Física Laboratorial Ano Lectivo 2003/04 TRABALHO PRÁTICO DETERMINAÇÃO DA RESISTÊNCIA INTERNA DE UMA PILHA Objectivo – Este trabalho compreende as seguintes partes: comparação entre as resistências internas de dois voltímetros, um analógico e um digital; medida da curva de resposta de um voltímetro digital; determinação da resistência interna de uma pilha. 1. Introdução - Conceitos e dispositivos eléctricos fundamentais 1.1. Lei de Ohm Para alguns componentes feitos por materiais condutores, verifica-se a relação: V = R, I sendo I a intensidade da corrente eléctrica que os atravessa quando aos seus terminais está aplicada a diferença de potencial VAB (figura 1). Os componentes com este comportamento são chamados de resistências, sendo R o seu valor. No Sistema Internacional as grandezas eléctricas referidas têm as seguintes unidades e símbolos representativos: V – volt (V); I – ampére (A); R – ohm (Ω). A I R VAB B Figura 1 1.2. Fontes de tensão Designam-se por fontes de tensão os dispositivos eléctricos caracterizados por imporem uma determinada tensão ou diferença de potencial (ddp) aos seus terminais. As fontes de tensão podem ser contínuas (fontes dc), quando a tensão gerada é constante no tempo, ou alternadas (fontes ac), quando a tensão é sinusoidalmente variável no tempo. Este último tipo de sinais pode ser fornecido por dispositivos conhecidos por geradores de sinais. As fontes de tensão contínuas são geralmente utilizadas para fornecer energia a circuitos eléctricos. Se a tensão gerada pela fonte de tensão for independente da corrente que percorre o circuito a que está ligado a fonte diz-se ideal (figuras 2-a) e 3-a)). Se a tensão depender da corrente fornecida de um modo linear, como acontece para correntes muitos baixas (figura 2-b)), a fonte de tensão pode ser modelada como sendo constituída por uma fonte ideal em série com uma resistência, designada por resistência interna (fig. 3-b)). As fontes reais têm sempre resistência interna, ainda que esta seja, por vezes, muito pequena e possa ser desprezada. 1.2.1. Tensão contínua A ddp medida numa fonte de tensão contínua quando não fornece corrente a um circuito, é numericamente igual à força electromotriz, E, da fonte. Num circuito alimentado por uma fonte de tensão ideal, a ddp entre os pontos A e B, VAB, é ainda igual à força electromotriz, E, da fonte. Contudo, num circuito com uma fonte real, é necessário ter em conta a resistência interna ri da própria fonte (fig. 3-b). Departamento de Física da FCTUC 1/7 Física Laboratorial Ano Lectivo 2003/04 VAB VAB = Ε VAB Ε variação aproximadamente linear Fonte de tensão ideal variação não-linear Fonte de tensão real I I a) b) Figura 2 - Variação da tensão VAB aos terminais de uma fonte de tensão de força electromotriz E, em função da corrente eléctrica I: a) para uma fonte ideal; b) para uma bateria. Quando a bateria funciona na zona de variação aproximadamente linear é bem modelada como sendo uma fonte ideal em série com uma resistência (a sua resistência interna) e é costume designá-la, então, por fonte de tensão real. A A I I ri R E R VAB VAB E VAB = E VAB = E - riI B B a) b) Figura 3 - Circuito eléctrico alimentado por: a) fonte de tensão ideal; b) fonte de tensão real Resistência interna de uma pilha O valor da resistência interna de uma pilha pode ser determinado montando um circuito equivalente ao da figura 3-b) e medindo a ddp VAB para diferentes valores conhecidos da resistência de carga R. Uma vez que V AB = RI = E − ri I , a representação gráfica de VAB em função da corrente eléctrica I que percorre o circuito – calculada para cada valor de R por aplicação da lei de Ohm –, permite extrair, da parte linear de VAB(I) (figura 2-b)), o valor da resistência interna da pilha, ri,. Departamento de Física da FCTUC 2/7 Física Laboratorial Ano Lectivo 2003/04 1.2.2 Sinal sinusoidal Este tipo de sinal, característico de uma tensão alternada, pode definir-se através dos V seguintes parâmetros: a amplitude, V0, o valor eficaz [1], Vef, tal que Vef = 0 , a 2 amplitude de pico a pico, Vpp (= 2V0), o período, T, a frequência, f, e a fase, φ. 1.3. Instrumentos de medida Na medição de grandezas eléctricas como a intensidade de corrente, a ddp e a resistência eléctrica usamos, em geral, amperímetros, voltímetros e ohmímetros, respectivamente. Os multímetros reúnem num só