela ICP-Brasil são considerados como documentos escritos, assinados e válidos como prova, presumindo-se verdadeiros em relação aos signatários, conforme estabelecido no § 1º, do art. 10 da MP.30 29 www.icpbrasil.gov.br. Todavia, o ordenamento jurídico nacional não dispõe sobre documento digitalizado. A legislação nacional somente regula a microfilmagem de documentos oficiais na Lei nº 5.433, de 8 de maio de 1968, que autoriza em seu § 1º do artigo 1º: o “ s microfilmes produzirão os mesmos efeitos legais dos documentos originais em juízo ou fora dele”. Com efeito, o Decreto nº 1.799, de 30 de janeiro de 1996, que regulamenta a Lei nº 5.433/68, define microfilme em seu artigo 3º, nos seguintes termos: “Entende-se por microfilme, para fins deste Decreto, o resultado do processo de reprodução em filme, de documentos, dados e imagens, por meios fotográficos ou eletrônicos, em diferentes graus de redução.” Nesse sentido, a Lei nº 9.492, de 10 de setembro de 1997, define competência, regulamenta os serviços concernentes ao protesto de títulos e outros documentos de dívida, estabelece no artigo 39: “A reprodução de microfilme ou de processamento eletrônico da imagem, do título ou de qualquer documento arquivado no Tabelionato, quando autenticado pelo Tabelião de Protesto, por seu Substituto ou Escrevente autorizado, guarda o mesmo valor do original, independente de restauração judicial.” O Conselho Federal de Medicina, na Resolução CFM nº 1.639/2002, estabelece a guarda permanente para os prontuários médicos arquivados eletronicamente em meio óptico ou magnético, e microfilmados. Dessa forma, constatamos que a legislação nacional não possui norma legal específica a documentos digitalizados. 30 O Substitutivo ao Projeto de Lei no 4.906, de 2001 (PLS no 672, de 1999 – apensados os Projetos de Lei no. 1.483, de 1999 e no 1.589, de 1999) que dispõe sobre o valor probante do documento eletrônico e da assinatura digital, estabelece: Art. 4o As declarações constantes de documentos eletrônicos presumem-se verdadeiras em relação ao signatário, nos termos do Código Civil, desde que a assinatura digital: ... III – seja gerada com chave privada cuja titularidade esteja certificada por autoridade certificadora credenciada e seja mantida sob o exclusivo controle do signatário; IV – esteja ligada ao documento eletrônico de tal modo que se o conteúdo deste se alterar, a assinatura digital estará invalidada; ...” A criptografia, a técnica de escrever em caracteres secretos ou em cifras, é o elemento chave na formação de uma infra-estrutura segura para troca de mensagens eletrônicas em redes inseguras (como a Internet) que é denominada ICP (Infra-estrutura de Chaves Públicas), capaz de garantir integridade e autenticidade aos documentos eletrônicos transmitidos na Internet. 1.4.2 – CRIPTOGRAFIA Os especialistas em telecomunicações Richard C. Barth e Clint N. Smith, da Motorola e da MCI, respectivamente, definem o conceito e campo de aplicação da criptografia: Encryption, the process of protecting the confidentiality of information by the application of mathematical formulae, was until recently the exclusive domain of governments. Only when the international financial services industry became more automated in the 1970s did it begin to incorporate strong encryption to secure payment and clearing systems. Other components of the private sector began to follow the financial services industry´s lead as their needs for secure information became apparent. Today encryption is considered an essential element of the infraestructure for electronic commerce and information exchange.31 O método tradicional de criptografia de mensagens, denominado criptografia simétrica, consiste na geração de uma chave secreta que serve para codificar e decodificar a mensagem, assim esta chave precisa ser de conhecimento tanto do emissor quanto do receptor. A fraqueza deste método consiste no risco de interceptação da mensagem de transmissão da chave secreta entre as duas pontas. Outro ponto, não menos importante, é a dificuldade de gerenciamento das chaves simétricas, ou seja, seriam necessários processos complexos, de alto risco, de controle de emissão das várias chaves para vários receptores. A solução para este problema veio com a criptografia de chave pública, ou criptografia de chaves assimétricas, inventada por Whitfield Diffie e Martin Hellman em 1975. Este método possui duas aplicações principais: encriptação e assinaturas digitais. 31 "Criptografia, o processo de proteger a confidencialidade da informação pela aplicação de fórmula matemática, era até recentemente o domínio exclusivo de governos. Só quando a indústria de serviços financeira internacional se tornou mais automatizada nos anos setenta se começou a incorporar a criptografia forte para afiançar pagamento e clarear sistemas. Outros componentes do setor privado começaram a buscar os serviços financeiros das indústrias, sendo que as necessidades por informação segura ficou aparente. Hoje a criptografia é considerada um elemento essencial da infra-estrutura para o comércio eletrônico e troca de informação.” (tradução livre do autor) . “International Regulation of Encryption: Technology Will Drive Policy”, pág. 283 apud Regis Magalhães Soares de Queiróz. Assinatura Digital e o Tabelião Virtual. Direito & Internet. EDIPRO, 2000. O processo de criptografia assimétrica, resultado de um complexo algoritmo matemático, está baseado na geração de duas chaves diferentes. Uma das chaves é denominada chave privada e deverá ficar guardada, de forma segura, com o proprietário. A segunda chave, denominada chave pública, como o próprio nome diz é pública e deve ser distribuída livremente. Entretanto, existe uma relação matemática entre a chave privada e sua correspondente chave pública. Assim, qualquer uma das chaves serve para cifrar ou decifrar uma mensagem, porém o que uma das chaves cifrou somente a outra decifrará. Entretanto, vale ressaltar que as chaves são matematicamente independentes, ou seja, de posse de uma chave é praticamente impossível a dedução da outra chave que compõe o par. Supondo-se que a pessoa “A” deseje enviar uma mensagem para “B” e o importante nesta comunicação é garantir a privacidade da comunicação, ou seja, garantir que ninguém, mesmo que interceptando a mensagem, será capaz de entender o seu conteúdo. Basta que “A” (remetente) utilize a chave pública de “B” (destinatário) para cifrar (codificar) a mensagem a ser enviada a “B”, este poderá ler a mensagem decifrando-a com sua chave privada, que somente ele, “B”, possui. No exemplo anterior adicione a necessidade da pessoa “B” (destinatário) ter certeza de que a mensagem foi realmente enviada por “A” (remetente), assim além da necessidade de manter a privacidade na comunicação, também passa a ser requisito do processo a identificação/autenticação do originador da mensagem. Para que isso ocorra, “A” deverá cifrar a mensagem com a chave pública de “B” e em seguida cifrar o resultado com a sua própria chave privada. Quando “B”, o destinatário, receber usará a chave pública de “A”, que garante a origem da mensagem como vindo do remetente “A”, após aplicará sua chave privada para ter acesso ao conteúdo da mensagem. 1.4.3 – ASSINATURA DIGITAL Um negócio jurídico aperfeiçoado implica na existência de meios físicos suficientes para formalização da avença, ou seja, o contrato. Clóvis Bevilácqua, baseado no artigo 81 do Código Civil de 1916, estabelece que o contrato “é o acordo de vontade entre duas ou mais pessoas com a finalidade de adquirir, resguardar, modificar ou extinguir direito”. Consoante disposto pelo artigo 129, do Código de Processo Civil32, prevalece o princípio da ausência de solenidade na celebração dos contratos em geral, o que inclui os eletrônicos, bastando o simples acordo de vontades. Já essa manifestação da vontade pode ser tácita, desde que a lei não exija forma expressa. Desta feita, a questão é saber se é ou não válida a declaração de vontade emitida através de comandos eletrônicos. Pelo entendimento doutrinário, a manifestação da vontade pode se verificar de qualquer maneira inequívoca, de modo que o meio eletrônico é hábil à formação do vínculo contratual, desde que se permita identificar o agente. 32 Art. 129, CPC – “A validade das declarações de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir”. Porém, para delimitarmos, com exatidão, o momento da formação do contrato, temos que verificar a modalidade da contratação (entre presentes ou entre ausentes). Sendo uma contratação entre presentes, a proposta é obrigatória se imediatamente aceita, momento em que se conclui a fase negocial. Na contratação entre ausentes, o contrato somente está acabado quando, após prazo razoável, a aceitação é expedida (arts. 127 e 1086 do Código Civil). Na opinião de Miriam Junqueira: “o contrato eletrônico é realizado entre presentes naquelas situações de transmissão instantânea, e realizado entre ausentes naquelas em que a formação do vínculo é diferida no tempo”. 33 Portanto, o momento da formação do contrato eletrônico pode diferir, dependendo da simultaneidade, ou não, da declaração da vontade das partes. Qualquer transação eletrônica, uma simples compra de uma “commodity”, por exemplo, um livro ou um CD de músicas implica a contratação (compra e venda), necessitará a autenticação das partes para vincular as respectivas obrigações e direitos. No comércio eletrônico não existe o contato físico, nem o entabulamento de negociações dentro da praxe que conhecemos no mundo real. A identificação do declarante, no mundo real, é resolvido através da assinatura autográfica no próprio documento que contem a declaração de vontade, conforme prevê o CPC: Art. 371 Reputa-se autor do documento particular: 33 JUNQUEIRA, Miriam. Contratos Eletrônicos, Rio de Janeiro: Ed. Maud, p. 23. I – aquele que o fez e o assinou;... Importante destacar todo o aparato que as partes e a justiça dispõe para validar uma assinatura: sistema de reconhecimento de firmas e perícia grafotécnica (nos casos de contestação de uma assinatura). Dentro desse contexto, a assinatura digital deverá atribuir aos documentos eletrônicos as duas características básicas, autenticidade e integridade, que lhes garantem força probante. O processo de assinatura digital de um documento eletrônico consiste de dois passos: 1 – executa-se uma função hash, trata-se de um algoritmo que lê o texto (documento eletrônico) e cria uma seqüência de bits de tamanho fixo, de tal forma que se uma parte qualquer do conteúdo do documento, um único caractere seja modificado a seqüência de bits seria outra. Temos comparativamente o DNA do documento eletrônico, obtido matematicamente; 2 – a parte que desejar declarar sua concordância com os termos do contrato poderá aplicar sua chave privada no resultado da função hash, isto é, na seqüência de bits única associada ao documento. O resultado destes dois passos é a assinatura digital do documento, pois a integridade do conteúdo do documento e a autenticidade do autor poderão ser facilmente verificadas com a reversão do processo, da seguinte forma: 1 – aplica-se a chave pública do autor (ou parte) do documento eletrônico na assinatura digital do documento, ou seja, no resultado da função hash criptografado; 2 – Agora, basta reprocessar a função hash no documento original obtendo um novo hash e compará-lo com o resultado do item 1. Entende-se, portanto, que todos os requisitos do Art. 4o do Substitutivo ao Projeto de Lei no 4.906, de 2001, que estabelece os requisitos para validade da assinatura digital, estão perfeitamente atendidos. Para que uma declaração de vontade seja considerada com tal pelo seu receptor, é necessário que o emissor seja perfeitamente identificável. Se o seu conteúdo não puder ser atribuído a alguém sujeito determinado, que assuma a autoria, então não estaremos diante de uma verdadeira declaração e, portanto, o seu conteúdo não tem força vinculatória para o Direito. Só há verdadeira declaração quando alguém exterioriza uma mensagem para outrem, fazendo-se reconhecer como emitente daquela manifestação. A identificação do emitente da declaração é, portanto, elemento constitutivo da própria declaração. O problema da identificação do declarante, nos documentos declarativos tradicionais, é resolvido com a aposição da assinatura autográfica no instrumento documental em que a declaração está representada. Pelo art. 371, inciso I do CPC, “Reputa-se autor do documento particular: I – aquele que o fez e assinou”. Segundo Carnelutti, assinatura é a ”scrittura del proprio nome che uma persona fa a piedi del documento”34. Num sentido amplo, podemos definir assinatura como uma forma pela qual o autor de um documento se identifica e manifesta o seu conhecimento e a sua concordância acerca do conteúdo do referido documento. No entanto, a assinatura autográfica não é adequada aos documentos eletrônicos. Evidente que a simples digitação de um nome ao pé de uma mensagem eletrônica não pode ser considerada equivalente à assinatura autográfica, assim como também não o seria um nome simplesmente datilografado em um pedaço de papel. Por outro lado, a natural fugacidade dos documentos digitais (que podem ser alterados sem deixar vestígios) torna insegura a prova sobre a concordância do remetente quanto ao conteúdo, devido à possibilidade técnica de adulteração imperceptível das mensagens que circulam no ambiente virtual. Nesse contexto, é também difícil ter certeza sobre a identidade de quem se encontra do outro lado de uma conexão de computador. Daí porque a Internet é, ainda, um ambiente onde é possível manter-se no anonimato, que é o antônimo de identificação. A assinatura tem, portanto, três funções típicas, que são: 1. Função declarativa: individualizar o autor do documento; 2. Função declaratória: afirmação da autoria do conteúdo do documento pela pessoa nela individualizada e; 3. Função probatória: garante a autenticidade do documento. 34 “Studi sulla sottoscrizione” in Riv. Dir. Comm., 1929, I, p. 523. A assinatura autográfica carrega intrinsecamente essas três funções. Feita manualmente, é considerada praticamente única, pois nela está representada a individualidade do traço escrito, geralmente diferenciado em cada indivíduo; além disso, a correlação da assinatura autográfica com uma determinada pessoa pode ser feita, atualmente, por um sistema de reconhecimento de firmas, cuja infraestrutura é funcional e já está instalada; além disso, também é possível se necessário, realizar perícia grafotécnica para essa finalidade. Da conjunção desses três fatores, obtém-se a garantia sobre a possibilidade e a viabilidade de identificar-se o autor da assinatura manual. Para que um sistema de assinatura digital tenha a mesma força que a assinatura autográfica é preciso que, à sua maneira, ele também preencha os requisitos que garantam a identidade, a integridade a perenidade do conteúdo: o uso e o controle da chave privada devem ser de exclusividade do proprietário, permitindo a individualização da autoria da assinatura (função declarativa); a autenticidade da chave privada deve ser passível de verificação, a fim de ligar o documento ao seu autor (autenticação, ligada à função declaratória); a assinatura deve estar relacionada ao documento de tal maneira que seja impossível a desvinculação ou adulteração do conteúdo do documento, sem que tal operação seja perceptível, invalidando automaticamente a assinatura (função probatória). Todos esses requisitos são preenchidos pela tecnologia da criptografia de chave pública, que é empregada nas assinaturas digitais. O funcionamento da assinatura digital de chave pública é baseada no modelo de criptografia assimétrica e depende fortemente para sua implementação da existência de uma infra-estrutura – PKI – Publick Key Infraestructure – que viabilizará todos os mecanismos de segurança idênticos aos cartórios no mundo real. Ainda destacamos a evolução do algoritmo de PGP – Pretty Good Privacy que viabilizam sobe o ponto de vista de segurança e performance o emprego concomitante dos modelos de criptografia simétrica e assimétrica. Por fim, para garantir a autenticidade da chave e privada, será preciso recorrer aos serviços de uma terceira parte, que desfrute da confiança das outras partes envolvidas, que possa afirmar, sem erro, a ligação entre a chave privada utilizada para a assinatura do documento e a pessoa que nela está apontada com emitente da mensagem eletrônica. Essa função cabe às chamadas autoridades certificadoras. 1.5 – O CONCEITO DE CONTRATO E A INTERNET Com o desenvolvimento da civilização e para melhor garantir as necessidades humanas, os interesses das pessoas devem estar resguardados por uma manifestação de vontade, denominada contrato. A noção de contrato foi discutida por diversos juristas. No direito francês, houve quem fizesse a distinção entre contrato e convenção, sendo que o contrato estava destinado unicamente a criar obrigações e a convenção seria o acordo de duas ou mais pessoas sobre um objeto jurídico.35 35 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil, vol. 3, 7ª ed. São Paulo: Oliveira Mendes, 1998, p. 10. Atualmente, Arnoldo Wald conceitua contrato como “um ato jurídico bilateral, pois depende de no mínimo duas declarações de vontade, visando criar, modificar ou extinguir obrigações (direitos relativos de conteúdo patrimonial)”. 