PRATICAS EDUCACIONAIS COM ALUNOS SEM
FALA ARTICULADA E/OU FUNCIONAL
CAROLINA RIZZOTTO SCHIRMER
BOLSISTA DE PÓS DOUTORADO DO CNPQ
DOUTORA EM EDUCAÇÃO PELO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO DA UERJ
LEILA REGINA D’OLIVEIRA DE PAULA NUNES
PROFESSORA TITULAR DA FACULDADE DE EDUCAÇÃO E DO PROGRAMA DE
PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO DA UERJ
RESUMO
A inclusão escolar e social de pessoas com deficiência e Transtornos do Espectro Autista (TEA) e a área da
Comunicação Alternativa e Ampliada (CAA) têm sido, nos últimos anos, pensadas e discutidas na literatura
especializada nacional tanto na área da Educação quanto na Saúde. Com o aumento significativo do ingresso de
alunos sem fala articulada e/ou funcional na escola comum, usuário ou potenciais usuários de CAA, aumentam
as dúvidas dos professores, tanto do ensino regular quanto do ensino especializado, em relação à condução do
processo de inclusão desses sujeitos. O grupo de pesquisa Linguagem e Comunicação da Pessoa com
Deficiência, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Educação da UERJ, vem se dedicando
sistematicamente ao ensino e à pesquisa sobre linguagem e comunicação de pessoas com deficiência e TEA e
nos últimos sete anos têm desenvolvido vários estudos dentro da escola. Esse artigo busca trazer as práticas
nos diferentes espaços da escola (sala de aula, sala de recursos multifuncional entre outros), no cotidiano de
professores e alunos nela envolvidos, suas condições materiais e organização e, de modo especial, na sala de
aula, mediada pela interação e comunicação dos professores, professores especializados, alunos com
deficiência e seus colegas apresentados através de problemas trazidos pelos próprios professores durante a sua
formação inicial e continuada em serviço.
PALAVRAS-CHAVE: Comunicação Alternativa – Tecnologia Assistiva – Práticas Educacionais.
1
INTRODUÇÃO
A inclusão escolar e social de pessoas com deficiência e Transtornos do
Espectro Autista (TEA) e a área da Comunicação Alternativa e Ampliada (CAA) têm
sido, nos últimos anos, pensadas e discutidas na literatura especializada nacional tanto
na área da Educação quanto na Saúde (DELIBERATO et al., 2007; DELIBERATO, 2009;
PELOSI, 2007; PELOSI, 2008; MANZINI, 2009; SCHIRMER et al., 2009; PELOSI; NUNES,
2009; SCHIRMER; NUNES, 2009; NUNES, 2009; WALTER; ALMEIDA, 2010; GOMES,
2011).
Com o aumento significativo do ingresso de alunos sem fala articulada e/ou
funcional na escola comum, usuário ou potenciais usuários de CAA1, aumentam as
dúvidas dos professores, tanto do ensino regular quanto do ensino especializado, em
relação à condução do processo de inclusão desses sujeitos. Muitas são as questões
que surgem sobre esse alunado: Como será avaliado se não fala e escreve da maneira
convencional? Será que ele entende e aprende? Como irá interagir e se comunicar com
os outros? Como será recebido pela comunidade escolar?
A CAA é uma área interdisciplinar e embora o grupo de profissionais envolvidos
nela em nosso país ainda seja relativamente pequeno, sua formação é diversa,
incluindo engenheiros, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, médicos, psicólogos
e educadores e outros (NUNES, 2007). Estudos têm demonstrado que o professor
quando recebe o apoio de uma equipe interdisciplinar consegue ter mais sucesso na
sua atuação e consequentemente consegue apresentar melhor prática junto ao seu
aluno com deficiência favorecendo assim sua formação continuada (GOMES, 2006;
PELOSI, 2008, NUNES et al., 2009, CORTELAZZO, 2007; LOURENÇO, 2012). Por isso a
relevância do acesso ao conhecimento da Tecnologia Assistiva (TA)2 e a constituição
1
Quando falamos dos usuários de CAA, referimo-nos, principalmente, a pessoas com deficiência física,
mental e ou múltipla que não são capazes de se expressar através da fala articulada. Apesar de estarmos
pensando sua aplicação na escola, esta abordagem e seus recursos podem ser utilizados com crianças,
adolescentes e adultos. Os profissionais da área da reabilitação e educação também usam CAA, só que
como instrumento para a sua atividade profissional no atendimento a essas pessoas.
