PROPRIEDADES FÍSICO-QUÍMICAS E OS
SENTIDOS
OBJETIVOS
Os objetivos desta aula são:
•
estudar as interações intermoleculares;
•
avaliar o efeito dessas interações sobre as propriedades
físico-químicas dos compostos orgânicos;
•
analisar as relações entre propriedades físico-químicas e as
propriedades organolépticas dos compostos orgânicos;
•
propor temas interdisciplinares a serem desenvolvidos.
PROPRIEDADES FISICO-QUÍMICAS E OS SENTIDOS
DO PALADAR E DO OLFATO
Os sentidos do paladar e do olfato, como você viu, são sentidos
químicos, ou seja, dependem da interação de moléculas com receptores
neuronais específicos. Dessa forma, as sensações obtidas por esses sentidos
são fortemente dependentes das estruturas e das propriedades físicoquímicas das moléculas que irão ativá-los.
Em relação ao olfato, a principal propriedade físico-química a ser
estudada é a volatilidade dos componentes do objeto que está sendo
cheirado. Essa propriedade está diretamente relacionada às interações
entre as moléculas dessas substâncias, de forma a permitir a passagem do
estado líquido
ou do estado sólido para a fase gasosa (evaporação e
sublimação, respectivamente) e ser carreado pelo ar até os bulbos olfativos
no interior do nariz.
http://www.flickr.com/photos/oldonliner/436326382/
http://www.flickr.com/photos/slice/464646935/
Evaporação
Sublimação
No
sentido
do
paladar,
a
principal
propriedade
físico-química
envolvida é a solubilidade em água, que representa a capacidade das
moléculas de uma substância de formar interações com moléculas de água
(interações soluto-solvente) às custas das interações entre as moléculas
dessa mesma substância (interações soluto-soluto) e entre moléculas do
solvente.
Assim, para compreender como certas moléculas conseguem ativar
esses sentidos e outras não, é preciso compreender essas interações
intermoleculares. As mais importantes – e que iremos discutir aqui – podem
ser enquadradas em três categorias:
1. Ligações hidrogênio
2. Interações dipolo-dipolo
3. Forças de van der Waals
Outras interações menos discutidas são variações das interações do
tipo dipolo-dipolo, como a íon-dipolo e os complexos de transferência de
carga, também chamados de interações do tipo π-stacking (a tradução
literal seria empilhamento de sistemas π), em que um anel aromático,
normalmente ligado a um grupo eletrodeficiente (R2), funciona como dipolo
positivo, e então forma uma interação dipolo-dipolo com outro anel
aromático ligado a um grupo doador de elétrons (R1), porém de alta
densidade eletrônica e que atua como dipolo negativo. Esse tipo de
interação é muito importante no meio biológico, pois possibilita a interação
entre os anéis aromáticos presentes nas estruturas de diversos fármacos e
os anéis aromáticos de resíduos de aminoácidos como a tirosina e o
triptofano.
R2
δ−
δ+
R1
INTERAÇÕES INTERMOLECULARES
Vamos agora olhar com mais detalhes as interações intermoleculares.
As ligações de hidrogênio (também chamadas ligações hidrogênio)
são interações intermoleculares que ocorrem entre um átomo de hidrogênio
com baixa densidade eletrônica em uma molécula e um átomo de alta
densidade eletrônica em outra molécula.
Doador de H
Aceptor de elétrons
δ−
δ−
X H
δ+
Y
Doador de elétrons
Aceptor de H
As ligações de hidrogênio mais fortes são aquelas em que X e Y são
átomos de alta eletronegatividade, como flúor, oxigênio e nitrogênio (o
tradicional FON dos livros de Química), mas outros átomos podem
participar, como enxofre, cloro e até mesmo carbono, desde que outros
átomos ligados a este promovam um acentuado momento de dipolo,
gerando uma forte redução da densidade eletrônica do hidrogênio, como
ocorre, por exemplo, no clorofórmio. Este trihalometano pode interagir com
outras moléculas orgânicas, como a acetona e a piridina, através desse tipo
de interação.
