INFORMAÇÕES, OPERAÇÕES DE INFORMAÇÃO, SISTEMA OPERACIONAL INFORMAÇÕES... O QUE REALMENTE QUEREMOS? Alex Alexandre de Mesquita – Tenente-Coronel de Cavalaria formado pela AMAN em 199; Mestre em Operações Militares, com ênfase em Cavalaria Mecanizada – Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais (EsAO), em 2000; Mestre em Ciências Militares, com ênfase em emprego de blindados em operações militares em ambiente urbano, pela Escola de Comando e EstadoMaior do Exército (ECEME), em 2008; Curso Avançado de Operações Psicológicas, no Centro de Estudos de Pessoal (CEP), em 2011; Estágio de Comunicação Social para oficiais do Quadro de Estado-Maior da Ativa (QEMA), no Centro de Comunicação Social do Exército, em 2009; Atualmente é instrutor da seção de Operações de Garantia da Lei e da Ordem da ECEME. [email protected] 1. INTRODUÇÃO O Ministério da Defesa, por meio do recém-editado manual MD 30-M-01- Doutrina de Operações Conjuntas – 1º Volume, creditou relevância às Operações de Informação no contexto dos conflitos atuais. Apontando nessa direção, a Diretriz Geral do Comandante do Exército Brasileiro, para 2011-2014, ao tratar dos Sistemas e Atividades, especificamente no que se refere à Doutrina Militar, estabelece que seja estudada a concepção de um Sistema Operacional “Informações” 1. É fato que ainda pairam relevantes dúvidas conceituais e de emprego em relação ao assunto Informações2, Operações de Informações e sobre a criação de um Sistema Operacional dedicado. Outro dado de destaque é que grande parte do conhecimento a 1 Este Sistema Operacional, de acordo com a Diretriz, absorveria as áreas de Guerra Eletrônica,Defesa Cibernética, Operações Psicológicas, Comunicação Social, Assuntos Civis e Operações de Dissimulação,dentre outras. Diretriz Geral do Comandante do Exército 2011-2014. p. 17. 2 Embora o Ministério da Defesa (MD) já tenha estabelecido a definição e a terminologia corrente a respeito do assunto no MD 31-D-03: Doutrina Militar de Comando e Controle. respeito do tema é proveniente de fontes norte-americanas, da doutrina de emprego da Organização do Tratado do Atlântico Norte e de países ocidentais europeus. Este texto busca condensar algumas ideias e, nos parágrafos que se seguem, abordar nuances que envolvem o assunto, enfatizando, em particular, as informações como parte do processo decisório, o ambiente da informação e as iniciativas internacionais que tratam do tema. 2. DESENVOLVIMENTO a. As Informações e o processo decisório Ao tratar do assunto, cumpre extrair dos manuais em vigor a definição de Informação. O MD-35-G-01, Glossário das Forças Armada, define Informação da seguinte forma: INFORMAÇÃO – 1. Conhecimento objetivo resultante do processamento de informes, com a finalidade de servir de base a atos decisórios (grifo nosso), de esclarecer, atualizar ou formar cultura e opinião. 2. Conhecimento resultante de raciocínio elaborado pelo analista de inteligência que expressa sua certeza sobre situação ou fato passado ou presente. MD-35-G-01. Ed 207. p. 135/274. A Força Terrestre trata do assunto definindo-o no manual de campanha C 20-1 Glossário de Termos e Expressões em Uso no Exército: Informação: Conhecimento de um fato ou situação, resultante do processamento de todos os informes disponíveis, relacionados com o referido fato ou situação. Conhecimento objetivo, resultante do processamento de informes com a finalidade de servir de base a atos decisórios, de esclarecer, atualizar ou formar cultura e opinião (grifo nosso). Também é considerada, ainda, como a expressão da verdade, merecendo, em consequência, toda a credibilidade. C 20-1. 3.Ed 2003. p.I-3. É possível identificar nas definições apresentadas que o conceito de Informação/Informações está muito relacionado aos processos de tomada da decisão do Comandante nos diversos níveis de planejamento previstos na Sistemática de Planejamento de Emprego Conjunto das Forças Armadas (SisPECFA)3 (níveis político, estratégico, operacional e tático). Isto quer dizer, grosso modo, que as informações não devem ser entendidas como um fim em si mesmo, mas como um insumo básico para que o decisor possa imprimir o seu ritmo ao combate. Como dedução correlata, as informações não devem servir somente como insumo para produção de mais informações. Sobre o processo de tomada de decisão, existem diversos modelos conceituais que buscam sistematizar as etapas que envolvem a atividade, sendo que um dos mais populares é o chamado ciclo OODA4. A figura a seguir apresenta o referido modelo, sendo motivado pela Informação. 