DISTÚRBIOS METABÓLICOS DISTÚRBIOS METABÓLICOS, Introdução ................................................. 531 Doenças Metabólicas Hereditárias .......................................................... 531 Doenças Relacionadas à Produção ......................................................... 532 TEMPERATURA CORPORAL ...................................................................... 533 PORFIRIA ERITROPOIÉTICA CONGÊNITA ................................................ 535 SÍNDROME DA VACA OBESA ..................................................................... 536 HIPOGLICEMIA NEONATAL (ver MCN) ...................................................... 1322 TETANIA DEVIDO À HIPOMAGNESEMIA EM BOVINOS E OVINOS ........ 536 Tetania devido à Hipomagnesemia em Bezerros .................................... 538 CETOSE NO GADO ...................................................................................... 538 TETANIA DA LACTAÇÃO EM ÉGUAS ........................................................ 540 HIPERTERMIA MALIGNA ............................................................................. 541 OBESIDADE .................................................................................................. 543 PARESIA DA PARTURIENTE EM VACAS .................................................. 544 PARESIA DA PARTURIENTE EM OVELHAS .............................................. 545 EXAUSTÃO FÍSICA ...................................................................................... 546 HEMOGLOBINÚRIA PÓS-PARTO ............................................................... 549 TOXEMIA DA PRENHEZ EM VACAS .......................................................... 549 TOXEMIA DA PRENHEZ EM OVELHAS ...................................................... 550 TETANIA PUERPERAL ................................................................................ 551 TETANIA DO TRANSPORTE EM RUMINANTES ........................................ 553 DISTÚRBIOS METABÓLICOS, INTRODUÇÃO As doenças metabólicas podem ser hereditárias ou adquiridas, sendo as últimas mais importantes. As doenças metabólicas têm importância clínica, pois afetam a produção de energia ou lesam tecidos críticos para a sobrevivência. DOENÇAS METABÓLICAS HEREDITÁRIAS Erros inatos do metabolismo são desordens genéticas raras que acometem muitos animais, mais comumente cães e gatos. A doença resulta de uma ausência parcial ou total de uma enzima crítica no metabolismo intermediário. A maioria das desordens primariamente documentadas afeta o SNC, as chamadas “doenças armazenadas.” A doença ocorre porque quantidades anormais de substratos de enzimas são “armazenadas” dentro dos lisossomos dos neurônios, que prejudicam sua função. Geralmente, os animais são normais ao nascimento, mas manifestam Distúrbios Metabólicos, Introdução 532 sinais clínicos dentro das primeiras semanas ou meses de vida. Estas doenças são progressivas e geralmente fatais, e não há tratamento específico atualmente para qualquer uma delas. As gangliosidoses, GM1 e GM2, ocorrem em gatas siamesas, korat e naquelas sem raça definida; em cães beagle, pointer alemão de pêlo curto e spaniel japonês. A esfingomielinose ocorre em gatos siameses e naqueles sem raça definida. A lipofuscinose ceróide ocorre em setters ingleses, cocker spaniels, dachshunds, chihuahuas, salukis e em gatos domésticos. A manosidose ocorre em gatos persas em sem raça definida. A glicogenose do Tipo II ocorre em cães lapland e a do Tipo III em pastores alemães. A leucodistrofia de células globóides (de Krabbe) ocorre em cairn terriers, west highland white terriers, bluetick hounds, beagles, poodles, lulus da Pomerânia e basset hounds. A mucopolissacaridose do Tipo VI, uma doença primariamente associada a laminite, ocorre em gatos siameses; o Tipo I ocorre em cães e gatos. Doenças associadas a leucopenia e anemia incluem deficiência de piruvatocinase em basenjis e beagles; deficiência de fosfofrutocinase em springer spaniels ingleses. Os eqüinos não possuem doenças metabólicas documentadas, exceto a metemoglobinemia possivelmente congênita e tremores episódicos. Em animais de grande porte, a quantidade deste tipo de doença é pequena, e a daquelas que ocorrem possui baixa incidência. A mais comum provavelmente é a manosidose em bovinos angus, galloway e murray grey; e de caprinos. Outras doenças identificadas que se manifestam por sinais neurológicos e que provavelmente são hereditárias são as gangliosidoses GM1 e GM2 em bovinos e suínos, respectivamente; a lipofuscinose ceróide em ovinos; as glicogenoses generalizadas em bovinos e ovinos; a citrulinemia e a uropatia em xarope de bordo em bovinos; e a leucodistrofia de células globóides em ovinos. Outras doenças hereditárias nas quais ocorrem erros metabólicos básicos de tecidos específicos são: bócio em ovinos e caprinos, paraceratose hereditária (edema) em bovinos, osteogênese imperfeita em ovinos e caprinos, e possivelmente miocardiopatia de bovinos, as hipotricoses, bezerros alopécicos, fotossensibilização de ovinos, dermatose vegetante, síndrome do estresse em suínos, dermatosparaxia e síndrome de Ehlers-Danlos em bovinos. Muitos outros defeitos hereditários, principalmente aqueles relacionados ao crescimento anormal de colágeno, cartilagem e osso, provavelmente também se devem a erros metabólicos básicos de tecidos estruturais. DOENÇAS RELACIONADAS À PRODUÇÃO (Doenças metabólicas adquiridas) “A verdadeira doença metabólica” geralmente resulta de uma deficiência ou excesso herdado de catalisador(es) ou enzima(s). Entretanto, a maioria das doenças discutidas nesta seção está primariamente relacionada à produção ou ao manejo, embora o metabolismo seja um fator crítico na patogenia de cada doença. Sua causa em muitos casos não é uma falha no metabolismo, mas sim um incremento de demanda para um nutriente particular, sendo seu suprimento adequado sob condições selecionadas. Estas doenças, como hipocalcemia, hipomagnesemia e hipoglicemia, são favorecidas pelas práticas de manejo que visam a um aumento da produção. Portanto, elas são mais adequadamente intituladas de doenças da produção. Por outro lado, sustenta-se que elas sejam doenças metabólicas porque o manejo do animal demanda uma produção que, no seu pico, está acima da capacidade das reservas metabólicas do animal para sustentar certos nutrientes nas concentrações fisiológicas . Portanto, a paresia das vacas parturientes ocorre quando a secreção mamária de cálcio é superior ao que a dieta pode fornecer ou maior que o fornecimento de emergência que o sistema ósseo pode Temperatura Corporal 533 reunir em pouco tempo. Há situações paralelas com glicose e magnésio, e com fósforo em relação à hemoglobinúria pós-parto. Nem todas as “doenças metabólicas” induzidas pela produção são devidas a um simples balanço negativo de determinado nutriente. Em algumas situações, a ingestão da dieta de determinado nutriente é subitamente reduzida em face de uma alta e constante necessidade metabólica, por exemplo, toxemia da prenhez de ovelhas e vacas de corte, síndrome da vaca obesa em