36 Dessa forma, verifica-se que o contrato é uma espécie de ato jurídico, proveniente do acordo de vontade praticado por duas ou mais partes, capaz de produzir os efeitos mencionados no art. 81 do Código Civil Brasileiro. Este conceito genérico recebe uma delimitação comercial e civil. O contrato civil é aquele praticado por qualquer pessoa que seja capaz, conforme dispõe o Estatuto Civil. Já o contrato comercial é aquele praticado por comerciante no exercício de sua profissão, cujo objeto é um ato do comércio. Os contratos possuem elementos peculiares como: a sua formação, as obrigações que originam, as vantagens que podem trazer às partes, a realidade da contraprestação, o obedecimento de seus requisitos formais, sua execução, sua regulamentação legal, etc. Diante destes elementos há uma arraigada classificação como se são consensuais e reais, unilaterais ou bilaterais, gratuitos ou onerosos, comutativos ou aleatórios, solenes ou não-solenes, principais e acessórios, típicos ou atípicos, etc. O conceito de contrato, “acordo de vontades, na conformidade com a lei, e com a finalidade de adquirir, resguardar, transferir, conservar ou extinguir direitos”37, mostra-se plenamente aplicável aos negócios celebrados através da rede. 36 WALD, Arnoldo. Curso de direito civil brasileiro: Obrigações e Contratos. 7ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1987, p. 120. 37 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 10ª edição. Rio de Janeiro, Forense, 1998, Vol. III, p.. 2. O estudo de todo instituto jurídico deve começar pelos princípios que o regem e, nesse sentido, observa-se que os princípios da autonomia da vontade, da força obrigatória, (lei entre as partes), do consensualismo e da boa-fé38 regem os contratos eletrônicos tal como os contratos tradicionais. Os pressupostos e requisitos essenciais à formação dos contratos eletrônicos reputam-se os mesmos aplicáveis a todos os demais contratos: capacidade das partes, objeto possível, forma prescrita ou não defesa em lei e consentimento39 Entretanto, diversas questões são suscitadas quando da aplicação das normas tradicionais aos contratos digitais. As formulações encontradas nos manuais de Direito Civil apresentam, apesar das variações lingüísticas e de estilo, um conteúdo uniforme e incontroverso: o contrato é definido como um negócio jurídico plurilateral formado de pelo menos duas declarações de vontade com conteúdos coincidentes destinado à criação de direitos e deveres entre as partes contratantes. O direito da contratação eletrônica requer a exploração de seu conceito apropriado a fim de serem delimitados os seus contornos próprios. Com isto, haverá a possibilidade de interpretarmos o seu conteúdo e as suas principais características. Karl Engish já dizia que: a “interpretação do conceito jurídico é o pressuposto lógico da subsunção, a qual, por seu turno, uma vez realizada, representa 38 39 Cf. GOMES, Orlando. Contratos. 18ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 22. GOMES, O. Ob. Cit., pp. 44 e 45. um novo material de interpretação e pode posteriormente servir como material ou termo de comparação”.40 Se houver a ausência de um conceito, não poderemos demarcar o início e fim de uma determinada temática. A forma e o sentido das coisas são o fator principal que influencia a necessidade de se proceder uma conceituação. O conceito jurídico é a diretriz primordial para a fixação das principais características do novo fenômeno jurídico em questão. Muitas definições tradicionais são passíveis de aplicação, pois a inovação está no meio pelo qual são realizados os acordos de vontades.41 O novo Código Civil Brasileiro, a exemplo do Código de 1916, deixou de conceituar o contrato, para que a doutrina o fizesse. Em sua essência, o art. 104 do Código Novo manteve os anteriores requisitos para a validade do negócio jurídico, a saber: agente capaz; objeto lícito, possível, determinado ou determinável; forma prescrita ou não defesa em lei. Mas numa análise comparativa pormenorizada, vê-se que o art. 82 do Código Antigo não chega a esse nível de detalhe. Estabelece a norma antiga que a validade do ato jurídico requer agente capaz, objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei. Por capacidade há de se falar em jurídica, no sentido de ser titular de direitos, e a de agir, que é a de poder ser parte em processo judicial, atuar judicialmente. 40 ENGISH, Karl. Introdução ao Pensamento Jurídico. 7ª ed. Trad. João Baptista Machado. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1996, pp. 96-97. 41 LAWAND, Jorge José. Teoria Geral dos Contratos Eletrônicos. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2003. Quanto à forma, deve-se contratar de acordo com o que a lei determinar, ou ao menos não vedar. É o princípio da livre forma. Não há impedimento legal para a compra e venda mediante contrato verbal, mas, para ser válido, deve ser lavrado em escritura pública. Avanços ocorrerem em relação à positivação de entendimento doutrinário, no texto novo, de modo a evidenciar que não basta a presença da idoneidade legal do objeto contratual, mas à possibilidade material de sua concretização. Não só o objeto jurídico deve ser legal, como também o objeto da relação jurídica deve ser realizável. Ainda que não seja o bem determinado em um primeiro momento, deve ser determinável. Não se pode, contudo, afirmar que a modificação do texto legal haja provocado uma mudança de sentido, teórico ou prático, em relação à norma anterior. 1.6 – TIPOS DE CONTRATOS INFORMÁTICOS: HARDWARE, SOFTWARE E CONTRATOS DIGITAIS O avanço da informática representou o surgimento de novos tipos contratuais. Neste sentido, não apenas os contratos eletrônicos propriamente ditos, ou seja, aqueles que regulam as operações realizadas on line, têm merecido especial atenção. Também os contratos tradicionais, firmados em papéis, precisaram adaptar-se para reger as relações envolvendo hardwares e softwares42. Dessa forma, iremos, a seguir, lançar breves notas neste campo, as quais consideramos de vital importância para uma melhor compreensão da problemática dos contratos eletrônicos, uma vez que grande parte desses tem por objeto o direito de uso de softwares (downloads). Ressaltamos, todavia, que muitos das operações realizados na rede configuram, na realidade, negócios jurídicos tradicionais, como a compra e venda de livros e cds. Um negócio jurídico aperfeiçoado implica meios físicos suficientes para formalização da avença, ou seja, o contrato. Clóvis Bevilacqua, baseado no artigo 81 do Código Civil de 1916, estabelece que o contrato “é o acordo de vontade entre duas ou mais pessoas com a finalidade de adquirir, resguardar, modificar ou extinguir direito” (...) "pode-se considerar o contrato como um conciliador dos interesses, colidentes, como um pacificador dos egoísmos em luta..." É certamente esta a primeira e mais elevada função social do contrato. E, para avaliar-se de sua importância, basta dizer que debaixo deste ponto de vista, o contrato corresponde ao direito, substitui a lei no campo restrito do negócio por ele regulado."43 Do conceito acima, entende-se que a vontade livremente manifestada pelas partes envolvidas no acordo, trazem em seu bojo a criação de vínculos obrigacionais que valerão como lei entre os contratantes. De nada difere o conteúdo dos contratos feitos por meio do computador, eis que na sua essência, eles nada mais são do que manifestações de vontade, voltadas para os interesses bilaterais que produzirão os mesmo efeitos jurídicos que os contratos até então por nós conhecidos. Apenas que, feitos através de meio eletrônico. Qualquer transação eletrônica, uma simples compra, por exemplo um livro ou um CD de músicas implica a contratação (compra e venda). No comércio eletrônico 42 In Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, abril de 1999, Vol. 762, p. 45 e ss. não existe o contato físico, nem o entabulamento de negociações dentro da praxe que conhecemos no mundo real. Portanto, as partes necessitam de um meio seguro, totalmente confiável, para identificar cada uma das partes envolvidas no negócio. Ainda, o mais importante precisam de um “terceiro” de confiança das partes que serve para garantir a identificação (autenticação) das partes. Além das partes (mínimo de duas) haver a autoridade certificadora, exercendo um papel semelhante aos cartórios do mundo real, que será responsável, através da emissão do certificado digital, por garantir a autenticidade da identificação das partes. 1.7 – AUTORIDADE CERTIFICADORA Pelas características inerentes ao meio digital, identificar com segurança o emissor de uma mensagem eletrônica não é uma tarefa fácil. Há sistemas de assinatura digital com o PGP, que por serem baseados na confiança mútua entre os usuários (que devem distribuir a chave pública pessoalmente, ou por intermédio de outro meio em que o destinatário da mensagem confie), minimizando-se o problema da autenticação da chave com a qual foi criada a assinatura, mas cria-se outro: a necessidade de distribuição individualizada da chave pública. Essa característica torna esse sistema pouco apropriado para aplicação em grande escala, inviabilizando o seu uso para o comércio eletrônico em larga escala. 43 BEVILÁQUA, Clóvis. Direito das Obrigações, Terceira Edição acrescentada, 1931. Quando a distribuição da chave pública deve ser feita em massa, como ocorre no comércio eletrônico, um dos maiores problemas diz respeito à confiabilidade da distribuição e da identificação sobre se o afirmado proprietário da chave pública é realmente quem diz ser. Um elemento mal intencionado poderia gerar uma chave pública e distribuí-la para terceiros como se fosse pertencente a outra pessoa. Feito isso, ele poderá emitir documentos assinados com a chave privada correspondente e quem vier a recebê-los, quando decodificá-lo com a falsa chave pública distribuída pelo fraudador, será levado a acreditar na autenticidade da origem daquela mensagem. Para evitar esse tipo de fraude, institui-se a autenticação digital, onde a identidade do proprietário das chaves é previamente verificada por uma entidade de confiança das partes, que certificará a ligação entre a chave pública e a pessoa que a emitiu, bem como a sua validade. Além disso, essa entidade geralmente é também encarregada de publicar as chaves públicas certificadas em diretórios seguros, onde elas poderão ser consultadas e verificadas por qualquer interessado, sendo, ainda, possível obter cópias autênticas dessas chaves. Assim, ninguém receberá uma chave pública senão da entidade confiável que a certificou ou, caso receba a chave pública de um terceiro, poderá confrontar a sua autenticidade consultando o diretório da certificadora. Essa terceira parte costuma ser denominada autoridade certificadora. 1.8 – ICP (INFRA-ESTRUTURA DE CHAVES PÚBLICAS) A Infra-estrutura de Chaves Públicas é um conjunto de técnicas, práticas e procedimentos, a ser implementado pelas organizações governamentais e privadas brasileiras com o objetivo de estabelecer os fundamentos técnicos e metodológicos de um sistema de certificação digital baseado em chave pública. As partes necessitam de um meio seguro, totalmente confiável, para obter a chave pública uma das outras. Isto é feito através das autoridades certificadoras. São empresas que exercem uma função próxima dos cartórios no mundo real, são responsáveis pela identificação da pessoa ou empresa e geração do certificado digital com o par de chaves. A chave privada é entregue a pessoa ou empresa solicitante e a chave pública fica a disposição de todos nos diretórios públicos, mantidos pelas autoridades certificadoras. Assim, quando “A” (remetente) necessitar da chave pública de “B” (destinatário) recorrerá à idoneidade da autoridade certificadora que disporá da chave pública garantido para quem for sua autenticidade. Assim “A” de posse da chave pública obtida na autoridade certificadora poderá criptografar a mensagem para “B” com a certeza de que somente “B” poderá decifrar a mensagem, pois somente este terá a chave privada correspondente à chave pública garantida pela autoridade certificadora. O Governo brasileiro, por meio da edição da Medida Provisória nº 2.200-2, de 24 de agosto de 2001, instituiu a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP-Brasil, ou seja, os meios e regras técnicas pelos quais possibilitará a habilitação de instituições públicas e organismos privados a atuarem na validação jurídica de documentos produzidos, transmitidos ou obtidos sob a forma eletrônica. Os meios e regras técnicas correspondem à ICP-Brasil, destinada, conforme texto da MP, a "garantir a autenticidade, a integridade e a validade jurídica de documentos em forma eletrônica, das aplicações de suporte e das aplicações habilitadas que utilizem certificados digitais, bem como a realização de transações eletrônicas seguras".44 (grifos nossos). Com essa medida passa-se a dispor de alternativa para realizar eletronicamente transações que até agora não se podiam fazer e exigiam registros em papel escrito, para adquirirem validade. Essa nova modalidade de documentos não exclui nem se sobrepõe aos documentos utilizados atualmente. São equivalentes e isonômicos. Isto é, o sistema de certificação digital não introduz conceitos novos nas transações, apenas estabelece equivalência e isonomia legal entre os documentos produzidos e obtidos eletronicamente e os documentos firmados em papel, desde que certificados pela ICP - Brasil. As certificações realizadas por entidades certificadoras não vinculadas à ICPBrasil poderão continuar sendo feitas. Nessa condição, ao certificar determinado documento, as entidades o atestam quanto à sua autenticidade e integridade, de modo semelhante a uma testemunha. Já no caso de uma entidade certificadora vinculada ao sistema IPC-Brasil, seus documentos gozarão de uma presunção de autenticidade derivada da lei. Em 30 de novembro de 2001 foi gerado o par de chaves criptográficas e o respectivo certificado digital da AC (Autoridade Certificadora) Raiz da InfraEstrutura 44 de Chaves Públicas Brasileira, ICP-Brasil, Medida Provisória nº 2.200-2, de 24 de agosto de 2.001, art. 1º. na presença de representantes da Casa Civil e do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República e da sociedade civil. Este evento ocorreu nas instalações do SERPRO, Rio de Janeiro, em ambiente de segurança especialmente criado para essa finalidade. A partir de agora é possível emitir certificados para as Autoridades Certificadoras, AC, que desejarem fazer parte da ICP-Brasil. De acordo com o Decreto 4.036 de 28/11/2001, publicado no DOU de 29/11/2001, o Instituto Nacional de Tecnologia da Informação, ITI, designado como AC Raiz da ICP-Brasil, passa a ser vinculado diretamente à Presidência da República. 1.9 – A INTERNET: O ESTADO E O DIREITO Vivemos em uma época de gigantescas mudanças, que fogem ao tradicional controle político e jurídico, e diante da possibilidade de uma revolução permanente, especialmente a gerada pelo progresso trazido pela telemática. Tais mudanças geram também grandes incertezas quanto ao futuro da humanidade – se haverá um aumento da desigualdade social, fundada na garantia dos direitos do homem em relação aos Estados e aos velhos e novos poderes.45 Liliane Minardi lembra a lição deixada por Bobbio quanto ao nexo entre direito e democracia: 45 PAESANI, Liliana Minardi. Op. cit., p. 29. (...) essa falência se deve, em grande parte, ao desprezo do direito – e dos direitos – como técnica de limitação de controle e desregulamentação do poder e à vitória da antiga e recorrente tentação que é o governo dos homens no lugar do governo das leis.46 Estamos diante de um processo de integração, que se denominou Direito Comunitário, originado dos novos meios eletrônicos, que operam uma aproximação cultural e institucional dos Estados. Quanto ao aspecto jurídico, Celso Ribeiro Bastos aponta que essa integração estabelece o primado do Direito Comunitário sobre o Direito Interno, princípio acatado pelos estados e que se processa por delegação de poderes estatais soberanos à comunidade de Estados. As normas comunitárias são aplicadas diretamente sobre o território dos Estados, não necessitando de nenhum processo de ratificação e independe de critérios constitucionais dos Estados para serem aceitos, como ocorre com o Direito Internacional Tradicional. São realidades totalmente diferentes. Tanto o fenômeno de integração regional, quanto a globalização debilitam o papel do Estado Nacional, que inevitavelmente migra para a Corporação, e determinam uma produção cultural e jurídica comum. Futuramente, podem surgir diplomas normativos supranacionais, como produtos de uma Federação de Estados, e não de meros organismos internacionais, como ocorria até o momento.47 46 Ibid., mesma p. BASTOS, Celso Ribeiro. Os limites da liberdade de expressão na Constituição da República. Primeiro Fórum Brasileiro de Legislação do Documento Digital. São Paulo, 1999, apud PAESANI, Liliana Minardi. Direito e Internet – Liberdade de Informação, Privacidade e Responsabilidade Civil, p. 30. 