O índio na esfera cultural brasileira Giselle Piragis Zogaib Mestre em Comunicação e Linguagem Resumo Este estudo teve como principal objetivo analisar porque motivo o índio é representado sempre como bom ou mau, pela imprensa, e qual a intenção em significá-lo dessa forma. Inicialmente, partiu-se da hipótese de que essa representação fosse consequência das histórias de viajantes e romances de séculos passados dos quais a imprensa utiliza de forma consciente os conceitos estabelecidos a partir dessas representações na produção do material informativo, reforçando conceitos culturais negativos ou positivos sobre eles, dependendo do enfoque desejado. Para iniciar esta investigação, fez-se necessário tomar consciência desta representação e deixar de ser apenas consumidora do produto informativo produzido pela mídia. Frente a isso, foi imprescindível a pesquisa de campo, levando à imersão em comunidades indígenas de diferentes localidades do Brasil, mas sem a conotação de pesquisa antropológica. Assim, buscou-se conhecer índios de diferentes etnias e comunidades para comparar as realidades encontradas com os fatos narrados pela imprensa. A experiência mostrou-se extremamente produtiva, pois sem ela, e apenas baseado em leituras de autores das áreas da antropologia, etnologia e sociologia, não teria sido possível compreender que a representação dos índios atualmente é vital, tanto quanto complexa, para que esses povos, ou seja, a caracterização como personagem os tornem visíveis para a sociedade. Com base no referencial teórico selecionado para este estudo, incluindo a Semiótica da Cultura, compreendeu-se que o domínio cultural recriou o índio brasileiro, já que a resistência desses povos não permitiu sua extinção cultural. Palavras-chave: Índio, Semiótica da Cultura, Representação da Mídia e Imprensa. Abstract The objective of this research is to analyze why Indian people are represented as good or bad individuals according to the press interests. Maybe, the Indian people representation told by the press is just a consequence of stories told by writers and travelers throughout the centuries. The press would probably use these established concepts in order to support positive or negative aspects of Indian people each time, according to interests involved. For the investigation, it was very important to understand that the mass media representation of Indian people itself should not lead the way. Field research across Brazilian Indian communities was necessary to deeply understand their culture. Different facts told by the press about indigenous groups were compared to reality. The whole experience was very productive showing that the knowledge that we have about Indian culture written by sociologists, ethnologists and anthropologists in different books cannot totally represent them. Under cultural semiotics concepts it is possible to understand how mass media reconstructed Indian people’s image. Keywords: Indians in Brazil, Cultural Semiotics, Mass Media Representation, Press O índio, na cultura brasileira, representa uma identidade forte, porém, diferenciada no contexto da historiografia cultural. O conflito maior entre as culturas está em não reconhecer que se trata de um processo entrópico constante e inevitável até mesmo para os povos mais isolados. De alguma forma, as interferências ocorrem: mitos são desconstruídos e novos são gerados, transformando povos diferentes e antagônicos, em afins. Um exemplo claro sobre essa desconstrução, seu impacto e resultados são os índios que resistiram as imposições dos europeus há cerca de quinhentos anos. Apesar de guerreiros fortes e determinados, eram fiéis a suas crenças e padrões de comportamento, e ao compreenderem a interferência que estavam sofrendo como contrária aos seus valores, entregaram-se ao conflito e à morte em resistência às mudanças ocorridas pelo contato. (Ribeiro, 1995). Considerando que o bem só pode existir em função da existência do mal, (Paz, 1996) uma cultura também precisa da não-cultura para fortalecer sua estrutura. Neste caso, os índios estavam mais do que sobrevivendo as interferências culturais dos europeus, estavam também reafirmando seus valores culturais. O oposto também é fato, visto que os europeus igualmente buscavam firmar seus códigos culturais em um novo território. Os semioticistas da cultura explicam esta resistência da seguinte forma: 76 O índio na esfera cultural brasileira Pelo fato de a cultura não viver somente da oposição das esferas interna e externa, mas também movimenta-se entre elas, a cultura não somente luta contra o “caos” externo, mas dele também necessita; ela não somente o destrói, como continuamente o cria. Uma das ligações entre cultura e civilização (e “caos”) consiste no fato de que a cultura aliena constantemente em favor de sua antípoda certos elementos “desgastados”, que se transformam em clichês e funcionam na não-cultura. Assim, na própria cultura, a entropia aumenta às custas da máxima organização. (IVÁNOV e outros, in MACHADO, 2003. p.101). A dicotomia entre europeus e índios não existia apenas no nível físico, ocorria mais intensamente a nível simbólico, devido às mudanças dos elementos que constituem este nível. Com seu estilo provocador, o sociólogo Jean Baudrillard (2007:18) reflete sobre a troca simbólica a partir da antropologia. Baudrillard interpreta que em trocas simbólicas como vida e morte não há dialética e nem reversibilidade, todo universo simbólico é formado por bens permutáveis, ou seja, sempre ocorrem mudanças que alteram o termo inicial e é neste sentido que tantos os índios quantos os europeus mais do que sobreviviam. Ora, não há dialética no simbólico. Em se tratando de vida e morte, em nosso sistema de valores não há reversibilidade: o que é positivo está do lado da vida; o que é negativo está do lado da morte, a morte sendo o fim da vida, seu oposto; ao passo que, no universo simbólico, os termos são, a bem dizer, permutáveis. (Baudrillard, 1991) Para o comunicólogo, Vicente Romano (2004), esse contato entre o sujeito e o outro forma um juízo de valores que gera uma transformação simbólica, capaz de alterar o ambiente e o sujeito, assim eles passam a ser percebidos a partir dessa representação simbólica. El análisis que hacen los sujetos del “nosotros” prévio adquiere su juicio prévio en el ambiente atmosférico para enfrentarse al futuro. La transformación simbólica, el cambio de médios y de papeles determinan hasta que punto se libera el sujeito respecto de su médio ambiente. En el toma y daca de la comunicación se hace práctica la libertad que decide sobre cada indivíduo y sobre el colectivo em donde vive. De ahí la especial significación de los mensajes cotidianos. Los valores intersubjetivos se constituyen en la repetición recurrente de las valorizaciones indicadas a los mensajes. La liberdad de comunicar precede a la valoración pues los valores no son perceptibles más que a través de lá simbolización. (ROMANO, 2004)1 1 Tradução: “A análise que fazem os sujeitos de “nós” prévio adquire seu juízo prévio no ambiente para se enfrentar o futuro. A transformação simbólica, a mudança de meios e de papéis determinam até que ponto se liberta o sujeito com relação a seu meio ambiente. Na conquista da comunicação se pratica a liberdade que decide sobre cada individuo e sobre o coletivo de onde ele vive. Daí vem a especial significação das mensagens cotidianas. Os valores intersubjetivos se constituem na repetição recorrente das valorizações indicadas às mensagens. A liberdade de comunicação precede à valorização, pois os valores não são perceptíveis mais que através da simbolização”. Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. Giselle Piragis Zogaib Partindo do olhar do Semioticista da Cultura e estudioso da Literatura Russa, pela Universidade de Tártu, Yuri Lótman (1990), a representação simbólica é importante para preservar a memória porque os símbolos são arcaicos e remetem elementos armazenados na memória, fundamentais para a estrutura da cultura. Para este estudioso: A symbol always has something archaic about it. Every culture needs a body of texts which serves the function of archaism. Symbols cluster here thickly and with reason because the core group of symbols are indeed archaic and go back to pre-literate times when certain signs (which are as a rule elementary space-indicators) were the condensed mnemonic programmes for the texts and stories preserved in the community’s oral memory. Symbols have preserved this ability to store up extremely long and important texts in condensed from.2(LÓTMAN, 1990:103) Mais importante que o representar histórias do passado e culturas é o potencial do símbolo tornar-se um texto3 completo, capaz de se inserir em um novo contexto, fora do seu tempo sem precisar perder suas características mais essenciais. Lotman compreende que os símbolos são importantes mecanismos da memória cultural, porque eles podem transferir textos e outras formações de um nível da memória da cultura para outro. O estável conjunto de símbolos que recorre diacronicamente em toda cultura serve, em grande parte, como mecanismos unificadores: por ativar a memória da cultura própria de impedir que a cultura sofra desintegração em camadas cronologicamente isoladas. Os símbolos presentes na semiosfera4 - limites das esferas culturais onde ocorre a comunicação entre diferentes culturas - são, em grande parte, determinados por um conjunto básico, de longa data, de símbolos dominantes na vida cultural. Essa definição de símbolo pode ser aplicada à representação do índio pós-colonização. A transformação do índio-signo de sua esfera cultural 2 Tradução: “Um símbolo tem sempre algo arcaico sobre ele. Cada cultura tem um corpo de textos que serve a função de arcaísmo. Símbolos aglomerados aqui densamente e com razão, porque o núcleo de símbolos é, de fato, arcaico e voltar a pré-alfabetizados vezes quando determinados sinais (que são, em regra elementar espaço-indicadores), formam o condensado mnemônico, programas de textos e histórias conservadas na comunidade da memória oral. Os símbolos têm preservado essa capacidade de armazenar mesmo por períodos extremamente longos e importante em textos de condensado”. 