2
Tecnologia Assistiva é uma área do conhecimento que engloba serviços e recursos e se propõe a
promover e ampliar habilidades em pessoas com limitações funcionais decorrentes de deficiência e do
envelhecimento (PELOSI, 2008; BERSCH, 2009). A área está organizada em modalidades, sendo a CAA
uma delas.
2
dessas equipes que, dentre outras funções, promovem a formação continuada do
professor (PELOSI, 2008; SCHIRMER et al., 2009).
A relação entre a educação e as novas tecnologias, embora bastante discutida,
continua sendo para os professores e escola um grande desafio (PELOSI; NUNES,
2009). Por isso, torna-se necessário que os professores na sua formação tenham
acesso aos conhecimentos teórico e prático voltados ao uso dessa tecnologia.
Compreendemos que a formação de professores não se trata de um repasse de saber
fora de sala de aula, e sim de uma possibilidade de rever a escola/prática educativa, e
analisar as potencialidades de uma intervenção colaborativa sistemática entre os
professores e os pesquisadores.
Pesquisas envolvendo alunos sem fala articulada e/ou funcional têm
demonstrado que mais importante que os recursos de CAA
(pranchas, cartões,
sistemas computadorizados e softwares especiais), é a presença de interlocutores
interessados em interagir com essas pessoas e oferecer melhor qualidade de vida para
essa população e assim favorecer sua inclusão escolar e social (ARAUJO; NUNES, 2008).
Galvão Filho (2012) destaca que toda a TA disponível representa meios e não um fim
em si mesmo. O autor ressalta que não é o uso em si que se constitui na meta e afirma
que a formação de professores não pode limitar-se ao aprendizado competente dessas
ferramentas. É necessário que os professores compreendam efetivamente os
princípios e propostas implicadas na educação inclusiva, construindo atitudes
genuinamente acolhedoras das diferenças e favoráveis à inclusão.
O grupo de pesquisa Linguagem e Comunicação da Pessoa com Deficiência,
vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Educação da UERJ, vem se dedicando
sistematicamente ao ensino e à pesquisa sobre linguagem e comunicação de pessoas
com deficiência e TEA e nos últimos sete anos têm desenvolvido vários estudos dentro
da escola com o objetivo principal de formar professores para atuarem nessa área
além de desenvolver, implementar e estimular o uso desses recursos, estratégias e
serviços por usuários de CAA e suas famílias (NUNES, 2009). Também tem buscado
verificar como ocorre a prática pedagógica com alunos sem fala articula e/ou funcional
e como a formação continuada dos professores pode modificar as práticas existentes.
Ou seja, identificar como os professores desses alunos têm aplicado os conhecimentos
3
teórico e prático adquiridos em suas formações na tentativa de resolução dos
problemas educacionais desses alunos.
Esse artigo busca trazer as práticas nos diferentes espaços da escola (sala de
aula, sala de recursos multifuncional entre outros), no cotidiano de professores e
alunos nela envolvidos, suas condições materiais e organização e, de modo especial, na
sala de aula, mediada pela interação e comunicação dos professores, professores
especializados, alunos com deficiência e seus colegas apresentados através de
problemas trazidos pelos próprios professores durante a sua formação continuada em
serviço.
Mais especificamente, o objetivo deste capítulo é apresentar para o leitor
algumas das práticas educacionais (estratégias e recursos) que foram sendo
desenvolvidos pela equipe na busca pela resolução dos problemas funcionais que os
alunos com deficiência, usuários de CAA, estavam apresentando na escola. Os autores
esperam compartilhar o conhecimento que adquiriu na área junto aos professores,
alunos e suas famílias.
Não se pretende neste capítulo aprofundar o estudo de cada assunto trazido
neste artigo, e tampouco abordar as diversas discussões teóricas em cada tema, pois o
objetivo é levar ao leitor um panorama geral do que foi e está sendo desenvolvido pelo
grupo de pesquisa. Serão apresentados a seguir os problemas e soluções para as
questões trazidas pelos professores durante a formação.