3 MD30-M-01 Doutrina de Operações - Conjuntas 1º Volume – 2011. p. 21/128 Modelo concebido e desenvolvido pelo Coronel da Força Aérea dos Estados -Unidos da América John Boyd. OODA significa Observar, Orientar, Decidir e Agir. 4 Fig 1 Ciclo OODA Fonte: autor O fluxo de Informação será o principal responsável por movimentar o ciclo OODA. Um detalhe relevante é que o inimigo/oponente também está sujeito a este modelo teórico referente à tomada da decisão. Por vezes, a vitória será alcançada pelo “giro” rápido do nosso processo decisório em relação ao antagonista. Outras vezes, a vitória será alcançada por fazer com que o inimigo movimente o seu ciclo decisório de acordo com o que desejamos e na velocidade que desejamos. Fazer com que o inimigo decida rápido, porém da forma equivocada, pode ser tão benéfico para o nosso planejamento, quanto fazê-lo claudicar em sua decisão. Em função de todas as condicionantes referentes à tomada da decisão, obterá sucesso aquele que implementar o processo mais eficaz e neste sentido, a eficácia está diretamente relacionada à capacidade de processar as informações o mais rápido possível, ficando em melhores condições do que o inimigo para conduzir as ações, caracterizando,assim, o conceito de Superioridade de Informação5. A Superioridade de Informação, de acordo com o MD 31-D-03 - Doutrina Militar de Comando e Controle, pressupõe não apenas sistemas com maior capacidade de aquisição e processamento de informações, mas processos decisórios que se utilizem do mínimo de informações sobre o inimigo e medidas de proteção que imponham, a este, uma necessidade muito grande deste mesmo insumo. O conceito de Superioridade de Informação está muito relacionado à Guerra Centrada em Redes (GCR), conforme previsto, também, no MD 31-D-03. Em verdade, como conclusão parcial, no que diz respeito ao relacionamento entre a Informação e o processo decisório, o principal é entender a informação como estímulo a este processo. Sobre a otimização do ciclo de tomada da decisão, pode-se dizer que ela será alcançada ao se fornecer a informação certa para a pessoa certa no momento certo, facilitando o entendimento da situação e a tomada de decisão. b. A informação e o seu ambiente Manuais como o JP 3-13-Information Operations, publicação conjunta do Departamento de Defesa norteamericano apresentam outro modelo conceitual teórico referente à Informação. O MD 31-D-03, já mencionado, também registra esses 5 A Superioridade de Informação é a capacidade de fornecer informações pertinentes aos usuários interessados, no momento oportuno e no formato adequado, negando ao adversário as oportunidades de atingi-la. Envolve a habilidade de criar uma vantagem por meio da utilização dessas informações quando em confronto com o oponente. MD 31-D-03. Ed 2006. p. 47/62. conceitos quando menciona a GCR. A Guerra Cibernética é outro ramo da doutrina militar que entende o Ambiente da Informação como um paradigma válido. Em linhas gerais, o ambiente da informação ou o domínio da GCR pode ser entendido como um conjunto de sistemas, pessoas e organizações que são responsáveis por coletar, processar e disseminar a informação e/ou agir utilizando-se da mesma. Considera-se que é neste ambiente que ocorre o ciclo decisório, conduzido por pessoas ou realizado de forma automatizada. A figura a seguir é a reprodução de um dos slides da apresentação realizada, pelo autor, no CIE e mostra este modelo em forma de domínios ou dimensões: Fig 2 Slide Fonte: autor A caracterização do ambiente em domínios permite entender de forma mais objetiva de que maneira a informação é produzida e transita como insumo do processo decisório. Ao mesmo tempo, a separação em domínios facilita entender as vulnerabilidades a que a informação e o processo decisório