3 “O texto pode ser considerado como elemento primário (unidade básica) da cultura. A relação do texto com o todo da cultura e seu sistema de códigos é revelada pelo fato de que em diferentes níveis a mesma mensagem pode aparecer como um texto, como parte de um texto ou como um conjunto completo de textos. O conceito de texto é empregado num sentido especificamente semiótico e, por um lado, é aplicado não apenas à mensagem de uma língua natural, mas também a qualquer portador de significado integral (“textual”): Uma cerimônia, uma obra de arte, uma peça musical”. (IVÁNOV e outros, in MACHADO, 2003:105) 4 I. Lótman, 1990:123. Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. 77 78 O índio na esfera cultural brasileira em personagem dos contos é a transformação do signo em um símbolo. Esse personagem é capaz de ilustrar o índio, realizar trocas de informações a partir do conceito que representa, mas, ainda assim é uma representação do original. A interpretação dos viajantes sobre o outro é que no entender do interprete, não possuía cultura. A ausência de cultura é conceituada, pela semiótica da cultura, como não-cultura, porque em essência existe, mas não é reconhecida. O antropólogo e estruturalista Claude Levi-Strauss, em seus estudos, que contribuíram com a Semiótica da Cultura, quando trata da relação entre etnologia e cultura, afirma que culturas diferentes podem coexistir em certa tranquilidade, mas: Logo, cada cultura afirma como a única verdadeira e digna de ser vivida; ignora as outras, chega mesmo a negá-las como culturas. A maior parte dos povos a que nós chamamos primitivos designam-se a si mesmos com nomes que significam ‘os verdadeiros’, ‘os bons’, os ‘ excelentes’, ou mesmo ‘os homens’ simplesmente; e aplicam adjetivos aos outros que lhes denegam a condição humana, como ‘macacos de terra’ ou ‘ovos de piolho’. Sem dúvida que a hostilidade, por vezes mesmo a guerra, podia também reinar entre uma cultura e outra, mas tratava-se sobretudo de vingar ofensas, de capturar vítimas destinadas a sacrifícios, de roubar mulheres ou bens: costumes que a nossa moral reprova, mas que jamais vão, ou vão-no excepcionalmente, até à destruição de uma cultura como tal, ou até à sua sujeição total, pois que não se lhe reconhece realidade positiva. (LEVI-STRAUSS, 1986:26). Os semioticistas da Escola de Semiótica da Cultura5 compreendem que no encontro de duas, ou mais esferas culturais, ocorre intensa troca de informações entre elas. A entropia estabelece uma relação em que códigos culturais ricos em história assimilam novos signos sem alterar sua historicidade, mas que sofrem mudanças no presente. No entanto, no momento em que essas mudanças ocorrem, ou seja, o estado presente, não permite compreender as interferências como positiva porque é estabelecido o caos em ambas as esferas culturais. Os textos onde estão organizados os códigos culturais iniciam um novo processo de assimilação e organização desses códigos. Na prática, isto equivale a conflitos como guerras, ou uma simples tentativa de provar o certo ou o errado em uma discussão. Apenas quando os choques ocorridos são visualizados como passado é possível identificar os aspectos positivos dessas trocas de informações e os códigos antes portadores de historicidade, quando não são perdidos pelas mudanças ocorridas, tornamse ainda mais valiosos para a cultura, pois trazem aspectos do passado para o presente, como ocorre com a literatura, música e artes. Saber reconhecer estes códigos acaba fortalecendo a cultura, diminuindo assim as possibilidades de sua extinção pela perda da identidade. 5 IVÁNOV, e outros, em MACHADO, 2003. Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. Giselle Piragis Zogaib O sociólogo alemão Norbert Elias (2000) em seu trabalho Os Estabelecidos e os Outsiders reflete sobre inverdades aplicadas em um grupo social recém-formado, por seu opositor com a finalidade de estigmatizá-lo e, dessa forma, desequilibrá-lo. O autor indica que o grupo que sofre com as mentiras fica enfraquecido por não estar estruturado em uma unidade, com identidade própria, porque ainda não possuía uma história, sendo definido pelo autor como Outsiders. Já o grupo responsável pelas mentiras era um grupo antigo, fortalecido em uma união trazida pelo convívio de gerações, definido, portanto, como Estabelecidos. O grupo dos estabelecidos se fortalece quando essas histórias assumem um caráter de verdade para as gerações que vieram em seguida. Os índios exemplificam o grupo os Outsiders, porque, apesar de estarem estabelecidos no território invadido há mais tempo que os exploradores, não constituíam uma única unidade. Eram diferentes etnias indígenas e, cada qual, a seu modo, recebeu os estrangeiros: Os mexericos depreciativos e a discriminação, que de início talvez se houvessem restringido aos adultos, empederniram-se ao longo das gerações, porque desde cedo os filhos foram aprendendo as atitudes e crenças discriminatórias. A relativa ‘antigüidade’ dessa tradição – o fato de ela ter sido transmitida dos pais para os filhos, e depois para os filhos destes quando cresceram – reforçou e 6 Termo aplicado segundo o estudo de Jean Baudrillard, 1981. Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. aprofundou o efeito que o caráter coletivo das fofocas de rejeição tem sobre o preconceito grupal, a discriminação grupal e as crenças neles encanadas. Também aumentou sua rigidez, seu caráter axiomático e sua impermeabilidade aos argumentos contrários, baseados em realidades concretas. (ELIAS, 2000: 127) As histórias irreais contadas sobre o grupo dos Outsiders assumiram caráter de realidade porque os mitos criados não foram confrontados com fatos reais, e, com isso, assimilaram-se à esfera cultural que esses dois grupos constituíam. Assim, diminui-se neste momento a possibilidade de futuramente conhecer a verdade sobre esse mito. O valor negativo atribuído ao grupo dos Outsiders é fortalecido à medida que o tempo passa. Entre índios e europeus ocorreram muitas inverdades, principalmente nos manuscritos levados para outros continentes, narrando as aventuras dos exploradores em terras desconhecidas. Exageros foram aceitos devido à impossibilidade de questionálos, e, com isso, criou-se uma substituição do real pelo imaginário, o que Baudrillard (1981:9) define por simulacro6: Já não se trata de imitação, nem de abordagem, nem mesmo de paródia. Trata-se de uma substituição do real dos signos do real, isto é, de uma operação de dissuasão de todo processo real pelo seu duplo operatório, máquina sinalética metaestável, programática, impecável, que oferece todos os signos do real e lhes curto-circuita 79 80 O índio na esfera cultural brasileira todas as peripécias. O real nunca mais terá oportunidade de se produzir – tal é a função vital do modelo num sistema de morte, ou antes de ressurreição antecipada que não deixa já qualquer hipótese ao próprio acontecimento da morte. Hiper-real, doravante ao abrigo do imaginário, não deixando lugar senão à recorrência orbital dos modelos e à geração simulada das diferenças. O pensador francês, Guy Debord (1997) analisa como o espetáculo paira acima do real, “com seu objetivo e sua mentira”, e classifica o espetáculo em três tipos: em primeiro lugar, concentrado, em seguida, difusa, e, em terceiro, a que se forma a partir destas duas, o espetacular integrado. A forma do espetacular integrado manifesta tanto uma ideologia (concentrada) quanto os interesses mercadológicos e de consumo do público (difuso), e, dessa forma, compreende-se que a sociedade moderna cria uma dependência dos meios de comunicação na formação do senso crítico: O espetáculo confundiu-se com toda realidade, ao irradiá-la. Como era teoricamente previsível, a experiência prática da realização sem obstáculos dos desígnios da razão mercantil logo mostrou que, sem exceção, o devir-mundo da falsificação era também o devirfalsificação do mundo. Exceto uma herança ainda considerável, mas com tendência a diminuir, de livros e construções antigas – que são, aliás, cada vez mais selecionados e considerados de acordo com as conveniências do espetáculo -, já não existe nada, na cultura e na natureza, que não tenha sido transformado e poluído segundo os meios e os interesses da indústria moderna. A própria genética tornou-se plenamente acessível às formas dominantes da sociedade” (DEBORD, 1997: 173) Seguindo nesta interpretação, avalia-se que, para Norbet Elias, a falta de contestação da mentira a confere uma nova qualidade que pode ser, no mínimo, o benefício da dúvida. A verdade deixa de existir quase que por completo, ou fica limitada a hipóteses sem condições de sustentação. A mentira abafa também a opinião pública: se