gado leiteiro e, provavelmente, hiperlipemia em éguas-pônei. Ainda são classificadas como doenças induzidas pela produção, porque um manejo ditado financeiramente decide não suplementar uma rápida queda no plano nutricional do animal que precipita a doença. A mioglobinúria paralítica dos cavalos é um outro tipo de doença metabólica induzida pela produção. Neste caso, a produção (atividade física de trabalho ou corrida) é mantida por um determinado nível de aporte nutritivo. Uma decisão de não trabalhar ou fazer correr o animal sem uma concomitante diminuição da ingestão de alimentos pode resultar em acúmulo de glicogênio num nível perigoso. A doença é produzida quando se resume o trabalho e a produção de ácido láctico excede seu metabolismo. A diferença entre as doenças metabólicas relacionadas à produção e à deficiência nutricional é freqüentemente sutil. Em termos gerais, as deficiências nutricionais são de larga duração, de estado crônico e corrigidas apenas pela suplementação da dieta. As doenças metabólicas são de estados agudos que respondem efetivamente à administração sistêmica do metabólito necessário, embora o animal possa requerer suplementação dietética para evitar o retorno da doença. O aspecto mais importante das doenças de produção metabólica induzidas pela produção é o diagnóstico rápido e acurado. Se possível, os mesmos testes devem ser utilizados para predizer a provável ocorrência da doença, antes de seu início clínico a fim de evitar as perdas financeiras que elas causam. Um sistema particular de diagnóstico que faz este trabalho é o Teste de Perfil Metabólico de Compton. O teste é baseado no exame de diversas amostras de grupos e na comparação dos estados bioquímicos dos animais dentro de um determinado rebanho e que estejam ou não num estado de estresse metabólico. Um desvio do grupo estressado em relação ao grupo normal é tomado como índice de potencial de ocorrência da doença. O sistema tem a desvantagem de ser caro. Uma extensão do sistema para predizer o desenvolvimento da doença em indivíduos não é recomendada favoravelmente pela mesma razão. TEMPERATURA CORPORAL Nos animais homeotérmicos, a função celular normal depende de uma temperatura corporal relativamente constante. Esta temperatura corresponde à soma entre o calor produzido e o calor perdido ou conservado, e é regulada por um mecanismo central do hipotálamo que ativa as atividades fisiológicas e comportamentais. A produção de calor é aumentada por tremor, termogênese não tremular, exercício, ingestão de alimento, taxa metabólica e secreção de certos hormônios. Em herbívoros, a fermentação bacteriana no trato GI representa uma fonte adicional de calor. A conservação do calor resulta da vasoconstrição periférica e de respostas comportamentais que reduzam a área superficial a partir da qual o calor possa ser perdido. Animais expostos ao calor excessivo procuram um ambiente mais frio, onde a perda de calor possa ser acelerada. O calor é perdido por radiação, condução e vaporização da água pelas vias respiratórias e pela pele; pequenas quantidades são perdidas nas fezes e na urina. Temperatura Corporal 534 As perdas são aceleradas pela área superficial maior, pelo ambiente mais frio, pela vasodilatação periférica, pelo arfar e pelo suor. O pêlo reduz a capacidade de perder calor, então animais muito peludos e aqueles com pelame escuro são vulneráveis a altas temperaturas. Os ruminantes possuem um mecanismo de sudorese limitado; portanto, a perda de calor por evaporação é ineficiente. Em animais de sangue quente ou homeotérmicos, a temperatura corporal real varia de espécie para espécie e às vezes entre indivíduos da mesma espécie (ver TABELAS 3 e 4, págs. 1169 e 1170); a temperatura normal pode variar de 35° a 43°C. Partes periféricas do corpo possuem temperaturas diferentes, em grande parte devido à temperatura ambiente e à quantidade de insulação. A temperatura retal é representativa da temperatura corporal, a qual varia menos. A temperatura basal pode ser obtida pela manhã, após um período de descanso, sem excitar o animal. Variação normal – A temperatura corporal de animais sadios está sujeita a variações diurnas leves. A temperatura eleva-se durante o dia e cai durante a noite. Grandes animais, como eqüinos, bovinos e elefantes, apresentam pequenas variações diurnas (, 0,5°C). Certos animais, por exemplo, os camelos, que são adaptados a grandes variações na temperatura ambiente e a uma disponibilidade restrita de água, apresentam flutuações diurnas na temperatura corporal, chegando até 5°C. A hipertermia em vários graus pode resultar de esforço, excitação ou exposição prolongada a ambientes quentes ou úmidos. A hipertermia devida à reduzida perda de calor pode afetar seriamente as funções normais, por exemplo, vacas sujeitas a temperaturas ambientais excessivamente altas reduzem a ingestão de alimento e perdem peso, e a produção láctea cai. A perda de calor está associada à perda de água. Têm sido demonstrados efeitos teratogênicos em embriões cujas mães foram sujeitas à hipertermia durante a gestação. Quando não há água disponível, a desidratação leva à inibição da sudorese; isto pode levar à hipertermia, que pode ser tratada prontamente pela administração de água (ver HIPERTERMIA MALIGNA , pág. 541). Variações sazonais na temperatura corporal estão relacionadas ao estresse ambiental e ao ciclo reprodutivo. No inverno, a temperatura retal pode estar 1°C abaixo dos níveis no verão. Antes da ovulação, a temperatura basal pode estar , 0,5°C abaixo do nível dos dias anteriores. Durante o estro, o nível é um tanto mais alto. Está um pouco acima do normal durante a primeira metade da gestação. Animais jovens possuem temperaturas mais instáveis que os idosos, com flutuações diurnas um tanto maiores. A febre é produzida por pirógeno químico, viral ou bacteriano. É o resultado de um “reajuste” dos mecanismos de termorregulação para funcionar acima dos níveis normais. Em muitos animais, as prostaglandinas são responsáveis por este reajuste; isto explica a efetividade da aspirina na redução da febre. Imediatamente após o nascimento, os neonatos não apresentam febre durante uma infecção, mas dentro de poucos dias, animais jovens respondem à infecção com uma febre muito maior do que a dos animais maduros. Em animais idosos, mesmo infecções severas produzem pouca ou nenhuma alteração na temperatura corporal. Na febre diurna, que pode indicar infecção crônica, a temperatura pode elevar-se por vários graus durante o dia e retornar ao normal à noite. Muitas infecções causam febre por indução de produção de pirógenos endógenos (interleucina-1) a partir dos leucócitos polimorfonucleares, que constituem um mecanismo de defesa. Estes pirógenos atravessam a barreira hematoencefálica para ajustar os centros de termorregulação no cérebro. Nas infecções agudas, a temperatura pode permanecer vários graus acima do normal por alguns dias, às vezes com uma flutuação diurna sobreposta. A febre reincidente de algumas infecções crônicas (por exemplo, brucelose) caracteriza-se por vários dias de temperatura