dispositivo estas três funções de medida. Todos estes aparelhos medem o valor de grandezas constantes no tempo ou o valor eficaz de grandezas de variação temporal periódica. Como é sabido, a variação temporal destas últimas grandezas pode ser caracterizada de modo mais completo utilizando um osciloscópio. Os multímetros (amperímetros, voltímetros e ohmímetros) podem ser de tipo analógico ou digital. Os primeiros indicam o valor da grandeza que medem através da posição de um ponteiro que se pode deslocar continuamente sobre uma escala. Os segundos fornecem directamente o valor numérico da grandeza resultante da medida e têm, em geral, melhor resolução e facilidade de utilização. 1.3.1. Utilização do voltímetro analógico e digital O voltímetro deve colocar-se num circuito de modo a que os seus terminais estejam ligados aos dois pontos entre os quais se pretende determinar a ddp. Monta-se, portanto, em paralelo com essa parte do circuito. Um voltímetro ideal deveria ter uma resistência interna infinita de modo a não ser atravessado pela corrente eléctrica ou, dito de outra forma, de forma a que a corrente do circuito não fosse de todo desviada para o próprio voltímetro. Não existindo, contudo, voltímetros ideais, é conveniente trabalhar-se com os de maior resistência interna possível, para não se alterarem significativamente as condições de funcionamento do circuito. Antes de usar os voltímetros deve, assim, garantir que o valor das suas resistências internas podem ser desprezadas relativamente às resistências dos troços de circuito em paralelo. 1.3.2. Curva de resposta de um voltímetro digital O modo de funcionamento de um voltímetro em tensões alternadas é algo mais complicado e com algumas limitações: só consegue medir o valor eficaz de tensões sinusoidais e apenas para uma curta gama de frequências. [1] A tensão eficaz corresponde ao valor da tensão contínua que provocaria a mesma dissipação de energia numa resistência. Departamento de Física da FCTUC 3/7 Física Laboratorial Ano Lectivo 2003/04 Escolhendo uma determinada amplitude de um sinal sinusoidal e fazendo variar a sua frequência, podemos analisar a curva de resposta do voltímetro digital. Quando se aumenta a frequência f do sinal sinusoidal, mantendo a mesma amplitude máxima, V0, verifica-se que, a partir de certo valor de f, a tensão eficaz lida no voltímetro, Vef, começa a decrescer. Os multímetros de baixo custo estão normalmente preparados para medir tensões alternadas de frequências próximas da da tensão da rede (50 Hz). 2. Realização experimental Como preparação para o trabalho, aconselha-se a leitura das notas “Introdução à análise de dados nas medidas de grandezas físicas”, nomeadamente, das secções 1 a 5.1. 2.1. Determinação da resistência interna de um voltímetro analógico e de um voltímetro digital Material necessário: Circuito constituído por uma pilha de 1.5V e por uma resistência de cerca de 100kΩ; multímetro analógico; multímetro digital. 2.1.1. Considere o circuito da figura 4, constituído por uma pilha de força electromotriz E (despreze o valor da sua resistência interna), uma resistência R de cerca de 100kΩ e um voltímetro incorporado no multímetro [2] analógico ou no digital . Antes de montar o circuito, meça a força electromotriz da pilha, E, ligando directamente os seus terminais ao voltímetro digital (fonte em vazio). Meça também o valor da resistência R. Registe esses valores na tabela I, admitindo que o erro de leitura é desprezável nos dois casos. R A E V B Figura 4 2.1.2. Monte o circuito começando por utilizar o voltímetro analógico e depois o digital. Registe a ddp, VAB, indicada pelo voltímetro e o erro de leitura, σ VAB , nessa medida utilizando as escalas dos voltímetros propostas na tabela I (Consulte a ref. Bibliográfica [3], secções 1 a 4). Conhecida a ddp VAB, estabeleça as relações matemáticas que lhe permitam conhecer VR, I e rV, sendo VR a ddp aos terminais da resistência R, I a intensidade da corrente que percorre o circuito e rV a resistência interna do voltímetro. 