I Jornada Científica e VI FIPA do CEFET Bambuí Bambuí/MG - 2008 ADAPTAÇÃO DE REFRIGERADOR DOMÉSTICO PARA FABRICAÇÃO DE SALAME TIPO ITALIANO RICARDO, C.F.(1); GONÇALVES, G.L. (2); BENEVENUTO JÙNIOR, A. A. (3); BENEVENUTO, W. C. A. N. (4) (1) CEFET Bambuí; (2) CEFET Bambuí; (3)CEFET Bambuí; (4)CEFET Bambuí . RESUMO Uma das maiores dificuldades encontradas no processamento de Salame, está no controle da temperatura, umidade relativa e velocidade do ar durante o processo. Com o intuito de desenvolver uma tecnologia mais acessível, foi realizada uma adaptação em um refrigerador doméstico, para produção de salame em pequena escala. O pH final salame foi de 4,67 e o volume de NaOH 0,1N para 2,5g de salame encontrado foi de 2,13 ml. A umidade final foi de 38,60% alcançada aos 26 dias de processo. A perda de peso média do produto foi de 38,2% e proporcional entre as peças de salame, mostrando que a ventilação foi satisfatória. Na análise sensorial, as maiores notas foram atribuídas ao quesito gostei muito. O salame produzido no refrigerador adaptado foi tecnologicamente viável, pois os dados obtidos estão coerentes a vários trabalhos realizados por outros autores. Palavras chaves: Salame, refrigerador adaptado, produção. 1. INTRODUÇÃO Salame é um embutido classificado como produto fermentado cru, seco ou semi-seco e nãoemulsionado (GALLI, 1993). É preparado com a mistura de carnes moídas, com variações quanto à composição e adição de condimentos e aditivos responsáveis pelas variações de salames produzidos no país. Diferencia-se dos demais embutidos pelo baixo teor de umidade e pela presença de ácido lático, que confere sabor característico (SCHEID, G. A. et al., 2003). Nesse contexto está inserido mais particularmente o Salame Tipo Italiano. Segundo Terra (1998), o Salame Tipo Italiano fabricado no Brasil é predominantemente obtido a partir de carne suína (mínimo 60%), a maturação é de aproximadamente trinta dias, seu aroma e sabor são suaves e valores de pH estão em torno de 5,4. Dentre as principais etapas do processamento estão à fermentação e a maturação/secagem (GALLI, 1993). Na etapa da fermentação há uma ocorrência simultânea de acidificação e formação da cor, com duração de uma semana. Na etapa de maturação ocorre uma desidratação em decorrência da fermentação, tendo duração de três semanas (TERRA, 2006). O processo fermentativo ocupa posição de alta relevância na fabricação de salame, pois participa diretamente na geração de cor, sabor, aroma, textura e vida útil (TERRA, 1998). A secagem do salame é uma etapa que também deve ser muito bem controlado. Se as condições de secagem forem muito drásticas, ocorrerá formação de uma crosta seca na superfície que contribuirá para a manutenção da umidade no interior do produto, o que pode causar problemas de conservação devido à alta atividade de água da porção central do salame (GALLI, 1993). De acordo com Galli (1993), além da secagem ocorrem processos de proteólise e lipólise, que permitem o desenvolvimento do aroma típico e a estabilização da cor. A maior dificuldade encontrada no processamento de salame em pequena escala, está no controle da temperatura ambiente e umidade relativa do ar, durante as fases de maturação e secagem (CHEFTEL, 1983). Nos produtos fermentados, empregam-se inicialmente temperaturas mais elevadas (24°C a 27°C), a fim de se obter uma rápida atividade das I Jornada Científica e VI FIPA do CEFET Bambuí Bambuí/MG - 2008 culturas inoculadas nas primeiras 24 ou 36 horas (UR = 90 a 95%). Nestas condições ocorre uma rápida acidificação no produto, onde seu pH atinge 5,1 a 5,3. Este procedimento permite o controle sobre o desenvolvimento da microbiota indesejável e permite a secagem do produto (BACUS, 1984). Na etapa de maturação/secagem, é estabelecida uma temperatura entre 12 e 18ºC e uma umidade relativa decrescente até alcançar um valor entre 70 e 75%, sendo necessária uma ventilação correta, de forma que a secagem seja homogênea (LUCK, 1998). Segundo Gava (2002), a circulação do ar ajudará na distribuição de calor dentro da câmara, permitindo assim manter uma temperatura uniforme. O presente trabalho tem como objetivo geral avaliar o desempenho operacional, aspectos físico-químicos, microbiológicos e sensoriais do Salame Tipo Italiano produzido em refrigerador doméstico adaptado. 