Práticas Pedagógicas com aluno sem fala articulada e/ou funcional
Alguns exemplos de recursos, estratégias e atividades que envolvem o uso de
CAA estão abaixo citados e foram retirados das pesquisas desenvolvidas com formação
continuada em serviço de professores pelo grupo de pesquisa Comunicação
Alternativa do Programa de Pós-Graduação em Educação da UERJ (GOMES, 2006;
NUNES, 2007; 2008; 2009; PELOSI, 2008; SCHIRMER et al., 2009; PELOSI; NUNES, 2009;
NUNES et al., 2009).
1.Problema/dificuldade apresentada pelo professor: “O aluno utiliza a prancha de
comunicação com a professora de sala de recursos multifuncional, mas não em sala de
4
aula comum”. Após a reunião surge a ideia de se realizar uma oficina com toda a turma
com o objetivo principal de introduzir o tema da comunicação alternativa, abordando
as diferentes formas de comunicação utilizadas pelos seres humanos. A oficina teve
quatro momentos de desenvolvimento: conversa entre os alunos e professor sobre as
diferentes formas de comunicação; a confecção de pranchas de comunicação por
todos os alunos, utilizando o mesmo sistema de simbologia gráfica utilizado pelo
colega com deficiência; o uso de pranchas de comunicação em duplas ou pequenos
grupos (após confeccionar a prancha os alunos foram estimulados a conversar
utilizando somente o recurso, sem a possibilidade de fala); e no último momento
ocorreu o relato da experiência através de desenho ou texto (diário de campo,
pesquisa Tecnologia Assistiva para a Inclusão, 2010).
2. Problema/dificuldade apresentada pelo professor: “Não consigo auxiliar o aluno
sem a ajuda de um estagiário/mediador e cuidar da turma ao mesmo tempo” Após a
reunião discute-se com o professor o espaço físico da sala de aula (como as crianças
ficam posicionadas) e as estratégias utilizadas por ela durante as atividades propostas.
A professora sempre fazia proposta de trabalho individual com a turma, sendo que a
aluna com deficiência ficava sentada no canto esquerdo da sala próxima à porta e ao
lado da mesa da professora. O grupo sugere que ela varie as estratégias com sua turma
buscando planejar trabalhos em grupo e em dupla; dessa forma a aluna com
deficiência não estaria sozinha e poderia contar com a mediação de seus colegas.
(diário de campo, pesquisa Tecnologia Assistiva para a Inclusão, 2010).
Os contextos inclusivos, segundo pesquisadores como Soto e von Tetzchner
(2003), favorecem a interação entre alunos usuários de Comunicação Alternativa e
seus pares falantes. O desenvolvimento da competência linguística alternativa pelo
aluno não oralizado e usuário de sistema de comunicação alternativa pressupõe uma
forma compartilhada de comunicação em sala de aula, ou seja, um número razoável
de pessoas no ambiente mais competentes do que ele na compreensão e no uso dessa
forma alternativa de linguagem que se inscreve nas rotinas escolares. von Tetzchner e
Grove (2003) se referem a esse fenômeno como inclusão comunicativa. Não basta,
contudo, a disponibilização de recursos materiais, sejam estes de tecnologias de alto
5
ou de baixo custo. Tão ou mais importante do que isso, é a presença de interlocutores
interessados em interagir e acolher as mensagens da pessoa não falante (NUNES,
2009).
3. Problema/dificuldade apresentada pelo professor: “O aluno não fala. Não consigo
compreender o que ele quer”.
O professor poderá utilizar vários recursos de baixa tecnologia, sistemas de
CAA, para resolver esse problema. São alguns deles:
• Objetos reais: O aluno poderá fazer escolhas “apontando com a mão, o pé, o
olhar” para objetos reais, como o alimento que deseja comer, o material escolar que
deseja utilizar, o livro que escolherá ou se quer colorir o trabalho com canetinha ou giz
de cera (diário de campo, pesquisa Acessibilidade Comunicativa, 2008).
• Fotografias: Podem ser utilizadas para representar objetos, pessoas, ações,
lugares, sentimentos ou atividades. Podemos também criar pranchas de comunicação
com fotografias recortadas de revistas e com rótulos de produtos (diário de campo,
pesquisa Acessibilidade Comunicativa, 2008).