corporal elevada, seguidos por vários dias de temperatura normal. Um calafrio geralmente é o mensageiro de um episódio febril e representa um período de produção e conservação de calor. O episódio começa com extrema Porfiria Eritropoiética Congênita 535 irritabilidade, tremor, procura por um ambiente quente e redução da área superficial do corpo (“envolvendo-se”) a partir da qual o calor pode ser perdido. No momento do calafrio, a temperatura corporal já está elevada; os mecanismos já mencionados produzem mais calor e fazem a temperatura elevar-se ainda mais. Ocorrem distúrbios metabólicos como resultado da febre. O mais notável destes é devido à excessiva perda de água. Desidratação severa pode produzir um aumento na temperatura corporal, que é resolvido pela administração de fluidos. Febre persistente pode levar a perda de cloreto de sódio e lesão cerebral. Durante o verão e depois da febre, eqüinos e bovinos devem ter sal disponível para repor as perdas. Os desequilíbrios ácido-básico e eletrolítico, associados a febre prolongada ou hipertermia, podem levar à acidose. Se a febre persistir, podem ocorrer convulsões, excessiva produção de calor, lesão cerebral e possivelmente morte. A febre pode ser tratada resfriando-se o animal por meio de banhos de imersão frios, ou no caso de pequenos animais, com banhos com esponja embebida em álcool. As convulsões podem ser controladas por sedação ou doses anestésicas de barbitúricos. A temperatura corporal máxima compatível com a vida é de 5°C acima do nível normal do animal. Hipotermia (ver também pág. 759) – Quando a pele ou o sangue são resfriados o suficiente para diminuir a temperatura corporal de animais que não estão hibernando, os processos metabólico e fisiológico diminuem. As taxas cardíacas e respiratórias tornam-se lentas, a pressão sangüínea é baixa e a consciência é perdida. Com uma temperatura retal de < 28°C, a habilidade para recuperar a temperatura normal é perdida, mas o animal continuará a sobreviver e, se for aplicado calor externo, a temperatura retornará ao normal. Estes achados têm sido adaptados e usados extensivamente em cirurgias cardíacas e cerebrais no homem. No estado de hipotermia, o oxigênio necessário para as células, principalmente para os neurônios, é muito reduzido, e a circulação pode parar relativamente por longos períodos. Uma temperatura corporal diminuída é observada em estágios terminais. É um sinal prognóstico ruim no caso de doenças infecciosas. No caso de hipotermia acidental, o animal deve ser colocado em um ambiente aquecido e lentamente deve retornar à temperatura normal. PORFIRIA ERITROPOIÉTICA CONGÊNITA (Porfirinúria, Dente rosado) É uma doença hereditária rara, típica de bovinos, suínos e homens, na qual a formação defeituosa de hemoglobina resulta na produção de quantidade excessiva de porfirinas do Tipo I nos núcleos dos normoblastos em desenvolvimento. O defeito no gado é herdado como um fator recessivo simples, e geralmente é restrito aos rebanhos nos quais o endocruzamento ou cruzamento entre animais próximos é praticado. A doença tem sido reconhecida nos EUA, Canadá, Dinamarca, Jamaica, Inglaterra, África do Sul, Austrália e Argentina. O animal heterozigoto parece ser normal, mas o homozigoto recessivo é afetado ao nascimento e possui uma descoloração marrom-avermelhada dos dentes, ossos e urina. A urina contém quantidades excessivas de coproporfirina I e uroporfirina I, mas a descoloração dos dentes e ossos é devida primariamente à uroporfirina I. Os ossos, a urina e os dentes (especialmente os decíduos) exibem uma marcante fluorescência rósea quando irradiados com luz ultravioleta. A exposição prolongada à luz solar causa lesões típicas de fotossensibilidade com necrose superficial das porções não pigmentadas da pele. Uma anemia hemolítica se desenvolve, sendo caracterizada por normocromia Porfiria Eritropoiética Congênita 536 com macrócitos e micrócitos e marcante pontilhado basofílico. A esplenomegalia eventualmente se desenvolve e os ossos mostram um aumento de fragilidade devido a um córtex diminuído. O animal se torna progressivamente apático e pode morrer, a menos que seja protegido da luz solar. Uma doença semelhante (ver pág. 949) causa fotossensibilidade somente no gado limusine e no homem. O defeito nos porcos e gatos é extremamente raro e difere da doença em algumas circunstâncias encontrada nos bovinos. A fotossensibilização não é característica e a doença é transmitida de maneira autossômica dominante. A doença nos suínos tem sido relatada somente na Dinamarca e Nova Zelândia; nos gatos, ela tem sido reconhecida somente nos EUA. O diagnóstico deve ser baseado na excreção de uroporfirinas anormais e na descoloração marrom dos dentes, os quais exibem fluorescência vermelho-alaranjada quando irradiados com luz ultravioleta. Animais afetados e seus parentes heterozigotos devem ser excluídos do programa reprodutivo, pois não há teste laboratorial definitivo para detecção de heterozigotos clinicamente normais. SÍNDROME DA VACA OBESA (Doença do fígado gordo dos bovinos) Esta doença de vacas obesas que pariram recentemente tem muito em comum com a toxemia da prenhez (ver pág. 549), estando geralmente associada a ela; entretanto, suas epidemiologias são diferentes. A doença do fígado gordo aparece preferencialmente após a parição e normalmente em vacas alimentadas de forma inadequada, isto é, seu aporte é planejado para ser maior do que a sua demanda nutricional para lactação. Devido às vacas estarem realmente num balanço energético negativo durante a súbita demanda de energia após a parição, há alta mobilização de gordura dos depósitos corporais, resultando em deposição hepática. Apenas vacas obesas desenvolvem a doença. Clinicamente, há cetonúria severa, anorexia, fraqueza, decúbito e, finalmente, taquicardia e coma. A morte em 7 a 10 dias é o desfecho usual. Nenhum tratamento específico pode ser recomendado. As medidas gerais de suporte são geralmente adotadas: forragens de alta qualidade e palatáveis; injeção de anabolizantes esteróides; infusão EV de soluções eletrolíticas combinadas ou glicose, ou ambas; insulinas; e transferência de bolo alimentar ou infusão intra-ruminal de grandes volumes de suco de rúmen de outros animais. Os resultados são pobres. Devido ao fato desta ser uma doença de vacas de alta produção em rebanhos intensivamente manejados, a prevenção é uma prioridade. Deve-se evitar a obesidade e tratar assiduamente a periparturiente. TETANIA DEVIDO À HIPOMAGNESEMIA EM BOVINOS E OVINOS (Tetania das pastagens) É um distúrbio metabólico caracterizado pela hipomagnesemia que ocorre principalmente em vacas e ovelhas adultas, sobretudo naquelas em lactações intensas ou em pastagens suculentas. Ocorre também em gado de qualquer idade ou condição, particularmente gado de corte, que pasta no trigo ou outros cereais, ou Tetania devido à Hipomagnesemia em Bovinos e Ovinos 537 naqueles que estejam subnutridos e expostos ao tempo frio e a mudanças bruscas. Manifesta-se por irritabilidade, tetania e convulsões, possuindo altas taxas de mortalidade. Etiologia – A taxa de ocorrência de hipomagnesemia depende do grau de deficiência; é rápida em vacas lactantes com acesso a pastos viçosos depois de terem sido estabuladas no inverno, e lenta em vacas de corte subnutridas. Os baixos níveis de magnésio e os altos níveis de potássio e nitrogênio na grama e pastagem de trigo combinam-se para limitar a absorção de magnésio. Excitação, ordenha, transporte e clima adverso são possíveis mecanismos desencadeantes. A hipocalcemia é um freqüente achado concomitante, possivelmente secundário à hipomagnesemia. Os níveis séricos de magnésio < 1,5mg/dL devem ser considerados suspeitos e níveis < 1mg/dL são diagnósticos; porém podem voltar praticamente ao normal (1,7 a 3,0mg/dL) durante o estágio convulsivo. Os níveis séricos de cálcio estão em geral moderadamente deprimidos (5,0 a 8,0mg/dL). Os níveis de magnésio no líquido cefalorraquidiano são baixos, e isto é considerado a causa dos episódios convulsivos característicos. Achados clínicos – Na forma mais aguda da doença, os animais afetados, que podem estar pastando de maneira aparentemente normal, repentinamente levantam as cabeças, urram, galopam de maneira cega e frenética, caem e sofrem severas convulsões de pedalagem. Estes episódios convulsivos podem ser repetidos em breves intervalos, e a morte geralmente ocorre em algumas horas. Em muitos casos, animais no pasto são achados mortos sem observação de doença. Em casos menos severos, a vaca está obviamente doente, porém tranqüila, apresenta andar rígido e hipersensibilidade ao toque e som, urina freqüentemente e pode progredir ao estágio agudo e convulsivo depois de um período de 2 a 3 dias. Devido à hipocalcemia concomitante com hipomagnesemia, pode ser difícil determinar qual o problema primário; a tetania das pastagens pode acompanhar a paresia da parturiente e os sinais clássicos desta última podem ser obscurecidos por convulsões tetânicas. Em todos os casos de tetania das pastagens, a diminuição dos ruídos cardíacos e da taquicardia são sinais característicos. A doença na ovelha ocorre essencialmente sob as mesmas condições e apresenta os mesmos sinais clínicos do gado. Tratamento – Animais afetados requerem tratamento urgente. Usualmente, o tratamento inclui administração de compostos de cálcio e magnésio e, algumas vezes, sedativos se as convulsões e a tetania forem severas. Uma injeção endovenosa contendo cálcio e magnésio pode ser usada, contudo deve-se administrá-la vagarosamente e monitorar o coração cuidadosamente. Uma alternativa de menor risco é administrar cálcio por via EV (ver PARESIA DA PARTURIENTE, pág. 544) e sulfato de magnésio por via s.c. (200mL/vaca de uma solução a 50%). A menos que o animal seja removido do pasto que produz a tetania, e com alimentação concentrada, é provável que o nível sangüíneo de magnésio caia outra vez em níveis perigosamente baixos, 24 a 36h após a terapia. Para prevenir isto, o tratamento diário com 60g de óxido de magnésio, VO, por ≥ 1 semana, deve ser iniciado e retirado gradualmente. Profilaxia – A prevenção é largamente feita por uma combinação de aumento da ingestão de magnésio nos períodos perigosos e de manejo. A suplementação oral diária de magnésio ou óxido de magnésio (60g para bovinos e 10g para ovinos) pode ser incorporada no concentrado alimentar ou em lambeduras contendo melaço; o sabor efetivamente desagradável impede o consumo de livre escolha. “Bolos” de liga de magnésio foram desenvolvidos para o gado e ovelhas a fim de promover uma liberação lenta de magnésio no rúmen. A fertilização com pedra calcária ou óxido de magnésio para aumentar o magnésio herbáceo é bem-sucedida apenas em certos tipos de solo. A aspersão da pastagem com óxido de magnésio em pó (125kg/ha) ou a pulverização com solução de sulfato de magnésio a 2% em intervalos de 2 Tetania devido à Hipomagnesemia em Bovinos e Ovinos 538 semanas dá boa prevenção a curto prazo contra tetania das pastagens sob condições climáticas adequadas. Animais que acabaram de sair da estação fria devem ser protegidos do frio e do vento e providos de suplementação alimentar. A fertilização com nitrogênio e potássio reduz o conteúdo e o aproveitamento do magnésio das pastagens e deve ser evitada na primavera antes do primeiro acesso dos animais à pastagem. Os bovinos e ovinos devem ter acesso ao feno ou à pastagem seca. Modificar a data de parição das vacas que não estiverem no início da lactação, quando o inverno for rigoroso, é uma medida efetiva de prevenção, mas pode ser economicamente impraticável. TETANIA DEVIDO À HIPOMAGNESEMIA EM BEZERROS A tetania em bezerros caracterizada por hipomagnesemia e comumente hipocalcemia, é clinicamente idêntica à tetania das pastagens no gado adulto. Por causa de sua ocorrência em bezerros de 2 a 4 meses sendo alimentados apenas com leite, ou em bezerros jovens alimentados com sucedâneos lácteos ou processos crônicos, a doença é considerada como decorrência da absorção inadequada de magnésio intestinal. A inadequação pode ser devida a uma deficiência primária de magnésio na dieta ou à rápida passagem da ingestão através dos intestinos. No último caso, é necessário cessar a diarréia crônica. Os bezerros afetados requerem tratamento imediato com solução de sulfato de magnésio a 10% (100mL s.c.), seguida pela administração oral de 10 a 15g de óxido de magnésio, diariamente. Este nível de dosagem oral com óxido de magnésio também é um profilático efetivo. Também é recomendado suplementar a dieta com feno ou pastagem. CETOSE NO GADO (Acetonemia, Cetonemia) Trata-se de uma doença metabólica de vacas lactantes que ocorre desde alguns dias a algumas semanas após a parição. É caracterizada por hipoglicemia, cetonemia, cetonúria, inapetência, letargia ou excitabilidade, perda de peso, diminuição da produção leiteira e, ocasionalmente, incoordenação. Na maioria das áreas, a incidência é maior nas vacas de alta produção que estão sendo alimentadas no estábulo. Etiologia – Qualquer fator que cause redução no aporte ou absorção dos precursores de carboidratos da dieta pode causar cetose primária. Embora, teoricamente, os fatores que afetam o metabolismo dos carboidratos absorvidos possam similarmente causar hipoglicemia e cetose primária, nenhum deles foi identificado. A teoria de que a causa primária de cetose é a disfunção do córtex adrenal não foi substanciada. A cetose é comumente secundária à depressão do apetite resultante de doenças primárias como metrite, mastite e deslocamento do abomaso. A hipótese de deficiência de carboidratos é baseada na observação de que, das várias formas de carboidratos ingeridas pelos ruminantes, poucas são absorvidas como glicose. As principais fontes de energia do animal são os ácidos acético, propiônico e butírico produzidos pela fermentação microbiana no rúmen; destes, o ácido propiônico é geralmente aceito como o maior precursor de carboidratos e o único a ter propriedades anticetogênicas. Se isto ocorrer, a vaca lactante recebe pouco ou nenhum excesso de carboidrato além daquele requisitado para a síntese de lactose secretada no leite. Um aporte calórico