2. MATERIAIS E MÉTODOS 2.1 Adaptação do Refrigerador As adaptações no refrigerador doméstico foram realizadas com objetivo de controlar a temperatura, umidade relativa e proporcionar uma circulação de ar no interior do refrigerador, com isso, possibilitando as condições necessárias para a produção do salame. A temperatura foi determinada com utilização de termômetro analógico. As temperaturas desejáveis no interior do refrigerador foram conseguidas com a utilização de um “timer”, em que era possível determinar os intervalos de tempo em que o refrigerador ficava ligado e desligado. Para se conseguir a circulação de ar no interior do refrigerador foi adaptando um ventilador na parte superior da porta. A alta umidade necessária na etapa da fermentação foi conseguida utilizando bandejas com água pura na parte inferior e superior do refrigerador. Na segunda etapa, maturação/secagem, a redução da umidade relativa foi conseguida utilizando bandejas com sal grosso. A umidade relativa do ar foi monitorada utilizando o termômetro citado anteriormente onde foram medidas as temperaturas de bulbo seco e de bulbo úmido e com a utilização de um programa denominado “Grapsi” foi possível determinar a umidade relativa dentro do refrigerador. 2.2 Ingredientes Utilizados Para fabricação do Salame Tipo Italiano, utilizouse carne suína (paleta) 60%, carne bovina (acém) 20% e toucinho (região costo-lombar) 20%, cloreto de sódio (sal) 2,5%, cal de cura (nitrato/nitrito) da Duas Rodas 0,7%, eritorbato de sódio 1,0%, glutamato monossódico 0,2%, glicose 0,5%, sacarose 0,5%, alho natural 0,5%, pimenta branca 0,1% e culturas iniciantes “starter” (T-SPX CRH Hansem S/A) 0,025%; envoltórios (tripas) artificiais de colágeno calibre 55 mm. 2.3 Elaboração do Salame Os salames foram fabricados no setor de processamento de carnes do Centro de Educação Tecnológica de Bambuí (CEFET-Bambuí). As carnes suínas (paleta) e bovinas (acém) estavam resfriadas e foram moídas separadamente, em moedor com disco de furos de 8mm e 5mm respectivamente. O toucinho congelado foi picado manualmente em cubos de 0,5cm, utilizando facas bem afiadas com o objetivo de conseguir pedaços mais firmes. Em seguida foram adicionados os ingredientes não-cárneos e misturados em misturadores por 10 minutos exceto a cultura starter que foi previamente diluída em 30 ml de água peptonada e em seguida foi adicionada a massa e misturada por mais 5 minutos. Para o embutimento, empregou-se tripa de colágeno, onde essas tripas foram cortadas de modo que fossem obtidas peças de aproximadamente 500g. As tripas foram previamente umidificadas em solução salina a 0,1%. O embutimento foi realizado de forma mais compacta possível, para evitar as bolsas de ar, o que viria a provocar a oxidação da massa, prejudicando a sua qualidade. Para o embutimento foi utilizada embutideira pneumática. Após o embutimento salames foram mergulhados em solução de Sorbato de Potássio a 10% para prevenir o crescimento de fungos durante etapas posteriores. Em seguida foram pesados e anotados os pesos para o acompanhamento da perda de peso durante o processo de fermentação e maturação/secagem do salame. Após o embutimento, os salames foram levados ao refrigerador adaptado, onde foram pendurados e a partir deste momento foi controlada a I Jornada Científica e VI FIPA do CEFET Bambuí Bambuí/MG - 2008 temperatura e a umidade relativa. Durante a etapa de fermentação, a temperatura foi mantida entre 20 a 25ºC e a umidade relativa em torno de 82 a 95%. Logo após os salames foram embalados a vácuo e armazenados em temperatura ambiente. 2.4 Análises Físico-Químicas e Sensoriais. As analises físico químicas e sensoriais foram realizadas no CEFET – Bambuí. · Análises físicas químicas. As análises realizadas foram pH, acidez titulável e umidade, utilizando método descrito por Terra; Brum (1988). Foi determinada também a perda de peso durante o processo de produção em algumas peças de salames situadas em lugares diferentes dentro do refrigerador. O objetivo foi verificar a eficiência da ventilação, que se caso as peças estivessem perdendo peso de maneira desproporcional, significaria ventilação insuficiente. · Redução pH 7 6,46 pH 6 5,35 5 4,69 4,62 4,61 2 1 3 7 14 21 25 Tempo (dias) Figura 1 Neste experimento o pH atingiu o valor inferior a 5,3 na primeira semana, isto se deve a temperatura utilizada no início do processamento, que foi maior que 20ºC. Resultado coerente com Garcia; Gagleazzi; Sobral (2000), Terra; Fries; Terra (2004), Campagnol (2007), Macêdo (2005) e Sheid et al., (2003) que encontraram na primeira semana de maturação pH inferior a 5,3, utilizando temperaturas de 20a 25ºC durante o período de fermentação. A Figura 2 demonstra o resultado da acidez titulável. Acidez salame: Refrigerador adaptado Acidez 2,5 2,33 2 1,5 2,13 1,73 1,63 1,4 1,06 1 0,5 0 1 3 7 14 21 25 Tempo (dias) Análise sensorial. O teste sensorial foi realizado por provadores não treinados, utilizando escala hedônica de 9 pontos, onde foram atribuídas notas que variavam desde desgostei muitíssimo (nota 1) a gostei muitíssimo (nota 9) para os atributos cor, aroma, sabor, textura e impressão global, com o intuito de verificar a aceitabilidade do produto. Os provadores também foram questionados quanto à possível aquisição dos produtos casos estes estivessem disponíveis no mercado. 