δ+
H
N
d-
Cl
Cl
δ−
Cl
Além de ocorrer entre moléculas, também podem existir ligações de
hidrogênio intramoleculares, sendo mais comuns quando ocorre a formação
de um anel de 5 ou de 6 membros:
O H
N
F
H
N
H
Por sua vez, as interações dipolo-dipolo ocorrem entre dipolos
de menor intensidade que aqueles envolvidos na ligação de hidrogênio,
como ocorre, por exemplo, entre moléculas de acetona.
δ−
δ+
O
δ+
O
δ−
Por último, as forças ou interações de van der Waals ocorrem entre
dipolos muito fracos, como aqueles que existem em cadeias hidrocarbônicas
e que são gerados pelo próprio movimento das nuvens eletrônicas. Esses
dipolos
podem
ser
permanentes
ou
induzidos,
como
quando
aproximação de um átomo polar a uma cadeia hidrocarbônica.
há
a
δ− δ+
δ− δ+
δ+ δ−
δ+ δ−
δ−
-
-
δ+
δ−
As interações de van der Waals, assim como as ligações de
hidrogênio, são na verdade casos especiais de interações dipolo-dipolo.
Enquanto as primeiras são interações dipolo-dipolo muito fracas, estas
últimas são muito fortes, o que lhes confere esses nomes especiais.
Entretanto, embora as interações de van der Waals sejam isoladamente
fracas, quando temos uma cadeia hidrocarbônica longa ocorre a formação
de diversas interações deste tipo, e o somatório da energia associada a
cada uma delas pode sobrepujar até mesmo uma interação do tipo ligação
de hidrogênio.
Observe, no quadro a seguir, a comparação das energias associadas
a cada tipo dessas interações intermoleculares e compare a ligação
covalente.
Tipo de ligação
Energia (kJ/mol)
Ligação de hidrogênio
10-40
Dipolo-dipolo
0,1-10
van der Waals
0,1-2,0
Ligação covalente
> 100
Como você pode ver, todas essas interações intermoleculares são
mais fracas que as ligações covalentes. O somatório dessas interações
intermoleculares define o grau de coesão intermolecular de uma substância,
e, assim, define a energia necessária para separar as interações, como
ocorre nas mudanças de estado físico e na solubilização em água. Quanto
mais forte e maior o número dessas interações, mais difícil será afastar as
moléculas e promover a fusão, a evaporação e a solubilização. Veja em
seguida esses processos em detalhes.
PROPRIEDADES FISICO-QUÍMICAS: PONTO DE
FUSÃO E PONTO DE EBULIÇÃO
Observe a tabela a seguir.
O
Estrutura
OH
Nome
n-Pentano
Butanona
1-Butanol
Peso
72
72
74
36
80
116
molecular
(u.m.a.)
PE (oC)
Nesta série de três compostos com pesos moleculares muito
próximos, observamos um aumento de ponto de ebulição na seguinte
seqüência: hidrocarboneto < cetona < álcool. Isso ocorre devido à força das
interações intermoleculares: nos hidrocarbonetos, temos apenas forças de
van der Waals atuando, enquanto a coesão entre as moléculas de butanona
é determinada por interações dipolo-dipolo, requerendo, assim, mais
energia térmica para promover a separação das moléculas e a conseqüente
mudança de estado físico. O mesmo raciocínio é empregado para justificar o
maior ponto de ebulição do butanol, que, por ser um álcool, tem suas
moléculas unidas por ligações hidrogênio, além das interações de van der
Waals que ocorrem entre as cadeias hidrocarbônicas.