47 Devido ao processo de globalização, o Estado, como detentor do poder político, recebe novos papéis e redesenha seu perfil, devendo adequar-se a multiplicidade de ordens jurídicas nos mais variados campos de atuação. Conforme Liliana Minardi Paesani: Constata-se o nascimento de regimes supranacionais, isto é, uma pluralidade de Estados Nacionais que se articulam para enfrentar questões sociopolíticas, organizando e integrando suas ações, inclusive como tentativa de se inserir nesse processo mais amplo e maior. Viabiliza-se, assim, a idéia de cidadania transnacional, que significa a vinculação da sociedade com este ordenamento. As relações econômicas internacionais não admitem a postura isolacionista do Estado, pois a idéia de auto-suficiência fenece com a modernidade globalizada.48 Atualmente, a idéia de uma soberania ilimitada do Estado está completamente prescrita, devido ao processo de globalização da economia e pela integração comunitária. Atualmente, há necessidade de mudança de enfoque. A nova realidade estatal precisa ser compreendida de acordo com os valores da sociedade atual, na qual os processos de comunicação ou de informação ganham cada vez mais espaço devido às conquistas tecnológicas. Segundo Miguel Reale, não se trata de substituir a “era do capitalismo” pela “era da informação”, mas de uma evolução do capitalismo, que desloca seu eixo, sendo que a informática tem dado significado e forma ao capital em razão de sua aplicação, permanecendo a informação sobre a posse dos bens e a produção.49 48 PAESANI, Liliana Minardi. Op. cit., p. 30. REALE, Miguel. Os fins do Estado. O Estado de São Paulo. São Paulo, 19.02.2000, Espaço Aberto apud PAESANI, Liliana Minardi, op. cit., pp. 30-31. 49 2. CONTRATOS ELETRÔNICOS 2.1 – DEFINIÇÃO O Novo Código Civil incorporou expressamente princípios contratuais tais como os da função social do contrato e da boa fé objetiva, bem como outros, por influência do contexto social em que se inseriu o direito das relações de consumo, como os princípios da interpretação mais favorável ao aderente e da nulidade das cláusulas que estipulam a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio. A respeito da função social do contrato, Arnold Wald observa que: A mesma “(...) não deve afastar a sua função individual, cabendo conciliar os interesses das partes e da sociedade. Assim, os direitos contratuais, embora exercendo uma função social, constituem direitos adquiridos (art. 5º, XXXVI) e gozam, nos termos da CF, da proteção do devido processo legal substantivo (art. 5º, LIV), em virtude do qual ninguém pode ser privado dos seus bens - e dos seus direitos que 50 também se incluem entre os bens - sem o devido processo legal”. Para ele, essa é a única interpretação aceitável em nosso regime constitucional, e considera que a inovação não põe em risco a sobrevivência do contrato. Apesar das importantes inovações, o novo Código Civil, assim, como o antigo, não definiu o que seja um contrato, deixando essa tarefa para a doutrina. É correto afirmar que um contrato decorre de um acordo de vontades, que resulta da coincidência entre duas declarações receptícias de vontade – oferta e a aceitação –, objetivando a produção de efeitos no mundo jurídico, com a constituição, modificação, conservação ou extinção de direitos, obrigando as partes ao seu cumprimento. 50 WALD, Arnold. Um novo direito para a nova economia: a evolução dos contratos e o Código Civil. Publicado na Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil nº 12 - JULAGO/2001, p. 39. Em termos genéricos, o contrato eletrônico é aquele avençado ou executado pela via eletrônica. O contrato celebrado através dos meios eletrônicos, ou seja, eletrônico na sua formação, pode ser considerado mais eletrônico do que um contrato avençado por modo tradicional mas com execução eletrônica. Assim, pode-se afirmar que o contrato celebrado eletronicamente é eletrônico strictu sensu, enquanto o contrato simplesmente executado eletronicamente o é latu senso. Portanto, as duas categorias estão compreendidas dentro do escopo dos contratos eletrônicos. Diante dessas considerações, contrato eletrônico é o acordo de vontades, celebrado ou executado por via eletrônica, que visa constituir, modificar, conservar ou extinguir direitos, obrigando os respectivos acordantes. 2.2 – CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS ELETRÔNICOS A especificidade do contrato eletrônico provém de ser concluído mediante uso de rede de computadores, não se constituindo em novo tipo contratual ou categoria autônoma, mas em nova técnica de formação contratual; portanto, aplica-se a qualquer categoria de contrato, típico ou atípico, que possa ser formalizado por meio eletrônico. Desse modo, pode haver contrato de compra e venda, contrato de mútuo, contrato de comodato, por exemplo, concluídos com o emprego de rede de computadores. A classificação desses contratos é afeita ao tipo contratual que reveste o negócio formado via computador. Além da classificação tradicional, os contratos que se expressam eletronicamente admitem classificação no tocante ao modo de contratação eletrônica. A utilização do computador conectado em rede para manifestação de vontade visando a formação do contrato pode dar-se de várias maneiras. Em conseqüência dessa variedade, surgem características que diferenciam os contratos de acordo com o modelo de utilização empregado na declaração da vontade. Cesar Viterbo Matos Santolin classifica o que chama de contratos por computador em três categorias distintas, conforme a utilização feita do computador na formação dos mesmos: • “computador como simples meio de comunicação” – situação em que o computador funciona como instrumento de comunicação de vontade já aperfeiçoada; • “computador como local de encontro de vontades já aperfeiçoadas” – hipótese em que o computador é posto a serviço das partes contratantes, não pertencendo o sistema a nenhuma delas, com exclusividade, programado por terceiros estranho à contratação; e • “computador como auxiliar no processo de formação da vontade (contrato por computador stricto sensu)” – atuando o computador como determinante na manifestação de vontade das partes.51 Em consonância com estes conceitos, Mariza Delapieve Rossi52 classifica a forma de contratação eletrônica em três categorias, que derivam das formas de 51 SANTOLIM, Cesar Viterbo Matos. Formação e Eficácia Probatória dos Contratos por Computador. São Paulo: Saraiva, 1995. comunicação eletrônica viabilizada a partir da conjugação das tecnologias de computação com as tecnologias de telecomunicações: • Contratos eletrônicos intersistêmicos – são os contratos eletrônicos formados utilizando-se o computador como ponto convergente de vontades preexistentes, ou seja, as partes apenas transpõem para o computador as vontades resultantes de negociações prévias, sem que o equipamento interligado em rede tenha interferência na formação dessas vontades; • Contratos eletrônicos interpessoais – podem ser entendidos os contratos celebrados por computador quando este é utilizado como meio de comunicação entre as partes, interagindo na formação da vontade destas e na instrumentalização do contrato, não sendo apenas forma de comunicação de vontade já concebida. Essa categoria se caracteriza principalmente pela interação humana nos dois extremos da relação; Podem ser considerados contratos celebrados entre presentes, pois a ficção assim o considera, uma vez caracterizada a possibilidade de resposta imediata. Aplica-se-lhes, portanto, o preceito do art. 1.081, inciso I, do Código Civil. O novo Código Civil, art. 428, inciso I, amplia o escopo da noção de contratos entre presentes ao equiparar ao telefone, como instrumento de formação contratual, outros meios de comunicação que a este se assemelhem, tornado desnecessário a utilização de analogia para o enquadramento do contrato eletrônico interpessoal simultâneo como contrato entre presentes; 52 Aspectos legais do comércio eletrônico – contratos de adesão, Anais do XIX Seminário Nacional de Propriedade Intelectual, São Paulo, Associação Brasileira da Propriedade Nos contratos em que a declaração e a recepção da manifestação de vontade não ocorrem simultaneamente, mas para os quais existe lapso temporal entre a declaração de uma parte e a recepção deste pela outra parte, são contratos interpessoais simultâneos. Exemplos desses contratos são os celebrados via correio eletrônico, que, como se infere do próprio nome, equivalem à correspondência epistolar comum. Esses contratos estariam contemplados no art. 1.086 do Código Civil. Novamente o novo Código Civil inova, quando, em seu art. 434, caput, utiliza a expressão “contrato entre ausentes” em substituição à menção a “correspondência epistolar” que faz o art. 1.086 do Código Civil, abarcando, assim os contratos eletrônicos interpessoais não simultâneos; • Contratos eletrônicos interativos – este é o mais peculiar dos modos de contratar via computador. Por esse meio de utilização uma pessoa interage com um sistema destinado ao processamento eletrônico de informações, colocando à disposição por outra pessoa, sem que esta esteja, ao mesmo tempo, conectada e sem que tenha ciência imediata de que o contrato foi efetuado. Este é o exemplo mais comum de contratos via Internet, pela Wold Wide Web, do qual derivam as compras de produtos ou contratação de serviços pela rede de computadores, mediante acesso aos chamados Web sites, compostos do que se usou denominar “páginas eletrônicas”. 2.3 – FORÇA PROBANTE DOS CONTRATOS ELETRÔNICOS Intelectual, ago. 1999, p. 105. No Brasil, ainda que inexistam regras jurídicas a respeito dessa importante questão, permitindo-se expressamente apenas na órbita das legislações fiscal e mercantil o emprego do suporte informático, não se vislumbra qualquer obstáculo à admissibilidade do documento eletrônico como meio de prova. O art. 332 do Código de Processo Civil preceitua que são hábeis para provar a verdade dos fatos, ainda que não-nominados, todos os meios legais e moralmente legítimos. Se, entender-se que o documento eletrônico deva ser inserido entre as provas atípicas, dúvida não pode haver no sentido de que a admissibilidade e aproveitamento destas defluem igualmente da regra da livre apreciação dos elemento de convicção Ademais pelo disposto no art. 371, III, do Código de Processo Civil, deve ser, em princípio, considerado o autor do documento particular “aquele que, mandado compô-lo, não o firmou, porque, conforme a experiência comum, não se costuma assinar ...”. E, consoante o enunciado do subseqüente art. 372, compete ao litigante, “contra quem foi produzido o documento particular, alegar, no prazo estabelecido no art. 390, se lhe admite ou não a autenticidade da assinatura e a veracidade do contexto; presumindo-se, com o silêncio, que o tem por verdadeiro”. Por fim, é de ser enfatizado que, pelo regramento da persuasão racional do juiz, consagrado no art. 131 do Código de Processo Civil, ao realizar o exame crítico dos elementos probatórios, o juiz tem a faculdade de apreciá-los livremente, para chegar à solução que lhe parecer mais justa quanto à vertente fática. 2.4 – OS CONTRATOS ELETRÔNICOS E O NOVO CÓDIGO CIVIL Com a vigência do novo Código Civil Brasileiro, Lei nº 10.406/2002, a partir de 11 de janeiro de 2003, um ano após sua publicação no Diário Oficial da União, o legislador não se utilizou da oportunidade para adequá-lo às necessidades do nosso tempo, mais especificamente, quanto a fixação de normas sobre a segurança na contratação por meios eletrônicos53. O processo legislativo é demasiado lento, enquanto o fato social caminha à velocidade da luz. A Lei Modelo da UNCITRAL (United Nations Comission for International Trade Law) data de 1996. Não se trata de uma lei propriamente dita, mas de diretrizes ou recomendações que devem as nações utilizar como base para suas normas internas acerca do comércio eletrônico, inclusive no que tange à assinatura digital, que é a ferramenta adequada para estabelecer a necessária segurança na contratação eletrônica. Desde o ano de 1995 estados norteamericanos de Utah e da Califórnia regulamentaram a utilização da assinatura eletrônica. A partir de 1997 vários países já editaram normas sobre o comércio eletrônico, adotando as diretrizes da Lei Modelo, a exemplo da Alemanha e Itália (1997), Espanha (1999) e França (2000). 53 Ressalve-se, aqui, normatização da Bovespa/BMF, sobre validade jurídica dos contratos eletrônicos firmados em bolsa. Embora o Projeto de Lei da Câmara nº 1589/99 da Câmara dos Deputados seja a mais importante iniciativa legislativa no setor, no Brasil, a primeira disposição a tratar do tema foi a Instrução Normativa nº 17, de 11 de dezembro de 1996, editada pelo Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado. Apenas em 5 de setembro de 2001, com o Decreto nº 3.587, é que foi instituída a Infra-Estrutura de Chaves Públicas do Poder Executivo Federal. Portanto, restrita ao âmbito da Administração Pública Federal. Hoje o PLC nº 1589/99 e o PLC 1.483/99 encontram-se apensados ao PLC nº 4.906/2001 (PLS nº 672/99), com a redação dada pelo substitutivo do Deputado Julio Semeghini, aprovado pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados em 26.09.2001. Portanto, o Brasil não possui uma lei que verse especificamente sobre o valor probante do documento eletrônico, a assinatura digital, a certificação digital, nem tampouco sobre o comércio eletrônico54. Não se pode afirmar que o § 1o do art. 10 da Medida Provisória nº 2200/200255 versa sobre o valor probante do documento, já que apenas transporta para o documento eletrônico o princípio da presunção de veracidade da declaração em relação ao subscritor. 2.4.1 – Responsabilização dos lesantes e intervenção do Estado 54 A vigente Medida Provisória nº 2.200/2001 não trata da contratação eletrônica. Ela instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira, além de fazer breve referência a alguns institutos do direito da informática que serão objeto de definição na futura Lei do Comércio Eletrônico. 55 Art. 10. Consideram-se documentos públicos ou particulares, para todos os fins legais, os documentos eletrônicos de que trata esta Medida Provisória. Na área de responsabilidade civil, a questão principal posta em debate está em que o aumento do raio de ação da Internet acarreta, de igual modo, o incremento de danos de difícil reparação, à mingua de identificação do seu autor. A legislação, a doutrina e a jurisprudência emergentes nos diversos países apresentam-se tímidas e contraditórias na definição de responsabilidades de usuários e provedores. Ex.: Espanha, Estados Unidos e Grã Bretanha, onde a informática desenvolve-se há muito mais tempo. Enquanto os norte-americanos excluem os provedores de responsabilidade pelos ilícitos cometidos pelos usuários, os ingleses aceitam-na, na condição de editores.56 A corrente que defende uma Internet livre de controle argumenta que obrigar o provedor a censurar o material que lhe é enviado pelo usuário é uma forma de limitar-se a liberdade de expressão. Tal entendimento foi bem visto pela Corte Suprema dos Estados Unidos, como declara Antonio Lindberg Montenegro: A tese restou vitoriosa perante a Suprema Corte dos Estados Unidos, ao declarar a inconstitucionalidade de lei, aprovada pelo Congresso em 1996 incriminava qualquer (Communication pessoa que, Decency através de Act), que meios de telecomunicação, transmitisse programas obscenos para menores de 18 anos. Naquela oportunidade, os juízes proclamaram que a § 1º As declarações constantes dos documentos em forma eletrônica produzidos com a utilização de processo de certificação disponibilizado pela ICP-Brasil presumem-se verdadeiros em relação aos signatários, na forma do art. 131 da Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916 - Código Civil. 56 LUCCA, Newton de; SIMÃO FILHO, Adalberto. Direito e Internet. Edipro, 2000, p. 168, nota 38. Internet cometia menos abusos que o rádio e a televisão, porque não invadia os lares das pessoas.57 (grifos nossos) Prosseguindo, o mesmo autor relata que o Federal Office of Justice de Berna, em documento de 1996, afirmou que “o provedor não tem obrigação legal analisar o material colocado à sua disposição pela rede na sua máquina”.58 Entretanto, reconhece-se que o tema é ainda muito polêmico, pois envolve a questão do controle dos meios de comunicação, esbarrando-se no direito de liberdade de expressão, como um direito fundamental do cidadão. A intervenção do Estado, portanto, torna-se uma tarefa difícil, uma vez que a Internet é caracterizada justamente pela liberdade dos cidadãos nos diversos pontos do mundo em se comunicar como bem quiserem. Por outro lado, qualquer forma de censura aos provedores poderia levar ao surgimento de monopólios ou oligopólios, além de penalizar os provedores, por não conseguirem atuar como juízes, impedindo que material ilegal seja veiculado na Internet. Seria como se fechar um jornal porque alguém mandou publicar um anúncio ofensivo ou porque alguém, numa entrevista, se declarou racista.59 Reconhece-se a necessidade de se preservar a liberdade de informação e os direitos autorais, sendo que a saída provavelmente seja uma auto- regulamentação, de forma que o costume fosse produzindo as suas próprias regras.60 57 MONTENEGRO, Antonio Lindberg. A Internet em suas Relações Contratuais e Extracontratuais. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2003, p. 13. 58 Ibid., p. 13-14. 59 Ibid., p. 14. 