Ex.mo Sr. Director-Geral da Agência Portuguesa do Ambiente Rua da Murgueira 9/9A Zambujal Apartado 7585- Alfragide 2611-865 Amadora Lisboa, 25 de Janeiro de 2011 Assunto: Consulta Pública do EIA – IC33 – Grândola (A2) / Évora (IP2) Exmo. Sr. Director-Geral, No âmbito da Consulta Pública do Estudo de Impacte Ambiental do IC33, na troço entre Grândola (A2) e Évora (IP2), a Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA) remete às entidades competentes o seu parecer referente ao Estudo Prévio submetido pela empresa Estradas de Portugal, SA, e realizado pela Empresa COBA, Consultores de Engenharia e Ambiente, com as seguintes características: • O Itinerário Complementar nº 33 (IC33) está previsto no Plano Rodoviário Nacional 2000 (PRN 2000), integra a Rede Rodoviária TransEuropeia (E82), proporcionando uma ligação rodoviária entre o litoral e o interior e permitindo reforçar as acessibilidades regionais e também as ligações do porto Sines à Península Ibérica e ao resto da Europa. • O trecho do IC33 em estudo apresenta uma extensão aproximada de 70 km e terá início no Nó com a A2 (junto a Santa Margarida do Sado), terminando a Sul de Évora, no Nó com o IP2. • De acordo com o tráfego previsto, o lanço do IC33 em avaliação, foi projectado com um perfil transversal 1x1 e para uma velocidade de 90 km/h, e será vedado em toda a sua extensão. • O estudo em análise tem por base dois corredores fundamentais, designados de Solução A e Solução B, nos quais foram consideradas diversas alternativas e interligações. Áreas Naturais afectadas: • Zona de Protecção Especial (ZPE) de Évora Sul, área incluída na Rede Natura 2000; • Área Importante para as Aves (IBA) da Planície de Évora; • Extensas áreas de povoamentos de Sobreiro (montados e florestas, Habitat 9330, protegido no âmbito da Directiva Habitats). Insuficiências na justificação deste projecto: • O Plano Rodoviário Nacional (PRN 2000) tem mais de 10 anos e está claramente desactualizado face às mudanças sócio-económicas e conjunturais dos últimos anos. O PRN 2000 deverá ser revisto e sujeito a uma consulta pública de acordo com a Lei da Avaliação Ambiental Estratégica. Todos os investimentos no âmbito deste PRN 2000 deverão ser suspensos até haver um novo plano. Só assim se garante uma gestão eficiente dos 1 • • investimentos, que minimize os custos e os impactos ambientais e maximize os resultados. O IC33 não pode ser justificado como a ligação o Porto de Sines à Península Ibérica. No contexto internacional o IC33 é totalmente irrelevante. A ligação pelo IP8 desde Sines até Beja, em configuração de auto-estrada, actualmente já aprovado, e depois pelo IP2 até à A6, em Évora, é a verdadeira e suficiente ligação do Porto de Sines ao resto da Europa. No contexto local da ligação haverá certamente outras alternativas menos dispendiosas e com menos impactos ambientais para ligar Grândola a Évora. Essas alternativas passam por melhorar o traçado das estradas existentes e construir circulares aos núcleos urbanos atravessados. Insuficiências do Estudo de Impacte Ambiental: • O EIA menospreza e minimiza a importância da IBA da Planície de Évora e das populações de aves ameaçadas que ali existem. O facto de áreas desta IBA que seriam atravessadas pelo empreendimento previsto não estarem incluídas na ZPE de Évora Sul não diminui a sua importância para a conservação das aves. Na maioria dos casos as populações de aves ameaçadas são as mesmas dentro e fora da ZPE (exemplo: Sisão e Abetarda). Nesta situação, e no cumprimento estrito do articulado das directivas Aves e Habitats, os potenciais impactos negativos resultantes de projectos total ou parcialmente fora da ZPE devem ser devidamente acautelados, tal como nos casos de projectos totalmente dentro da ZPE. • Caracterização insuficiente da avifauna da área de estudo. Existem áreas imediatamente a Sul da ZPE de Évora Sul que albergam