• Símbolos gráficos: No caso das nossas pesquisas, adotamos o sistema de
simbologia gráfica PCS3. Com esse sistema foram construídos vários recursos de CAA
como, por exemplo: as pranchas e cartões de comunicação. Na pesquisa realizada por
Nunes (2007) as pranchas de comunicação elaboradas pela professora em formação
foram confeccionadas individualmente respeitando as diferentes necessidades
educacionais dos alunos. Os símbolos PCS foram impressos em papel ofício, sendo
separados por categorias e cores. Foram utilizadas pastas de plástico coladas na
posição vertical ou horizontal ou as folhas de papel ofício plastificadas e encadernadas
para a montagem final das pranchas de comunicação. Schirmer et.al. (2009) em
levantamento de recursos de CAA utilizados por professora em formação continuada
traz uma fala da mesma exemplificando o uso do recurso em sala de aula: “[...] Numa
3
Picture Communication System.
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atividade na Oficina da CAA os alunos selecionaram os símbolos PCS para confeccionar
diferentes pranchas temáticas em cartolina plastificada que daria uma orientação
espacial dos diferentes ambientes da escola. Desta forma, todos os alunos da escola,
assim como seus responsáveis e demais funcionários e visitantes, estariam se
apropriando dos recursos de CAA. Estes cartões foram espalhados pela escola
sinalizando a localização das rampas e escadas de acessos aos diferentes andares,
salas de aulas, salas de atendimentos de música, educação física, leitura, banheiros,
secretaria, direção, salas de recursos de comunicação alternativa e ampliada, cozinha,
refeitório, cozinha experimental e clube das mães.” (SCHIRMER et al., 2009, p.5).
Schirmer et.al. (2009) em levantamento de recursos de CAA utilizados por
professora em formação continuada traz uma fala da mesma exemplificando o uso do
recurso em sala de aula: “[...]Diversos cartões com os símbolos PCS, separados por
categorias, foram distribuídos nos murais da sala de aula. A primeira atividade
pedagógica desenvolvida pela turma utilizando este recurso foi: cada aluno deveria
escolher um colega para que este cumprisse uma ordem. Cada um escolheu os cartões
para a construção da sentença. A ordem só seria cumprida caso o colega escolhido
lesse a mensagem através dos símbolos. Esta atividade foi muito gratificante, visto que
oportunizou o primeiro episódio de interação efetivo entre uma aluna com paralisia
cerebral e um aluno que possui linguagem oral. A aluna solicitou que o seu colega
empurrasse sua cadeira de rodas da sala para o refeitório na hora da merenda [...].”
(professora regente) (SCHIRMER et al., 2009, p.4).
• Mesa com símbolos: “Foram fixados na mesa da cadeira de rodas símbolos de
“sim” e “não” facilitando a comunicação de uma aluna com paralisia cerebral” (diário
de campo, pesquisa Dando Voz, 2008).
4. Problema/dificuldade apresentada pelo professor: “O aluno fica agitado, não para
sentado fica todo tempo querendo sair da sala. Acho que ele não entende a rotina da
sala de aula”. As agendas e calendários são excelentes para uso em sala de aula e
estimulam a organização espacial e temporal dos alunos. Esta estratégia pode ser
utiliza com a toda a turma onde cartões com símbolos de CAA podem se tornar um
7
instrumento importante para a socialização de informações do aluno usuário de CAA e
seus colegas (diário de campo, pesquisa Tecnologia Assistiva para a Inclusão, 2010).
5. Problema/dificuldade apresentada pelo professor: “O aluno não lê ainda como
poderá acompanhar a aula? Como vou fazer para ele fazer as atividades?” Uma das
grandes dificuldades para o trabalho com o ensino do aluno com deficiência se refere à
utilização de recursos pedagógicos. Vários são os pesquisadores que estudam a
viabilidade para utilização de jogos, brinquedos, brincadeiras e recursos para o ensino
de alunos com deficiência e que apresentam necessidades educacionais especiais
(DELIBERATO, 2009; MANZINI, 2009). Principalmente para alunos com paralisia
cerebral, que apresentam dificuldades e alterações motoras, o desenvolvimento de
material pedagógico tem se tornado uma necessidade para o professor (MANZINI,
2009).