Veja esta outra tabela:
Estrutura
CO2H
CO2H
CO2H
CO2H
OH
OH
Nome
Ácido o-
Ácido
Ácido p-
Ácido
toluico
salicílico
toluico
phidroxibenzóico
PF (oC)
102
157
177
213
Aqui você pode observar como a capacidade de aproximação entre os
grupos capazes de realizar ligações hidrogênio intermoleculares determina o
valor de ponto de fusão. No caso dos ácidos o-toluico e salicílico, que
possuem substituintes na posição orto ao grupo ácido carboxílico, o ponto
de fusão é menor que seus isômeros em que esses grupos encontram-se na
posição para. Isso se dá pelo impedimento estérico (volume ocupado) que
esses grupos promovem ao redor da carboxila (CO2H), dificultando a
aproximação entre carboxilas de duas moléculas desses ácidos, diminuindo
assim a coesão intermolecular. Por outro lado, os ácidos que possuem uma
função hidroxila adicional (ácidos salicílico e 4-hidroxibenzóico), também
capazes de realizarem ligações hidrogênio, possuem ponto de fusão mais
elevado que os outros dois.
Veja outro exemplo de como os efeitos estéricos podem afetar uma
propriedade físico-química. No gráfico a seguir, você encontra a correlação
entre os valores de peso molecular e ponto de ebulição de uma série de
ésteres de ácidos acéticos (acetatos), descritos na tabela posterior ao
gráfico.
Ponto de ebulição (oC)
160
140
120
100
80
60
40
70
80
90
100
110
Peso molecular (u.m.a.)
120
130
140
Nome
Estrutura
Acetato de metila
O
Acetato de etila
O
O
Acetato de n-propila
Acetato de isopropila
O
O
O
O
O
Acetato de n-butila
O
O
74
88
102
102
116
57
77
101
91
125
Acetato de s-butila
Acetato de isobutila
Acetato de t-butila
Acetato de n-pentila
Acetato de isopentila
Peso molecular
(u.m.a.)
Ponto de ebulição
(oC)
Nome
Estrutura
O
O
Peso molecular
O
O
O
O
O
O
O
O
116
116
116
130
130
111
116
98
146
142
(u.m.a.)
Ponto de ebulição
o
( C)
Observe que na seqüência dos ésteres de cadeia linear existe uma
correlação positiva entre os valores de ponto de ebulição e o aumento da
cadeia hidrocarbônica (linha vermelha), o que pode ser explicado pelo
aumento das interações intermoleculares do tipo van der Waals. Entretanto,
os ésteres de cadeia ramificada fogem dessa reta, já que a ramificação
dificulta a aproximação das cadeias para que ocorra a formação de
interações de van der Waals mais efetivas (reflita: se essas interações são
muito fracas, pequenos aumentos na distância entre as cadeias causam
redução significativa da coesão intermolecular, reduzindo assim o ponto de
ebulição).
O
O
O
O
O
O
O
O
Situação semelhante pode ser observada em uma série de ésteres
metílicos de ácidos graxos: o aumento da cadeia hidrocarbônica leva ao
aumento dos valores de ponto de fusão e de ebulição, mas a presença de
insaturações leva a uma queda nestes valores. Isso ocorre porque as
ligações duplas das cadeias dos ácidos graxos insaturados são regiões de
alta densidade eletrônica, e quando duas cadeias se aproximam a repulsão
entre essas ligações impede uma interação intermolecular maior.
300
Ponto de fusão/ebulição (oC)
250
200
150
Ponto de fusão
100
Ponto de ebulição
50
0
100
150
200
250
-50
-100
Peso molecular (u.m.a.)
300
350
Nome
Butirato de
Caproato de
Decanoato de
Laurato de
Miristato de
Palmitato de
metila
metila
metila
metila
metila
metila
O
O
O
O
O
O
Estrutura
()
O
2
Peso molecular
()
4
O
()
8
()
10
O
O
()
12
()
14
O
O
102
130
186
214
242
270
-95
-71
-14
5
18
30
102
151
224
268
296
-
(u.m.a.)
Ponto de fusão
(oC)
Ponto de
ebulição (oC)
Nome
Estearato de metila
Estrutura
O
()
16
Oleato de metila
Linoleato de metila
O
O
O
()
7
()
7
O
()
O
7
()
4
Peso molecular (u.m.a.)
