o enSino da étiCa , BioétiCa e deontologia na gRaduação de f onoaudiologia The teaching of ethics, bioethics and deontology in phonoaudiology graduation Aline M. Arakawa1, Cibele C. Santos2, Natalia G. Carleto2, Arsênio SalesPeres3, Sílvia H.C. Sales-Peres4 rESUmo O ensino da bioética nos cursos de graduação nas áreas da saúde é um tema emergente, decorrente da evolução científica e tecnológica. O curso de fonoaudiologia atende a problemas relativos a comunicação humana, e tem impacto direto sobre a qualidade de vida dos pacientes. O objetivo deste estudo foi identificar quais os cursos de graduação em Fonoaudiologia no país, apresentam em sua matriz curricular a disciplina de bioética, ética e/ou deontologia, e verificar qual ano do curso esta é ministrada. Os dados foram obtidos da lista de cursos disponibilizada pelo CFFa, via endereço eletrônico acessados entre os meses de março e abril de 2009. Junto ao CFFa estavam cadastradas 90 instituições. Destas, apenas 60 possuíam endereço eletrônico, sendo que 9 não possuíam a matriz curricular do curso, 9 não puderam ser acessadas por problemas no endereço eletrônico e 5 não constavam o curso de graduação em Fonoaudiologia e em 7 endereços não constavam as disciplinas de ética, bioética e/ou deontologia na matriz curricular. A Bioética, Ética, e Deontologia foram distribuídas de forma diferente em cada Instituição ao longo dos anos. Concluiu-se que nenhuma instituição adota os três termos e não há consenso em que período esta(s) deve(m) ser ministradas. palavraS -ChavE Bioética, teoria ética, curriculum abStraCt The teaching of bioethics in health sciences graduation is an issue that needs to be addressed, considering the scientific and technological development. The phonoaudiology deals with human communication issues, and has direct impact on patients life quality. The aim of this study was to identify which Brazilian phonoaudiology graduation courses included the disciplines of bioethics, ethics and/or deontology, and verify in which year of the course it is ministered. Data Mestranda pelo Programa de Pós-graduação em Ciências Odontológicas Aplicadas. Faculdade de Odontologia de Bauru – USP - Departamento de Saúde Coletiva. End: Al. Dr. Octávio Pinheiro Brisolla, 9-75, Bauru – SP. CEP: 17012-901. E-mail: [email protected] 1 2 Mestranda pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Odontológicas Aplicadas 3 Doutor em Odontologia Preventiva e Social. Professor responsável pela disciplina de Orientação Profissional do curso de ós-graduação da FOB/USP 4 Pós doutorado pela UNICAMP. Professora Associada da Faculdade de Odontologia de Bauru - USP Cad. Saúde Colet., Rio de JaneiRo, 17 (3): 529 - 544, 2009 – 547 a l i n e m . a R a k a w a , C i B e l e C . S a n t o S , n a t a l i a g . C a R l e t o , a R S ê n i o S a l e S - p e R e S , S i l v i a h . C . S a l e S p e R e S were obtained from the Conselho Federal de Fonoaudiologia (CFFa – national phonoaudiology council) online database, in the period from March to April 2009. There were 90 institutions registered in the CFFa database. 60 of them have available websites; of those, 9 did not display the curriculum online, 9 could not be verified due to website problems, 5 had no phonoaudiology graduation course information and 7 had no bioethics, ethics and/or deontology in the displayed curriculum. Those disciplines were distributed differently in each institution, over the course years. The conclusion is that no institution uses the three terms and there is no consensus about on which period the disciplines must be ministered KEy wordS Bioethics, ethical theory, curriculum 1. introdUção A bioética surgiu como um movimento interdisciplinar para questionar e refletir sobre as questões concretas que a sociedade atual está vivenciando. Relaciona-se com a discussão