X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 UMA CONSTRUÇÃO POSSÍVEL: TÚNEL USANDO GEOMETRIA Ana Paula Silva Universidade Federal de Uberlândia [email protected] Kelen Cristina Pereira de Sousa Universidade Federal de Uberlândia [email protected] Resumo: O presente trabalho tem por finalidade desvendar como Eupalinos (matemático ou engenheiro) utilizou os conhecimentos matemáticos relacionados à Geometria, pelo menos no que se refere à proporcionalidade entre dois triângulos retângulos. Destacamos que o túnel foi construído para atender a necessidade de uma região que facilitaria o fornecimento de água. Assim pretendemos mostrar os procedimentos utilizados por Eupalinos a fim de ser uma proposta metodológica para ser desenvolvida em sala de aula como estimulo nas aulas de matemática. Palavras-chave: Modelagem Matemática; História da Matemática; Geometria Plana. UM POUCO DA HISTÓRIA Por volta do século VI a.C, a ilha de Samos, na Grécia, enfrentava um problema em relação ao abastecimento de água na cidade. Foi então sugerido a abertura de um túnel pelo Monte Castro, a fim de levar água até Pitagorein, capital da ilha. O exemplo de Eupalinos merece ser conhecido pelos leitores da Revista do Professor de Matemática por dois motivos: fornece um tópico interessante para ilustrar nossas aulas e mostra como o conhecimento matemático, mesmo quando de natureza teórica, pode ter influência decisiva no progresso tecnológico. (ROSA, p.52) Como a construção do túnel seria demorada, procurava-se um modo de construí-lo em menos tempo. Mas havia outro problema: escolher a melhor entrada (ponto A) e a mais conveniente saída (ponto B) do túnel, porém não sabiam como achar um modo de sair de A e cavando, chegar em B sem se perder no caminho. Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Pôster 1 X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 Neste dilema surge Eupalinos, que surpreende a todos com uma solução simples e prática. Ele anunciou que reduziria o tempo de trabalho à metade propondo que se iniciasse a obra em duas frentes, começando a cavar simultaneamente nos pontos A e B, encontrando-se as duas turmas no meio do túnel. O túnel tem um quilômetro de extensão, sua secção transversal é um quadrado com dois metros de lado, com uma vala funda para os canos de água e aberturas no teto para renovação do ar e limpeza de detritos. O objetivo do trabalho é resolver a seguinte indagação: Como Eupalinos conseguiu construir o túnel sem nenhum instrumento óptico? Mostraremos a seguir os métodos utilizados. OS PROCEDIMENTOS COMEÇAM COM A SEGUINTE INDAGAÇÃO: COMO CONSTRUIR O TÚNEL? Suponhamos o contorno abaixo como sendo à base da montanha. Sabemos quem são os pontos A e B, pois já foram escolhidos como ponto de entrada e ponto de saída respectivamente. Desenhamos então o triângulo retângulo AKB de forma que AB seja a hipotenusa. Em seguida, para determinarmos as medidas dos lados de AKB, vamos traçar uma poligonal BCDEFGHA da seguinte forma: partindo de B toma-se uma direção, em linha reta, até o ponto C, depois saindo de C segue-se em direção ao ponto D de modo que cada lado forme um ângulo de 90° com o lado anterior. Seguindo este procedimento, completa-se então a poligonal lembrando que esses pontos devem ser escolhidos de forma a evitar as áreas mais inclinadas da montanha. Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Pôster 2 X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 Figura 1: Traço da poligonal Medem-se os lados da poligonal. Assim é possível calcular os lados dos catetos AK e KB da seguinte maneira: AK = DE + FG – BC – AH KB = DC – EF – GH Calcula-se então a razão entre os catetos do triângulo AKB: r= AK KB Vamos agora, a partir dos pontos A e B, construir dois triângulos retângulos, como nos mostra a figura abaixo: Figura 2: Construção dos triângulos retângulos O teorema usado nesta construção foi o seguinte: Se dois triângulos retângulos têm catetos proporcionais então seus ângulos agudos são iguais. Com isso, conclui-se que construindo esses dois novos triângulos retângulos a partir dos pontos A e B, e considerando a razão r, podemos afirmar que as três hipotenusas estão alinhadas. Esses triângulos devem ser construídos satisfazendo o seguinte critério: a razão entre os catetos de cada novo triângulo retângulo construído deve ser igual a razão entre os catetos do triângulo AKB. Ou seja, Figura 3: Razão das medidas