Para o desenvolvimento de um trabalho nessa área, é necessário que o
professor inicie o seu trabalho com a CAA buscando através de uma avaliação obter
informações sobre seus alunos (suas potencialidades, habilidades e interesses) e sobre
o meio no qual está inserido (rotina e as principais necessidades de comunicação). A
partir dessas informações, o professor, junto com seus alunos e com a equipe de apoio
interdisciplinar, organizará o desenvolvimento de recursos e estratégias favoráveis, no
sentido de qualificar a aprendizagem, a comunicação, e a interação do aluno com o
grupo e sua participação nas tarefas escolares (SCHIRMER et al., 2009). A
complexidade de características dos alunos com deficiência implica a necessidade do
envolvimento de uma equipe de trabalho para a organização e direcionamento de uma
proposta de programa (NUNES, 2009; DELIBERATO, 2009). Sabe-se que o estudo,
desenvolvimento e aplicação dos vários aspectos que englobam esse trabalho vêm
sendo realizados por profissionais das mais diversas áreas e uma abordagem de equipe
é recomendada para se decidir sobre o formato do recurso de comunicação e
estratégias adequadas para sua utilização. Os parceiros de comunicação (família,
professores e amigos), bem como os próprios usuários, devem ser envolvidos na
seleção do recurso e do vocabulário mais apropriado. Receber informações de todos
8
também pode ser o ponto de diferença entre um recurso útil e um que traga
frustração (SCHIRMER; BERSCH, 2007).
Como muitos alunos que precisam de recursos de CAA também apresentam
dificuldades em relação à escrita e leitura será importante que o professor busque
utilizar recursos como os softwares Escrevendo com Símbolos (ECS) e Speaking
Dinamically Pro (SDP) além de outros recursos para adaptar o material didático, paradidático e lúdico para que esses alunos possam acompanhar a turma segundo o seu
ritmo. A adequação do material pedagógico e escolar constitui elemento crítico no
processo de ensino-aprendizagem desse alunado. Um exemplo de como a TA pode
beneficiar as pessoas com deficiência é em relação à atividade de leitura. Alguns
alunos apresentam dificuldades em acompanhar a turma e seu ritmo para aprender a
ler é diferenciado. Para auxiliá-lo, o professor poderá produzir, com o recurso de
softwares como o ECS ou o Boardmaker, textos apoiados por símbolos gráficos e
assim favorecer a compreensão dos mesmos pelo aluno. Imerso no contexto de
símbolos pictográficos e alfabéticos, o aluno poderá realizar leitura global e ter acesso
a novos conhecimentos de forma mais autônoma (SCHIRMER; BERSCH, 2007;
ANDRADE; CORREIA, 2007; CORREIA, 2007).
Segundo Schirmer et al. (2009) durante a formação continuada é possível
perceber a imensa gama de atividades diferenciadas que passam a compor o
planejamento de sala de aula e as inúmeras sugestões de recursos, que vão sendo
apresentadas pela equipe interdisciplinar e construídas em conjunto com a professora
e alunos. São alguns deles: livros clássicos de histórias infantis, outros relacionados a
atividades do dia a dia ou mesmo livros paradidáticos transcritos ou reescritos de
forma simplificada (PELOSI et. al.,2007).
• Livros construídos com simbologia da CAA: Os alunos constroem livros com
temas de seus interesses e ordenam os símbolos para contar suas histórias. Versos,
cantigas, pesquisas, criação e re-contagem de histórias infantis são alguns dos temas
utilizados. Esta é mais uma atividade que poderá envolver todos os alunos e
colaborará para a compreensão da escrita através da ordenação dos símbolos gráficos,
além de trazer novo vocabulário ao aluno usuário da CAA. Schirmer et.al. (2009) em
9
levantamento de recursos de CAA utilizados por professora em formação continuada
traz duas falas da mesma exemplificando o uso do recurso em sala de aula: “Montar
uma gibiteca. Escolhemos com eles um filme, o do Homem Aranha. Vamos fazer com
eles o reconto deste filme que vamos assistir [... ]Isto para que alguns alunos possam
fazer a ilustração e a minha turma se encarrega de contar a história através da CAA. O
produto final vai ser uma revista do Homem Aranha. A partir dos desenhos da turma
dela e dos pictogramas também” (professora regente) (SCHIRMER et al., 2009, p.3).
“Interpretação da história com perguntas mais abertas. Então eu fiz com dez
envelopes, cada um escolheria um envelope e os outros teriam que aguardar e deu
super certo.” (professora regente) (SCHIRMER et al., 2009, p.3).