inadequado pode ocorrer quando a comida é insuficiente ou desagradável, ou quando o balanço de substâncias cetogênicas e anticetogênicas na dieta é perturbado, por exemplo, pela administra- Cetose no Gado 539 ção de determinadas silagens com elevado conteúdo de ácido butírico. A composição da dieta pode similarmente modificar a população microbiana do rúmen, e isso influencia a proporção relativa dos ácidos graxos voláteis produzidos pela fermentação. Se a propensão for para a produção de ácidos graxos voláteis cetogênicos, a cetose é esperada como seqüela. Em rebanhos leiteiros, boa parte do componente etiológico para cetose deriva da demanda de glicose requerida para produção de lactações profusas. Se a demanda para um suprimento direto de glicose para os tecidos não for obtida dos estoques hepáticos de glicogênio, os tecidos são invadidos por gordura, cujo metabolismo promove cetogênese. Achados clínicos – Os sinais incluem inapetência, constipação, fezes cobertas de muco, depressão, olhar fixo, queda na produção leiteira, algumas vezes uma postura corcunda sugestiva de dor abdominal suave e, em pouco tempo, em casos não tratados, uma óbvia perda de peso. A maior parte dos casos é definhante, do tipo letárgico, mas com alguns sinais de frenesi e agressão. Os sinais clínicos incluem o andar em círculos, cambaleios, pancadas, mastigação, urros, hiperestesia, andar compulsivo e pressão da cabeça contra objetos. Isto ocorre em episódios que duram , 1h e recorrem a intervalos. A respiração possui odor acetônico. A hipoglicemia, cetonúria e cetonemia estão sempre presentes. A doença é autolimitante porque a redução de aporte alimentar eventualmente causa uma cessação do fluxo de leite e esgotamento de glicose. A cetose subclínica ocorre em vacas que apresentam cetonúria após a parição mas estão clinicamente normais. Estas vacas têm uma pequena redução na produção láctea, mas um nível significante na ineficiência reprodutiva associado à endometrite. Diagnóstico – Enquanto um teste negativo de urina ou leite (Rothera ou “Acetest”) descarta a cetose, a simples presença de hipoglicemia, cetonemia e cetonúria não é suficiente para confirmar o diagnóstico de uma cetose primária. Qualquer anormalidade que leve uma vaca em início de lactação a apresentar anorexia, por exemplo, metrite, pneumonia, ou mastite, causa um certo grau de cetose secundária ou cetose rápida . Tais condições, naturalmente, podem acompanhar a síndrome cetótica pura. Uma das causas mais comuns da cetose secundária é o deslocamento do abomaso para a esquerda (ver pág. 183). A hipomagnesemia persistente subclínica (ver pág. 536) também foi identificada como precursora da acetonemia e liga-se à deficiência de cobalto (ver pág. 1452) como um fator predisponente identificável no gado em pastagens. Na cetose secundária, a reação positiva aos comprimidos de “Acetest” pela urina não é freqüentemente tão rápida e tampouco é pronunciada, como na doença primária. Algumas vezes, é aconselhável cautela no diagnóstico até que a resposta ao tratamento tenha sido observada. A falha em se conseguir uma resposta contínua e definitiva pela glicose ou hormonioterapia é causa para reconsideração dos sinais e possíveis complicações. Tratamento – Em vacas magras que obviamente têm sido subnutridas, a reposição dos carboidratos é recomendada. Em vacas obesas, nas quais o desequilíbrio nutricional é a causa mais provável, os glicocorticóides são eficazes. A injeção EV de glicose não é suficientemente eficaz, mesmo quando repetida diariamente por 3 a 4 dias, para ser recomendada como única forma de tratamento. Entretanto, é comumente usada como suplemento para glicocorticóides parenterais ou propilenoglicol oral. Uma injeção de glicose resulta em pronto incremento na glicose sangüínea, que é seguido por um decréscimo nas próximas horas para valores geralmente abaixo dos normais, mas ainda maiores que o nível prétratamento; a glicose sangüínea pode não voltar ao normal por vários dias, mesmo em vacas que mostrem boa resposta. Em seguida a uma injeção intramuscular de glicocorticóides, a glicose sangüínea geralmente retorna ao normal em 8 a 10h e pode chegar a um valor consideravel- Cetose no Gado 540 mente acima do normal em 24h, especialmente quando a causa é ingestão calórica inadequada. Nestes casos, uma melhora marcante do apetite e do comportamento geral normalmente ocorre em 24h, e os níveis de cetose sangüínea retornam ao normal em 3 a 5 dias. A produção de leite pode diminuir durante a terapia com esteróides, mas aumenta no segundo a terceiro dia após o tratamento. Esteróides anabólicos estão sendo usados atualmente como tratamento, mas não foram oficialmente aprovados em todos os países. Propilenoglicol (225g, 2 vezes ao dia por 2 dias, depois 110g diariamente por 2 dias) ou lactato de amônio (200g diariamente por 5 dias) administrado por VO possuem um bom efeito em muitos casos. Comparada com outros tratamentos, entretanto, a resposta é lenta e a terapia deve ser estendida por um longo período. Estas substâncias parecem ser de grande valor quando usadas como tratamento de suporte seguindo-se aos usos de glicocorticóides ou glicose. Acetato de sódio administrado oralmente é menos eficaz. Hidrato de cloral, algumas vezes, é usado conjuntamente com outros tratamentos, sendo especialmente eficaz quando a hiperexcitabilidade está presente. Quando o apetite é recuperado, seguindo-se a qualquer dos tratamentos anteriores, a boa alimentação é necessária para restaurar o animal para saúde e produção totais. Sendo freqüentemente difícil a distinção entre cetose primária e secundária quando o animal exibe sinais de outras condições de enfermidade, é aconselhável tratar a cetose e a condição complicada. Profilaxia – Os animais suscetíveis à cetose devem ser mantidos em um regime de ingestão de energia relativamente alta antes da parição, e o nível deve ser incrementado substancialmente após a mesma. Um bom guia para a alimentação satisfatória é a condição corporal da vaca, que deve ser mantida para se evitar engorda ou emagrecimento exagerados. O conteúdo proteico da ração deve ser moderado (,16%), e o concentrado administrado para vacas estabuladas deve ser de , 1kg/3kg de leite produzido. O aporte diário de feno para a manutenção da condição corporal deve ser de ,3kg/100kg de peso corporal. A forragem deve ser de boa qualidade, palatável, digestível e nutritiva. Silagens úmidas e finas, emboloradas e empoeiradas são precursores comuns de acetonemia em vacas de alta produção. As rações que induzem uma alta produção de ácidos propiônicos no rúmen podem contribuir materialmente para a prevenção da cetose, quando administradas por algumas semanas antes e após a parição; por exemplo, uma ração de feno de alfafa finalmente moída e peletizada, com um cereal cozido em vapor (milho em flocos, cevada etc.), na qual a relação feno-cereal cozido possa ser de até 8:1, promove uma alta produção de ácido propiônico. Para esta ração ser efetiva, o animal não deve ter acesso a fenos compridos, molhados, raspas ou outras forragens não moídas. Quando