esta já não era ouvida, agora fica praticamente impossível ser autoconstituída, trazendo consequências para diferentes setores da sociedade, como a política, ciências aplicadas e a justiça. Eric Landowski (1992:20), sobre a opinião pública e seus porta-vozes (a imprensa), afirma que existem dois setores em especial que se auto-intitulam no direito de representar a opinião pública: a política e o jornalismo. Os homens políticos acreditam estarem sintonizados com a demanda social, e os jornalistas por pensarem que realmente escutam a opinião pública. Mas, em ambos os casos, apenas representam uma parte do todo, singularizam algo que é plural, pois não conseguem representar todos os grupos, apenas os mais acessíveis e convenientes. A esfera cultural brasileira descende de códigos que tiveram origem no choque cultural entre europeus e índios, assim como, também, de outras interferências Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. Giselle Piragis Zogaib culturais ao longo de cinco séculos. Inicialmente, europeus versus indígenas, em seguida, brasileiros versus imigrantes. A cultura brasileira reúne mitos de diferentes histórias provenientes de outros continentes, ou de suas próprias terras. Os conceitos foram gerados a partir de uma infinidade de assuntos que transitavam entre as pessoas e influenciavam os textos culturais escritos e traduzidos pela livre interpretação que a capacidade humana pudesse desejar: as cartas e os diários são algumas dessas fontes. O matemático dedicado ao estudo da antropologia, Bronislaw Malinowski (1986), também afirma que os mitos criados a partir destas constantes trocas de informações entre diferentes culturas influencia os que descendem deles, como se pode verificar: Tal como existe em uma comunidade selvagem, isto é, em sua forma primitiva viva, o mito não é apenas uma história contada, e sim algo vivido. Não possui a mesma natureza da ficção que podemos ler hoje em um romance, mas é uma realidade viva, considerada como tendo realmente acontecido em tempos primitivos e que, desde então, continua a influenciar o mundo e seus destinos humanos. (MALINOWSKI,1986) Em outras palavras, o semioticista da cultura, Yuri Lotman (2004), em seu estudo sobre o determinismo e o acaso, afirma que “os mecanismos que asseguram a individualidade da configuração do enredo de um Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. dado texto são complexos e multiformes”. Entre esses mecanismos, Lótman aponta que na realização do enredo, as palavras que aparecem com frequência no texto, devido à necessidade de sua repetição, ganham significados fixos, passam a realizar ligações entre diferentes situações e sofrem um processo de “mitologização”. Tornam-se sinais-símbolos de culturas que acabam sendo associadas a outros enredos, independentes do enredo que deu origem a esses significados. Quando essas palavras são inseridas em novas narrativas, apenas pela necessidade de nomear elementos, acabam acrescentando mais significação, além de uma denominação. Elas passam a desenvolver construções de novos enredos a partir de um texto no qual o significado, quanto sinal-símbolo, não estava vinculado, e é desta forma que o símbolo pode se tornar um texto completo (Lótman, 1990). Lótman denomina estas palavras por “temas” da narrativa e lembra que o enredo é a base onde tecem as distintas situações-motivos que fixam os temas. Para ele, A capacidade de qualquer realia do enredo transforma-se em tema depende de vários fatores. Em primeiro lugar, trata-se de assinalar aqui a importância de um dado elemento em um determinado sistema de cultura. Ao perpassar em cada um de seus estratos de época, realiae como “casa”, “estrada”, “fogo” impregnaram-se de ligações associativas tão ricas e complexas que, tendo em vista o enredo original, sua inserção no texto cria imediatamente inúmeras 81 82 O índio na esfera cultural brasileira possibilidades potenciais de desvio imprevisíveis da narrativa. (LOTMAN, 2004: 86) No século XVI não existia a figura do índio para no imaginário europeu, ao menos não a respeito do índio brasileiro, e, por isso, a palavra índio não poderia representar algo significativo, era basicamente uma palavra. As cartas trouxeram uma mensagem, uma informação codificada que os receptores decodificaram, segundo os signos já existentes. Histórias como a do fuzileiro alemão Hans Staden, que ficou preso entre os antropofágicos tupinambás, em 1554, traduzem uma imagem sobre os índios, determinada a partir da interpretação do narrador sobre os códigos culturais incompatíveis a sua cultura e à situação de conflito em que estava envolvido. No caso de Hans Staden, esses elementos foram determinantes para a definição de uma imagem negativa sobre os índios. Em romances como os escritos por José de Alencar, na metade do século XIX, o tema índio, após três séculos de presença em enredos, sofreu novos processos de “mitologização”. O índio deixa de ser apenas o selvagem ou primitivo para agregar novos valores quanto sinal-símbolo de um texto cultural modificado. Assim, o índio já poderia ser interpretado, também, como o homem da sociedade que, quando aceita as regras sociais estipuladas, é bem visto pela burguesia (Holanda, 1988). A alteridade estabelecida nesse processo era fundamental porque, como explica o historiador Francisco Moraes Paz: A pós-modernidade desfez tantas alteridades que chegamos ao impasse da definição de nosso outro. Feito para ser exterminado, rejeitado ou seduzido, agora é reconhecido e compreendido. Neste sentido, a alteridade dá lugar à interação, e o sujeito não é o outro de ninguém. Ocorre que a utopia da diferença, além de separar os termos, os unifica. O Bem não existe sem o Mal, tal como o Céu e o Inferno ou a Civilização e a Barbárie. (PAZ, 1996. pg. 24) O sociólogo Edgar Morin (2005:59) entende que, no século XVIII, o imaginário popular abandona as tradições orais para se fixar na tipografia. Romances vendidos por ambulantes de casa em casa eram os responsáveis por difundir os contos de fadas, lendas, narrações fantásticas do folclore etc, e acabavam por introduzir também novos temas. Para Morin, esse contexto fez com que, no imaginário popular houvesse uma intensa valorização do extraordinário, mais do que o habitual; com isso, passou a se interessar mais a projeção no personagem do que a identificação com ele. Aconteceu um estreitamento da relação do leitor com o herói, e motiva o público a buscar seus objetivos. Um exemplo do poder do espetáculo difuso (Debord, 1997), onde um estímulo intencional pode direcionar a força da massa. Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. Giselle Piragis Zogaib Segundo o economista Celso Furtado (1999: 64), no quadro cultural do século XVIII, o povo estava reduzido a uma referência negativa, a criatividade artística nacional não tinha valor. Por outro lado, novos escritores buscavam ultrapassar esta barreira cultural com obras que tinham na figura indígena a imagem do herói nacional. Carlos Gomes e José de Alencar, por exemplo, transformavam a realidade e os valores tradicionais dos índios para revesti-los com valores da cultura européia. Pode-se dizer que “O indianismo de um Carlos Gomes ou de um José de Alencar, ao revestirem os homens da terra de valores que lhes são culturalmente estranhos, traduz em realidade a rejeição dos valores do povo verdadeiro”. A liberdade civil, mesmo no caso da liberdade tutelada, permitia aos índios distanciarem-se do estigma social ligado à escravidão. Ao mesmo tempo em que alguns índios aceitaram o papel de tutelados, assimilando as mudanças, outros deixaram de serem escravos porque apresentaram resistência aos estigmas e se isolaram ou morreram. E completa Francisco Moraes Paz: Os colonizadores acreditavam que os índios eram dotados apenas de uma razão parcial, incapazes de construir um estado, administrar patrimônios particulares ou construir uma cultura e, por isso, acreditavam no direito a dominação (PAZ, 1996). Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. O sociólogo, Sérgio Buarque de Holanda tece sua observação sobre o estigma ao destacar em Raízes do Brasil o trato da sociedade com os índios. Para o autor, a ociosidade, a gula, o desleixo e atividades predatórias (características tradicionais também aos padrões nobres de comportamento) não eram pecado e faziam parte da identificação do burguês com o índio. E mesmo o casamento entre eles deixou de ser mal visto, desde que o índio correspondesse a características que lhe foram doadas, como se pode observar: E deve ser por isso que, ao procurar traduzir para termos nacionais a temática da Idade Média, própria do romantismo europeu, escritores do século passado, como Gonçalves Dias e Alencar, iriam reservar ao índio virtudes convencionais de antigos fidalgos e cavaleiros, ao passo que os negros deviam contentar-se, no melhor dos casos, com a posição de vítima submissa ou rebelde. (HOLANDA, 1988. p. 26) Textos como este é que deram um sentido à palavra índio, tornando-a tema. E, hoje, pelo popular, são imaginados como povos marginalizados à sociedade, dependentes economicamente e etnicamente isolados. Marginalizados porque estão à margem da esfera cultural brasileira, na zona definida como semiosfera pelos semioticistas da cultura - área mais suscetível a sofrer com os códigos culturais. Ainda, hoje, constantemente os índios entram em choque com 83 84 O índio na esfera cultural brasileira valores, são estigmatizados