298
296
294
Ponto de fusão (oC)
38
-5
-35
Ponto de ebulição (oC)
-
-
-
É por isso que, atualmente, existe uma preocupação muito grande
com o consumo de gorduras hidrogenadas: elas são predominantemente
saturadas, com alto grau de associação intermolecular, o que pode levar a
doenças, além de diminuir a fluidez da membrana celular. Essa propriedade
de fluidez da membrana plasmática, fundamental para a manutenção da
vida, é dependente da presença de insaturações nas moléculas dos ácidos
graxos que constituem a sua bicamada fosfolipídica. Será que seus alunos
imaginam que a Química pode explicar algo tão fundamental para a
manutenção das condições de saúde deles?
PROPRIEDADES FÍSICO-QUÍMICAS: SOLUBILIDADE
Analise a propriedade da solubilidade em água. Veja a tabela e o
gráfico a seguir:
Estrutura
HO2CCO2H
HO2C(CH2)2CO2H
Nome
Ácido oxálico
Ácido succínico
Peso molecular (u.m.a.)
90
118
Solubilidade em água
9,5
6,8
(g/100 mL)
Estrutura
HO2C(CH2)4CO2H
HO2C(CH2)6CO2H
Nome
Ácido adípico
Ácido subérico
Peso molecular
146
174
2
0,16
(u.m.a.)
Solubilidade em água
(g/100 mL)
Solubilidade em água (g/mL)
9,5
7,5
5,5
3,5
1,5
-0,5
2
3
4
5
6
7
8
Número de átomos de carbono
Nesta série de ácidos dicarboxílicos, você pode perceber que a
solubilidade em água diminui com o tamanho da cadeia hidrocarbônica. Isso
pode ser explicado assim:
Antes de ocorrer a
O
HO
O
OH
HO
O
OH
O
solubilização, as moléculas do
O
soluto estão unidas por ligações
HO
O
OH
HO
de hidrogênio (verde) e
O
OH
O
O
H
H
O
H
interações de van der Waals
O
H
O
H
O
H
H
H
(azul), enquanto as moléculas
de água interagem entre si por
ligações hidrogênio (verde).
O
OH
HO
O
OH
OH
O
H
O
H
H
O
H
H
O
H
O
H
H
necessário que ocorra a quebra de interações
O
soluto-soluto (ligações hidrogênio e van der Waals)
OH
e solvente-solvente (ligações hidrogênio) e se inicie
HO
O
HO
O
O
H
O
H
No início do processo de solubilização, é
HO
O
o processo de formação de interações solutosolvente (ligações hidrogênio).
O
O
H
O
HO
OH
O
H
O
O
H
O
H
O
H
H
O
O
OH
O
O
H
H
O
O
H
estão rompidas, e todas as moléculas do soluto
H
estão interagindo com moléculas de solvente.
H
O
OH
O
O
Ao final desse processo, as interações soluto-soluto
O
HO
H
Conseqüentemente, para que o processo de
H
O
solubilização ocorra, é necessário que a energia
H
H
associada à formação das interações soluto-
H
solvente compense a energia gasta na quebra das
interações soluto-soluto e solvente-solvente.
Quando ocorre o aumento da cadeia
hidrocarbônica, isso não ocorre, já que não há
formação de interações entre a água e a cadeia (na
verdade, ocorre repulsão), e a energia associada às
ligações hidrogênio soluto-solvente não compensa
essa repulsão nem a quebra das interações solutosoluto e solvente-solvente.
A polaridade da molécula também é importante para a sua solubilização em
água. Veja o caso de dois ácidos isoméricos, os ácidos maléico e fumárico:
CO2H
CO2H
Ácido maleico
Solubilidade =
78 g/100 mL
CO2H
HO2C
Ácido fumárico
Solubilidade =
0,63 g/100 mL
Devido à sua geometria, o ácido maléico apresenta um momento de dipolo
diferente de zero (representado pela seta vermelha), o que faz com que ele possua alta
solubilidade em água. Já o ácido fumárico é muito pouco solúvel, porque o momento de
dipolo é zero nesta molécula, já que o vetor de momento de dipolo de uma carboxila é
cancelado pelo da outra carboxila.