estão expostos, levando a deduzir quais capacidades disponíveis na Força, ou fora dela, poderão ser empregadas para proteger o nosso processo decisório e degradar o do inimigo/oponente. A figura 3 apresenta de maneira resumida alguns aspectos relacionados às vulnerabilidades. Fig 3 Vulnerabilidade do Ambiente de Informação Fonte: autor A título de exemplo, e considerando as vulnerabilidades conforme apresentado na figura 3, é possível elencar algumas possíveis ações para manter a integridade dos nossos processos e impactar o do inimigo/oponente: Domínio Físico Da Informação Cognitivo Vulnerabilidade Possíveis Ações Sujeito a ações que afetam as infraestruturas - emprego de ações cinéticas, de coleta, de transmissão, de processamento e emprego de Guerra Eletrônica (GE), de armazenamento da Informação. Defesa Cibernética (Def Ciber), etc. Sujeito a ações eletrônicas e físicas que podem remover, corromper, modificar, negar, - emprego de GE e Def Ciber. proteger, detectar, explorar ou degradar a informação. Sujeito a ações que influenciam a maneira - emprego de Operações Psicológicas como as pessoas recebem, processam, (Op Psc), Comunicação Social (Com interpretam e utilizam a informação, criando Soc), Ações Cívico Sociais (ACISO), uma percepção diferente da realidade. contato pessoal, dissimulação, etc. Tabela: Ambiente da Informação e os seus domínios Fonte: autor As ações suprarrelacionadas, quando empregadas de forma integrada6, permitem a sinergia necessária para interferir no ciclo normal de tomada da decisão. Isto quer dizer que, destruindo ou inabilitando estruturas físicas; corrompendo ou removendo dados e informações e/ou influenciando a percepção do usuário da informação poder-se-á influir diretamente no ritmo ou na direção da decisão tomada. O mesmo resultado será alcançado por meio da proteção em face dessas ações. 6 O termo integrada(o), neste texto, tem o por significado ações que vão além do simples desconflito de atribuições ou efeitos. Ele está relacionado à sinergia. A figura 4 mostra a comparação entre um processo decisório normal e outro sujeito a interferências, sendo que a nuvem representa o Ambiente a Informação: Fig 4 Processo Decisório Fonte: autor A figura procura mostrar que, sem a devida proteção do Ambiente da Informação, o ciclo decisório, invariavelmente, sofrerá interferências na medida em que o insumo básico do processo, a Informação, é alvo das mais diversas ações. Em resumo, sobre este aspecto estudado, é possível concluir parcialmente que o conhecimento do Ambiente da Informação é fundamental para entender que somente protegendo/explorando as suas vulnerabilidades será possível se sobrepor ao inimigo, no que tange ao processo decisório. c. Ideias atuais sobre o emprego das informações Com base nos conceitos apresentados anteriormente, em particular os que dizem respeito ao Ambiente da Informação, alguns países ocidentais e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) sistematizaram o emprego de seus recursos, notadamente militares, para prevalecer sobre os seus inimigos. EUA, Canadá e a OTAN entendem as Informações e o seu manejo para benefício da campanha militar de maneira bem semelhante, sendo que todos consideram a Superioridade de Informações como a chave pra a o sucesso das operações. Outro consenso é de que as forças militares oriundas desses atores e a sociedade em geral estão cada vez mais dependentes das infraestruturas que fazem parte do domínio físico; a sociedade, em particular, está sensível a influências no domínio cognitivo e a informação está cada vez mais à mercê de intervenções, conforme apresentado na tabela: Ambiente da Informação e os seus domínios. Estas mesmas circunstâncias podem ser generalizadas para todo o tipo de força militar que combate de maneira convencional e com algumas ressalvas para aquelas que se utilizam do combate irregular. Com base nessas premissas, os EUA utilizam, de forma integrada, todo e qualquer recurso disponível, em particular capacidades provenientes das Operações Psicológicas, da Guerra Eletrônica, da Guerra Cibernética, da Dissimulação e da Contrainteligência para aumentar a vantagem operacional, por