para o bem ou para o mal, normalmente quando estão tentando sobreviver à morte, mesmo que esta seja a morte negativa apresentada por Baudrillard (2007) e citada no início deste estudo7. Mas o sentido polarizado atribuído ao índio atualmente sofre a interferência de mais um fator, o índio como símbolo é aplicado e utilizado nos enredos do jornalismo condizendo com o interesse do público. O espectador ou leitor está ainda mais interessado em uma história espetacular do que propriamente em se projetar no herói ou se identificar com a narrativa (Cervi, 2007), ainda que busque a si próprio no espelho da mídia. O semioticista Ivan Bystrina (1995) afirma que o pólo negativo é sentido sempre muito mais forte que o positivo porque desperta a necessidade de superação. No Século XX, segundo Edgar Morin (2005), isto é estímulo para uma boa história na mídia, porque desperta a curiosidade sobre como será a luta pela vitória. Nada de muito sacrificante, nem extenso, mas dramático o suficiente para permitir que o público reconheça na narrativa os mesmos elementos do seu cotidiano e, assim, projete o Happy End8 em sua própria vida, mesmo que isto seja apenas um simulacro. E, justamente porque o Final Feliz é uma constante, obcecadamente esperada pelo público, a maneira em que se desenvolve a história tornou-se a maior responsável por apreender o interesse do público nos meios de comunicação. Assim foi no caso amplamente divulgado pela imprensa, em 18 dias de publicação, sobre um índio que era o símbolo do Bom Selvagem, “o caciquesímbolo da pureza ecológica” como foi apresentado pela Revista Veja, em 10 de junho de 1992, o índio Caiapó, Paulinho Paiakan. Ele era um bom exemplo do que José de Alencar tentou exprimir em O Guarani, mas sua bela história foi interrompida por uma acusação de estupro, e o herói tornou-se vilão. Um caso de assimetria por inversão, conforme o Semioticista da Cultura, Ivan Bystrina, qualificaria segundo seu estudo sobre a estrutura dos códigos culturais. Se a imprensa se limitasse a retratar Paiakan como o índio bom que se tornou mau, a estrutura polar que melhor exemplificaria seria a de assimetria por identificação, onde Paikan poderia ora ser o bom selvagem, ora o mau selvagem. No entanto, neste caso de acusação de estupro contra Paiakan, prevaleceu na imprensa o conceito negativo sobre sua imagem, resultando em 7 Referente à segunda citação. 8 Happy End e Final Feliz estão escritos com a primeira letra em maiúscula para atribuir um status conceito pela autora, porque há uma interpretação de que este termo seja algo que está instituído como tema, segundo definição de Iuri Lótman (2004). Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. Giselle Piragis Zogaib uma estrutura polar de assimetria por inversão, onde seu valor negativo tornou-se inquestionável e inalterável. Pois neste caso, até mesmo o histórico de bom índio não surtiu em boa repercussão, como foi demonstrado, pelos veículos analisados, em afirmativas de que Paiakan vendia suas entrevistas a repórteres americanos. Em outro caso intensamente divulgado pela imprensa, ocorrido em abril de 1997, um índio foi queimado vivo em um ponto de ônibus em Brasília. O crime contra o índio Pataxó Galdino de Jesus dos Santos foi planejado por cinco jovens, educados, de classe média, que diziam não ter a intenção de matar e desconheciam que a vítima era um índio. Nesse caso, também ocorreu o que o semioticista da cultura definiria como assimetria por inversão, mas neste contexto o sentido negativo se refere à morte do índiomito. Pois, observou-se uma intensa necessidade de superação deste mito, por representar um inimigo da situação política e econômica levantadas em sua luta pela demarcação das terras indígenas, e que envolvem governo e imprensa. No entanto, neste caso também ocorrem casos de assimetria por supressão da negação, onde sistemas são pluricompostos pela tríade: bem, mal e neutro, e não apenas binários, e onde o índio-mito, agora como conceito positivo, cumpre seu papel de prevalecer sobre o mal, a perda das terras indígenas, por exemplo. Em oposições assimétricas como Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. esta, pólos opostos podem oscilar entre positiva e negativamente. Ainda, neste caso, no dia 24 de abril de 1997, quando os jornais Folha de São Paulo e O Estado de São Paulo dão destaque de uma página, na primeira página dos cadernos Cotidiano, na Folha de São Paulo, e Geral, no O Estado de São Paulo destacam a invasão de fazendas próximas à aldeia pataxó pelos índios, é apresentado mais um exemplo de assimetria, mas neste momento envolvendo os índios e não mais apenas Galdino, o índio-mito. Aqui, ocorre a assimetria por identificação, pois os índios que ora são bons, neste momento também são maus, sem anular aspectos positivos. Apesar da cobertura do evento destacar os motivos da invasão como justificáveis (positivo), mas condenam a forma (negativo) como os índios detiveram na aldeia o presidente da Funai e jornalistas após o enterro de Galdino de Jesus dos Santos. Além disso, nos dias que sucederam a esse acontecimento e nos posteriores, os índios são enquadrados com conceitos positivos, principalmente Galdino, que não era apresentado como Índio Galdino, como ocorreu no caso Paiakan, mas como Santos, atribuindo uma relação de identificação com o leitor. O Final Feliz nos dois casos está no julgamento e punição dos culpados, e na restauração das honras das vítimas, mesmo que seja em memória, como no 85 86 O índio na esfera cultural brasileira caso do índio Galdino. Nas coberturas da imprensa, o Final wFeliz de Silvia Letícia foi marcado no dia 20 de junho de 1992, com o indiciamento de Paiakan; e o do índio Galdino, no dia 28 de abril 1997, com o ato pela memória do índio. No entanto, Edgar Morin fala sobre dois tipos de Happy End: o otimista que favorece o sistema social e o privado que diz respeito à busca individual pela felicidade, ainda que fictícia. O privado é negativo porque o indivíduo acredita estar seguro, mas os perigos que o amedrontam são imaginários. Mas o otimista é assim definido porque está baseado nessa valorização mitológica da felicidade para fortalecer o sistema social. Sendo assim, Esses dois aspectos – negativos e positivos – mostram que o happy end dá uma forma imaginária sintética às aspirações vividas que adquirem consistência no Welfare State9 e na busca da felicidade privada. A tirania do happy end corresponde ao novo demos. (MORIN, 2005: 97) Nos dois casos divulgados pela imprensa, na década de 1990, o Happy End é otimista porque nos dois momentos a opinião pública (expressa através da imprensa) exigia justiça, faziam manifestações e abaixo-assinados. No caso Paiakan, isso é observado no dia 11 de junho de 1992, nos jornais Folha de São Paulo e Estado de São Paulo, e na edição do dia 17 de junho de 1992 da Revista Veja. No caso Galdino, as manifestações ocorreram praticamente todos os dias de 21 e 28, apenas os dias 24 a 26 não divulgaram nenhum tipo de manifestação popular. A Revista Veja comentou as manifestações sobre o caso em sua única edição, no dia 30 de abril de 1997. Divulgar essas manifestações vai um pouco mais além do que apresentar à opinião pública sobre este fato. Atinge-se o nível do espetáculo, da tentativa de direcionar o olhar do leitor, e interferir em suas avaliações e opinião. Manifestações, assassinatos e estupros, sensibilizam o público e prende sua atenção e ele passa a procurar por uma justificativa, ou apenas conhecer o desfecho do caso mesmo que espere sempre pela justiça. Os leitores, de modo consciente, sabem que não estão envolvidos diretamente com as histórias narradas pela imprensa, mas o leitor, agora no singular, de modo inconsciente poderia projetar-se nos personagens e espera pelo Final Feliz, ou, ao menos, por uma boa resposta, porque sente a necessidade da supressão da negação, e da sobrevivência diante das adversidades (MORIN, 2005:82). O autor: Diferentes fatores favorecem a identificação; o ótimo da identificação se estabelece num certo equilíbrio de realismo e de idealização; é preciso haver condições de verossimilhança e de veridicidade 9 Welfare State: Estado de bem-estar. Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. Giselle Piragis Zogaib que assegurem a comunicação com a realidade vivida, que as personagens participem por algum lado da humanidade quotidiana, mas é preciso também que o imaginário se eleve alguns degraus acima da vida quotidiana, que as personagens vivam com o comum dos mortais. É preciso, também que as situações imaginárias correspondam a interesses profundos, que os problemas tratados digam respeito intimamente a necessidades e aspirações dos leitores ou espectadores; é preciso, enfim, que os heróis sejam dotados de qualidades eminentemente simpáticas. (MORIN, 2005:82) O texto do repórter, reproduzindo a opinião pública ou não, representa o real, siginificando-o, a ponto de torná-lo sinal-símbolo – ausência de realidade profunda -, conceito, cria um simulacro. Independente do período em que cada história se passou, o paradigma é detectado quando se percebe que suas semelhanças com outras histórias não são ao acaso. Não se trata apenas de um padrão, um modelo persuasivo, ou uma cartilha a ser seguida, mas de um fato natural que determina as ações do homem desde seus primórdios: o estranhamento ao que não está em sua organização: “Deste modo, o mito humanista do homem sobrenatural reconstituiu-se no próprio seio da antropologia e a oposição natural/cultural assumiu a forma de paradigma, quer dizer, de modelo conceptual que dirige todos os seus discursos”. (MORIN, s/ano). Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. Para o Semioticista da Cultura, Iuri Lótman (2004) dizer que o resultado de um acontecimento foi determinado pelo acaso é o mesmo que afirmar que desconhece os motivos que o determina. Neste caso, o acaso é uma soma de fatos que tem como consequência um resultado esperado, mesmo que a isto seja atribuída à sorte, ou à falta dela. E por isso que, muitas vezes, se observa o mesmo fato acontecendo diversas vezes, mesmo em períodos diferentes da história da humanidade. Esses fatos não precisam ser necessariamente iguais, mas semelhantes como acontece com a imprensa na forma como consegue sempre lidar com a opinião pública. Também, não é ao acaso que um símbolo torna-se um texto completo, em ambos os casos é uma relação. A repetição de uma palavra em determinado contexto leva a uma associação do termo com o conceito utilizado na narrativa. Não é por acaso que ocorrem os choques culturais, há sempre a necessidade de dominar o outro antes que o dominador seja dominado. O poder de lidar com a opinião pública e o estigma social são exemplos de tentativas com o objetivo de manter certa ordem na esfera cultural, bem como organizar os conflitos internos para que não desestruturem todo o conjunto. É muito mais seguro para os que lideram a ordem da esfera cultural criar um simulacro, que propicia um certo controle sobre o momento do 87 88 O índio na esfera cultural brasileira sofrida; por isso, a facilidade em dominar e de se impor. Portugueses e espanhóis eram povos que estavam acostumados a essa situação de caos, justamente por este potencial explorador, eram vistos como sem raízes por outros povos europeus mais tradicionais e sem tanta vocação para exploração dos mares (Holanda, 1988). Norbert Elias lembra que um grupo consegue estigmatizar outro quando está instalado de forma que o grupo estigmatizado seja excluído do poder, mas não da vida social, afinal, toda cultura precisa da contra parte para existir, ou seja, da mais básica relação binária, vida versus morte. Por algum motivo, isso faz lembrar a passagem em que os jesuítas rezam a primeira missa no Brasil, ilustrada na tela de Victor Meirelles, de 1861: FIGURA 1: Primeira Missa. Tela de Victor Meirelles, de 1861. FONTE: Museu de Arte do Rio Grande do Sul – MARGS. Disponível em: http:// www.margs.rs.gov.br/ tour_virtual.php Happy End, do que lidar com as surpresas e imprevistos do real. Também não foi por acaso que o processo de conquista de novos territórios, realizado pelos portugueses e espanhóis, estava em uma posição privilegiada. A iniciativa de ultrapassar os limites da semiosfera, da própria esfera cultural, os preparou, mesmo que inconscientemente, para uma desordem, colocando-os em posição superior aos índios. Outsiders que não esperavam por um conflito na proporção Afixar o rótulo de ‘valor humano inferior’ a outro grupo é uma das armas usadas para manter sua superioridade social. Nessa situação, o estigma social imposto pelo grupo mais poderoso ao menos poderoso costuma penetrar na auto-imagem deste último e, com isso, enfraquecê-lo e desarmá-lo. Conseqüentemente, a capacidade de estigmatizar diminui ou até inverte, quando um grupo deixa de estar em condições de manter seu monopólio das principais fontes de poder existente numa sociedade e de excluir da participação nessas fontes outros grupos independentes – os antigos outsiders.” (ELIAS, 200:24) Justamente pela necessidade de sobreviver às relações binárias, ao perceber o enfraquecimento Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. Giselle Piragis Zogaib do grupo dos Estabelecidos, o grupo inferiorizado tende retalhar com uma contraestigmatização. Alguns dos exemplos citados por Elias são os negros na América e os operários, mas também se enquadram nesse grupo os índios que, a exemplo de suas contraestigmatização, organizam retaliações aos “brancos” para fazer valerem seus direitos à saúde, à demarcação de terras, entre outros fatores vitais para suas sociedades, baseando-se no princípio de que nada precisariam se não lhes tivessem roubado. Lembrando, ainda, que se enquadram na denominação “brancos” todos os que não são índios, ou seja, a não-cultura indígena. A impossibilidade de segregar cada fase, e cada um dos períodos da história de uma esfera cultural, está justamente na contribuição de cada etapa na organização do que sempre há de mais recente. Na realidade, contemporânea, por exemplo, com seus romances, crônicas, contos, etc, adaptados aos mais diferentes meios de comunicação – em evolução constante, como a TV, o Cinema, as novas tecnologias de comunicação virtual – observam-se alguns desses códigos que sobreviveram aos séculos de busca por uma identidade. Um vaivém sempre diferente que pretendia nada mais do que um formato capaz de melhor representar as sociedades, suas ânsias, fobias e sonhos repetidos em cada nova experiência. A Imprensa No exemplo da representação dos povos indígenas pela imprensa, a aplicação prática destes estudos voltase à identificação dos fatores que levam a imprensa a retratar o índio como vilão, selvagem, ou como o coitado, que vive à margem da sociedade. Acredita-se que ao longo da história da sociedade brasileira (grupo cultural em questão neste momento), os signos responsáveis pela identificação e geração de conceitos sobre os índios sofreram uma re-significação (Lótman, 2004), assimilando e alterando os conceitos existentes para valores que correspondiam à ordem intracultural desta sociedade10 organização responsável por estabelecer as fronteiras da cultura de uma coletividade. Por volta de 1500, Hans Staden e outros exploradores, além da fama de heróis desbravadores, tratavam os índios da mesma forma que tratavam os recursos naturais, como mercadorias na sociedade mercantilista (Romano, 2004). José de Alencar, assim como Gonçalves Dias e outros escritores do Romantismo descendentes de códigos culturais pós-Iluministas, viam no índio a figura 10 Expressão intracultural e extracultural utilizadas a partir de uma interpretação dos conceitos da Semiótica da Cultura apresentados por Norval Baitello Jr (1999). Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. 89 90 O índio na esfera cultural brasileira do herói nacional e projetavam nessa imagem a figura de uma sociedade que atravessava uma crise política, econômica e social. Por estas re-significações, o índio hoje representa um personagem. Perdeu sua identidade quanto indivíduo e está subjugado aos valores sociais que a sociedade através da mídia lhe atribui. Isso ocorreu porque o índio-signo, homem social11 ficou perdido no passado, escondido atrás das re-significações criadas pelas histórias de viajantes e escritores ao longo do tempo. Inverdades não foram questionadas e acabaram por anular o índio real, como foi explicado no início deste capítulo. Sobre isto, o etnólogo e filósofo, Frédéric Rognon (1991) também teceu seu comentário: Sociedades da ordem, sociedades da harmonia, sociedades sem repressão nem Estado, sociedades de abundância: tantos lemas, tantas manifestações contra a modernidade desordenada, desarmoniosa, repressiva e ameaçada pela penúria. A crítica de tal discurso é fácil, pois ele nada mais é do que a imagem invertida das ideologias que o precederam. É o reflexo das preocupações e das angústias de uma época. Donde o sucesso na mídia e entre o grande público. Suprema alienação para o selvagem: retira-se-lhe o direito à palavra ou espera-se seu desaparecimento para glorificá-lo (ROGNON, 1991:130). É dessa falsa realidade, ou seja, de uma simulação da figura do índio, que a sociedade em geral tem como referência. O personagem ocupa o papel do índio real, apesar deste índio ainda estar fisicamente presente na sociedade brasileira, não é identificado conforme seus valores reais, mas pelos valores que lhe foram atribuídos. Simulações e, eventualmente, simulacros quando há a necessidade de preencher lacunas nas mudanças que ocorrem nos códigos culturais, conforme analisa Jean Baudrillard (1981). Os valores culturais não são transmitidos apenas pela mídia, mas, atualmente, devido à expansão dos meios de comunicação, a mídia tem ocupado um espaço cada vez maior na vida das sociedades. Não são apenas as tecnologias que favorecem esta dinâmica, mas os critérios para transformar um fato em notícia e, a partir disto, o potencial da informação em gerar comentários, por um grande período tempo ou com uma grande intensidade, mesmo que em um curto espaço de tempo. Como exemplo, o caso do índio Paiakan, que foi publicado durante dezoito dias nos jornais impressos, e do índio Galdino que durou apenas uma semana, mas com uma média de duas páginas diárias sobre o acontecido e fatos relacionados. Está entre os critérios de noticiabilidade o sensibilizar e mobilizar o 11 Em referência a participação dos índios na sociedade brasileira, e não em relação aos seus povos e comunidades. Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. Giselle Piragis Zogaib público, seja para sentimentos positivos como a vitória da vida sobre a morte, ou negativos como o ódio e o desejo de justiça por um crime cometido (Cervi, 2007). Uma boa informação deixa margem para exploração de assuntos relacionados aos desdobramentos do fato principal, como no caso, por exemplo, do índio Paiakan, a exploração de madeireiras em reservas ambientais, a imputabilidade dos índios brasileiros e o abuso sexual cometido às crianças e aos jovens. No caso do índio Galdino, a falta de limites dos jovens, a demarcação de terras indígenas, os direitos indígenas e as discriminações sofridas pelas classes menos favorecidas como os índios, negros e mulheres. Entre estas “histórias de imprensa”, mudam os personagens, os cenários, as datas, mas, a essência da informação e a crítica continuam, em base, as mesmas, atendendo aos padrões informativos (Cervi, 2007). Os meios de comunicação, nas últimas décadas, têm ocupado um importante espaço de forma individual e grupal na sociedade. O sistema projeção-identificação, a re-significação ou reapresentação (Baitello, 2005) dos signos são algumas das mudanças nos códigos culturais causados pela mídia. São mudanças que normalmente já ocorreriam, mas com a contribuição dos meios de comunicação foram intensivadas e direcionadas de acordo com os critérios de ordem social adotados pelas instituições que têm o poder de decisão na sociedade. Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. Para o historiador Renato Ortiz (2003), o Estado deve estimular a cultura como meio de integração, mas sob o seu controle, para que se atenda aos Objetivos do Estado: A noção de integração, trabalha pelo pensamento autoritário, serve assim de premissa a toda uma política que procura coordenar as diferenças, submetendo-as aos chamados Objetivos Nacionais. (...) Não estou sugerindo com isto que esse controle é absoluto. Existe evidentemente um hiato entre o saltar é que esta ideologia ao se voltar exclusivamente para a repressão, mas possui um lado ativo que serve de base para uma série de atividades que serão desenvolvidas pelo Estado. (ORTIZ, 2003:83) Desde o século XIX, com o desenvolvimento do tipógrafo e da imprensa, depois com o rádio e a televisão, os padrões de consumo mudaram e com as alterações ocorridas vieram os novos padrões de comportamento. Na última metade do século XX no Brasil, algumas das mudanças aconteceram na imprensa, devido às exigências políticas e sociais, são exemplos de como elas acontecem desde o século XIX. Na década de 1960, os meios de comunicação em geral precisaram adaptar suas programações e formatos: primeiro, em obediência às exigências políticas da ditadura militar; em seguida, para tentar burlar a censura e informar os leitores, ouvintes e espectadores sobre a crise política que o país atravessava. 91 92 O índio na esfera cultural brasileira Para isso, a criatividade aprimorou a união já existente entre informação e entretenimento como forma de transmitir o conteúdo que interessava a uma parcela da população preocupada em estar informada. Alguns anos depois, essa criatividade continua a servir os interesses dos meios de comunicação, mas de forma a direcionar o olhar da massa para a ordem social que os poderes determinam como melhor padrão de comportamento. O excesso de informação, de re-significações, inibe a capacidade de formação da opinião própria do indivíduo, ao menos para a maioria da sociedade, subjugando-a, assim, à opinião pública (Landowski, 1992). Um fato possível de virar notícia normalmente está baseado na realidade, no entanto ao ser transformado em notícia passa do real para a representação do real. O real bruto passa a ser representado por imagens do real. Em um estudo específico sobre imagens, mas compatível com esta reflexão, Norval Baitellor Jr. (2005) analisa imagens como suportes de memória onde há uma apropriação simbólica ou não da imagem, seja ela um conjunto de elementos visuais, sonoros, oufativos, gustativos ou espaciais, como uma antropofagia. As formas de apropriação (simbólica ou não) como manifestação da antropofagia são ainda muitas outras; a apropriação do espaço e seus recursos, a apropriação do tempo e seus atributos, a apropriação das mentes e suas imagens nem sempre passam pela relação direta de apropriação entre dois corpos, sofrendo nestes casos um processo de mediação pelas imagens. É então que teremos o surgimento da iconofagia. (BAITELLO, 2005: 94) A imagem como suporte de memória surge, portanto, da apropriação da imagem real. A iconofagia descrita por Baitello é a transformação do real na simulação do real, a criação do não-real, citada por Baudrillard (1981). A antropofagia também está presente quando o fato em questão é uma representação da realidade, estigmatizado e assimilado aos códigos culturais como verdade. Neste caso, a representação é um simulacro, pois há uma representação do que nunca existiu ou do que já não existe mais, pois perdeu seu caráter real, tornou-se irreal. Ou seja, como os índios que já perderam seu poder como signos, e tornaramse re-significações, representações do índio, de uma irrealidade. Tanto é que, Na construção de um conjunto de imagens, sejam elas pertencentes ao universo icônico visual ou sonoro, sejam elas pertencentes a outros universos (verbais, performáticos, olfativos, gustativos), é notável a utilização de imagens precedentes como referência e como suporte de memória. Assim, a representação de um objeto não é apenas a representação de algo existente no mundo (concreto, das coisas, ou não concreto, das não-coisas), mas também uma re-apresentação das maneiras pelas quais este algo foi já Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. Giselle Piragis Zogaib representado. Em outras palavras, toda imagem se apropria das imagens precedentes e bebe nelas ao menos parte de sua força”. (BAITELLO, 2005: 95) É com base neste suporte de memória que há a resignificação do índio, aqui, como exemplo em questão. O índio bom ou mau é uma relação assimétrica, pois devido ao fato do índio não ser mais uma realidade, mas uma representação da realidade, ele é definido como bom ou mau em função do contexto em que esta representação é inserida. E, novamente, sofre adaptações quanto a sua re-significação, respeitando os objetivos de integração e ordem social do Estado e outras instituições de poder, como os meios de comunicação. Tanto que um índio ora definido como símbolo do bom selvagem, em outra ocasião pode servir a uma situação em que melhor cabe identificá-lo como apenas o mau selvagem. No entanto, estas situações não são criadas do nada, sempre existem outros fatores que reunidos criam a oportunidade para determinada situação tornar uma representação positiva ou negativa. Segundo Lótman (2004), acreditar que alguma coisa acontece por acaso, é o mesmo que assumir desconhecer os motivos que levaram a determinada situação, mas nunca que elas surgiram do nada. Portanto, toda notícia surge de uma reunião de fatos consecutivos que contribuíram Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. para a construção de uma realidade ou uma nova representação do irreal já representado. Em entrevista a esta pesquisa, o representante dos povos indígenas brasileiros na Organização das Nações Unidas (ONU), Marcos Terena, quando questionado sobre o impacto das notícias sobre Paulinho Paiakan na participação dos índios na Conferência pela Biodiversidade, a Eco-92, ou Rio-92, responde que compreende que todos os tipos de movimento sociais ou políticos precisam da mídia como aliada, assim como a mídia também precisa destes eventos, mas para os índios, os movimentos não nascem deste princípio, nascem das questões da terra, dos direitos humanos, da diversidade, e a mídia avalia estas questões de acordo com esses interesses: De maneira geral quando a Veja coloca na capa, em plena RIO 92, que foi o grande movimento ecológico do mundo, o termo “O Selvagem”, o titulo da capa era “O Selvagem” e o retrato do Paikã com toda sua indumentária tipica do Caipó, cocar, cores, etc... isso foi uma afronta muito grande contra os povos indígenas, não a figura do Paikã, mas a figura do índio, do selvagem. Isso é o que tentamos combater, com esses movimentos, com esses debates, os jogos indígenas, enfim. (...) Aquilo poderia ter um outro título “O Bom Selvagem”, por exemplo, e nós teríamos a mesma crítica, porque nós não queremos ser tratados como uma figura exótica, como a de que nós só fazemos coisas certas ou só fazemos coisas erradas, mas queremos ser tratados como ser humano comum com 93 94 O índio na esfera cultural brasileira falhas, defeitos e um ponto muito básico também, com direitos. Nós realmente temos direitos, mas também responsabilidades e deveres. E também é uma forma de preconceito achar que os indios so têm direitos, que podem fazer o que quiser, mas têm que ter responsabilidade em seus atos (...), e com a figura do indio incapaz, isso favorece a manipulação. O fato do índio, Paulinho Paiakan, ser acusado de estupro por uma jovem, só pôde existir porque uma sequência de fatos criou a oportunidade para esta informação receber a atenção que teve da imprensa. Paiakan era um índio conhecido por representar o bom selvagem, mas não escondia outros hábitos de vida como, por exemplo, o de homem selvagem que seduz as mulheres (VEJA, 1992), algo típico das histórias de aventuras e romances como O Guarani, conforme já foi dito. A acusação contra Paiakan pode ser verdade ou inverdade com objetivos escusos de um ou mais poderes, mas vestiu-se de realidade a partir do momento em que fatos e hábitos tornaram esta acusação uma possibilidade. Paiakan, mesmo sem ter as provas divulgadas pela imprensa, foi condenado pela opinião pública conforme foi apresentado pelos representantes da voz do povo (Landowski, 1992) – imprensa e políticos. O povo também condenou, segundo a imprensa e representantes do governo, os cinco jovens que queimaram o índio Galdino. Enquanto o assunto repercutia em Brasília, o público questionou o fato de os índios correrem o risco de ficarem para fora da pensão, mas também questionou os motivos que levaram aqueles jovens a cometer ato tão primitivo, mas sempre impulsionada pela imprensa. Segundo o jornalista Luiz Nassif, em suas críticas publicadas no jornal Folha de São Paulo, em 1997, e revisadas por ele mesmo em 200312 a opinião pública apenas os condenou em manifestações que clamava pelos direitos dos povos indígenas. No entanto, este estudo fez observar que houve, sim, um forte apelo pelos direitos dos índios, mas impulsionados pela imprensa e por ordens do governo que pretendia preservar sua imagem na esfera internacional. A exemplo do caso Galdino, a principio acreditou-se na possibilidade de que a mobilização realizada pelos índios tivesse sido a responsável pela repercussão, mas, apesar de compreender que isso contribuiu para alimentar a imprensa com informações, logo se percebeu a inviabilidade em crer nesta hipótese, pois a imprensa jamais perderia o controle sobre uma informação. Ela sobrevive deste controle. Em entrevista a esta pesquisa, o representante indígena Carlos Terena, relembra fatos relacionados ao caso Galdino que contribuem para confirmar esta observação: 12 NASSIF, Luiz. O jornalismo dos anos 90. São Paulo, Futura: 2003. Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. Giselle Piragis Zogaib Lá no IML eu falei para os repórteres que nós íamos fazer um velório, um protesto, e todo mundo achou legal a notícia. (...) Eu não sou ‘fazedor’ de notícia, mas se têm fatos, você trabalha com eles negativamente ou positivamente, de acordo com o que você quer fazer com a noticia. Ele é bom ou é ruim. Nós temos que ter realmente a capacidade de saber o quê que está fazendo e pra quê que está fazendo e quais as conseqüências de tudo isso. A sociedade de uma maneira geral ela vive de fatos, (...) a mídia também, o próprio jornal, o jornalismo, eles vivem de fatos. Ela repercute uma notícia aqui e dá a mesma notícia em noutro lugar com o mesmo fato. (...) A morte, por exemplo, do índio Cretã, tudo mundo já esqueceu,. A morte do Tubain, no Mato Grosso, uns anos atrás, já passou. E a morte daquele Chicão que foi sacrificado, imolado. Que o cara atirou nele e disse ‘eu matei mesmo’ Isso já passou, nem repercutiu. então a sociedade vai esquecendo porque é a imprensa que informa. E mesmo depois que o Galdino morreu nos ficamos acompanhando pari passo (...) e ninguém mais está preocupado porque isso já passou. O interesse da imprensa em direcionar o olhar da massa está relacionado ao consumo de bens materiais e não materiais. Os materiais são os bens relacionados à publicidade; os não materiais, isto é, os valores morais de ordem social, talvez sejam os mais importantes por serem os responsáveis pela manutenção de uma cultura. Como se pode notar, A sociedade modernizada até o estágio do espetacular integrado se caracteriza pela combinação de cinco aspectos principais: a 13IBOPE: Instituto Brasileiro de Opinião Pública Estatística. Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. incessante renovação tecnológica, a fusão econômico-estatal, o segredo generalizado, a mentira sem contestação e o presente perpétuo. (DEBORD, 1997:175) No período pós Ditadura Militar, os meios de comunicação necessitavam manter uma qualidade informativa, mas também desenvolver o entretenimento para atender aos novos padrões de consumo. Então estas relações de domínio sobre a informação tornam-se mais frequentes, até mesmo por uma questão de sobrevivência dos veículos de comunicação. Nesse período, as indústrias começaram a produzir mais e a classe média, como consequência, passou a consumir mais. O entretenimento vinha para prender ainda mais a atenção das massas e, dessa forma, garantir a publicidade o retorno desejado em vendas dos produtos anunciados. À medida que o IBOPE13 crescia, avançavam também as técnicas de publicidade e os recursos econômicos nos meios de comunicação pela venda de espaços publicitários. Esses recursos eram novamente investidos em estratégias para prender o leitor, ou ouvinte, ou ainda o espectador, e começam a delinear o que mais tarde se tornaria a filosofia das empresas de comunicação, o padrão de jornalismo baseado na política editorial do veículo. Sabe-se que: 95 96 O índio na esfera cultural brasileira O crescimento da classe média, a concentração da população em grandes centros urbanos vão permitir ainda a criação de um espaço cultural onde os bens simbólicos passam a ser consumidos por um público cada vez maior. Em 64 inaugura um período de enorme repressão política e ideológica, mas significa também a emergência de um mercado que incorpora em seu seio tanto as empresas privadas como as instituições governamentais. Durante o período 64-80 ocorre uma formidável expansão, a nível da produção, da distribuição e consumo de bens culturais. É nesta fase que se dá a consolidação dos grandes conglomerados que controlam os meios de comunicação de massas (TV Globo, Ed. Abril, etc). (ORTIZ, 2003:83) Para a imprensa, que deveria noticiar todos os fatos que fossem de interesse do público e do governo, era fundamental agradar a todos para evitar atritos que poderiam interferir nos interesses econômicos dos veículos de comunicação. Poderiam falar sobre qualquer coisa, desde que não prejudicasse a credibilidade do povo no governo e esses foram os resquícios do Regime Militar. Como consequência, definir a linha editorial de um veículo de comunicação poderia ser determinante para sua sobrevivência. Deste ideal de jornalismo, surgem os padrões de jornalismo com o objetivo de fidelizar o público consumidor da informação, a informação havia se tornado produto não-material. Os padrões atuam diretamente nas relações e articulações no sistema social. Para o pesquisador em comunicação, José Luiz Braga (2006): A noção de “sistemas sociais” pode cobrir uma gama variada de caracterizações, desde um patamar concreto, de instituições formalizadas e com articulações normatizadas expressamente (“sistema Globo de produções midiáticas”, por exemplo), até um padrão em que o que enfoca não é o agregado real de pessoas, grupos, idéias e objetos, mas sim “um instrumento intelectual, um procedimento heurístico, um “modelo” destinado a guiar a percepção da realidade. (BRAGA,2006:29) No entanto, os padrões de diferentes veículos não trabalham em conjunto, mas as respostas na sociedade acontecem ao mesmo tempo. Cada veículo desenvolve o padrão que melhor atende a sua política editorial, e com isso todos acabam atuando dentro de um mesmo círculo de intenções e tensões correspondente ao sistema social. O fato é que: Os diferentes dispositivos e ações específicas não fazem sistema institucionalizado entre si, mas participam, pela natureza mesmo de suas atividades, de um sistema social mais amplo, reações e inter pretações sobre a mídia e seus produtos e processos – de produzir respostas. Isso significa que atividades de uma mesma classe podem ser percebidas como desenvolvidas em diferentes estruturas e uma mesma classe de estruturas pode ser observada gerando classes de atividades diferentes. Podemos falar então em “sistemas processuais”, com relativo deslocamento em relação aos “sistemas estruturais” em que ocorrem. Dito de outro modo: é preciso pensar que os processos eram estruturas tanto quanto as estruturas se realizam em processos. (BRAGA,2006:30) Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. Giselle Piragis Zogaib O padrão estabelecido pela Revista Veja na década de 1990, por exemplo, não tinha a pretensão de mudar o sistema social, mas em viver a partir dele. Uma amostra deste estilo era o uso de pautas com citações que os repórteres deveriam tirar dos entrevistados, as polêmicas denúncias de fontes sigilosas que nunca eram apuradas de fato, apenas polemizadas. A exemplo, o caso Paiakan em que Veja não se preocupou em verificar se a acusação era verdadeira, mas na polêmica que um índio selvagem poderia gerar diante da “opinião pública” que ela mesma coordenava junto com os outros padrões de jornalismo da época – Folha de São Paulo, Rede Globo de Televisão, etc. A capa do dia dez de junho de 1992, com “O Selvagem” era surpreendente, polêmica, exclusiva, apenas com base em uma acusação mal apurada e o índio-personagem ao melhor estilo do selvagem, de Hans Staden. Mas assim como o índio era apenas um personagem baseado em fatos reais, uma simulação, o status selvagem também não representava o real, mas era a representação do selvagem que melhor cabia à situação. Conforme define o antropólogo Claude Levi-Strauss: Cada civilização tende a superestimar a orientação objetiva de seu pensamento; é, por isso, então, que ela nunca está ausente. Quando cometemos o erro de crer que o selvagem é exclusivamente governado por suas necessidades orgânicas ou econômicas, não reparamos que Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. 