PROPRIEDADES FÍSICO-QUÍMICAS: ACIDEZ E
BASICIDADE
Outra propriedade importante para o sentido do paladar é o caráter
ácido-base dos compostos orgânicos. Em Química Orgânica utilizamos
principalmente as teorias de Bronsted-Lowry e de Lewis sobre acidez e
basicidade; assim, o ácido acético é tipicamente um ácido em meio aquoso,
já que tende a doar [H+] para a base (água), formando a base conjugada
(acetato),
O
OH
O
+ H2 O
Ácido acético
O
+ H 3 O+
Acetato
enquanto a trietilamina se comporta como base nesse mesmo solvente, por doar um par
de elétrons, o que corresponde a receber [H+].
H
N
+ H2 O
Trietilamina
Entretanto,
em outros
+
N
+ -OH
Trietilamonio
solventes,
essas
mesmas
espécies
podem ter
comportamentos opostos, como acontece com o ácido acético na presença de ácido
sulfúrico concentrado.
+
O
OH
+ H2SO4
OH
OH
+ HSO 4
Como a estrutura influencia a acidez/basicidade de um composto? Os grupos
ligados ao sítio ionizável podem modular essas propriedades através de três efeitos
diferentes:
a. Efeito indutivo
Este é um efeito eletrônico que se transmite ao longo das ligações σ. Através
dele, átomos eletronegativos retiram (“puxam”) elétrons do sítio ionizável, enquanto
cadeias hidrocarbônicas doam elétrons. No caso dos ácidos, os grupos que retiram
elétrons (GRE) diminuem a densidade eletrônica do carboxilato, aumentando sua
estabilidade:
O
O
GRE
OH
+ H2O
GRE
O
+ H3O+
Quanto mais estável for a base conjugada, maior a acidez do ácido
correspondente. Seguindo o mesmo raciocínio, grupos doadores de elétrons (GDE) irão
diminuir a acidez, por aumentar a densidade eletrônica do carboxilato, diminuindo sua
estabilidade.
O
O
GDE
OH
+ H2 O
GDE
O
+ H3O+
Para as bases, ocorre o efeito inverso: os GDE aumentam a densidade eletrônica
do sítio básico, favorecendo sua capacidade de doar um par de elétrons, enquanto os
GRE diminuem-na, levando então a uma base mais fraca:
GDE NH2
H2O
+
GDE NH3
HO-
GRE NH2
H2O
HO-
GDE doa elétrons
para espécie deficiente
em elétrons = maior
estabilidade do ácido
conjugado = maior
basicidade
+
GRE NH3
GRE retira elétrons
de espécie deficiente
em elétrons = menor
estabilidade do ácido
conjugado = menor
basicidade
O efeito indutivo se perde muito rapidamente com o aumento do número de
ligações σ entre o sítio ionizável e os GDE/GRE. Veja um exemplo:
O
Estrutura
Cl
O
OH
O
OH
Cl
OH
Cl
Nome
pKa
Ácido 2-
Ácido 3-
clorobutírico
clorobutírico
2,86
4,05
Ácido 4-clorobutírico
4,52
Veja como o valor de pKa (constante que mede a acidez de um composto)
aumenta com o distanciamento do grupo GRE (Cl) do sítio ionizável (CO2H). Isso
ocorre em função da redução do efeito indutivo com o aumento dessa distância.
b. Efeito estérico
Esse efeito é exercido por átomos ou grupos volumosos. Ele dificulta a
aproximação da espécie que reage com o ácido ou base orgânica; assim, o efeito
estérico sempre leva a uma redução da acidez ou da basicidade:
CO2H
Ácido benzóico
pKa = 5,05
CO2H
Ácido 2,6-di-t-butil
benzóico
pKa = 6,25
c. Efeito de ressonância
Esse efeito eletrônico, ao contrário do efeito indutivo, não se dá ao longo das
ligações σ, mas envolve as ligações π e elétrons em orbitais n, desde que essas ligações
e os elétrons n estejam em orbitais paralelos que possam se conjugar:
H
N
H
Podemos representar este efeito através das formas de ressonância do composto:
..