2.5 – ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DO CONTRATO Os elementos constitutivos do contrato, ou sua “força propulsora”, na lição de Orlando Gomes61, são aqueles que permitem aos interessados a condução da intenção de contratar, de modo a permitir ao outro interessado, de interesse contraposto, o conhecimento e a respectiva condução, visando à coincidência entre elas como o nascedouro do contrato. Tratam-se das declarações receptícias de vontade (oferta e aceitação) e ainda da coincidência entre ambas (o consenso). Segundo ele: (...) requer o contrato, para valer, a conjunção de elementos extrínsecos e intrínsecos. A doutrina moderna distingue-os sob os nomes, respectivamente, de pressupostos e requisitos. Pressupostos são as condições sob as quais se desenvolve e pode desenvolver-se o contrato (FERRARA). Agrupam-se em três categorias, conforme digam respeito: 1.o) aos sujeitos; 2.o) ao objeto; 3.o) à situação dos sujeitos em relação ao objeto. Todo contrato pressupõe: a) capacidade das partes; b) idoneidade do objeto; c) legitimação para realizá-lo. Esses pressupostos devem estar presentes no momento em que o contrato se realiza ou alcança vigor (BETTI). São, portanto, extrínsecos, embora se integrem posteriormente na relação contratual. Mas, não bastam. A lei exige outras condições para o contrato cumprir sua função econômico-social típica. São requisitos complementares, considerados elementos intrínsecos indispensáveis à validade de qualquer contrato: a) o consentimento; b) a causa; c) o objeto; d) a forma. Porque pressupostos e requisitos se completam, confundem-se, apesar de serem diversos. Por simplificação, diz-se que são requisitos essenciais à validade do negócio jurídico: a capacidade do agente, a possibilidade do objeto e a forma, esta quando prescrita 60 Ibid., p. 15. em lei. Sendo o contrato negócio jurídico bilateral, a vontade dos que o realizam requer exame à parte, por ser particularização que precisa ser acentuada. Assim, o acordo das partes adquire importância especial entre os elementos essenciais dos negócios jurídicos bilaterais. É, de resto, sua força propulsora. O proponente é aquele que emite a declaração receptícia62 da vontade denominada proposta, objetivando contratar. O oblato é o destinatário da proposta que emite a declaração receptícia da vontade chamada aceitação. Tem-se como proposta uma declaração receptícia de vontade emitida por quem realmente pretende contratar. Não pode ser considerada proposta uma declaração estapafúrdia, inconsistente, feita por brincadeira ou gracejo. A proposta séria é vinculante, obriga o proponente ao seu cumprimento. Enquanto a intenção de ofertar se mantiver apenas na mente de quem pretende externá-la, o fato é de nenhum valor jurídico. A partir do instante em que a oferta é produzida, ou seja, em que ocorre a exteriorização da vontade de contratar, o fato torna-se juridicamente importante, na medida em que o evento declaração há que produzir efeito na mente de outrem. É ela o ato que serve para a satisfação da necessidade de transmissão do pensamento.63 Para produção da declaração da vontade, o que importa não é se isso ocorre de forma escrita, verbal ou eletrônica, mas o fim a ser alcançado. Carnelutti assim afirma: 61 GOMES, Orlando. Contratos. Rio de Janeiro: Forense, 1990, pp. 45 e 46. Declaração Receptícia: “A declaração que produz os seus efeitos com o recebimento pelo destinatário. Contrapõem-se à declaração não-receptícia, que produz seus efeitos tão-só com a emissão pelo agente” Vocabulário Jurídico – De Plácido e Silva – 15ª. Edição – Ed. Forense – pg. 243 63 CARNELUTTI, Francesco. Teoria geral do direito. Tradução Antônio Carlos Ferreira. São Paulo: Lejus; 1999, p. 444. 62 (...) o modo de declaração consiste, pois, numa transformação da realidade tal, que permita a transmissão do pensamento. Se, para auxiliar o raciocínio, me permitem aqui comparar o pensamento com uma mercadoria, direi que o que se trata aqui é de construir o veículo e o motor que o transporte. A metáfora, embora grosseira, pode ser útil, porque permite ver que assim como são preciso os mais minuciosos cuidados na embalagem e expedição das mercadorias para garantir a sua integridade, algo de semelhante se passa para assegurar bom termo às viagens do pensamento. 64 Além da exteriorização do pensamento, da manifestação da declaração receptícia de vontade, apresenta-se como elemento essencial para a formação do vínculo contratual o consenso. O consenso deve corresponder à coincidência entre as declarações de vontade, ainda que os interesses sejam opostos. 2.6 – CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS EM GERAL QUANTO AO REQUISITO FORMAL Para a validade do ato jurídico, um dos requisitos é a forma, que deve ser prescrita ou não defesa em lei (art. 104 do novo Código). Prescrita é a forma que a lei assim estabelece ou que as partes convencionaram como tal. A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir (art. 107 do novo e 129 do antigo). Assim, desde que a lei não exija para certa avença um documento escrito, esta pode ser celebrada verbalmente. 64 Ibid., p. 444. A escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visam à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País (art. 108 do novo, sem correspondência exata com o antigo, é semelhante ao art. 134, II. O sentido do art. 108, combinado com o 215, equivale a uma refundição dos art. 130 e 134), bem como naqueles celebrados com a cláusula de não valer sem instrumento público (art. 109 do novo e 133 do antigo). Excetuando-se as situações em que os contratos devam ser escritos, solenes ou não, nada obsta que sejam celebrados de forma verbal, ou de qualquer outra forma que a mente humana seja capaz de imaginar ou inventar. Embora o novo Código Civil não tenha inserido expressamente a forma eletrônica de contratação em nosso ordenamento jurídico, o fez de maneira indireta, envolvendo as situações em que as partes estão presentes, assim como aquelas em que estão ausentes. Tais modificações, embora poucas em quantidade e pequenas se comparadas ao texto anterior, representam um grande avanço, servindo como um calmante para a inquietação do operador do direito, que certamente diminuiu, acaso não se haja dissipado inteiramente. Um avanço diz respeito à ampliação da noção de contratos entre presentes contida no preceito do art. 1.081, inciso I do código vigente, pois a nova lei equiparou ao telefone, como meio de comunicação para a formação contratual, outros meios de comunicação que a estes se assemelhem (art. 428, I). Outro avanço, observado versa sobre a substituição da noção de contrato epistolar, do caput do art. 1.086 do código antigo, pela de contratos entre ausentes (art. 434, caput), portanto, ampliada, na mesma esteira daquele outro dispositivo. Com isso, e sem necessidade de enumerá-lo explicitamente, o novo Código Civil admitiu a contratação na forma eletrônica, seja entre ausentes ou entre presentes. Daí, é correto afirmar que os contratos podem ser revestidos de forma verbal, escrita, solene ou eletrônica. Pode parecer impróprio falar em forma eletrônica, na medida em que é evidente que um contrato celebrado por e-mail ou por documento a ele anexado e um outro celebrado através de uma videoconferência são extrinsecamente tão diferentes. Por isso, e porque não é possível dispensar a todos os contratos eletrônicos o mesmo tratamento, a forma eletrônica é um gênero que comporta várias espécies que serão podem ser denominada subformas, as quais serão examinadas ao longo do tópico que versa sobre a classificação dos referidos contratos. A definição do momento e do local de constituição do contrato tem relevância para o direito, na medida em que são determinantes para a verificação da existência da relação jurídica, das obrigações constituídas, dos prazos prescricionais e decadenciais, da legislação aplicável e do foro competente para processar a julgar eventuais feitos entre as partes. Quando entre presentes, por dedução lógica, o contrato se forma no local em que se encontram os contratantes. Já em relação ao momento da formação, este ocorre no instante em que se dá a aceitação, ou seja, quando o oblato aceita a proposta a ele dirigida. A ficção legal de que é considerado entre presentes o contrato celebrado por telefone é conseqüência do fato de que, embora haja uma distância física entre os contratantes, existe a possibilidade de troca imediata de declarações de vontade. Quando entre ausentes, o contrato se forma no local onde foi proposto (art. 435 do novo Código Civil, 1.087 do antigo). A norma guarda pertinência com os preceitos da Lei de Introdução ao Código Civil, que no caput do art. 9º consigna que regerá as obrigações a lei do país em que se constituírem e, no § 2º do mesmo dispositivo que a obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente. As duas teorias mais aceitas entre as que buscam estabelecer o momento exato em que se dá a formação contratual são a teoria da expedição e a teoria da recepção. De acordo com esta última, o contrato se forma no instante em que o aceite chega à esfera de conhecimento do proponente (à caixa de correspondência do prédio onde reside ou à sua caixa postal de correio eletrônico). Não significa dizer que o proponente deva ter necessariamente lido o teor resposta, mas que ele esteja apto a fazê-lo. Diversamente, a teoria do conhecimento ou da cognição é aquela que considera formado o vínculo contratual somente após o conhecimento da aceitação; Para a primeira o contrato é considerado formado com a expedição da resposta, não bastando a simples intenção em enviar a resposta, mas efetivamente fazê-lo. A teoria da vontade, por sua vez, admite que a formação contratual ocorre quando o oblato aceita a proposta, antes mesmo de manifestá-la ao proponente. Nosso ordenamento acolheu como regra geral a teoria da expedição. Assim é que o novo Código Civil diz expressamente que os contratos entre ausentes tornam- se perfeitos desde que a aceitação é expedida (art. 434), seguindo a mesma orientação da norma anterior (art. 1.086), inclusive quanto às exceções (se antes da aceitação ou com ela chegar ao proponente a retratação do aceitante; se este se houver comprometido a esperar resposta; ou se esta não chegar no prazo convencionado). 2.7 – OS CONTRATOS ELETRÔNICOS E O PROJETO DE LEI BRASILEIRO O Projeto de Lei do Comércio Eletrônico é hoje uma compilação do PL da Câmara nº 1.483/99, do PLC nº 4.906-A/2001 (PL de Senado nº 672/99) e do PLC nº 1.589/1999, hoje apensados. São todos eles baseados na Lei Modelo da UNCITRAL, organismo das Nações Unidas para o comércio internacional. A Lei Modelo é uma referência, fornece diretrizes, não é uma lei propriamente dita. Ela visa obter uma uniformidade na norma jurídica brasileira com a dos outros países, diante do fato da globalização da economia, que sugere a utilização de preceitos comuns. Na ementa do projeto consta expressamente: (...) dispõe sobre a validade jurídica e o valor probante do documento eletrônico e da assinatura digital, regula a certificação digital, institui normas para as transações de comércio eletrônico e dá outras providências. Enfoca-se as vantagens tecnológicas e o comércio manifestações da transformação vivenciada na atualidade. eletrônico como Engloba nove títulos sobre a questão do documento eletrônico e da assinatura digital; dos certificados digitais; das entidades certificadoras; do comércio eletrônico, além de sanções administrativas e criminais. O projeto é didático, uma vez que proporciona uma série de conceitos necessários para a compreensão do fenômeno jurídico decorrente da aplicação da Internet nos contratos. A parte mais relevante é aquela que regulamenta o comércio eletrônico, contida no Título V do projeto sob análise, onde no capítulo I trata especificamente da contratação no âmbito do comércio eletrônico, no capítulo II refere-se à proteção e defesa do consumidor e no restante dispõe sobre queixas relativas a responsabilidade dos provedores e a solicitação e uso das informações privadas. O projeto de Lei n. 1.483, de 1999, de autoria do Deputado Dr. Hélio, tinha como objetivo a instituição da fatura eletrônica e da assinatura digital os negócios realizados no comércio eletrônico, diante da necessidade de serem regulamentadas as relações entre empresas e consumidores, diante do vertiginoso avanço da Internet no Brasil.65 Já o Projeto de Lei n. 1.589, de 1999, de autoria do Deputado Luciano Pizzato e outros, dispõe sobre o comércio eletrônico de forma mais ampla, abrangendo a questão relativa a validade jurídica do documento eletrônico e da assinatura digital. 65 LAWAND, Jorge José. Teoria Geral dos Contratos Eletrônicos. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2003, p. 62. Ambos os projetos são de iniciativa da Câmara dos Deputados. Com o recebimento do Projeto de Lei n. 4.906, de 2001, do Senado Federal, esses projetos foram apensados ao projeto vindo da casa legislativa. Entretanto, as normas para as transações de comércio eletrônico têm sido mantidas e dificilmente sofrerão modificação. Parece não haver controvérsia doutrinária sobre as mesmas. A oferta de bens, serviços e informações não está sujeita a qualquer tipo de autorização prévia pelo simples fato de ser realizada por meio eletrônico (art. 25). Isso é bom, em parte, porque legitima o que, na prática, já está operando normalmente. O contrário resultaria em inexplicável cerceio da atividade mercantil. É, contudo, ruim em parte, porque admite que os spammers entupam nossas caixas de correio. Não se diga que o spam equivale às malas-diretas tradicionais que recebemos em nossas casas ou escritórios, porque estas custam para o marqueteiro infinitamente mais do que o spam que lota as caixas de entrada de nossos correios eletrônicos. Aquelas malas-diretas custam o papel, a impressão e a postagem; esta custa quase nada... Muito dificilmente alguém receberia malas-diretas em mesma quantidade e freqüência com que se recebe spams. A lei posterior e específica revoga a lei geral naquilo em que conflitam. Para a definição do momento da formação contratual, uma espécie de teoria da mista foi adotada pelo projeto. De acordo com o projeto, mas sem prejuízo das disposições do Código Civil, a manifestação de vontade das partes, nos contratos celebrados por meio eletrônico, dar-se-á no momento em que o destinatário da oferta enviar documento eletrônico manifestando, de forma inequívoca, a sua aceitação das condições ofertadas e o ofertante transmitir resposta eletrônica transcrevendo as informações enviadas pelo destinatário e confirmando seu recebimento. (art. 26). Se a contratação se der mediante a troca de e-mails, em que será necessária a intervenção (humana) do ofertante, ainda que a oferta tenha ocorrido através de uma página eletrônica, a teoria adotada é a do conhecimento, ou seja, não é a expedição da aceitação (teoria da expedição) nem o simples ingresso da resposta na esfera de conhecimento do proponente (teoria da recepção) que definirá o momento da formação contratual. O proponente tem que enviar uma reposta ao oblato, dando-lhe ciência de que recebeu sua resposta de aceitação. Parece uma teoria da expedição às avessas... Por outro lado se trata de proposta colocada à disposição em página eletrônica interativa, que emite confirmação automática, não será necessário que o proponente saiba que a aceitação chegou à sua esfera de conhecimento, portanto não é necessário que tenha sequer sabido da sua existência, bastando apenas que a aceitação tenha ingressado em sua esfera de conhecimento para que seu programa de operação de comércio eletrônico dispare uma resposta automática de confirmação dirigida ao aceitante ou oblato. Essa situação parece abraçar a teoria da recepção... O dispositivo é confuso porque, se valem os preceitos do Código Civil, então foi mantida a teoria da expedição. Vale dizer, se não há prejuízo das disposições do Código Civil, então o contrato se forma no momento em que a aceitação é expedida. É regra de hermenêutica jurídica que a lei não contenha palavras inúteis. Nesse passo, não é à toa que o caput do art. 26 diz expressamente que “sem prejuízo das disposições do Código Civil, a manifestação de vontade das partes contratantes, nos contratos celebrados por meio eletrônico, dar-se-á no momento” em que for expedida a aceitação e o ofertante transmitir a confirmação, contendo os dados preenchidos pelo aceitante. Feitas estas ponderações, continua em vigor a teoria da expedição, sendo necessária a confirmação pelo proponente – automática ou não –, com a finalidade de estabelecer uma segurança jurídica na transação, para que as parte fiquem devidamente documentadas, não para revolucionar a teoria contratual. Da mesma forma, a proposta é vinculante, obrigando o proponente quando enviada por ele ou por sistema automático por ele programado (art. 26, § 1º). Por proposta há que se considerar a proposta séria, e não um mero gracejo ou brincadeira. Vale salientar que o projeto diz expressa e induvidosamente que aplicam-se ao comércio eletrônico as normas de defesa e proteção do consumidor vigentes no País (art. 30). Nesse mesmo diapasão, o dispositivo seguinte impõe ao comércio eletrônico o funcionamento em ambiente seguro, devidamente certificado, e com claras e inequívocas informações sobre a perfeita identificação e localização do ofertante bem como sobre os meios e endereços para contato, sua política de tratamento e armazenamento do contrato e das informações fornecidas pelo cliente, instruções para arquivamento do contrato eletrônico pelo aceitante e para sua recuperação, os de segurança empregados na operação e ainda a identificação do seu provedor de hospedagem (art. 31, I a VIII). O fato de uma oferta em desacordo com os preceitos da norma não desobrigará as partes quanto ao respectivo cumprimento. O direito não pode estar alheio aos fatos. Se algum consumidor decide aceitar uma oferta de um fornecedor que não se identifica adequadamente, que se esconde atrás do anonimato que a Rede ainda possibilita, correrá sério risco de não ver a obrigação contratual adimplida, mas não está ao desamparo do ordenamento jurídico, desde que se trata de um negócio lícito, como, por exemplo, uma compra de um objeto de artesanato. Ao revés, o inadimplemento quanto à entrega, pelo ofertante, de CDs piratas, em afronta ao Direito Autoral, não autoriza o adquirente a buscar abrigo na lei. Além do mais, não será negado valor probante ao documento eletrônico, pelo simples fato de esta não se basear no Projeto de Lei do Comércio Eletrônico, conforme previsão do seu art. 5º, parágrafo único. Parece que o próprio mercado já opera uma espécie de processo de seleção natural, separando o joio do trigo, os maus dos bons comerciantes. Por certo, o advento da Lei do Comércio Eletrônico dará ênfase a esse processo. No mais, é simplesmente lamentável que o substitutivo haja olvidado interessantes regras de hermenêutica existentes no Projeto de Lei 1.589/99 da Câmara (projeto da OAB), além de haver recepcionado preceito da Medida Provisória nº 2.200/2001 que, em afronta ao art. 236, §1o da Carta Magna66 e ao 66 Constituição Federal. Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público. § 1º. Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário. art. 1o da Lei 8.935/9467 (Lei de Registros Públicos), reveste de “autoridade” a pessoa, física ou jurídica, que adere à Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP-Brasil, mediante instituto denominado “credenciamento” em detrimento da natureza jurídica do interessado e sem a observância de qualquer das formas de delegação pelo Poder Público. 2.8 – OS CONTRATOS ELETRÔNICOS E O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR Como mencionamos anteriormente, o Projeto de Lei 4.096/01, que dispõe sobre a validade jurídica e o valor probante do documento eletrônico e assinatura digital, e institui normas para as transações de comércio eletrônico, além de igualar a oferta de bens, serviços e informações realizadas por meios eletrônicos às tradicionais, assegura a legitimidade da manifestação da vontade das partes, quando contratarem no âmbito do comércio eletrônico, mediante troca de documentos eletrônicos (Título V, Capítulo I, arts. 25 e 26, § 2º). Não obstante a importância dada pelo projeto, é importante destacar que o próprio Código de Defesa do Consumidor – CDC já dispôs em seu art. 30 que: (...) toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação, com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado. (grifos nossos) 67 o Lei 8.935/94. Art. 1 . Serviços notariais e de registro são os de organização técnica e administrativa destinados a garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos. Ou seja, o princípio da liberdade das formas também está consagrado nas relações de consumo, face à obrigatoriedade imposta ao fornecedor que veicular informações ou publicidade, referentes a produtos ou serviços oferecidos ou apresentados, independentemente da forma ou meio de comunicação. Analisando-se o exposto, percebe-se que não há no ordenamento jurídico brasileiro, preceito legal que impeça a contratação por meios eletrônicos. Pelo contrário, os diplomas legais brasileiros mostram-se bastante adequados a esta nova realidade, principalmente pelo notório Código de Defesa do Consumidor. Além disso, já se denota no cenário internacional e brasileiro, a produção de um aparato normativo que garante legitimidade a esta nova forma de contratar e atende às peculiaridades da contratação eletrônica. Como por exemplo, a garantia do valor probatório dos contratos eletrônicos. Contudo, a validade do contrato eletrônico depende da presença dos elementos essenciais inicialmente expostos, constantes no art. 104, do C.C./2002. Como todo ato negocial pressupõe uma declaração de vontade, a capacidade do agente é indispensável à validade dos contratos eletrônicos na seara jurídica, uma vez que está intimamente ligada à existência ou não de uma vontade válida. Ou seja, se um jovem de 16 anos, sem a devida assistência, aceitar uma oferta comercial na Internet, pela regra do Código Civil, considerar-se-á este ato jurídico como anulável. Esta regra, todavia, não possui caráter geral. Dispõe o art. 180, do C.C./2002 que (...) o menor, entre 16 (dezesseis) e 18 (dezoito) anos, não pode, para se eximir de uma obrigação, invocar a sua idade, se dolosamente a ocultou, inquirido pela outra parte, ou se, no ato de se obrigar, espontaneamente se declarou maior. Situações como essa são comuns na Internet, isto pelo fato de que a grande maioria de sites não dispõe de instrumentos capazes de impedir o acesso ou a compra de produtos ou serviços por pessoas com idade inferior à permitida. O acesso ou não ao site ou a realização do negócio jurídico, resume-se, na maior parte das vezes, a uma relação de confiabilidade. Além disso, nas situações em que se exige o preenchimento de dados cadastrais, os mesmos podem ser facilmente burlados, ocultando-se os reais. Com efeito, um dos grandes problemas da contratação eletrônica é a determinação da autenticidade dos sujeitos envolvidos na relação obrigacional. O que, via de conseqüência, é fundamental não só como requisito de validade contratual – capacidade do agente –, mas também e principalmente, para que se possa fazer atuar a responsabilidade civil em decorrência de eventual prática de ato ilícito ou qualquer outra situação que configure dano. Das soluções vislumbradas, a que mais tem destaque atualmente, não só para garantir a identificação, mas também a integridade dos documentos eletrônicos, é a assinatura digital baseada na criptografia assimétrica de chave pública e privada, já reconhecida pela Medida Provisória 2.200, de 28 de junho de 2001 e suas reedições. Quanto ao objeto dos contratos eletrônicos, a regra aplicada é a mesma dos contratos tradicionais, deverá ser lícito, isto é, conforme a lei, não sendo contrário os bons costumes, à ordem pública e à moral. E, deverá ainda ser um objeto possível, física ou juridicamente. Há ainda um terceiro requisito que é o consentimento dos interessados. Aos contratos eletrônicos a regra é a mesma, distinguindo-se apenas na maneira como a vontade é expressa. Particularmente, nos contratos celebrados eletronicamente, a manifestação de vontade pode se dar pelo envio de um e-mail; por tratativas em tempo real como no Internet Relay Chat - IRC; e pela a interação com um sistema pré-programado, caso este aplicável a sites, dentre outros. Como se vê, uma vez atendidos os requisitos do art. 104 do C.C./2002 e excetuadas as hipóteses em que a lei exige forma especial, são plenamente válidos os negócios jurídicos constituídos por vias eletrônicas. Das regras a serem aplicadas estão as do Código Civil e do Código do Consumidor, quando houver relação jurídica de consumo. 2.9 – PRINCÍPIOS JURÍDICOS APLICÁVEIS AOS CONTRATOS ELETRÔNICOS Os princípios configuram-se no meio utilizado pelos magistrados para resolverem os litígios, pelo legislador para redigirem a legislação, pelo jurista para elaborar as suas teorias e pelo operador do direito par atuar sobre eles.68 É composta por enunciados amplos que permitem solucionar um problema e orientam comportamento, originando um esquema abstrato, mediante um procedimento de redução a uma unidade diante da multiplicidade de fatos que 68 LAWAND, Jorge José. Teoria Geral dos Contratos Eletrônicos. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2003, p. 39. oferece a vida real. Trata-se de normas sem uma definição completa, tornando-se flexíveis e possíveis de serem completadas. Desta forma, aplicam-se todos os princípios previstos para os contratos tradicionais. Seu objetivo principal é oferecer aos julgadores e intérpretes uma orientação, a fim de interpretar contratos em todos os seus aspectos, inclusive quanto a sua formação e conclusão. Assim sendo, há os princípios basilares aplicáveis a todos os tipos de negócios jurídicos, sendo os mais relevantes: a) autonomia privada; b) supremacia da ordem pública; c) consensualismo; d) relatividade dos contratos; e) força obrigatória; f) onerosidade excessiva e a boa-fé.69 Não deve-se esquecer que a Lei UNCITRAL, já citada, delineou princípios próprios para as transações por meios eletrônicos, que servem de referência para as leis que venham a ser elaboradas. São eles: a) identificação, autenticação, impedimento de rejeição, verificação e privacidade.70 Contudo, há ainda a necessidade de se considerar também outros princípios, a fim de possibilitar a sua conformação ao direito. Podemos citar os seguintes: a) Princípio da equivalência funcional dos atos jurídicos produzidos por meios eletrônicos com os atos jurídicos tradicionais; b) princípio da neutralidade tecnológica das disposições reguladoras do comércio eletrônico; c) princípio da inalterabilidade do direito existente sobre obrigações e contratos; d) princípio da boa-fé e; e) princípio da autonomia privada (ou da liberdade convencional), como veremos a seguir: 69 70 LAWAND, Jorge José. Op. cit., pp. 40-41. Ibid., p. 41. 2.9.1 – Princípio da Equivalência Funcional dos Atos Jurídicos produzidos por meios eletrônicos com os atos jurídicos tradicionais Este princípio veda qualquer espécie de diferenciação entre os contratos clássicos, produzidos em papel e reconhecida a sua legitimidade através de um tabelionato de notas e os contratos efetivados através dos meios eletrônicos, em especial pela Internet. Tem como objetivo impedir preconceitos em relação ao que consta da rede mundial de computadores. Este preceito está previsto na Lei Modelo sobre Comércio Eletrônico (UNCITRAL), ocasionando duas conseqüências jurídicas: 1) a impossibilidade de ser considerado inválido o contrato em base virtual e; 2) a inviabilidade de se preverem condições diferentes daquelas impostas aos contratos, com suporte escrito, em papel. Assim, evitam-se entraves em impedimentos legais ao uso de mensagens eletrônicas, ou de dúvida que pudesse haver sobre a legitimidade ou eficácia jurídica dessas mensagens. O que a Lei Modelo pretende é minimizar possíveis obstáculos para o desenvolvimento de instrumentos avançados de comunicação. Em suma, este princípio tem a função jurídica que é cumprida em toda sua extensão pela instrumentação escrita e autógrafa – ou eventualmente – sua expressão oral – tem igualmente a mesma aplicabilidade quanto à instrumentação eletrônica, através de uma mensagem de dados, com independência de conteúdo, dimensão, alcance e finalidade do ato assim instrumentado.71 Adotou-se um critério flexível, para viabilizar a aplicação dos requisitos previstos para a documentação fundada em papel, proporcionando confiabilidade, inalterabilidade e rastreabilidade. O instrumento de prova será o documento eletrônico, que embora não tendo meios de segurança e reconhecimento jurídico, tem a mesma força probante dos documentos tradicionais (em papel). 2.9.2 – Princípio da neutralidade tecnológica das disposições reguladoras do Comércio Eletrônico Basicamente, representa que a lei deve ultrapassar os conceitos tecnológicos atuais, em constante mudança. O item 8, referente a neutralidade tecnológica, assim diz: Cabe assinalar que, em princípio, não se excluiu nenhuma técnica de comunicação no âmbito da Lei Modelo, de forma a acolher em seu regime toda eventual inovação técnica neste campo.72 Este é o que se denominou de princípio da neutralidade tecnológica. Demonstra que as normas disciplinadoras do comércio eletrônico englobarão, não somente a tecnologia existente no momento em que foram promulgadas, mas também as futuras, sem a necessidade de modificações. 71 LAWAND, Jorge José. Op. cit., p. 43. Ministério das Relações Exteriores (Org.). Lei Modelo da UNCITRAL sobre Comércio Eletrônico (1996) com Guia para sua incorporação ao direito interno, p. 19. 72 As normas reguladoras do comércio eletrônico e, especialmente, quanto aos contratos, devem ser aplicadas à tecnologia disponível no mercado e àquelas outras que porventura surgirão. Segundo Ana Paula Gambogi Carvalho: (...) A lei a ser promulgada deve ser tecnologicamente neutra, ou seja, reconhecer a validade jurídica não apenas do sistema de criptografia assimétrica, mas também de outras tecnologias equiparáveis, que atendam aos mesmos fins. (...) a lei não deve se restringir à normatização do valor probante do documento assinado eletronicamente (Direito Processual), mas deve também conter preceitos versando sobre o reconhecimento jurídico da assinatura digital como meio idôneo para atender às exigências formais do Direito Civil.73 O intuito é evitar a obsolescência do diploma normativo, ao ser aplicada a determinada tecnologia, que, porventura, poderá ficar ultrapassada. 2.9.3 – Princípio da inalterabilidade do direito existente sobre obrigações e contratos Este princípio parte da premissa mediante a qual a eletrônica é um novo suporte e meio de transmissão da vontade dos negociantes, e não um novo direito regulador das mesmas. Desta forma, a regulamentação das relações obrigacionais elaboradas, executadas e consumadas por este meio não devem necessariamente acarretar uma mudança no direito preexistente que já normatiza legalmente todos os contratos privados. 73 CARVALHO, Ana Paula Gambogi. Contratos Via Internet. Belo Horizonte: Del Rey, 2001, p. 152. O negócio eletrônico não implicará uma modificação da regra uniforme que rege os conflitos pertinentes às transações interfronteiriças. A respeito, comenta Ana Paula Gambogi Carvalho, que: A Internet não cria um espaço livre, alheio do Direito. Ao contrário, as normas legais vigentes aplicam-se aos contratos eletrônicos basicamente da mesma forma que a qualquer outros negócios jurídicos. A celebração de contratos via Internet sujeita-se, portanto, a todos os preceitos pertinentes do Código Civil Brasileiro (CC). Tratando-se de contratos de consumo, são também aplicáveis as normas do Código de Defesa do Consumidor (CDC).74 Observa-se uma modificação quanto ao meio físico utilizado, um novo meio de comunicação, como ocorre com os computadores interligados, através de provedores de acesso, possibilitando a conexão entre pessoas localizadas em diferentes localidades, e diversos países. O direito brasileiro está apto para regular as relações contratuais resultantes da utilização da Internet, sempre que o proponente seja domiciliado no país, de acordo com as regras contidas no art. 9º e 2º da Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro, além do art. 1.087 do codex. O novo Código Civil, Lei n. 10.406, de 10.1.2002, reproduz identicamente tal dispositivo no art. 435: “Reputar-se-á celebrado o contrato no lugar em que foi proposto”. Também o Código Civil brasileiro de 1916, art. 1.086, e o seu correspondente na Lei n. 10.462, de 10.1.2002 – que instituiu o novo estatuto civil -, art. 434, prevê a contratação por correspondência epistolar, ou telegráfica, informando quando se tornam perfeitos. Na legislação anterior já havia a preocupação com os avanços tecnológicos, incorporando ao ordenamento jurídico as novas tendências, que agora encontram-se patentes no novo Código civil, Lei n. 10.462, de 10.1.2002, onde no art. 428, Inciso I, incorpora os outros meios de comunicação semelhantes, porém, não menciona claramente o comércio eletrônico, e suas implicações. Por fim, os problemas que atingem a contratação eletrônica não são totalmente distintos daqueles que cercam a contratação costumeira. Portanto, os meios que proporcionam o direito privado, e mais precisamente o direito geral das obrigações e dos contratos, são suficientes para resolver as principais questões que suscitam os negócios na Internet.75 2.9.4 – Princípio da Boa-Fé Também com base na Lei Modelo da UNCITRAL, em seu art. 3.1, que diz: (...) na interpretação desta Lei, levar-se-ão em consideração a sua origem internacional e a necessidade de promover a uniformidade de sua aplicação e a observância da boa-fé. A boa-fé significa a ausência de vontade de agredir um direito alheio. Ela traz a possibilidade das partes procederem à revisão dos negócios jurídicos, tendo em vista a cláusula rebus sic stantibus e a teoria da onerosidade excessiva, consistindo na possibilidade de ser argüido qualquer espécie dos vícios do consentimento, a aplicação do art. 51 do Código do Consumidor que confere proteção contra cláusulas abusivas, entre outras decorrências do princípio.76 74 CARVALHO, Ana Paula Gambogi. Op. cit., p. 47. LAWAND. Jorge José. Op. cit., p. 48-49. 76 GRINOVER, Ada Pellegrini (et. al.). Código brasileiro de defesa do consumidor. 6ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999, p. 429. 75 Comenta Maria Helena Diniz, que: (...) intimamente ligado não só à interpretação do contrato – pois, segundo ele, o sentido literal da linguagem não deverá prevalecer sobre a intenção inferida da declaração da vontade das partes – mas também ao interesse social de segurança das relações jurídicas, uma vez que as partes deverão agir com lealdade e confiança recíprocas, isto é, proceder com boa fé.77 De acordo com o Código Civil de 1916, o princípio da boa-fé baseia-se no art. 85 que diz: “Nas declarações de vontade se atenderá mais à sua intenção que ao sentido literal da linguagem”. O novo diploma civil, em vigor, mantém a redação anterior (art. 112), não tendo sido alterado o conteúdo da norma já existente. O problema mais relevante quanto à adoção da boa-fé refere-se à segurança que deve ser proporcionada aos contratos celebrados por meio da Internet, o que conseqüentemente, exige a adoção de um sistema de criptografia, de forma a assegurar a integridade para a mensagem de dados seja decodificada somente pelo destinaria que possua a “chave” adequada.78 2.9.5 – Princípio da Autonomia Privada Este princípio trata da ampla liberdade de contratação, fixando livremente as regras aos seus interesses, desde que estejam de acordo com a ordem pública. A ampla liberdade é facultada aos contratantes para que concluam o seu negócio, dentro da diretriz traçada no direito privado moderno, no sentido de que tudo é permitido desde que não prejudique a outros. Estabelece-se o respeito à 77 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 15ª ed. São Paulo: Saraiva, 2000, vol. 3, p. 36. 