sobre a sustentabilidade do planeta, a natureza e a dignidade humana, a biotecnologia e outras temáticas, que interferem no processo saúde-doença e ultrapassam qualquer fronteira que limite áreas específicas do conhecimento (Ferreira & Ramos, 2006). O termo bioética apareceu pela primeira vez no início dos anos setenta e foi aplicado por Van Rensselaer Potter (Bioethics: the science of survival e Bioethics: bridge to the future, Prenctice Hall, Englewood Clifs -NY). Na verdade estas obras não tinham muita relação com o que hoje chamamos de bioética. Para ele a finalidade da bioética é auxiliar a humanidade no sentido de participação racional, porém cautelosa no processo da evolução biológica e cultural. O termo “bioética” significa, literalmente, “ética da vida” deve ser vista à luz dos princípios constitucionais e preceitos ordinários valendo-se da combinação de conhecimentos biológicos (Nicolielo et al., 2005) na conduta humana nas áreas da saúde, e através do desenvolvimento das Ciências Biológicas e dos avanços realizados no campo da saúde que a bioética surge como ponte que liga a reflexão no complexo universo dos dilemas éticos no campo da biociência (Sanches & Souza, 2008). Após o término da Segunda Guerra Mundial, em 1947, uma corte formada por juízes dos Estados Unidos reuniu-se para julgar os crimes cometidos pelos médicos nazistas em campos de concentração, devido às atrocidades cometidas por eles em nome da ciência; o que resultou na elaboração de um conjunto de preceitos éticos para a pesquisa clínica, conhecido como Código de Nuremberg (Diniz & Corrêa, 2001). Em suma este Código estabelece normas para a realização de experimento em seres humanos e a necessidade de obter 548 – Cad. Saúde Colet., Rio de JaneiRo, 17 (3): 547 - 558, 2009 o enSino da étiCa, BioétiCa e deontologia na gRaduação de fonoaudiologia o consentimento livre e esclarecido dos indivíduos (Shuster, 1997). Por fim, este Código promoveu relfexos com profunda influência na área de direitos humanos e bioética, consagrando-se em inúmeras leis internacionais (Grodin & Annas, 1996), e após a elaboração deste, outras diretrizes foram propostas como a Declaração de Helsinki (Guerra García, 2007). A principal razão para que a bioética viesse a ocupar lugar de tão grande destaque na atualidade foi, indubitavelmente, decorrente da acelerada evolução científica e tecnológica experimentada pelas ciências biológicas e da saúde (Fernandes Junior, 2002). A primeira trata-se de como um conjunto de princípios morais que regem os direitos e deveres de cada um de nós e que são estabelecidos e aceitos por determinada comunidade humana, relacionando a responsabilidade individual, pública, e dos Estados (Koerich et al., 2005). Pieper (2008) considera a segunda, um ramo da ética baseada na moral, que ações são boas ou ruins em si mesmas, sendo fundamentadas na noção de que se deve fazer o que é moralmente certo e de que se deve evitar o que é moralmente errado (Lara & Pena, 2005). Trata-se de um conjunto de normas ou princípios que têm por fim a orientação das relações profissionais, destes com seus clientes, com a equipe de trabalho, com as instituições a que servem, gerando os Códigos de Ética elaborados por associações de classe (Figueira et al., 2004). No entanto, observa-se o avanço do conhecimento acerca da área da saúde e as intervenções necessárias com o distanciamento cada vez maior entre profissionais/instituições de saúde e usuários (Souza et al., 2005). A educação ética embasada somente em discussões conceituais não é suficiente para formar os profissionais que o momento atual exige. Um novo paradigma em saúde se estabeleceu na América Latina e tem-se discutido intensivamente a necessidade de mudança nas metodologias de formação dos profissionais da saúde. Um novo modelo de saúde exige novos sujeitos