grandes quantidades de silagens estão sendo administradas, a sua substituição por feno pode ser vantajosa. A adição de propionato de sódio ao alimento reduz a incidência da doença. TETANIA DA LACTAÇÃO EM ÉGUAS (Tetania do transporte, Eclâmpsia) É uma condição associada à hipocalcemia e, algumas vezes, a alterações nos níveis de magnésio sangüíneo. Ocorre mais freqüentemente em éguas que pariram , 10 dias ou 1 a 2 dias pós-desmame, ou em éguas amamentando em pastagens viçosas. Ocasionalmente, é vista em cavalos não lactantes, em geral, após algum Hipertermia Maligna 541 estresse, por exemplo, transporte prolongado. De ocorrência incomum desde o “final” dos cavalos de tração, é caracterizada por incoordenação, tetania, suor, tremores musculares, respiração rápida e violenta e um som surdo vindo do peito, considerado por muitos como uma contração espasmódica do diafragma. O manuseio pode exacerbar os sinais, mas cavalos afetados não são hipersensíveis ao som e não há prolapso da terceira pálpebra como no tétano. Entretanto, o andar tenso e duro e a cauda em bandeira são aparentes. A temperatura corporal está próxima ao normal e o apetite parece não estar prejudicado, mas durante um ataque, o animal é incapaz de comer, urinar ou defecar. Animais levemente afetados podem se recuperar espontaneamente; animais afetados de forma severa decaem em ,24h, desenvolvem convulsões tetânicas e usualmente morrem no dia seguinte. A resposta às injeções EV de soluções de cálcio administradas vagarosamente é, em geral, boa. Se a tetania for associada ao transporte, é aconselhável a incorporação de magnésio à solução. A sedação é freqüentemente indicada para éguas excitáveis. HIPERTERMIA MALIGNA (Síndrome do estresse porcino [SEP], Carne de porco pálida, mole e exsudativa [PME], Necrose do músculo dorsal, Miopatia do transporte) É uma miopatia hipermetabólica, semelhante ao choque, causada em animais geneticamente suscetíveis por estresse e inalação de anestésicos ou por relaxantes musculares despolarizantes. Os suínos são os principais animais envolvidos, mas casos foram relatados em cavalos, cães, gatos, veados, galinhas, coelhos, bovinos (síndrome da musculatura dupla, ver pág. 574) e no homem. A miopatia da captura dos animais selvagens (ver pág. 667) é similar em muitos aspectos. Nos suínos, aqueles de carne magra, bem musculados, de raças de crescimento rápido, como pietrain, landrace, poland china e aqueles obtidos de cruzamentos destas raças, são mais suscetíveis. Etiologia – Embora se pensasse que a hipertermia maligna (HM) fosse transmitida por um único gene autossômico dominante com expressão incompleta ou variável, evidências mais recentes sugerem que seja transmitida por um gene autossômico recessivo. Vários fenótipos têm sido identificados, o que sugere que a herança possa variar de raça para raça, ou ainda, de rebanho para rebanho. O defeito primário é uma anormalidade da cinética do cálcio no músculo esquelético. Ocorre aumento da concentração de cálcio mioplasmático e mitocondrial na hipertermia maligna. Níveis elevados de cálcio mioplasmático estimulam a excitação-contração muscular e aumentam a glicogenólise muscular e a produção cardíaca. Sob condições naturais, a hipertermia maligna é iniciada por estresse, por exemplo, no manuseio, manejo, transporte, acasalamento, excitação e exercício. Experimentalmente, a síndrome pode ser induzida por inalação de agentes anestésicos, por exemplo, halotano, metoxiflurano, clorofórmio, enflurano e fluroxeno. Relaxantes musculares despolarizantes, como a succinilcolina e agonistas αadrenérgicos também podem iniciar ou potencializar a síndrome. Achados clínicos – Os sinais iniciais são leves e finos tremores musculares rápidos da cauda, dorso e pernas. Os tremores progridem até a rigidez muscular, e o animal torna-se incapaz de se movimentar. Perda da cor e eritemas, seguidos por cianose, são evidentes em porcos brancos devido à vasoconstrição periférica. Taquicardia (, 200bpm), arritmias cardíacas, respiração de boca aberta, hiperventilação, aumento da temperatura corporal e hipercapnia são seguidos por narcose Hipertermia Maligna 542 pelo CO2, apnéia e morte. A temperatura corporal pode aumentar em até 1°C (a cada 5 a 7min) e pode alcançar até 45°C antes da morte. Após a morte, o rigor mortis se desenvolve em poucos minutos. A temperatura muscular está elevada e o alto nível de ácido láctico causa um baixo pH muscular (≤ 5); entretanto, o pH muscular aumenta rapidamente, conforme o corpo esfria. Os músculos do dorso, coxas, quadril e ombros são os mais freqüentemente afetados. Músculos com alta porção de fibras do Tipo 2, como o semitendinoso e o psoas, são extensivamente mais afetados e devem ser examinados macroscópica e histologicamente à necropsia. Os músculos afetados de um animal que morre com quadro agudo, são pálidos, úmidos, e liberam fluidos à necropsia. Episódios repetidos podem produzir focos secos e escuros nos músculos afetados. As alterações histológicas nos músculos não são específicas e podem incluir uma variação no diâmetro das fibras musculares seccionadas transversalmente e degeneração hialina. Diagnóstico – Um histórico de estresse ou exposição a drogas estressantes e suscetibilidade genética são importantes considerações, juntamente com sinais clínicos semelhantes a choque agudo, tremor muscular, aumento rápido na temperatura, taquipnéia e rigidez. O pH sangüíneo está diminuído (< 6) e os níveis de lactato e piruvato sangüíneos estão aumentados. Os níveis de ácido láctico sangüíneo podem atingir 425mg/dL. A pressão parcial de CO2 está elevada no sangue arterial e o consumo de oxigênio está aumentado. A concentração de catecolaminas plasmáticas está aumentada e é responsável pela hiperglicemia concorrente. As principais mudanças eletrolíticas plasmáticas são os aumentos de potássio e fosfato. Diagnósticos diferenciais incluem: 1. insolação, que é devida a confinamento ou exercício forçado em ambientes quentes; 2. tetania hipocalcêmica (puerperal) com contrações musculares e aumento de temperatura corporal; 3. miopatia de captura em animais selvagens (quando esta é um diagnóstico diferencial); e 4. azotúria ou síndrome paralítica, caracterizada pela mioglobinúria, que se desenvolve em seguida a exercícios em cavalos, bovinos de tração, ovelhas e galgos de corrida. A SEP, HM e PME são consideradas por alguns como uma única síndrome e por outros como 3 síndromes. Evidências experimentais demonstraram que estas síndromes são clinicamente similares e todas são geneticamente determinadas. Entretanto, genes diferentes parecem controlar a suscetibilidade a estressantes específicos; por exemplo, todos os porcos que desenvolvem PME não parecem suscetíveis ao estresse da anestesia por halotano. A suscetibilidade aos diferentes estressantes pode ser o fator principal na diferenciação das 3 síndromes. Tratamento – Uma vez que a hipertermia maligna é determinada geneticamente, uma seleção de criações, em função da suscetibilidade, é essencial; entretanto, características desejáveis geneticamente controladas, como