78 LAWAND, Jorge José. Op. cit., p. 51-52. liberdade de contratar, aos direitos e obrigações dos contratos privados, sem modificar os códigos civis em vigor. Este princípio fundamenta-se na Lei Modelo da UNCITRAL, que em seu art. 4.1, prevê a possibilidade de alteração das relações contratuais, que poderão ser modificadas ao critério dos contratantes, assegurando, desta forma, a liberdade de contratação das pessoas, o que também está disciplinado no art. 1.1. dos Princípios da UNIDROIT para os contratos do comércio internacional, onde está estabelecido que as partes tem liberdade para celebrar um contrato e determinar o seu conteúdo, muito embora, possa haver a interferência do Estado na relação contratual privada.79 O novo Código Civil, Lei n. 10.406, de 10.1.2002, art. 421, traz a previsão expressa do princípio da liberdade contratual aliada a função social do contrato nos seguintes termos: “A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato”. A autonomia da vontade, ou liberdade contratual, assegura que as partes se utilizem dos métodos contratuais constantes do ordenamento jurídico (contratos típicos ou nominados), ou criem uma modalidade de contrato de acordo com suas necessidades (contratos atípicos ou inominados).80 A legislação brasileira, que adota a liberdade de forma, afirma ser lícita qualquer atitude do agente que demonstre de maneira inequívoca a sua manifestação. Somente em alguns casos, o estatuto civil admite a necessidade de alguma atitude, como na prescrição do art.130, pelo qual se estabelece que apenas será 79 80 LAWAND, Jorge José. Op. cit., pp. 52-53. LAWAND, Jorge José. Op. cit., p. 53. decretada a nulidade de um ato jurídico quando a lei determinar a adoção de determinada forma. Também o art. 145, incisos III e IV do codex de 1916, estabelece a nulidade do ato na hipótese deste não estar revestido da forma estabelecida na lei, e quando for deixada de lado qualquer solenidade que a norma considere como primordial par a sua validade. O novo Código Civil, em seu Capítulo V, tratando “da invalidade do negócio jurídico”, traz os casos que implicam no decreto de nulidade de um determinado contrato, como se pode notar a partir do art. 166, incisos I a VII, mantendo os pontos basilares do antigo sistema legal. Pode-se afirmar que os contratos podem ser firmados de modo escrito ou verbal, inclusive, se assim for necessário, na modalidade mímica ou através de gestos, pois, de acordo com nosso Direito, não é a forma escrita a única forma de formação de vínculo contratual.81 2.10 – DA FORMAÇÃO E CONCLUSÃO DOS CONTRATOS ELETRÔNICOS A formação de um contrato envolve necessariamente uma proposta ou oferta e uma aceitação. Proposta é a firme declaração receptícia de vontade dirigida à pessoa com a qual pretende alguém celebrar um contrato, ou ao público. Quem a emite é chamado policitante ou proponente. Aceitação é a aquiescência a uma proposta. Quem a emite é chamado aceitante ou oblato. Conforme já foi explicado, não há disposto legal que proíba a declaração da vontade por meios eletrônicos, sendo assim, a proposta e aceitação realizadas eletronicamente, 81 LAWAND, Jorge José. Op. cit., p. 54. possuem a mesma validade jurídica que as tradicionais. Em relação aos contratos eletrônicos, dentre os tipos de proposta, a mais conhecida é a oferta de produtos e serviços provenientes de sites, a qual, via de regra, é considerada uma oferta permanente ao público, ad incertam personam. Além dessa, existem ofertas realizadas pelo envio de mensagens eletrônicas – declaração receptícia de vontade dirigida à pessoa(s) determinada(s) –, muitas vezes caracterizadas como spams, e os casos em que duas pessoas contratam através de comunicação direta e instantânea, como pode ocorrer, por exemplo, no Internet Relay Chat-IRC. De acordo com o art. 427, do C.C./2002, “a proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso”. Como se vê, a proposta reveste-se de força vinculante, ou seja, não pode o proponente retirá-la de maneira injustificada, sob pena de responder por perdas e danos. No comércio eletrônico deve-se observar rigorosamente esta regra, principalmente na oferta de produtos veiculada por home-pages. É comum, por exemplo, sites comerciais venderem produtos que não mais dispõem em estoque, descumprindo o prazo de entrega. Isto pode ocorrer, quer pela falha do sistema que atualiza o banco de dados de produtos, ou por mera negligência dos responsáveis de páginas – quando não há sistemas pré-programados que informem automaticamente a disponibilidade da compra do produto pelo consumidor – incorrendo o comprador a erro, pois a proposta diverge da real possibilidade de cumprimento. É de extrema importância, nesse sentido, que os sites comerciais prestem todas as informações relevantes ao consumidor (prazo de validade da oferta, qualidade do produto, preço, limite de estoque, modo de pagamento, dentre outros), assegurando assim a efetividade dos negócios firmados. Isto evitará ao ofertante eventuais ações por perdas e danos decorrentes da má contratação e protegerá o consumidor contra ofertas já expiradas ou cuja realização se mostre duvidosa, como acontece nos casos de propaganda enganosa. A oferta contratual que é seria, completa, inequívoca e obrigatória, distingue-se do mero “convite a fazer oferta” (invitatio ad offerendum), que consiste na comunicação não vinculatória por parte de alguém, durante a fase das negociações preliminares, de sua disposição de contratar. Para que a proposta seja válida, deve ela ser formulada em termos que a simples aceitação do destinatário baste à conclusão do contrato. Nos contratos eletrônicos a regra é a mesma. Sugere-se aqui, novamente, que as home-pages que apresentam ofertas na Internet, demonstrem o seu propósito firme de contratar, de modo que o vínculo contratual se constitua com a simples aceitação do pedido. Ou seja, a oferta deve ser clara, formulada em linguagem simples e acessível a todos, de modo que traduza incontestavelmente à vontade do proponente, permitindo o consentimento exato e direto do oblato. O art. 1.081 do C.C./1916 previa os casos da perda de força vinculante da proposta. O novo Código Civil acrescentou a esta sistemática – no inciso primeiro – que se considera também presente a pessoa que contrata por meio de comunicação semelhante ao telefone (art. 428, do C.C./2002), como se observa a seguir. Art. 428. Deixa de ser obrigatória a proposta: I - se, feita sem prazo a pessoa presente, não foi imediatamente aceita. Considera-se também presente a pessoa que contrata por telefone ou por meio de comunicação semelhante; II - se, feita sem prazo a pessoa ausente, tiver decorrido tempo suficiente para chegar a resposta ao conhecimento do proponente; III - se, feita a pessoa ausente, não tiver sido expedida a resposta dentro do prazo dado; IV - se, antes dela, ou simultaneamente, chegar ao conhecimento da outra parte a retratação do proponente. Verificar-se-á no decorrer, o quão substancial foi esta mudança para os contratos eletrônicos, pois põe fim a inférteis discussões acerca da possibilidade ou não de se igualar a contratação por telefone com outros mecanismos de comunicação instantânea, dentre eles os que aqui vamos abordar. A doutrina tradicional criou duas modalidades de formação dos contratos: inter praesentes, aquela em que se formam instantaneamente (oferta x aceitação) e inter absentes, aquela em que há um intervalo entre a oferta e a aceitação. Se fossemos aplicar esta regra aos contratos eletrônicos, em que casos o contrato se daria entre presentes ou entre ausentes? Em princípio, pode-se afirmar as ofertas transmitidas ao oblato por meio de Internet Relay Chat, ou seja, de forma interativa, devem ser consideradas, como no caso de ofertas feitas por telefone, inter praesentes. Contudo, devem ser consideradas inter absentes as ofertas transmitidas ao solicitado por e-mail ou por “clique” em uma homepage, hipóteses em que ocorre um lapso temporal significativo entre a exteriorização da oferta e a sua chegada à esfera de conhecimento do oblato.82 Assim, pode-se afirmar que nos casos de ofertas sem prazo realizadas por meio de IRC, a proposta deixa de ser obrigatória caso ela não seja imediatamente aceita. Sendo assim, tais como nos contratos realizados pessoalmente ou com o uso do telefone, caso oblato se interesse pela proposta, deverá aceitá-la de pronto. Deve-se ressaltar que esse é um entendimento doutrinal, corroborado agora com a inovação trazida pelo Código Civil de 2002, pois considera também presente a pessoa que contrata por meio de comunicação semelhante ao telefone. Entendese que não só o IRC se assemelha ao telefone, mas todos aqueles instrumentos que permitem uma comunicação direta e instantânea, como por exemplo, as videoconferências, que permitem que as partes se vejam e se escutem tal como estivessem frente a frente. Desta forma, para fins de aplicação da regra supra mencionada (art. 428, do C.C./2002), devem-se considerar os contratos eletrônicos firmados via Internet Relay Chat (IRC) como sendo entre presentes, perdendo força vinculante a proposta, caso não seja imediatamente aceita. No caso de uma oferta sem prazo inserida em uma homepage ou transmitida por e-mail (inter absentes), o proponente deverá esperar pela aceitação por um tempo razoável tido como suficiente, para que a resposta do oblato lhe alcance, após ter 82 CARVALHO, Ana Paula Gambogi. Contratos via Internet. Belo Horizonte: Del Rey, 2001. este recebido a oferta, refletido sobre ela e enviado a mensagem com a aceitação (chamado prazo moral). A questão do prazo moral, entretanto, gera algumas polêmicas no âmbito das propostas veiculadas em sites, isto porque, o aceitante que recebe a oferta pela visita no site, toma ciência imediatamente, e, portanto, sua resposta deveria ser formulada no mesmo momento. De acordo com esta idéia, pretende-se igualar as ofertas em sites às contratações entre presentes, ou seja, se estipulado prazo de duração às ofertas nas páginas eletrônicas, considerar-se-iam válidas apenas neste prazo indicado. Já na ausência, dever-se-iam ser aceitas de imediato. Quanto às ofertas transmitidas por e-mail, não há dúvidas de que são diferidas no tempo, haja vista o lapso temporal que medeia a proposta e sua aceitação. Nestes casos, aplicam-se as regras pertinentes à contratação entre ausentes. Ou seja, deixará de ser obrigatória a proposta caso: feita sem prazo, tiver decorrido tempo suficiente para chegar a resposta ao conhecimento do proponente; e, feita com prazo, a resposta não tiver sido expedida nesse tempo. Em relação à conclusão do contrato, esta se dá no momento em que o destinatário de uma proposta, dentro do prazo estipulado, manifesta a sua vontade, aderindo a todos os termos do contrato. Denomina-se este ato como aceitação. Nos contratos eletrônicos, geralmente a conclusão se procede através do envio de um e-mail, informando que está de acordo com a proposta ou então, no caso das propostas em sites, utilizando-se de algum comando eletrônico que esteja disponível, por exemplo, o clicar com o mouse em algum ponto da homepage, destinado à manifestação da vontade de contratar. Tais como nos contratos tradicionais, nos eletrônicos, para que a aceitação tenha força vinculante, ela deverá ser oportuna, ou seja, formulada dentro do prazo concedido na policitação. A aceitação tardia não produz qualquer efeito jurídico, porque a proposta se extingue com o decurso de certo lapso de tempo. Apesar disto, segundo o art. 430 do C.C./2002, se a aceitação for oportuna e chegar a seu destino fora do prazo, por circunstância imprevista, contra a vontade do emitente, o ofertante deverá comunicar o fato ao aceitante se não pretender levar adiante o negócio, sob pena de responder por perdas e danos. Além disso, de acordo com o art. 431 do C.C./2002, se a aceitação for manifestada extemporaneamente, contendo modificações, restrições ou adições, ter-se-á nova proposta ou contraproposta. Se houver, portanto, aceitação modificativa que introduza alterações na oferta, não se terá a conclusão do contrato, pois a resposta do oblato se transforma em proposta ao primitivo ofertante. Por final, o art. 1.079 do Código Civil de 1916 pregava ainda a hipótese de aceitação tácita, nos casos em que a lei não exigisse que fosse expressa. Não há correspondente deste artigo no novo Código Civil, até porque o mero silêncio não representa por si só manifestação de vontade, é necessário que venha acompanhado de outras circunstâncias ou condições que envolvam a vontade contratual no caso concreto, ou seja, apenas um silêncio qualificado equivaleria a uma manifestação de vontade. Ante a necessidade de interação entre uma parte e um sistema ou entre duas pessoas, a aceitação nos contratos eletrônicos será sempre expressa. Entretanto, um exemplo bastante conhecido de dispensa de aceitação expressa por parte do proponente, é aquele em que os provedores de acesso realizam promoções, ofertando através de CD-ROM acesso à Internet grátis por um tempo determinado. Observando o contrato destes provedores, passado este período gratuito e não cancelado o serviço, automaticamente o contrato é concluído e a pessoa se torna assinante. Ressalte-se, todavia, à abusividade destes contratos, pois faz consumidores desatentos aderirem a contratos que muitas vezes não pretendiam firmar. Deveriam estes provedores acrescentar no software que dá acesso à Internet, um mecanismo que informasse ao consumidor quando do término do período grátis, propondo oportunamente a realização do contrato – agora de natureza onerosa e permanente – de serviço de acesso à Internet, concluindo-o de forma legítima. CONCLUSÃO Como visto, no comércio eletrônico, a legislação consumerista já regula certos aspectos, sendo plenamente aplicável. A dificuldade prática que se apresenta é que a contratação de produtos e serviços muitas vezes ultrapassa os limites continentais do País. O consumidor deve tomar as cautelas necessárias, portanto. Se nas vendas presenciais, onde o consumidor dirige-se ao estabelecimento comercial ocorrem problemas (não entrega do produto, atraso na entrega, defeitos, etc.), na internet tais problemas podem não ter solução. De outro lado, os fornecedores que resolverem atuar nesta área, devem ser transparentes quanto ao produto/serviço oferecido, cumprindo a oferta realizada, especialmente a entrega e assistência técnica. A confiabilidade deve ser adquirida dia após dia, através da qualidade, responsabilidade e comprometimento nos serviços oferecidos. A modalidade de contratação eletrônica cresce a cada dia no Brasil, suscitando grandes dúvidas, que aos poucos têm sido resolvidas pelos operadores do direito, mas, ainda assim, será necessário certa dose de legislação, ver Terceira Parte – Anexos (Leis, Decretos e Projetos de Lei) para regular a tão nova modalidade negocial, objetivando conferir maior garantia jurídica às partes contratantes, efetivamente, o princípio da estabilidade da ordem jurídica e social. Porém, enquanto isso não ocorre, por lei própria, cabe aos profissionais do direito a análise minuciosa de todo e qualquer detalhe existente na elaboração de um contrato eletrônico, sempre objetivando os princípios basilares da livre manifestação de vontade da obrigatoriedade do cumprimento dos contratos (“pacta sunt servanda”), conferido integral segurança jurídica às partes contratantes, e, assim, mantendo a ordem jurídica e social, sem qualquer desequilíbrio ou má-fé. A insegurança existente na Internet, quer em razão do anonimato, quer devido à arquitetura da rede, possibilita simulações e fraudes por aventureiros, sendo um empecilho ao desenvolvimento do comércio eletrônico. Com o decorrer do tempo, as empresas sérias e confiáveis da nova economia acabarão se tornando conhecidas e passarão a gozar de boa reputação. As outras, ao contrário, se tornarão perfumaria etérea. O mercado fará sua própria seleção natural. Os fornecedores devem buscar o auxílio de um advogado, para que seus contratos eletrônicos padronizados de adesão estejam em conformidade com o ordenamento jurídico. Por cautela, e a fim de afastar o risco de possíveis discussões acerca da lei aplicável ao contrato eletrônico e do foro competente para julgamento das lides dele resultantes, o fornecedor de produtos e serviços na Internet deve criar obstáculos que inviabilizem a formação dos contratos por aqueles com quem ele não deseja contratar. O consumidor deve amparar-se na opinião de um advogado, para que não tenha que, no futuro, desgastar-se emocionalmente com pendengas judiciais. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AMARAL JR., Alberto do. Comentários ao Código de Proteção do Consumidor. Coordenação de Juarez de Oliveira. São Paulo: Saraiva, 1991. BARBAGALO, Erica Brandini. Contratos eletrônicos. São Paulo: Saraiva, 2001. BEVILÁQUA, Clóvis. Direito das Obrigações, Terceira Edição acrescentada, 1931. CARNELUTTI, Francesco. 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Dispõe sobre o valor probante do documento eletrônico e da assinatura digital, regula a certificação digital, institui normas para as transações de comércio eletrônico e dá outras providêndias. Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos MEDIDA PROVISÓRIA No 2.200-2, DE 24 DE AGOSTO DE 2001. Institui a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira ICP-Brasil, transforma o Instituto Nacional de Tecnologia da Informação em autarquia, e dá outras providências. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 62 da Constituição, adota a seguinte Medida Provisória, com força de lei: Art. 1o Fica instituída a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICPBrasil, para garantir a autenticidade, a integridade e a validade jurídica de documentos em forma eletrônica, das aplicações de suporte e das aplicações habilitadas que utilizem certificados digitais, bem como a realização de transações eletrônicas seguras. Art. 2o A ICP-Brasil, cuja organização será definida em regulamento, será composta por uma autoridade gestora de políticas e pela cadeia de autoridades certificadoras composta pela Autoridade Certificadora Raiz - AC Raiz, pelas Autoridades Certificadoras - AC e pelas Autoridades de Registro - AR. Art. 3o A função de autoridade gestora de políticas será exercida pelo Comitê Gestor da ICP-Brasil, vinculado à Casa Civil da Presidência da República e composto por cinco representantes da sociedade civil, integrantes de setores interessados, designados pelo Presidente da República, e um representante de cada um dos seguintes órgãos, indicados por seus titulares: I - Ministério da Justiça; II - Ministério da Fazenda; III - Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior; IV - Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão; V - Ministério da Ciência e Tecnologia; VI - Casa Civil da Presidência da República; e VII - Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. § 1o A coordenação do Comitê Gestor da ICP-Brasil será exercida pelo representante da Casa Civil da Presidência da República. § 2o Os representantes da sociedade civil serão designados para períodos de dois anos, permitida a recondução. § 3o A participação no Comitê Gestor da ICP-Brasil é de relevante interesse público e não será remunerada. § 4o O Comitê Gestor da ICP-Brasil terá uma Secretaria-Executiva, na forma do regulamento. Art. 4o Compete ao Comitê Gestor da ICP-Brasil: I - adotar as medidas necessárias e coordenar a implantação e o funcionamento da ICP-Brasil; II - estabelecer a política, os critérios e as normas técnicas para o credenciamento das AC, das AR e dos demais prestadores de serviço de suporte à ICP-Brasil, em todos os níveis da cadeia de certificação; III - estabelecer a política de certificação e as regras operacionais da AC Raiz; IV - homologar, auditar e fiscalizar a AC Raiz e os seus prestadores de serviço; V - estabelecer diretrizes e normas técnicas para a formulação de políticas de certificados e regras operacionais das AC e das AR e definir níveis da cadeia de certificação; VI - aprovar políticas de certificados, práticas de certificação e regras operacionais, credenciar e autorizar o funcionamento das AC e das AR, bem como autorizar a AC Raiz a emitir o correspondente certificado; VII - identificar e avaliar as políticas de ICP externas, negociar e aprovar acordos de certificação bilateral, de certificação cruzada, regras de interoperabilidade e outras formas de cooperação internacional, certificar, quando for o caso, sua compatibilidade com a ICP-Brasil, observado o disposto em tratados, acordos ou atos internacionais; e VIII - atualizar, ajustar e revisar os procedimentos e as práticas estabelecidas para a ICP-Brasil, garantir sua compatibilidade e promover a atualização tecnológica do sistema e a sua conformidade com as políticas de segurança. Parágrafo único. O Comitê Gestor poderá delegar atribuições à AC Raiz. Art. 5o À AC Raiz, primeira autoridade da cadeia de certificação, executora das Políticas de Certificados e normas técnicas e operacionais aprovadas pelo Comitê Gestor da ICP-Brasil, compete emitir, expedir, distribuir, revogar e gerenciar os certificados das AC de nível imediatamente subseqüente ao seu, gerenciar a lista de certificados emitidos, revogados e vencidos, e executar atividades de fiscalização e auditoria das AC e das AR e dos prestadores de serviço habilitados na ICP, em conformidade com as diretrizes e normas técnicas estabelecidas pelo Comitê Gestor da ICP-Brasil, e exercer outras atribuições que lhe forem cometidas pela autoridade gestora de políticas. Parágrafo único. É vedado à AC Raiz emitir certificados para o usuário final. Art. 6o Às AC, entidades credenciadas a emitir certificados digitais vinculando pares de chaves criptográficas ao respectivo titular, compete emitir, expedir, distribuir, revogar e gerenciar os certificados, bem como colocar à disposição dos usuários listas de certificados revogados e outras informações pertinentes e manter registro de suas operações. Parágrafo único. O par de chaves criptográficas será gerado sempre pelo próprio titular e sua chave privada de assinatura será de seu exclusivo controle, uso e conhecimento. Art. 7o Às AR, entidades operacionalmente vinculadas a determinada AC, compete identificar e cadastrar usuários na presença destes, encaminhar solicitações de certificados às AC e manter registros de suas operações. Art. 8o Observados os critérios a serem estabelecidos pelo Comitê Gestor da ICP-Brasil, poderão ser credenciados como AC e AR os órgãos e as entidades públicos e as pessoas jurídicas de direito privado. Art. 9o É vedado a qualquer AC certificar nível diverso do imediatamente subseqüente ao seu, exceto nos casos de acordos de certificação lateral ou cruzada, previamente aprovados pelo Comitê Gestor da ICP-Brasil. Art. 10. Consideram-se documentos públicos ou particulares, para todos os fins legais, os documentos eletrônicos de que trata esta Medida Provisória. § 1o As declarações constantes dos documentos em forma eletrônica produzidos com a utilização de processo de certificação disponibilizado pela ICPBrasil presumem-se verdadeiros em relação aos signatários, na forma do art. 131 da Lei no 3.071, de 1o de janeiro de 1916 - Código Civil. § 2o O disposto nesta Medida Provisória não obsta a utilização de outro meio de comprovação da autoria e integridade de documentos em forma eletrônica, inclusive os que utilizem certificados não emitidos pela ICP-Brasil, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento. Art. 11. A utilização de documento eletrônico para fins tributários atenderá, ainda, ao disposto no art. 100 da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional. Art. 12. Fica transformado em autarquia federal, vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia, o Instituto Nacional de Tecnologia da Informação - ITI, com sede e foro no Distrito Federal. Art. 13. O ITI é a Autoridade Certificadora Raiz da Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira. Art. 14. No exercício de suas atribuições, o ITI desempenhará atividade de fiscalização, podendo ainda aplicar sanções e penalidades, na forma da lei. Art. 15. Integrarão a estrutura básica do ITI uma Presidência, uma Diretoria de Tecnologia da Informação, uma Diretoria de Infra-Estrutura de Chaves Públicas e uma Procuradoria-Geral. Parágrafo único. A Diretoria de Tecnologia da Informação poderá ser estabelecida na cidade de Campinas, no Estado de São Paulo. Art. 16. Para a consecução dos seus objetivos, o ITI poderá, na forma da lei, contratar serviços de terceiros. § 1o O Diretor-Presidente do ITI poderá requisitar, para ter exercício exclusivo na Diretoria de Infra-Estrutura de Chaves Públicas, por período não superior a um ano, servidores, civis ou militares, e empregados de órgãos e entidades integrantes da Administração Pública Federal direta ou indireta, quaisquer que sejam as funções a serem exercidas. § 2o Aos requisitados nos termos deste artigo serão assegurados todos os direitos e vantagens a que façam jus no órgão ou na entidade de origem, considerando-se o período de requisição para todos os efeitos da vida funcional, como efetivo exercício no cargo, posto, graduação ou emprego que ocupe no órgão ou na entidade de origem. Art. 17. Fica o Poder Executivo autorizado a transferir para o ITI: I - os acervos técnico e patrimonial, as obrigações e os direitos do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação do Ministério da Ciência e Tecnologia; II - remanejar, transpor, transferir, ou utilizar, as dotações orçamentárias aprovadas na Lei Orçamentária de 2001, consignadas ao Ministério da Ciência e Tecnologia, referentes às atribuições do órgão ora transformado, mantida a mesma classificação orçamentária, expressa por categoria de programação em seu menor nível, observado o disposto no § 2o do art. 3o da Lei no 9.995, de 25 de julho de 2000, assim como o respectivo detalhamento por esfera orçamentária, grupos de despesa, fontes de recursos, modalidades de aplicação e identificadores de uso. Art. 18. Enquanto não for implantada a sua Procuradoria Geral, o ITI será representado em juízo pela Advocacia Geral da União. Art. 19. Ficam convalidados os atos praticados com base na Medida Provisória no 2.200-1, de 27 de julho de 2001. Art. 20. Esta Medida Provisória entra em vigor na data de sua publicação. Brasília, 24 de agosto de 2001; 180o da Independência e 113o da República. FERNANDO HENRIQUE CARDOSO José Gregori Martus Tavares Ronaldo Mota Sardenberg Pedro Parente Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 27.8.2001 SUBSTITUTIVO AO PROJETO DE LEI Nº 4.906, DE 2001 (PLS Nº 672, DE 1999) (APENSADOS OS PROJETOs DE LEI Nº 1.483, DE 1999 E Nº 1.589, DE 1999) Dispõe sobre o valor probante do documento eletrônico e da assinatura digital, regula a certificação digital, institui normas para as transações de comércio eletrônico e dá outras providências. O Congresso Nacional decreta: TÍTULO I DISPOSIÇÕES PRELIMINARES Art. 1º Esta lei dispõe sobre o valor probante do documento eletrônico e da assinatura digital, regula a certificação digital, institui normas para as transações de comércio eletrônico e estabelece sanções administrativas e penais aplicáveis. Art. 2º Para os efeitos desta lei, considera-se: I – documento eletrônico: a informação gerada, enviada, recebida, armazenada ou comunicada por meios eletrônicos, ópticos, opto-eletrônicos ou similares; II – assinatura digital: resultado de um processamento eletrônico de dados, baseado em sistema criptográfico assimétrico, que permite comprovar a autoria e integridade de um documento eletrônico cifrado pelo autor com o uso da chave privada; III – criptografia assimétrica: modalidade de criptografia que utiliza um par de chaves distintas e interdependentes, denominadas chaves pública e privada, de modo que a mensagem codificada por uma das chaves só possa ser decodificada com o uso da outra chave do mesmo par; IV – autoridade certificadora: pessoa jurídica que esteja apta a expedir certificado digital; V – certificado digital: documento eletrônico expedido por autoridade certificadora que atesta a titularidade de uma chave pública; VI – autoridade credenciadora: órgão responsável pela designação de autoridade certificadora raiz e pelo credenciamento voluntário de autoridades certificadoras. Parágrafo único. O Poder Público acompanhará a evolução tecnológica, determinando a aplicação das disposições constantes desta lei para a assinatura digital a outros processos que satisfaçam aos requisitos operacionais e de segurança daquela. TÍTULO II DO DOCUMENTO ELETRÔNICO E DA ASSINATURA DIGITAL Capítulo I – Dos efeitos jurídicos do documento eletrônico e da assinatura digital Art. 3º Não serão negados efeitos jurídicos, validade e eficácia ao documento eletrônico, pelo simples fato de apresentar-se em forma eletrônica. Art. 4º As declarações constantes de documento eletrônico presumem-se verdadeiras em relação ao signatário, nos termos do Código Civil, desde que a assinatura digital: I – seja única e exclusiva para o documento assinado; II – seja passível de verificação pública; III – seja gerada com chave privada cuja titularidade esteja certificada por autoridade certificadora credenciada e seja mantida sob o exclusivo controle do signatário; IV – esteja ligada ao documento eletrônico de tal modo que se o conteúdo deste se alterar, a assinatura digital estará invalidada; V – não tenha sido gerada posteriormente à expiração, revogação ou suspensão das chaves. Art. 5º A titularidade da chave pública poderá ser provada por todos os meios de direito. Parágrafo único. Não será negado valor probante ao documento eletrônico e sua assinatura digital, pelo simples fato desta não se basear em chaves certificadas por uma autoridade certificadora credenciada. Art. 6º Presume-se verdadeira, entre os signatários, a data do documento eletrônico, sendo lícito, porém, a qualquer deles, provar o contrário por todos os meios de direito. § 1º Após expirada ou revogada a chave de algum dos signatários, compete à parte a quem o documento beneficiar a prova de que a assinatura foi gerada anteriormente à expiração ou revogação. § 2º Entre os signatários, para os fins do parágrafo anterior, ou em relação a terceiros, considerar-se-á datado o documento particular na data: I - em que foi registrado; II - da sua apresentação em repartição pública ou em juízo; III - do ato ou fato que estabeleça, de modo certo, a anterioridade da formação do documento e respectivas assinaturas. Art. 7º Aplicam-se ao documento eletrônico as demais disposições legais relativas à prova documental que não colidam com as normas deste Título. Capítulo II - Da falsidade dos documentos eletrônicos Art. 8º O juiz apreciará livremente a fé que deva merecer o documento eletrônico, quando demonstrado ser possível alterá-lo sem invalidar a assinatura, gerar uma assinatura eletrônica idêntica à do titular da chave privada, derivar a chave privada a partir da chave pública, ou pairar razoável dúvida sobre a segurança do sistema criptográfico utilizado para gerar a assinatura. Art. 9º Havendo impugnação de documento eletrônico, incumbe o ônus da prova: I - à parte que produziu a prova documental, quanto à autenticidade da chave pública e quanto à segurança do sistema criptográfico utilizado; II - à parte contrária à que produziu a prova documental, quando alegar apropriação e uso da chave privada por terceiro, ou revogação ou suspensão das chaves. TÍTULO III DOS CERTIFICADOS DIGITAIS Capítulo I - Dos certificados digitais e seus efeitos Art. 10 Os certificados digitais produzirão, entre a autoridade certificadora e o titular do certificado, os efeitos jurídicos definidos no contrato por eles firmado. Parágrafo único. Em relação a terceiros, a certificação produz os efeitos que a autoridade certificadora declarar à praça, se mais benéficos àqueles. Art. 11 Para fazer prova, em juízo, em relação ao titular indicado no certificado, é necessário que, no ato de sua expedição: I – o titular tenha sido pessoalmente identificado pela autoridade certificadora; II - o titular haja reconhecido ser o detentor da chave privada correspondente à chave pública para a qual tenha solicitado o certificado; III – tenham sido arquivados registros físicos comprobatórios dos fatos previstos nos incisos anteriores, assinados pelo titular. Art. 12 Os certificados digitais deverão conter, pelo menos, as seguintes informações: I – número de série; II - identificação e assinatura digital da autoridade certificadora; III –chave pública a que o certificado se refere e identificação do seu titular; IV – data de emissão e prazo de validade; V – nome do titular e poder de representação de quem solicitou a certificação, no caso do titular ser pessoa jurídica; VI – elementos que permitam identificar os sistemas de criptografia utilizados pela autoridade certificadora e pelo titular. Parágrafo único. A regulamentação desta lei poderá determinar a inclusão de informações adicionais no certificado digital, em respeito a requisitos específicos conforme a finalidade do certificado. Art. 13 São obrigações do titular do certificado digital: I – fornecer as informações solicitadas pela autoridade certificadora, observado o inciso VII do art. 18; II – guardar sigilo, manter controle e fazer uso exclusivo de sua chave privada; III – manifestar sua concordância expressa com os dados constantes do certificado digital; IV – solicitar a revogação dos certificados nos casos de quebra ou suspeita de quebra de confidencialidade ou comprometimento da segurança de sua chave privada. § 1º O titular do certificado digital será civilmente responsável pela falsidade das informações fornecidas à autoridade certificadora, sem prejuízo das sanções penais aplicáveis, bem como pelo descumprimento das obrigações previstas no caput deste artigo. § 2º Exclui-se a responsabilidade do titular do certificado, decorrente do inciso II do caput deste artigo, quando o uso da assinatura digital lhe for imposto ou os meios a ele fornecidos para a criação das chaves não ofereçam garantias de auditabilidade e controle do risco. Capítulo II – Da suspensão e revogação de certificados digitais. Art. 14 A autoridade certificadora suspenderá temporariamente o certificado digital: I – a pedido por escrito do titular, devidamente identificado para o evento, ou de seu representante legal; II – quando existam fundadas razões para crer que: a. o certificado foi emitido com base em informações errôneas ou falsas; b. as informações nele contidas deixaram de ser condizentes com a realidade; ou c. a confidencialidade da chave privada foi violada. Parágrafo único. A suspensão do certificado digital com fundamento no inciso II deste artigo será sempre motivada e comunicada prontamente ao titular, bem como imediatamente inscrita no registro do certificado. Art. 15 A autoridade certificadora deverá revogar um certificado digital: I - a pedido por escrito do titular, devidamente identificado para o evento, ou de seu representante legal; II – de ofício ou por determinação do Poder Judiciário, caso se verifique que o certificado foi expedido com base em informações falsas; III – de ofício, se comprovadas as razões que fundamentaram a suspensão