sociais, novas formas de prestação de serviços e novas maneiras de formar os profissionais da área (Almeida et al., 1999). Com as grandes transformações na área da saúde nos últimos anos, a sociedade tem manifestado preocupação com aspectos que tangem a segurança de direitos subjetivos surgidos nas relações jurídicas quanto aos serviços relacionados à saúde (Sales Peres et al., 2006) tornando crescente a importância da ética e bioética para a compreensão da realidade e antecipação às novas questões impostas na vida daqueles que lidam com a saúde. Em todo o mundo observa-se uma tendência de abordagem multidisciplinar e integrada das questões relacionadas à bioética (Dantas & Souza, 2008). A bioética deve ser uma disciplina capaz de acompanhar o desenvolvimento Cad. Saúde Colet., Rio de JaneiRo, 17 (3): 547 - 558, 2009 – 549 a l i n e m . a R a k a w a , C i B e l e C . S a n t o S , n a t a l i a g . C a R l e t o , a R S ê n i o S a l e S - p e R e S , S i l v i a h . C . S a l e S p e R e S científico com a consciência ética e moral, supostamente isenta de interesses (Potter, 1971). Devido ao seu caráter multidisciplinar, o ensino da bioética representa um desafio para muitos educadores e pesquisadores, principalmente porque exige informações de diferentes áreas como da filosofia, medicina, biologia e da antropologia (Aires et al., 2006). Diante do pressuposto, pode-se dizer que é crescente a importância da ética médica e bioética para a compreensão das novas questões impostas na vida daqueles que lidam com a saúde (Almeida et al., 2008). Como parte desta diversidade, podemos citar o ensino da bioética não somente na Fonoaudiologia, como também, na Medicina (Hossne, 2006), na Enfermagem (Ferreira & Ramos, 2006), na Psicologia (Ferreira Neto & Pena, 2006) e na Odontologia (Aires et al., 2006). E ainda, observa-se que muitos estudos mostram a busca do ensino da bioética ao longo da graduação (Figueira et al., 2004; Ferreira & Ramos, 2006; Ferreira Neto & Pena, 2006) bem como na pós-graduação (Dantas & Souza, 2008). Logo, a bioética conta com um importante desenvolvimento metodológico e didático, principalmente devido à complexidade de temas que podem ser abordados (Correa & Javier, 2008). O ensino da disciplina de bioética nos cursos de graduação é um tema emergente cuja discussão é imperativa, especialmente na área de ciências da saúde (Musse et al., 2007). A profissão de Fonoaudiologia é a área da saúde que atende o ser humano nos problemas relativos à comunicação como um todo, uma vez que a comunicação influencia na qualidade de vida do paciente. Além disso a profissão envolve, não só questões relativas à pesquisa cientifica, mas também aspectos referentes ao atendimento de pacientes, e por esse motivo apresenta muitas áreas de interesse bioético (Nicolielo et al., 2005). O fonoaudiólogo recebe em sua formação conhecimentos globais, incluindo aspectos culturais, emocionais, físicos, ambientais e econômicos (Lipay & Almeida, 2007), a fim de formar um profissional generalista, humanista, crítico e reflexivo (Santos & Rodrigues, 2007). No dia 19 de Fevereiro de 2002, o Conselho Nacional de Educação junto com a Câmara de Educação Superior criaram a RESOLUÇÃO CNE/ CES, que institui diretrizes curriculares nacionais ao curso de graduação em Fonoaudiologia. Segundo o artigo 3º dessa resolução, estabelecem-se normativas para a formação do Fonoaudiólogo, sendo esta generalista, humanista, crítica e reflexiva. Já o artigo 4º dessa resolução refere-se as quais tarefas o profissional deve desempenhar em sua função como na atenção à saúde dentro dos mais altos padrões de qualidade e dos princípios da ética/bioética. O artigo 5º dessa resolução afirma que os conhecimentos requeridos na formação do Fonoaudiólogo, para realização de análise crítica, no campo 550 – Cad. Saúde