dos catetos Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Pôster 3 X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 Assim, a escavação do túnel começaria, a partir dos pontos A e B, nas direções das hipotenusas dos dois novos triângulos. Entretanto, neste caso, tem-se outro problema: os pontos marcados A e B não estão no mesmo nível. Na construção do túnel de Eupalinos, é necessário que B esteja a um nível mais baixo que A, pois é o ponto de saída da água. Para resolver esse problema deve-se descobrir a diferença de nível existente entre A e B, a qual pode ser calculada da seguinte maneira: a medida que se percorre a poligonal BCDEFGHA, marca-se a diferença de nível entre cada vértice e o seguinte. Figura 4: Ilustração das diferenças de nível Dessa maneira a diferença de nível entre os pontos A e B será dada por: dAB= dbc+dcd+dde+ def+dfg+dgh+dha Temos o triângulo AMB abaixo, onde AM = dAB e AB= x (calcula-se o valor de x utilizando o Teorema de Pitágoras no triângulo AKB formado no início do problema). Nesse triângulo AMB, a razão AM/AB = s mostra como se deve controlar a inclinação da escavação: cada vez que cavarmos uma unidade de comprimento ao longo do túnel, o nível deve baixar s unidades. Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Pôster 4 X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 Figura 5: Triângulo que auxilia para controlar a inclinação Assim, após fazermos esse cálculos basta iniciar a escavação do túnel. ALGUMAS OBSERVAÇÕES A CERCA DO TÚNEL DE EUPALINOS É importante destacar que esse raciocínio foi posto em prática e funcionou. Um fato curioso que ocorreu foi que as duas extremidades não se encontraram no mesmo ponto, houve um erro de aproximadamente 9 metros na horizontal e 3 metros na vertical. Porém, este erro torna-se insignificante devido à extensão do túnel. Esses erros servem para comprovar que o túnel foi, realmente, cavado em duas frentes. Além disso, o erro na vertical esta ligado ao cuidado dos construtores em não deixar as pontas se encontrarem com a saída mais alta do que a entrada. O túnel, considerado perdido, foi redescoberto em 1882 por arqueólogos alemães, relativamente em bom estado de conservação. Suas características principais: tem pouco mais de 1 km de comprimento, secção transversal de um quadrado com 2 metros de lado, apresentando uma vala funda para os canos da água, bem como aberturas no teto para renovação de ar. Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Pôster 5 X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 Figura 6: Foto do interior do túnel O exemplo de Eupalinos nos mostra como o conhecimento matemático pode ter influência decisiva no progresso tecnológico. ENCERRANDO COM UMA PERGUNTA Neste momento cabe a seguinte pergunta: Eupalinos deixou algo escrito para comprovar suas idéias? A resposta para tal pergunta é: NÃO. Temos o prazer de saber desses conhecimentos usados por Eupalinos através do Heron de Alexandria que publicou alguns textos mencionando o fato. De acordo com o que foi apresentado nos procedimentos de construção do túnel, acreditamos que algumas curiosidades tratadas assim em sala de aula podem ajudar os professores em suas práticas pedagógicas. Em relação a isso, Pais (2001, p. 28) faz a seguinte observação: A educação escolar deve se iniciar pela vivência do aluno, mas isso não significa que ela deva ser reduzida ao saber cotidiano. No caso da matemática, consiste em partir do conhecimento dos números, das medidas e da geometria, contextualizados em situações próximas do aluno. O desafio didático consiste em Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Pôster 6 X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 estruturar condições para que ocorra uma evolução desta situação inicial rumo aos conceitos previstos. Acreditamos que mostrar para os alunos o quanto é importante a matemática e que tal ciência pode ser aplicada em suas práticas corriqueiras contribui para a melhor compreensão da mesma. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS PAIS, L. C. Didática da matemática: uma análise da influência francesa. Belo Horizonte: Autêntica, 2001. ROSA, E. Geometria, cap. 3 Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/EnsMed/expensmat_icap3.pdf Acesso em 19 de fevereiro de 2010. TROTA, F. , et.al, Matemática Aplicada V.1. São Paulo; Moderna,1979. Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Pôster 7