97 ele nos dirige a mesma censura, e que, aos seus olhos, seu próprio desejo de saber parece melhor equilibrado que o nosso. (LEVI-STRAUSS, 1976:21) Selvagem, como sinônimo de primitivo, foi a revista Veja e os jornais Folha de São Paulo e O Estado de São Paulo, entre outros veículos da época, que pretendiam apenas atender à demanda do sistema social. Agiam pelo impulso, pela primitiva necessidade de superação da mor te, ou seja, a morte simbólica e a não simbólica da empresa de comunicação e do produto da informação. Com base nesta análise, conclui-se que a imprensa utiliza os códigos culturais a seu favor e não a favor os povos indígenas. O que prevalece é a intenção de FIGURA 2: “O Selvagem”, capa da revista Veja de 10 de junho de 1992. FONTE: Revista Veja, 1922. 98 O índio na esfera cultural brasileira utilizar a informação e os códigos culturais de forma que sirvam a seus objetivos, tanto políticos quanto editoriais. Mudar esta postura equivale a uma impossível mudança mercadológica. A informação é o produto das empresas de comunicação, e a imprensa não se considera responsável por zelar pelo índio, ou por qualquer outro grupo social, no sentido de tentar mudar conceitos culturais, ela se dispõe apenas a utilizar os códigos culturais que prevalecem no momento da informação. Desta forma, não pode ser acusada de cometer algum crime, pois, como é ensinado nas escolas de jornalismo, cabe ao jornalista narrar o fato tal como ele é, e aos veículos de comunicação, publicá-los. Se culturalmente a sociedade só conhece o índio-símbolo, será sobre este que a imprensa irá falar. Caso, um dia, os índios consigam mudar esta forma de representação do índio-símbolo pela de índio-signo, este estudo leva a crer que a imprensa assim o representará. Aos índios cabe não mais aceitar serem comparados a conceitos míticos, como os de selvagem ou herói. É compreensível que mudanças culturais neste sentido revelem um verdadeiro conflito, um choque cultural, mas os resultados tendem a ser, no mínimo, uma representação menos excludente dos povos indígenas, e, como conseqüência, um fortalecimento da esfera cultural em que estão incluídos os índios e os não-índios. Considerações Finais Sempre que uma notícia sobre índios toma espaço nos veículos de comunicação, em especial quando mostram o índio autônomo, lutando por seus direitos e fazendo reivindicações, como nos casos apresentados nesta pesquisa, é comum ressurgirem críticas sobre os meios aplicados fazendo com que sejam comparados a selvagens. Em uma das pesquisas de campo, após uma manifestação por melhor qualidade no atendimento médico, onde os índios mantiveram três funcionários da FUNASA presos na aldeia até que tivessem as solicitações atendidas, o líder indígena da comunidade foi questionado sobre as críticas que a manifestação recebeu da imprensa. Sua resposta, apesar de surpreendente, revela uma das formas como os índios sobreviveram tantos séculos de exclusão: “Não importa o que eles falem desde que falem sobre nós e sobre o que estamos reivindicando”14. Em muitos casos, quando precisam, não se constrangem em parecerem selvagens ou o bom selvagem, por saberem que isso trará resultados. A mobilização popular, tanto positiva quanto negativa, sempre pressiona os órgãos governamentais responsáveis, e, como conseqüência, garantem que 14 Antonio Awa, Aldeia Renascer do Wituguaçu, Bertioga – SP. Junho de 2005. Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. Giselle Piragis Zogaib sejam ouvidos e muitas vezes atendidos. É claro que nem todas as lideranças indígenas agem desta forma, isto varia de acordo com o grau de instrução e convívio interpessoal que possuem, da mesma forma em qualquer outro grupo social. Grandes lideranças indígenas, como Carlos Terena, posicionam-se contra atitudes que reforcem conceitos onde os índios possam ser comparados a selvagens. Mas, também existem índios na Amazônia, dependentes de instituições que os protejam, como as comunidades detentoras de formulas farmacológicas eficientes na cura de graves doenças e que desconhecem o quanto estes conhecimentos podem ser fatais para suas comunidades se compartilhados com pessoas oportunistas. Mas, cada qual utiliza as ferramentas que possui. A imprensa conhece estas dificuldades, mas as submetem as necessidades do mercado da informação. Inicialmente, no caso Galdino, acreditava-se que os índios tivessem conquistado a atenção da imprensa simplesmente porque a violência do caso chamaria a atenção do público, e com isso ocorreria uma representação positiva do índio. Eles estariam usando suas qualidades enquanto índios-símbolos em favor do grupo, mas, a imprensa não perde seu foco. Para ela, mais vale um índio selvagem do que um índio civilizado, pois, como afirma Bystrina, o mal sempre será mais forte do que bem, porque instiga a necessidade de Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. superação. E, embora Galdino tenha se tornado um símbolo do índio-herói contemporâneo, a imprensa não deixou de retratar o índio como selvagem, mesmo que por apenas um dia, o dia 24 de abril. Concluiu-se que os índios são representados de forma positiva ou negativa de acordo com a intenção do veículo, ou seja, as estrutura básica dos códigos culturais que representam os índios são oposições assimétricas por identificação. Como diz o ditado egípcio citado por Bystrina (1995) “o que está acima também está abaixo”, isto é, os conceitos de positivo ou negativo, bom e mau, têm o mesmo valor, e irá prevalecer aquele que melhor couber à situação. E são as intenções da imprensa que determinam os momentos em que deve sobressair este ou aquele conceito, sem ignorar o interesse do publico, ou seja, seu consumidor. Os jornais não têm poder sobre os fatos, embora muitas vezes possam prevê-los com base na teoria de Lótman (2004) sobre o acaso, em que ele afirma que tudo é consequência de ações anteriores. Sendo assim, a imprensa sempre está preparada para que depois do primeiro instante de um acontecimento, ela possa dominá-lo. Na prática, isso funciona como no caso Paiakan, em que o bom índio sofre uma acusação de estupro e torna-se o índio mau. Até onde se sabe, a imprensa não teve participação nesta acusação, ou seja, não foi ela quem armou o cenário e determinou quem 99 100 O índio na esfera cultural brasileira seria a vítima e quem seria o vilão, mas soube aproveitar o caso para preparar o público para uma acusação que ganharia destaque nas semanas seguintes, o caso de corrupção do ex-presidente Fernando Collor de Mello, como pode ser observado na cobertura da revista Veja e Folha de São Paulo. Paiakan foi julgado e incriminado pelo público, sem nem ao menos existirem provas contra ele. Existiam apenas evidências. E a mobilização pública, a mesma sensibilização que o próprio Paiakan usou tantas vezes em benefício de suas causas, dessa vez, foi contrária a ele. Tudo porque o personagem que ele representava perdeu o status de herói e passou à selvagem, se houve ou não alguma intenção política nesta nova representação, não importa, porque o público não está preparado para acreditar nisso, ele acredita apenas que conseguiu fazer justiça. O que importa de fato é que o conceito negativo e a condenação são consequências dos atos de Paiakan, porque ele aceitou seu papel de personagem. E como todo personagem é dependente de seu autor, sua história terá o final que lhe for determinado. No caso Galdino, o índio foi representado como herói, não por que permitiu ser representado dessa forma, mas porque a mobilização pública, incentivada pela mobilização indígena e certificada pela imprensa viu no índio Galdino um símbolo pela luta dos direitos indígenas, fato oportuno para medir forças com o governo (Folha de São Paulo), ou mostrar apoio (O Estado de São Paulo). E neste caso, a revista Veja, apesar das criticas e ironias, ficou de fora do caso porque sua edição já estava nas bancas quando a história aconteceu. Com base nesta análise, conclui-se que a imprensa utiliza os códigos culturais a seu favor e não a favor os povos indígenas. O que prevalece é a intenção de utilizar a informação e os códigos culturais de forma que sirvam a seus objetivos, tanto políticos quanto editoriais. Mudar esta postura equivale a uma impossível mudança mercadológica. A informação é o produto das empresas de comunicação, e a imprensa não se considera responsável por zelar pelo índio, ou por qualquer outro grupo social, no sentido de tentar mudar conceitos culturais, ela se dispõe apenas a utilizar os códigos culturais que prevalecem no momento da informação. Desta forma, não pode ser acusada de cometer algum crime, pois, como é ensinado nas escolas de jornalismo, cabe ao jornalista narrar o fato tal como ele é, e aos veículos de comunicação, publicá-los. Se culturalmente a sociedade só conhece o índio-símbolo, será sobre este que a imprensa irá falar. Caso, um dia, os índios consigam mudar esta forma de representação do índio-símbolo pela de índio-signo, este estudo leva a crer que a imprensa assim o representará. Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. Giselle Piragis Zogaib Aos índios cabe não mais aceitar serem comparados a conceitos míticos, como os de selvagem ou herói. É compreensível que mudanças culturais neste sentido revelem um verdadeiro conflito, um choque cultural, Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 44, p. 73-106, Curitiba, 2010. mas os resultados tendem a ser, no mínimo, uma representação menos excludente dos povos indígenas, e, como consequência, um fortalecimento da esfera cultural em que estão incluídos os índios e os não-índios. 101 102 O índio na esfera cultural brasileira Referências ADORNO, Theodor; HORKHEIRMER, Max. Dialética do esclarecimento. Trad. Guido Antonio de Almeida. 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