desenvolvimento muscular e taxas de crescimento, devem ser mantidas. Vários testes de seleção têm sido utilizados. No teste de desafio ao halotano, os suínos são expostos à anestesia por halotano (3 a 6% v/v) durante , 5min e os níveis séricos de creatinina fosfoquinase (CPK) pré e pós-anestésicos são medidos; um aumento de 20 a 100 vezes é encontrado em porcos suscetíveis. Evidências recentes indicam uma combinação de halotano e succinilcolina produzindo maior sensibilidade à detectação de hipertermia maligna. Outro teste utilizado é o do exercício, no qual um aumento de creatinina fosfoquinase após exercício indica suscetibilidade à hipertermia maligna. A resistência (e suscetibilidade) à hipertermia maligna também tem sido associada a certos grupos sangüíneos e à fragilidade osmótica das hemácias. O tratamento da HM consiste na remoção do animal dos possíveis estresses ou anestésico inalatório, administração EV de tranqüilizantes, fluidoterapia com bicarbonato para corrigir a acidose láctica, resfriamento superficial e hiperventilação com oxigênio. Um relaxante muscular intracelular experimental, o dantroleno (um derivado de fenitoína) tem demostrado experimentalmente inibir e controlar episódios Obesidade 543 de HM em suínos. As doses relatadas foram de 3 a 5mg/kg de peso corporal, EV. A taquiarritmia pode ser tratada com procainamida. OBESIDADE O acúmulo de gordura ocorre quando há um desequilíbrio entre as calorias ingeridas e as perdidas. A obesidade ocorre quando o peso corporal é ≥ 15% acima do considerado ótimo (ver a seção MCN, pág. 1317, sobre requerimentos nutricionais de várias espécies; ver também APETITE, pág. 1323, e COMPORTAMENTO, pág. 1085). Etiologia – A principal causa é o excesso de alimentação combinado com o exercício inadequado. É o distúrbio nutricional mais comum em cães, sendo que a incidência aumenta com a idade (acima de 50%), provavelmente devido à redução da taxa metabólica basal e da atividade física. É mais comum em fêmeas que em machos, e em cães castrados que em não castrados de ambos os sexos. Algumas raças de cães tendem a ser mais obesas, incluindo labradores, dachshunds e beagles. Cães alimentados com comida caseira, restos de comida e petiscos apresentam uma tendência maior à obesidade quando comparados aos animais que se alimentam exclusivamente de rações comerciais. Ao contrário dos cães, os gatos conseguem regular melhor a ingestão de alimentos de acordo com a necessidade calórica, e a obesidade é menos comum. Entretanto, o número de gatos obesos parece estar aumentando em freqüência, provavelmente devido ao aumento do sabor das rações comerciais para gatos. Condições patológicas que podem estar associadas à obesidade incluem hipotireoidismo, hiperadrenocorticismo, diabetes melito e insulinoma. O ponto no qual o acúmulo de gordura em comidas de animais se torna excessivo é um tanto subjetivo. É, invariavelmente, o resultado de padrões alimentares anormais impostos aos animais. Achados clínicos – A espessura da camada de gordura que cobre a caixa torácica é o melhor indicador da obesidade quando não se sabe qual é o peso corporal ótimo do animal. Normalmente, as costelas podem ser sentidas com facilidade, mas não vistas, enquanto as costelas não podem ser facilmente palpadas nos animais obesos. Abdome pendular, andar bamboleante e inatividade são outros sintomas de alguns animais obesos. A obesidade pode predispor a muitos problemas incluindo distúrbios locomotores ou articulares, dispnéia e fadiga, lipidose hepática, eficiência reprodutiva diminuída, distocia e aumento do risco anestésico e cirúrgico. Tratamento – O consumo calórico deve ser reduzido e um programa de exercícios regulares deve ser desenvolvido para gastar energia e possivelmente reduzir o apetite. A ingestão calórica diária deveria ser reduzida para , 60 a 70% daquela requerida para manutenção. Isto pode ser realizado mais efetivamente com uma nutrição completa, mas com baixa caloria e alta concentração de fibra. Dietas caseiras ou comerciais são preferíveis à alimentação em quantidades menores da dieta normal. Pequenas refeições podem ser ministradas freqüentemente durante o dia; petiscos e restos de comida devem ser eliminados. A taxa de perda de peso deve ser de , 3% por semana durante as primeiras 6 semanas e menor posteriormente. O progresso deve ser monitorado por pesagem semanal e devem-se fazer modificações dietéticas se necessário. A monitoração freqüente também entusiasma o proprietário a continuar com o programa. Uma redução dramática do peso pode ser realizada em cães quando a ingestão de alimento é quase que completamente restrita. Isto não deve ser realizado em gatos obesos. Idealmente, o animal deve ser hospitalizado durante este período e Obesidade 544 examinado diariamente; devem ser administrados suplementos vitamínicos-minerais e a água deve ser dada ad lib. A acidose metabólica e a cetose geralmente não representam problemas clínicos em cães quando a gordura é mobilizada. Entretanto, quando ocorrem alterações no equilíbrio de fluidos, a perda do tecido adiposo ocorre proporcionalmente à redução do peso e à inanição. Drogas como as anfetaminas são comprovadamente ineficazes em cães, e procedimentos cirúrgicos como desvio jejunoileal não são necessários ou recomendados. PARESIA DA PARTURIENTE EM VACAS (Febre do leite) É uma doença afebril de vacas leiteiras idosas que ocorre mais comumente durante ou logo após a parição e manifesta-se por colapso circulatório, paresia generalizada e depressão. Etiologia – A doença geralmente está associada com o súbito início da lactação profusa; é uma hipocalcemia aguda, na qual os níveis séricos de cálcio estão abaixo do normal (, 10mg/dL), podendo chegar até 3 a 7mg/dL (média 5mg/dL). A concentração sérica de magnésio pode estar dimuída e resultar em tetania, ou elevada e resultar em paralisia flácida e sonolência. A doença pode ocorrer em vacas de qualquer idade, porém é mais comum em vacas leiteiras de 5 a 9 anos de idade. Há uma incidência maior na raça jersey. Achados clínicos e diagnóstico – A paresia parturiente geralmente ocorre em 72h após a parição, mas ocasionalmente antes, durante, ou mesmo alguns meses após. A doença é algumas vezes a causa de distocia que se origina de esforços expulsivos inadequados, e o prolapso do útero pode ser uma complicação. No início da doença, a vaca pode exibir alguma instabilidade ao andar. Mais freqüentemente, ela é incapaz de se levantar, sendo encontrada deitada sobre o esterno; a cabeça pode estar deslocada para um lado ou virada para o flanco. Os olhos são embaçados e fixos e as pupilas dilatadas. A anorexia é completa, o focinho tende a ser seco e as extremidades são frias. A freqüência do pulso geralmente é elevada e a temperatura é normal ou subnormal. O trato gastrointestinal se torna atônico com defecação suprimida e ânus relaxado. Se o tratamento é adiado por muitas horas, a apatia dá origem ao coma, que se torna progressivamente mais profundo, levando à morte. Com o coma próximo, o animal assume decúbito lateral, o qual predispõe a timpanismo, regurgitação