N
A
+
N
B
-
N
C
Nesse esquema, A e B são formas de ressonância da N,N-dimetil-2-propenamina
(N,N-dimetilalilamina). Embora A seja a forma que melhor representa esse composto,
por não haver separação de cargas, algumas das propriedades eletrônicas desta amina
podem ser explicadas pela forma de ressonância B. Nenhuma das duas formas de
ressonância corresponde ao composto real, que é mais bem representado pelo somatório
das propriedades eletrônicas de cada forma de ressonância; esse somatório é o híbrido
de ressonância, representado no esquema por C. Não esqueça que A e B não existem;
logo, não há equilíbrio entre as formas de ressonância (veja que a seta utilizada entre
elas é uma seta de duas pontas e não duas setas em sentidos opostos!). Ao desenhar
formas de ressonância, estamos desenhando, de certa forma, um mapa da distribuição
eletrônica do sistema π de uma molécula; assim, apenas elétrons se movem, e os
núcleos atômicos permanecem imóveis nas diversas formas de ressonância.
O efeito de ressonância permite o espalhamento de elétrons ao longo de vários
átomos na estrutura do composto, levando a uma redução da densidade eletrônica. No
caso dos ácidos, isso favorece a acidez, por aumentar a estabilidade da base conjugada;
no caso das bases, essa redução da densidade eletrônica tende a diminuir a basicidade
do composto. O efeito de ressonância geralmente predomina sobre os demais efeitos
estereoeletrônicos.
Nas aulas sobre ácidos carboxílicos (vinagre), aminas (pimenta) e fenóis
(canela), discutiremos mais profundamente as conseqüências do efeito de ressonância
sobre a acidez e a basicidade dos compostos orgânicos.
O efeito de ressonância também explica por que os ácidos carboxílicos são mais
ácidos que os álcoois. A base conjugada dos ácidos carboxílicos (carboxilato) é
estabilizada por ressonância, levando à distribuição do par eletrônico entre dois átomos
de oxigênio:
O
O
O
O
No caso dos alcóxidos (bases conjugadas dos álcoois), como não há ressonância, o par
eletrônico advindo da quebra da ligação O-H fica concentrado no átomo de oxigênio,
diminuindo assim a estabilidade da base conjugada e, conseqüentemente, reduzindo a
acidez dos álcoois em comparação aos ácidos carboxílicos:
OH + H2O
Etanol
pKa = 16
O
+ H 3 O+
Etóxido
QUANTIFICAÇÃO DA ACIDEZ DE UM COMPOSTO
Quando comparamos dois ácidos, podemos concluir que um deles é
mais forte que o outro; o mais forte é aquele que tende a doar mais [H+],
dissociando-se em maior proporção que o mais fraco. Entretanto, é
necessário quantificar essa força. Isto pode ser feito a partir da constante
de equilíbrio de dissociação de um ácido:
HA + H2O
A- + H3O+
Keq = [A-][H3O+]/[HA][H2O]
Como a água é solvente da reação, sua concentração é muito maior que a
dos demais reagentes, e, assim, a quantidade convertida em íon hidrônio é
desprezível. Logo, podemos considerar [H2O] = constante e omiti-la da
equação, que passa então a ter a forma:
Keq’ = Ka = [A-][H3O+]/[HA]
Assim, quanto maior a força de um ácido, menor será [HA] e,
conseqüentemente, maior será o valor de Ka.
Como os valores de Ka são geralmente muito pequenos, necessitando
serem expressos na forma exponencial, empregamos mais comumente o
valor de seu co-logaritmo, o pKa (= -log Ka). Assim, quanto menor o valor
de pKa de um ácido, maior a sua acidez.
Para as bases, podemos, de forma análoga, calcular o valor de pKb.
Entretanto, a força de uma base (B-) é expressa, em geral, pela força de
seu ácido conjugado (HB): quanto mais forte ele for, mais dissociado estará
em meio aquoso, gerando a base livre; logo, quanto maior o pKa do ácido
conjugado (HB) de uma base, mais forte é esse ácido e, conseqüentemente,
mais fraca é a base.
B- + H 2 O
HB + -OH
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Propriedades fisico-químicas e os sentidos