Colet., Rio de JaneiRo, 17 (3): 547 - 558, 2009 o enSino da étiCa, BioétiCa e deontologia na gRaduação de fonoaudiologia fonoaudiológico, precisam ser estabelecidos e para isso há uma grande importância de ter uma formação científica, generalista ao desenvolver, participar e/ou analisar projetos de atuação profissional disciplinares, multidisciplinares, interdisciplinares e transdisciplinares. Complementando tais artigos, encontra-se o artigo 6º da resolução, ressaltando que o Curso de Graduação em Fonoaudiologia deve oferecer base para contemplar o processo saúde-doença ao associar o estudo de áreas como: Ciências Biológicas e da Saúde, Ciências Sociais e Ciências Fonoaudiológicas. Por fim, o artigo 13 afirma que a estrutura do Curso de Graduação em Fonoaudiologia deve garantir a organização curricular que proporcione um desenvolvimento coerente e gradual, garantindo a relação teórico-prática para uma melhor formação desse profissional. Pensando nisso a importância do ensino da bioética torna-se indispensável para o curso de Fonoaudiologia uma vez que se facultará na formação de “bons fonoaudiólogos” e “fonoaudiólogos bons”, competentes, compassivos, solidários, respeitadores dos seus pacientes e, ao mesmo tempo, procuradores dos interesses dos mesmos. Dessa forma, o propósito desse artigo é identificar, em nível nacional, quais os cursos de graduação em Fonoaudiologia que apresentam em sua matriz curricular a disciplina de bioética, ética e/ou deontologia, como também verificar em que ano do curso esta é ministrada. 2. mÉtodoS Foram coletadas informações, via endereço eletrônico, das instituições de ensino superior do país, que oferecem o curso de Fonoaudiologia, utilizando como referência a lista de cursos disponibilizada pelo Conselho Federal de Fonoaudiologia (CFFa) em seu endereço eletrônico na rede mundial de computadores (www.fonoaudiologia.org.br). Os endereços eletrônicos das faculdades selecionadas foram acessados para análise de sua condição de gestão – pública ou privada, para verificar se em sua matriz curricular possui a disciplina de bioética, ética e/ou deontologia, bem como, qual ano do curso a mesma é ministrada. No site, as faculdades estão divididas de acordo com suas respectivas regiões, sendo que a 1ª região refere-se ao Estado do Rio de Janeiro; a 2ª região refere-se ao Estado de São Paulo; a 3ª região refere-se aos Estados de Paraná e Santa Catarina; a 4ª região aos Estados de Alagoas, Bahia, Pernambuco, Paraíba e Sergipe; a 5ª região aos Estados do Acre, Amazonas, Amapá, Distrito Federal, Goiás, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins. A 6ª região comporta os Estados de Espírito Santo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso; a 7ª região os Estado do Rio Grande do Sul; e por fim, a 8ª região os Estados do Ceará, Piauí, Maranhão e Rio Grande do Norte. Cad. Saúde Colet., Rio de JaneiRo, 17 (3): 547 - 558, 2009 – 551 aline m. aRakawa, CiBele C. SantoS, natalia g. CaRleto, aRSênio SaleS-peReS, Silvia h.C. SaleS peReS Vale ressaltar ainda que neste trabalho os termos “ética profissional” e “ética em fonoaudiologia” encontrados em algumas matrizes curriculares, foram considerados como “deontologia” nas apresentações em tabela. A pesquisa foi executada durante os meses de março e abril de 2009. 