populações importantes de: Abetarda (Otis tarda), Sisão (Tetrax tetrax), Grou (Grus grus), Abibe (Vanellus vanellus), Tarambola-dourada (Pluvialis apricaria) (Ver relatórios CANAN, http://www.spea.pt/pt/estudo-e-conservacao/censos-deaves/canan/). Também não é referida claramente a ocorrência de espécies florestais ameaçadas que dependem das florestas de Sobreiro da área afectada pelo projecto de IC33: Águia-perdigueira (Aquila fasciata), Cegonhapreta (Ciconia nigra) e Milhafre-real (Milvus milvus). • Relativamente aos impactes ambientais na fauna e flora, foi omitida a dimensão do abate de Sobreiros, bem como a extensão dos povoamentos de elevada densidade de árvores que serão afectados. Não foi analisado o impacte na manutenção do habitat semi-natural do Montado de Sobro, resultante da inviabilização do sistema de uso múltiplo florestal-pecuáriocinegético pela compartimentação das explorações agro-florestais em resultado do projecto. • Relativamente ao impacto nas aves, nomeadamente nas espécies estepárias, foi referido o efeito barreira. Mas faltou referir o elevado efeito de exclusão que uma infra-estrutura desta natureza provoca em espécies como a Abetarda, o Sisão e o Grou. Ou seja, a área de habitat que efectivamente desaparece para as populações locais destas espécies será muito superior ao canal ocupado pela via rodoviária. • Por fim, no que diz respeito à minimização de impactes, verificámos que não há medidas de minimização para a maioria dos impactes mais graves sobre a avifauna. Alguns impactes, como o referido no ponto anterior, não foram sequer considerados adequadamente, e tememos que não sejam sequer minimizáveis. 2 Ilegalidades do EIA e do projecto: • A ausência da análise da “Alternativa Zero”, tal como exigido pelo Artigo 6º da Directiva Habitats para projectos que afectam a Rede Natura 2000, faz com que este procedimento de AIA seja ilegal à luz do direito Comunitário e da Lei Portuguesa. Como já foi referido, a SPEA está convencida que haveria alternativas muito mais económicas e com menor impacte ambiental para melhorar a acessibilidade entre Grândola e Évora. Uma “Alternativa Zero” que incluísse a construção de circulares aos núcleos populacionais e o melhoramento das estradas existentes (exemplo: N2, N257, N383, N254 ou N380), seria certamente mais vantajosa do que qualquer das soluções em estudo. • Este é um projecto com graves impactes negativos na Rede Natura 2000 (ZPE Évora Sul) e graves impactes sobre espécies ameaçadas da fauna e flora protegidas por Lei, em qualquer das soluções estudadas. Não está provada a necessidade deste projecto, uma vez que existem alternativas viáveis já instaladas ou em vias de instalação (IP2 e IP8). Ao abrigo do Artigo 6ª da Directiva Aves, não pode ser alegado o Superior Interesse Público e não estão reunidas as condições legais para viabilizar qualquer das soluções estudadas neste EIA e a destruição da ZPE de Évora Sul. Considerando os factos expostos, a SPEA rejeita este EIA e o projecto de IC33 em avaliação. A SPEA solicita à tutela que seja suspenso este Projecto de IC33, bem como todos os outros incluídos no Plano Rodoviário Nacional 2000 que ainda não iniciaram. Deverá ser revisto todo o PRN 2000 e desenvolvido um processo de Avaliação Ambiental Estratégica, com consulta pública e demais requisitos previstos na Lei. A SPEA encontra-se totalmente disponível para reunir e discutir este assunto, bem como para reformular a sua posição face a novos dados que possam surgir. Com os melhores cumprimentos. Dr. Domingos Leitão Coordenador do Programa Terrestre Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves Avenida João Crisóstomo, 18 – 4º Drt. 1000-179 Lisboa Tel. +351 213 220 430 | Fax. +351 213 220 439 | www.spea.pt Cc: Secretário de Estado do Ambiente Presidente do Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade DG Ambiente da Comissão Europeia 3