4,89 4 3 Volume (ml)/ 2,5g Na etapa da maturação/secagem, a temperatura ficou entre 15 a 18ºC e a umidade relativa em torno de 70 a 80%. Os embutidos permaneceram no refrigerador adaptado, com umidade relativa e temperatura controlada, até atingir a umidade próxima de 35% (máx). pH salame: Refrigerador adaptado Figura 2 O valor da acidez titulável aos 25 dias de processo foi de 2,13 ml de NaOH 0,1 N gastos para neutralizar 2,5g de salame, mesmo resultado encontrado por Macedo (2005). A umidade final foi de 38,6% conforme mostra a Figura 3. Resultado este de acordo com Scheid et al., (2003) e Garcia; Gagliazzi; Sobral (2000). Umidade salame: Refrigerador adaptado Umidade 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO % umidade O Salame Tipo Italiano produzido no refrigerador doméstico adaptado apresentou pH final em 26 dias de maturação de 4,61, resultado abaixo do encontrado por Fernandez et al., citado por Terra; Fries; Terra (2004), que foi de 5,1 a 5,4. A evolução do pH do salame produzido no refrigerador adaptado está apresentada na Figura1. 80 60,9 60 52,3 40,5 40 38,6 20 0 1 14 21 25 Tempo (dias) Figura 3 A percentagem de perda de peso em relação ao peso inicial correspondeu a 38,2%, valor próximo I Jornada Científica e VI FIPA do CEFET Bambuí Bambuí/MG - 2008 do encontrado por Reis; Soares (1998) que obteve 38,4%. No artigo escrito por Campagnol et al., (2007), obteve a perda de peso de 45,86%, valores muito próximos da faixa de 30 a 40%, considerada ideal para produtos fermentados secos segundo Price; Schweigert (1994). certamente compraria 80% provavelmente compraria 70% 60% 50% talvez comprasse/talvez não comprasse 40% 30% As peças de salame tiveram perda de peço proporcional (Tabela 1), mostrando que o sistema de ventilação do refrigerador foi satisfatório. Tabela 1: Amostras (Diferentes % de perda de peso em pontos no refrigerador) relação ao peso inicial 36,00 Amostra 1 Amostra 2 36,00 Amostra 3 38,70 Amostra 4 39,36 Amostra 5 39,78 Amostra 6 38,46 Amostra 7 38,14 Amostra 8 39,13 Amostra 9 39,08 · Análise sensorial. 1-desgostei muitíssimo 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% 2-desgostei muito 3-desgostei moderadamente gl ob al tu ra te x pr es sã o im sa bo r 4-desgostei ligeiramente ar om a 10% 0% certamente não compraria Figura 5 Tabela 2: PARÂME TROS MÉDIA DESVIO PADRÃO COEF. DE VARIAÇ ÃO ATRIBUTOS SENSORIAIS sabor textura 8,24 7,78 cor 8,02 aroma 7,96 imp. global 8,04 0,71 0,72 0,86 1,10 0,72 8,81 9,05 10,45 14,15 8,96 De acordo com os resultados obtidos na análise sensorial verifica-se que o salame tipo italiano foi bem aceito pelos provadores sendo que, as maiores notas foram atribuídas aos quesitos gostei muito (cor: 56%, aroma: 62%, sabor: 48%, textura: 44%, impressão global: 60%). 4. CONCLUSÃO Os resultados obtidos para análise sensorial do Salame Tipo Italiano podem ser observados, conforme as Figuras 4 e 5. A Tabela 1 mostra os valores obtidos estatisticamente, analisando as notas atribuídas pelos provadores para cada atributo. co r provavelmente não compraria 20% Figura 4 5-nem gostei/nem desgostei 6-gostei ligeiramente De acordo com os resultados das análises físicoquímicas, pode-se concluir que a adaptação realizada no refrigerador doméstico foi tecnologicamente viável, pois os resultados obtidos estão de acordo com trabalhos realizados por outros autores. A análise sensorial comprovou que o Salame Tipo Italiano foi bem aceito pelos provadores e que os mesmos estariam dispostos a adquiri-lo. 5. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA BRASIL. Instrução normativa n. 22, de 31 de julho de 2000. Regulamento técnico de identidade e qualidade de Salame Tipo Italiano. Ministério da Agricultura e do Abastecimento secretaria de defesa agropecuária. 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