3. rESUltadoS Após a realização da busca do ensino da bioética nas instituições nacionais, via endereço eletrônico, pode-se observar os seguintes resultados. A relação de faculdades no endereço eletrônico do CFFa apresentava 90 instituições nas quais 18 eram públicas e 72 privadas. A consulta aos endereços eletrônicos das instituições possibilitou a obtenção de informações sobre a grade curricular de 60 instituições, sendo que 9 endereços eletrônicos não possuíam a matriz curricular do curso, em 9 não foi possível o acesso devido problemas no endereço eletrônico e em 5 não constavam o curso de graduação em Fonoaudiologia e em 7 endereços não consta a disciplina de ética, bioética e/ou deontologia na matriz curricular. Das 60 instituições selecionadas, 14 apresentavam a disciplina de bioética, 25 de ética, 35 de deontologia em sua matriz curricular, considerando-se que grande parte das matrizes curriculares encontradas não tinham a descrição do conteúdo da disciplina disponibilizada. Em relação ao ano em que a disciplina de ética é ministrada, em 1 instituição esta ocorre no primeiro ano, em 14 instituições no segundo ano, em 9 instituições ocorre no terceiro ano e em 1, no quarto ano. Quanto a disciplina de bioética, é ministrada em 2 instituições no primeiro ano, em 5 instituições no segundo ano, em 6 instituições no terceiro ano e em 1 instituição no quarto ano. Já a disciplina de deontologia é encontrada na matriz curricular em 2 instituições no primeiro ano, em 15 instituições no segundo ano , em 11 instituições no terceiro ano, em 7 instituições no quarto ano e 2 instituições não informaram o período. Pode-se verificar também que a disciplina de ética e bioética é ministrada no segundo ano por 3 instituições e também por 2 instituições no terceiro ano. A disciplina de ética e deontologia foi oferecida no segundo ano por 3 instituições, por 1 instituição no terceiro ano e apenas 1 instituição não informou o período desta. Tabela 1 Ensino superior em fonoaudiologia - 1ª e 2ª Regiões do Brasil 552 1° ano 2° ano 3° ano 4° ano Ética - 4 3 1 Bioética - 1 2 - Deontologia - 6 3 2 – Cad. Saúde Colet., Rio de JaneiRo, 17 (3): 547 - 558, 2009 o enSino da étiCa, BioétiCa e deontologia na gRaduação de fonoaudiologia Tabela 2 Ensino superior em fonoaudilogia - 3ª, 4ª e 5ª Regiões do Brasil 1° ano 2° ano 3° ano 4° ano Ética 1 6 1 - Bioética - 2 - - Deontologia 1 4 4 3 Tabela 3 Ensino superior em fonoaudilogia - 6ª, 7ª e 8ª Regiões do Brasil 1° ano 2° ano 3° ano 4° ano Ética - 4 5 - Bioética 2 2 4 1 Deontologia 1 5 4 2 Além disso, observou-se que 55% das instituições oferecem a disciplina de ética, bioética e/ou deontologia durante os primeiros 2 anos do curso. Abaixo encontramse tabelas divididas entre 1ª e 2ª regiões, 3ª, 4ª e 5ª regiões e 6ª, 7ª e 8ª regiões. 4. diSCUSSão O estudo dos aspectos éticos que envolvem o exercício das profissões de saúde tem merecido crescente atenção nas últimas décadas, em todo o mundo16. Segundo o Conselho Federal de Fonoaudiologia, a Resolução CNE/CES 5, de 19 de fevereiro de 2002, estabeleceu a inclusão de diretrizes curriculares nacionais no curso de graduação em Fonoaudiologia. Tais diretrizes afirmam que, para a formação do fonoaudiólogo, este deve ser capacitado a atuar, pautado em princípios éticos, no campo clínico-terapêutico e preventivo das práticas fonoaudiológicas, justificando a importância da existência das disciplinas de ética, bioética e/ou deontologia na matriz curricular do curso de graduação do mesmo (Brasil, 2002). Isso possibilitou a exposição e discussão de uma amplitude de valores que facilitarão ao aluno conhecê-los, e a tomar consciência de um conjunto de princípios que lhe sejam pessoais e que, possivelmente, se modificarão em decorrência das experiências a que estará sujeito ao longo de sua existência, incluindo a própria vida profissional (Ferreira & Ramos, 2006). Cad. Saúde Colet., Rio de JaneiRo, 17 (3): 547 - 558, 2009 – 553 a l i n e m . a R a k a w a , C i B e l e C . S a n t o S , n a t a l i a g . C a R l e t o , a R S ê n i o S a l e S - p e R e S , S i l v i a h . C . S a l e S p e R e S Apesar da maioria das instituições pesquisadas apresentarem em sua matriz curricular a disciplina de ética, bioética e/ou deontologia, pode-se observar que esta é ministrada somente durante 1 período (6 meses), ou seja, há pouca relevância quanto a carga