2.1.3. Recorrendo a essas relações e ao cálculo de propagação de erros (ref. [3], secções 5.1 e 6) complete a tabela I. [2] Repare que, no circuito da figura 4, o voltímetro não está montado em paralelo apenas com um elemento ou troço do circuito mas com toda a parte restante do circuito. Isso deve-se ao facto desse circuito pretender analisar a resistência interna do próprio voltímetro e não usá-lo como instrumento de medida. Departamento de Física da FCTUC 4/7 Física Laboratorial Ano Lectivo 2003/04 Tabela I R (kΩ) = Escala Voltímetro Analógico Voltímetro Digital ; E (V) = V AB ± σ VAB (V) VR ± σ VR (V) I ± σ I (µA) rV ± σ rV (MΩ) 2.5 V / div 10 V /div 0–2V 2.1.4. Compare e comente os valores encontrados para a resistência interna desses aparelhos. 2.2 Curva de resposta de um voltímetro digital Material necessário: gerador de sinais, semi-logarítmico. multímetro digital, osciloscópio, papel 2.2.1 No gerador de sinais, seleccione um sinal sinusoidal V0 de cerca de 1.5 V de amplitude e uma frequência f de 100 Hz. Verifique, com o osciloscópio, o valor destas grandezas. 2.2.2 Ligue o gerador de sinais ao voltímetro digital e seleccione o modo de funcionamento ac. Registe a leitura do voltímetro, ou seja, o valor da Vef. Varie a frequência do sinal para 50, 200, 500, 1 000, 2 000, 5 000, 50 000, 100 000 e 200 000 Hz, sem alterar a amplitude do sinal de entrada, V0. Para cada valor da frequência, registe o valor de Vef lido no voltímetro digital, completando uma tabela semelhante à tabela II. De quando em quando, verifique com o osciloscópio que V0 não se alterou. Tabela II V0 (V) f (Hz) Vef (V) ... ... 2.2.3 Em papel semi-logarítmico, construa um gráfico de Vef em função da frequência do gerador. A partir do gráfico, escolha o valor correcto da tensão eficaz (Vefc). NOTA – Quando uma das grandezas utilizadas no gráfico varia ao longo de várias ordens de grandeza, como é o caso da frequência, é adequado traçá-lo em papel semi-logarítmico, no qual se pode representar um eixo com uma escala linear e o outro com uma escala logarítmica. Consulte as notas fornecidas sobre “Gráficos”, extraídas da referência [4]. Departamento de Física da FCTUC 5/7 Física Laboratorial Ano Lectivo 2003/04 2.3 Determinação da resistência interna de pilhas comerciais Material necessário – Duas pilhas comerciais (uma do tipo zinco-carvão (ou salina) e outra do tipo alcalino), resistências de valor conhecido (caixa de resistências) e um voltímetro digital 2.3.1 Utilizando o voltímetro digital, meça a força electromotriz (Ε) da pilha alcalina, ligando apenas o voltímetro aos seus terminais (fonte em vazio). Registe esse valor na tabela III. 2.3.2 Monte o circuito representado na figura 3-b) utilizando a caixa de resistências fornecida. Seleccione uma resistência de 100 Ω, e meça a tensão aos terminais da fonte em carga (VAB), registando esse valor na tabela III. Escolha outros valores para a resistência R (20, 10, 5, 3, 2 e 1 Ω, por exemplo) e meça o valor de VAB em cada caso, completando a tabela III. Tabela III Pilha Alcalina Pilha Zinco-Carvão E (V) = E (V) = R (Ω) VAB (V) I (A) VAB (V) I (A) ... ... ... ... ... 2.3.3 Repita o procedimento anterior para a outra pilha de que dispõe. 2.3.4 Construa o gráfico da tensão VAB em função da corrente I para cada uma das pilhas. Compare os gráficos obtidos com o representado na fig. 2-b) e, utilizando os pontos em que o comportamento da pilha pode ser aproximado por uma fonte de tensão real, determine a resistência interna da pilha. 2.3.5 Compare os resultados obtidos e comente. Relatório Elabore um relatório do trabalho efectuado, no qual deve incluir, para além da identificação do trabalho e da equipa (nome, licenciatura, turma e grupo) que o realizou: • • • • o objectivo do trabalho (4 a 5 linhas); os resultados experimentais obtidos (organizados em tabelas e gráficos sempre que possível); o tratamento matemático adequado desses resultados e a discussão/comentário dos mesmos; as conclusões finais. Departamento de Física da FCTUC 6/7 Física Laboratorial Ano Lectivo 2003/04 Bibliografia [1] Multímetros, Notas de apoio para Física Laboratorial, extraídas da referência [4]. [2] Osciloscópio, Notas de apoio para Física Laboratorial, Coimbra, Departamento de Física da FCTUC (2003/2004). [3] Introdução à análise de dados nas medidas de grandezas físicas, Coimbra, Departamento de Física da Universidade (2003/04). [4] M. C. Abreu, L. Matias e L. F. Peralta, Física Experimental – Uma Introdução, Lisboa, Editorial Presença (1994). [5] M.M.R.R. Costa, M.J.B.M. de Almeida, Fundamentos de Física, Coimbra, Livraria Almedina (1993). Departamento de Física da FCTUC 7/7