meio da habilidade de coletar, processar e disseminar um fluxo ininterrupto de informações, ao mesmo tempo em que impede o inimigo de fazer o mesmo7. Além dessas capacidades principais, o Departamento de Defesa dos EUA preconiza que a Comunicação Social, a Diplomacia Pública, os Assuntos Civis, dentre outros, também pode contribuir de maneira significativa para o aumento da supramencionada vantagem operacional. Isto tudo visa a influir no processo de tomada da decisão do inimigo. Para a OTAN, a solução para se atingir a superioridade de informação perpassa pela utilização de recursos de maneira coordenada, que reforcem percepções, que protejam as informações e o seu fluxo e que afetem diretamente o Comando & Controle do inimigo. Considera, também, o emprego de ações cinéticas, utilizando sistemas tradicionais de armas. O objetivo, segundo a OTAN, é criar efeitos desejáveis que afetem o entendimento a respeito da situação, reduzindo o poder de combate do inimigo e aumentando o da aliança militar. Por fim, o Canadá emprega ações coordenadas de capacidades, à semelhança do realizado pelos EUA, para criar efeitos desejáveis que comprometam a consciência situacional do inimigo; que afetem as informações, os seus processos de aquisição, processamento e armazenamento e os processos e sistemas de tomada de decisão, deste mesmo inimigo. Em contrapartida, explora e protege as próprias informações, processos e sistemas. É possível concluir, de maneira parcial, que, mesmo compartilhando cenários semelhantes, nos quais a superioridade da informação é o calcanhar de Aquiles, os três atores mostrados apresentam abordagens com ligeiras distinções a respeito do assunto. Ao mesmo tempo, são unânimes em entender que a Informação deve ser trabalhada por diversos setores, de forma integrada, ou coordenada. Contudo, o objetivo final é levar o inimigo a adotar uma linha de ação menos favorável por meio da criação de uma realidade distorcida da situação, ou seja, modificar a sua consciência situacional. 3. CONCLUSÃO A criação de um Sistema Operacional especialmente dedicado à Informação não parece ser uma solução compartilhada internacionalmente. Apesar disso, o assunto merece ser estudado com maior profundidade no âmbito da Força Terrestre. Em síntese, é possível concluir que a informação é o insumo básico do processo decisório e que, por conta de uma série de fatores atuais, ela está diretamente sujeita às dimensões que compõem o seu ambiente. Isto conduz ao entendimento de que com capacidades integradas ou coordenadas, atuando neste ambiente, poder-se-á aumentar a superioridade militar no campo de batalha. É importante amadurecer os conceitos em torno do assunto, estudando iniciativas que tem apresentado êxito e, após um diagnóstico da atual situação da Força, expor propostas que suplantem possíveis lacunas existentes. Contudo, é necessário iniciar o estudo com base no preconizado nos manuais do MD, sugerindo, ao final, as mudanças necessárias. Impactar o processo decisório do inimigo, protegendo nossas forças do mesmo efeito, pode ser a diferença entre não precisar combater ou perder o conflito. A compreensão do papel da Informação em todo o seu contexto atual já é uma condição 7 Esta percepção está melhor detalha no Information Operations Primer - Fundamentals of Information Operations. básica para o sucesso da empreitada militar e aquele que melhor a manejar e a explorar ira obter, certamente, o sucesso final. REFERÊNCIAS BAKER. Ralph O.. Operações de Informações de Boas a Ótimas. Military Review. Edição Brasileira. Fort Leavenworth, Kansas, Estados Unidos da América, Setembro-Outubro 2011. BRASIL. Ministério da Defesa. Estado-Maior. MD 31-D-03: Doutrina Militar de Comando e Controle – Documento em caráter experimental, 1. ed. Brasília, DF, 2006. _______.MD 35-G-01: Glossário das Forças Armadas, 4 ed. Brasília, DF, 2007. _______. MD 30-M-01: Doutrina de Operações Conjuntas – 1º Volume, 1. ed. Brasília, DF, 2011. _______. Exército Brasileiro. Estado-Maior do Exército. Manual de Campanha C20-1: Glossário de Termos e Expressões para uso no Exército, 3. ed. 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