prevista no inciso II do art. 14; IV – tratando-se de autoridade certificadora credenciada, por determinação da autoridade credenciadora, na forma prevista na regulamentação desta lei; V – se a autoridade certificadora vier a encerrar suas atividades, nos termos do § 1º do art. 20 desta lei; VII – por falecimento ou interdição do titular do certificado, se pessoa física, ou no caso de falência ou dissolução de sociedade, se pessoa jurídica. TÍTULO IV DAS AUTORIDADES CERTIFICADORAS Capítulo I – Dos princípios gerais Art. 16 A atividade de certificação digital será regida pelos seguintes princípios: I - liberdade de contratação, observadas as normas de defesa do consumidor; II - preservação da privacidade do usuário; III - dispensa de autorização prévia; IV - direito do usuário a ser adequadamente informado sobre o funcionamento dos sistemas criptográficos utilizados e os procedimentos técnicos necessários para armazenar e utilizar com segurança a chave privada; V - vedação à exigência de depósito de chaves privadas pela autoridade certificadora. Art. 17 Poderão ser autoridades certificadoras as pessoas jurídicas de direito público ou privado, constituídas sob as leis brasileiras e com sede e foro no País. Parágrafo único. O funcionamento de autoridade certificadora independe do credenciamento previsto no art. 21 desta lei, sendo obrigatória apenas a comunicação, ao Poder Público, do início das atividades. Capítulo II – Dos deveres e responsabilidades das autoridades certificadoras Art. 18 As autoridades certificadoras deverão: I – emitir certificados conforme o solicitado ou acordado com o titular das chaves criptográficas; II – implementar sistemas de segurança adequados à criação, emissão e arquivamento de certificados digitais; III – implementar sistemas de proteção adequados para impedir o uso indevido da informação fornecida pelo requerente de certificado digital; IV – operar sistema de suspensão e revogação de certificados, procedendo à imediata publicação nas hipóteses previstas nesta lei; V – tornar disponível, em tempo real e mediante acesso eletrônico remoto, lista de certificados emitidos, suspensos e revogados; VI – manter quadro técnico qualificado; VII - solicitar do requerente de certificado digital somente as informações necessárias para sua identificação e emissão do certificado; VIII – manter confidencialidade sobre todas as informações obtidas do titular que não constem do certificado; IX – exercer as atividades de emissão, suspensão e revogação de certificados dentro dos limites do território brasileiro. § 1º Os dados pessoais não serão usados para outra finalidade que não a de certificação, salvo se consentido expressamente pelo requerente, por cláusula em destaque, que não esteja vinculada à realização da certificação. § 2º A quebra da confidencialidade das informações de que trata o inciso VIII do caput deste artigo, quando determinada pelo Poder Judiciário, respeitará os mesmos procedimentos previstos em lei para a quebra do sigilo bancário. Art. 19 A autoridade certificadora é responsável civilmente pelos danos sofridos pelo titular do certificado e por terceiros, decorrentes da falsidade dos certificados por ela emitidos ou do descumprimento das obrigações previstas no art. 18. Art. 20 O registro de certificado expedido por uma autoridade certificadora deve ser por ela conservado até o término do prazo exigido pela lei que regular o negócio jurídico associado ao certificado, não inferior, em qualquer caso, a vinte anos. § 1º No caso de pretender cessar voluntariamente a sua atividade ou tiver a falência decretada, a autoridade certificadora deverá providenciar a revogação dos certificados por ela emitidos, comunicando o fato, em até trinta dias, aos titulares e à autoridade credenciadora. § 2º No caso de revogação, referida no § 1º deste artigo, dos certificados emitidos por autoridade certificadora credenciada, a guarda da respectiva documentação será de responsabilidade da autoridade credenciadora. Capítulo III – Do credenciamento voluntário Art. 21 Poderão ser credenciadas pela autoridade competente, mediante requerimento, as autoridades certificadoras que preencham os seguintes requisitos, conforme a regulamentação desta lei: I - capacitação técnica para prestar os serviços de certificação, nos termos definidos nesta lei; II – recursos de segurança física e lógica compatíveis com a atividade de certificação; III - capacidade patrimonial adequada à atividade de certificação, ou manutenção de contrato de seguro suficiente para cobertura da responsabilidade civil decorrente da atividade de certificação; IV - integridade e independência no exercício da atividade de certificação; V – garantia da qualidade das informações transmitidas aos requerentes, quanto ao uso e procedimentos de segurança dos sistemas utilizados; VI – submeter-se ao cumprimento das diretrizes, normas técnicas e práticas operacionais instituídas pela autoridade credenciadora. § 1º O credenciamento da autoridade certificadora importa na emissão do respectivo certificado pela autoridade certificadora raiz ou autoridade a esta vinculada. § 2º A autoridade certificadora raiz, primeira autoridade da cadeia de certificação, terá suas atribuições definidas na regulamentação desta lei, sendo-lhe vedada a emissão de certificados para o usuário final. § 3º A autoridade credenciadora procederá, a título provisório, ao credenciamento de autoridades certificadoras sem a emissão do certificado de que trata o § 1º deste artigo, até que a autoridade certificadora raiz tenha comprovadamente inserido seu certificado raiz nos programas de computador, máquinas e equipamentos de acesso à Internet, de modo a preservar a interoperabilidade dos certificados emitidos pelas autoridades certificadoras credenciadas. Art. 22 Às autoridades certificadoras credenciadas será atribuído um sinal gráfico, atestando que atendem aos requisitos previstos no art. 21. Parágrafo único. O credenciamento permitirá à autoridade certificadora utilizar, com exclusividade, o sinal previsto no caput deste artigo, bem como a designação de "autoridade certificadora credenciada". Art. 23 O credenciamento será revogado, sem prejuízo de outras sanções aplicáveis na forma desta lei, nos casos em que: I – for obtido por meio de declaração falsa ou expediente ilícito; II – deixar de se verificar algum dos requisitos previstos no art. 21; III – deixar a autoridade certificadora de exercer suas atividades por período superior a doze meses; IV – ocorrerem irregularidades insanáveis na administração, organização ou no exercício das atividades da autoridade certificadora; V – forem praticados atos ilícitos ou que coloquem em perigo a confiança do público na certificação. § 1º A revogação compete à autoridade credenciadora, em decisão fundamentada, devendo a autoridade certificadora ser notificada no prazo de sete dias úteis. § 2º A autoridade credenciadora dará ampla publicidade à decisão. Art. 24 Lei disporá sobre a criação de autoridade credenciadora, a quem caberá designar autoridade certificadora raiz, credenciar e proceder à fiscalização das autoridades certificadoras credenciadas, bem como executar atividades correlatas. TÍTULO V DO COMÉRCIO ELETRÔNICO Capítulo I – Da contratação no âmbito do comércio eletrônico Art. 25 A oferta de bens, serviços e informações não está sujeita a qualquer tipo de autorização prévia pelo simples fato de ser realizada por meio eletrônico. Art. 26 Sem prejuízo das disposições do Código Civil, a manifestação de vontade das partes contratantes, nos contratos celebrados por meio eletrônico, dar-se-á no momento em que o destinatário da oferta enviar documento eletrônico manifestando, de forma inequívoca, a sua aceitação das condições ofertadas. § 1º A proposta de contrato por meio eletrônico obriga o proponente quando enviada por ele próprio ou por sistema de informação por ele programado para operar automaticamente. § 2º A manifestação de vontade a que se refere o caput deste artigo será processada mediante troca de documentos eletrônicos, observado o disposto nos arts. 27 a 29 desta lei. Art. 27 O documento eletrônico considera-se enviado pelo remetente e recebido pelo destinatário se for transmitido para o endereço eletrônico definido por acordo das partes e neste for recebido. Art. 28 A expedição do documento eletrônico equivale: I – à remessa por via postal registrada, se assinado de acordo com os requisitos desta lei, por meio que assegure sua efetiva recepção; e II - à remessa por via postal registrada e com aviso de recebimento, se a recepção for comprovada por mensagem de confirmação dirigida ao remetente e por este recebida. Art. 29 Para os fins do comércio eletrônico, a fatura, a duplicata e demais documentos comerciais, quando emitidos eletronicamente, obedecerão ao disposto na legislação comercial vigente. Capítulo II - Da proteção e defesa do consumidor no âmbito do comércio eletrônico Art. 30 Aplicam-se ao comércio eletrônico as normas de defesa e proteção do consumidor vigentes no País. Art. 31 A oferta de bens, serviços ou informações por meio eletrônico deve ser realizada em ambiente seguro, devidamente certificado, e deve conter claras e inequívocas informações sobre: I – nome ou razão social do ofertante; II – número de inscrição do ofertante no respectivo cadastro geral do Ministério da Fazenda e, em se tratando de serviço sujeito a regime de profissão regulamentada, o número de inscrição no órgão fiscalizador ou regulamentador; III – domicílio ou sede do ofertante; IV – identificação e sede do provedor de serviços de armazenamento de dados; V – número de telefone e endereço eletrônico para contato com o ofertante, bem como instruções precisas para o exercício do direito de arrependimento; VI – tratamento e armazenamento, pelo ofertante, do contrato ou das informações fornecidas pelo destinatário da oferta; VII – instruções para arquivamento do contrato eletrônico pelo aceitante, bem como para sua recuperação em caso de necessidade; e VIII – sistemas de segurança empregados na operação. Art. 32 Para o cumprimento dos procedimentos e prazos previstos na legislação de proteção e defesa do consumidor, os adquirentes de bens, serviços e informações por meio eletrônico poderão se utilizar da mesma via de comunicação adotada na contratação para efetivar notificações e intimações extra-judiciais. § 1º Para os fins do disposto no caput deste artigo, os ofertantes deverão, no próprio espaço que serviu para o oferecimento de bens, serviços e informações, colocar à disposição dos consumidores área específica, de fácil identificação, que permita o armazenamento das notificações ou intimações, com a respectiva data de envio, para efeito de comprovação. § 2º O ofertante deverá transmitir uma resposta automática aos pedidos, mensagens, notificações e intimações que lhe forem enviados eletronicamente, comprovando o recebimento. Capítulo III – Da solicitação e uso das informações privadas Art. 33 O ofertante somente poderá solicitar do consumidor informações de caráter privado necessárias à efetivação do negócio oferecido, devendo mantê-las em sigilo, salvo se prévia e expressamente autorizado pelo respectivo titular a divulgá-las ou cedê-las. § 1º A autorização de que trata o caput deste artigo constará em destaque, não podendo estar vinculada à aceitação do negócio. § 2º Sem prejuízo de sanção penal, responde por perdas e danos o ofertante que solicitar, divulgar ou ceder informações em violação ao disposto neste artigo. Capítulo IV – Das obrigações e responsabilidades dos provedores Art. 34 Os provedores de acesso que assegurem a troca de documentos eletrônicos não podem tomar conhecimento de seu conteúdo, nem duplicá-los por qualquer meio ou ceder a terceiros qualquer informação, ainda que resumida ou por extrato, sobre a existência ou sobre o conteúdo desses documentos, salvo por indicação expressa do seu remetente. § 1º Igual sigilo recai sobre as informações que não se destinem ao conhecimento público armazenadas no provedor de serviços de armazenamento de dados. § 2º Somente mediante ordem do Poder Judiciário poderá o provedor dar acesso às informações acima referidas, sendo que as mesmas deverão ser mantidas, pelo respectivo juízo, em segredo de justiça. Art. 35 O provedor que forneça serviços de conexão ou de transmissão de informações, ao ofertante ou ao adquirente, não será responsável pelo conteúdo das informações transmitidas. Art. 36 O provedor que forneça ao ofertante serviço de armazenamento de arquivos e sistemas necessários para operacionalizar a oferta eletrônica de bens, serviços ou informações não será responsável pelo seu conteúdo, salvo, em ação regressiva do ofertante, se: I – deixou de atualizar as informações objeto da oferta, tendo o ofertante tomado as medidas adequadas para efetivar as atualizações, conforme instruções do próprio provedor; ou II – deixou de arquivar as informações ou, tendo-as arquivado, foram elas destruídas ou modificadas, tendo o ofertante tomado as medidas adequadas para seu arquivamento, segundo parâmetros estabelecidos pelo provedor. Art. 37 O provedor que forneça serviços de conexão ou de transmissão de informações, ao ofertante ou ao adquirente, não será obrigado a vigiar ou fiscalizar o conteúdo das informações transmitidas. Art. 38 Responde civilmente por perdas e danos, e penalmente por co-autoria do delito praticado, o provedor de serviço de armazenamento de arquivos que, tendo conhecimento inequívoco de que a oferta de bens, serviços ou informações constitui crime ou contravenção penal, deixar de promover sua imediata suspensão ou interrupção de acesso por destinatários, competindo-lhe notificar, eletronicamente ou não, o ofertante, da medida adotada. TÍTULO VI DAS SANÇÕES ADMINISTRATIVAS Art. 39 As infrações às normas estabelecidas nos Títulos II, III e IV desta lei, independente das sanções de natureza penal e reparação de danos que causarem, sujeitam a autoridade infratora à penalidade de multa de dez mil reais a um milhão de reais cominada, no caso de autoridade credenciada, à suspensão de credenciamento ou à sua revogação. § 1º As sanções estabelecidas neste artigo serão aplicadas pela autoridade credenciadora, considerando-se a gravidade da infração, vantagem auferida, capacidade econômica, e eventual reincidência. § 2º A pena de suspensão poderá ser imposta por medida cautelar antecedente ou incidente de procedimento administrativo. Título VII Das SANÇÕES PENAIS Art. 40 A quebra de sigilo das informações de que trata o inciso VIIII do art. 18 e os arts. 33 e 34 desta lei constitui crime e sujeita os responsáveis à pena de reclusão, de um a quatro anos. Art. 41 Equipara-se ao crime de falsificação de papéis públicos, sujeitando-se às penas do art. 293 do Código Penal, a falsificação, com fabricação ou alteração, de certificado digital de ente público. Parágrafo único. Incorre na mesma pena de crime de falsificação de papéis públicos quem utilizar certificado digital público falsificado. Art. 42 Equipara-se ao crime de falsificação de documento público, sujeitando-se às penas previstas no art. 297 do Código Penal, a falsificação, no todo ou em parte, de documento eletrônico público, ou a alteração de documento eletrônico público verdadeiro. Parágrafo único. Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, aplica-se o disposto no § 1º do art. 297 do Código Penal. Art. 43 Equipara-se ao crime de falsidade de documento particular, sujeitando-se às penas do art. 298 do Código Penal, a falsificação, no todo ou em parte, de certificado ou documento eletrônico particular, ou alteração de certificado ou documento eletrônico particular verdadeiro. Art. 44 Equipara-se ao crime de falsidade ideológica, sujeitando-se às penas do art. 299 do Código Penal, a omissão, em documento ou certificado eletrônico público ou particular, de declaração que dele devia constar, ou a inserção ou fazer com que se efetue inserção, de declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante. Parágrafo único. Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, aplica-se o disposto no parágrafo único do art. 299 do Código Penal. Art. 45 Equipara-se ao crime de supressão de documento, sujeitando-se às penas do art. 305 do Código Penal, a destruição, supressão ou ocultação, em benefício próprio ou de outrem, de documento eletrônico público ou particular verdadeiro, de que não se poderia dispor. Art. 46 Equipara-se ao crime de extravio, sonegação ou inutilização de documento, sujeitando-se às penas previstas no art. 314 do Código Penal, o extravio de qualquer documento eletrônico, de que se tem a guarda em razão do cargo, ou sua sonegação ou inutilização, total ou parcial. Título VIII DAS DISPOSIÇÕES GERAIS Art. 47 As certificações estrangeiras de assinaturas digitais terão o mesmo valor jurídico das expedidas no País, desde que a autoridade certificadora esteja sediada e seja devidamente reconhecida em país signatário de acordos internacionais relativos ao reconhecimento jurídico daqueles certificados, dos quais seja parte o Brasil. Art. 48 Para a solução de litígios de matérias objeto desta lei poderá ser empregado sistema de arbitragem, obedecidos os parâmetros da Lei n° 9.037, de 23 de setembro de 1996, dispensada a obrigação decretada no § 2° de seu art. 4°, devendo, entretanto, efetivar-se destacadamente a contratação eletrônica da cláusula compromissória. Título IX DISPOSIÇÕES FINAIS Art. 49 O Poder Executivo regulamentará a presente lei no prazo de noventa dias. Art. 50 Esta lei entra em vigor na data de sua publicação. Sala da Comissão, em 26 de setembro de 2001. Deputado JULIO SEMEGHINI Relator