• Simbologia da CAA nas atividades educacionais: Todos os projetos
desenvolvidos em sala de aula podem ser acompanhados de simbologia gráfica em
forma de cartões, pranchas temáticas ou atividades adaptadas, por exemplo. Os
materiais citados a seguir foram confeccionados no decorrer do trabalho de pesquisa
para favorecer o desenvolvimento das atividades pedagógicas, as avaliações das
mesmas e a interação. Letras de músicas e textos com perguntas para interpretação
dos mesmos, símbolos gráficos individualizados para construção de sentenças e
pequenos textos.
“Para que a turma participasse da Feira Literária que estava sendo montada na
escola foi escolhida com os alunos, uma música que todos gostassem para ser
adaptada. Após a votação a música escolhida, O Barquinho, foi transcrita utilizando os
símbolos pictográficos. Durante a apresentação, enquanto a música era tocada, os
alunos da turma, exibiam a letra da música adaptada que foi confeccionada em
cartolina para que os outros participantes acompanhassem. A seguir, foram
apresentadas pelos alunos da turma perguntas, também escritas com os símbolos,
para que os demais participantes da escola respondessem oralmente.” (professora
regente) (SCHIRMER et al., 2009, p.4).
“Os alunos durante uma atividade na oficina das múltiplas linguagens estavam
trabalhando um conteúdo relacionado à água. Quando a professora colocou o CD com
a música Planeta Água, um aluno que possui PC severa começou a “pular” na cadeira e
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olhar para o corredor; sinalizando com o olhar que desejava alguma coisa que estava
fora da sala. A professora desta oficina solicitou a presença da professora da oficina da
CAA e esta ao chegar perguntou o que ele desejava. O aluno, sorrindo, olhou para a
folha de papel ofício que estava com a letra da música escrita e olhou para o
computador. Imediatamente a professora entendeu e perguntou ao aluno se ele
desejava que a música fosse transcrita com os símbolos PCS. A resposta foi positiva e
ao chegar à sala da oficina da CAA a atividade de transcrição foi desenvolvida
utilizando o ECS e com algumas fotografias da aula passeio que foram inseridas no
software. A solicitação do aluno oportunizou a interação das duas oficinas em uma
mesma atividade e ainda a exposição do produto final da atividade durante a semana
da amostra pedagógica que ocorre na escola mensalmente.” (professora regente)
(SCHIRMER et al., 2009, p.6).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Acreditamos que a prática pedagógica diferenciada se constrói na colaboração
e troca entre a equipe envolvida com o aluno não falante. As reuniões de equipe foram
os espaços nos quais os professores e o grupo de pesquisa buscaram soluções para os
problemas de sala de aula e/ou SRM ou associadas à observação das sessões
videogravadas e intervenções da equipe de apoio in loco.
Esta parece ter se
constituído em uma significativa oportunidade de desenvolvimento e participação de
todos. Nessas ocasiões, os professores tiveram a possibilidade de observar seu próprio
fazer pedagógico sob múltiplas perspectivas. Essa tomada de consciência é, para
Vygotsky, uma generalização: “[...] perceber as coisas de outro modo é, ao mesmo
tempo, adquirir outras possibilidades de ação em relação a elas [...] generalizando um
processo próprio de minha atividade, eu adquiro a possibilidade de uma outra relação
com ela” (VYGOTSKY, 1989).
As ações descritas reforçam a teoria de que falar/ouvir, escrever no
quadro/copiar e o trabalho realizado pelos alunos de forma unicamente individual não
são práticas pedagógicas que favoreçam aprendizagens efetivas e, portanto, devem ser
evitadas, não sendo a única opção dos professores. O trabalho cooperativo em rede,
onde o professor utilize dinâmicas em dupla, trios ou pequenos grupos, tem se
11
mostrado eficiente para aprendizagem de todas as crianças, além de estimular outras
habilidades importante para a interação e comunicação. O material adaptado também
não precisa ser apenas utilizado pelo aluno com deficiência, podendo e devendo ser
oferecido ao grupo todo pois, para o aluno com deficiência, pode significar a ampliação
das possibilidades de comunicação e o aumento da participação nas atividades
pedagógicas mas igualmente beneficia a aprendizagem de todos,uma vez que é um
material rico em imagens e símbolos gráficos.
Acreditamos que ações como essas cumprem o objetivo da CAA que é tornar o
sujeito com distúrbio de comunicação o mais independente e competente possível em
suas situações comunicativas, podendo assim ampliar suas oportunidades de interação
com os outros, na escola e na comunidade em geral.
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