horária que a disciplina é oferecida. Este trabalho também mostrou que nos cursos de Fonoaudiologia, 55% das instituições pesquisadas oferecem a disciplina de ética, bioética e/ou deontologia durante os primeiros 2 anos do curso. Condiz assim com o estudo de Almeida et al., 2008 no qual foram aplicados questionários a docentes e discentes referentes ao interesse e ao conhecimento sobre ética médica e bioética na graduação médica e obtiveram como resultado que o momento mais adequado para ministrar a disciplina ética médica seria, na opinião dos estudantes, o primeiro semestre (28,7%), seguido da opção “todos os semestres” (21,4%). Apenas um estudante (0,3%) considerou que a disciplina não é essencial durante a graduação e quatro consideraram que a disciplina deveria ser optativa. No grupo dos professores, a maioria (62,9%, n = 56) considerou que a disciplina deveria ser ministrada em todos os semestres. Porém contradiz com o estudo de Musse et al. (2007) no qual foi verificado que nos cursos de Odontologia das universidades pesquisadas, a disciplina de Bioética é oferecida apenas na metade final do curso. Contudo, pesquisadores como Prado e Garrafa (2006) apresentaram o resultado de uma pesquisa na qual concluíram que os alunos e cirurgiões-dentistas com formação em bioética demonstraram uma visão mais abrangente e crítica sobre os temas discutidos relacionados à bioética. Esse estudo faz menção à importância da inserção dessa disciplina na graduação em todos os cursos da área da saúde. Além disso, por serem escassos estudos publicados na profissão de Fonoaudiologia sobre o ensino da disciplina de bioética, ética e/ou deontologia na graduação, este estudo levou em consideração as referências de trabalhos publicados na área da saúde que também inseriram em seus cursos essa disciplina, porém ainda são restritas as revistas indexadas nos bancos de dados pesquisados que priorizam a publicação de artigos que versam sobre essa temática. 5. ConClUSão Nesse estudo concluiu-se que a disciplina é distribuída de forma diferente em cada instituição ao longo dos anos de formação dos estudantes de graduação e que nenhuma adota os três termos unificados. A grande maioria das instituições apresentou em sua matriz curricular a disciplina de ética, bioética e/ou deontologia, mas não há consenso em que período esta deve ser ministrada, e também que grande parte das matrizes curriculares encontradas não tinham a descrição do conteúdo da disciplina disponibilizada. Contudo, faz-se necessário a realização de mais estudos a respeito do assunto podendo vir a estabelecer um período em comum para o oferecimento 554 – Cad. Saúde Colet., Rio de JaneiRo, 17 (3): 547 - 558, 2009 o enSino da étiCa, BioétiCa e deontologia na gRaduação de fonoaudiologia da disciplina entre as instituições como também a disponibilização do conteúdo da mesma. Por se tratar de um tema pouco estudado, este trabalho fornece dados originais em nosso meio científico sobre a inserção da disciplina de ética, bioética e/ou deontologia, contribuindo para melhor fundamentação do ensino fonoaudiológico bem como das outras áreas da saúde, em sua vertente científica e generalista, fundamental à prática profissional. RefeRênCiaS airES, C. p.; hUgo, f. n.; roSalEn, p. l.; marCondES, f. K. Teaching of bioethics in dental graduate programs in Brazil. Brazilian Oral Research. São Paulo v. 20, n. 4, p. 285 – 289, 2006. almEida, a. m.; bitEnCoUrt, a. g. v.; navES, n. m. b. C.; navES, f. b. C. S.; lordElo m. r.; lEmoS, K. m.; nUñEz, g. r.; barbEtta, m. C.; athanazio, r. a.; nEry-filho, a. Conhecimento e interesse em ética médica e bioética na graduação médica. Revista Brasileira de Educação Médica. Rio de Janeiro, v. 32, n. 4, p. 437 – 444, 2008. almEida, m.; fEUErwErKEr, l.; llanoS, m. 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