e pneumonia por aspiração. O tratamento nos estágios iniciais é melhor sucedido e poucas recaídas ocorrem. Animais afetados no momento ou algumas horas após a parição parecem desenvolver sinais graves mais rapidamente do que aqueles que são acometidos em outros períodos. Diagnósticos diferenciais incluem metrite, mastite coliforme, tetania das pastagens, indigestão aguda, gastrite traumática, luxações coxofemorais, paralisia do nervo obturador, linfossarcoma, compressão espinhal e fratura da pelve. Algumas destas doenças, em adição à pneumonia por aspiração e à miopatia degenerativa, podem também ocorrer concomitantemente com a paresia da parturiente ou como complicações (ver também V ACA C AÍDA, pág. 669). Tratamento – Os esforços são dirigidos no sentido de restaurar o nível sérico de cálcio ao seu patamar normal, o que deve ser feito o mais cedo possível para evitar danos nervosos e musculares e decúbito. Isto é facilitado pela supervisão intensa das vacas que pariram nas 72h precedentes. Borogliconato de cálcio é mais comumente usado (250 a 500mL, 25% de solução), preferivelmente por injeção EV, Paresia da Parturiente em Ovelhas 545 porém as vias subcutânea e intraperitoneal também são usadas. A administração s.c. permite lenta absorção do íon de cálcio e pode diminuir o risco de parada cardíaca. A assepsia cuidadosa e a limitação de volume injetado em cada local a , 50mL reduzem as chances de reações locais. Os animais que apresentam recidiva ou que não se levantam depois de 8 a 12h devem ser tratados novamente, embora no momento de cada tratamento, o diagnóstico deve ser reconfirmado e as complicações estabelecidas. Na ausência de uma análise sangüínea, é freqüentemente impossível se saber qual elemento está abaixo de seu nível de normalidade: além do cálcio, outros íons, como o fósforo, o potássio ou mais provavelmente o magnésio, podem estar indicados para casos não responsivos. Nos casos complicados por cetose (ver pág. 538), devem-se administrar 250 a 500mL de dextrose a 50%, EV. Nos poucos casos nos quais há falhas na resposta a qualquer outro tratamento, o úbere pode ser inflado. Cada quarto é inflado através de um tubo estéril via teta até ficar firme, se necessário, as tetas são gentilmente amarradas com gaze para prevenir o escape do ar. A gaze é removida depois de 2 a 3h e o úbere é parcialmente ordenhado. Se necessário, a insuflação pode ser repetida 6 a 8h mais tarde. Profilaxia – A alimentação com dietas contendo níveis de fósforo normais a elevados e com baixo nível de cálcio durante a fase final da prenhez ajuda a prevenir a paresia da parturiente, porém estas rações são difíceis de preparar de forma prática e, se administradas por longos períodos em vacas de alta lactação, podem resultar em perigosa depleção das reservas minerais esqueléticas. Ordenha retardada ou incompleta após a parição, pela manutenção de certa pressão no úbere, é de valor duvidoso na redução do número de ocorrências e pode agravar uma infecção latente para mastite aguda. Doses maciças de vitamina D (20 a 30 milhões de unidades diárias), administradas na alimentação por 5 a 7 dias antes da parição, reduzem a incidência, porém se a administração for interrompida por mais de 4 dias antes da parição, a vaca se torna mais suscetível. Esta eventualidade pode ser evitada pela injeção simultânea de um corticosteróide para induzir a parição. A dosagem por períodos mais longos que aqueles recomendados deve ser evitada devido ao perigo de toxicidade. Uma única injeção EV ou s.c. de 10 milhões de unidades de vitamina D cristalina, administrada 8 dias antes da parição, é um preventivo eficaz. A dose é repetida se a vaca não parir na data devida. Novos compostos usados (onde aprovados e disponíveis) no lugar de vitamina D e menos prováveis de causar hipervitaminose D são 25-hidroxicolecalciferol, 1,25-diidroxicolecalciferol e 1α-hidroxicolecalciferol. Depois da parição, uma dieta rica em cálcio é requerida. Atualmente, é uma prática comum administrar largas doses de cálcio em forma de gel (VO) após a parição para assegurar uma alta ingestão do elemento. Doses de 150g de cálcio são administradas 1 dia antes e 1 dia após a parição. PARESIA DA PARTURIENTE EM OVELHAS É um distúrbio de metabolismo em ovelhas prenhes e lactantes caracterizado por hipocalcemia aguda e rápido desenvolvimento de hiperexcitabilidade, ataxia, paresia, coma e morte. Etiologia – A causa exata é desconhecida, mas as condições sob as quais os surtos de campo ocorrem são consideravelmente bem definidas. A deficiência de cálcio e/ou magnésio pode contribuir para o processo. A doença ocorre a qualquer momento, desde 6 semanas antes da parição até 10 semanas após, principalmente em ovelhas velhas muito limitadas ao pasto. O princípio é súbito e quase invariavel- Paresia da Parturiente em Ovelhas 546 mente segue, dentro de 24h, mudança abrupta na alimentação, súbita mudança no tempo ou curtos períodos de jejum impostos por circunstâncias tais como tosquia, enforquilhamento ou transporte (ver também TETANIA DO TRANSPORTE EM RUMINANTES, pág. 553). Achados clínicos e diagnóstico – Caracteristicamente, a doença ocorre em surtos. A incidência é em geral < 5%, mas em surtos graves, 30% do rebanho pode estar afetado ao mesmo tempo. Os sinais precoces são ligeira hiperexcitabilidade, tremores musculares e distúrbios locomotores. Isto é logo seguido por embotamento, decúbito esternal (freqüentemente com os membros posteriores estendidos para trás), discreto timpanismo ruminal, regurgitação de comida através das narinas, olhar fixo, respiração superficial, coma e morte em 6 a 36h. O diagnóstico é baseado no histórico e sinais clínicos. Em surtos de ocorrência anterior ao parto, a toxemia da prenhez é o principal diagnóstico diferencial. Um diagnóstico experimental de hipocalcemia aguda pode ser confirmado de imediato por uma dramática e geralmente duradoura resposta à calcioterapia. Profilaxia e tratamento – O tratamento consiste em injeção de cálcio, EV ou s.c. (por exemplo, 100mL de borogliconato de cálcio a 25% w/v), preferencialmente com magnésio adicionado. As ovelhas afetadas devem ser manejadas com cuidado a fim de que mortes súbitas não ocorram por falha cardíaca. A prevenção reside, sobretudo, na prevenção das causas predisponentes. EXAUSTÃO FÍSICA Ocorre por uma série complexa de eventos metabólicos que acometem um indivíduo quando o mesmo ultrapassa o seu limite de resistência. (É diferente da fadiga, a qual pode ser considerada como um cansaço extremo dentro do limite normal do indivíduo.) Ocorre mais freqüentemente em animais forçados a exercícios físicos prolongados, na maioria das vezes sob condições ambientais severas. Eqüinos utilizados em enduros e maratonas são os mais comumente afetados. Fisiopatologia – No início do exercício, o corpo responde ao aumento da demanda metabólica, aumentando o suprimento de oxigênio para os músculos locomotores, os quais sintetizam ATP para a produção de energia. Se a intensidade dos exercícios for mantida em níveis aeróbicos, esta pode ser mantida durante períodos consideráveis. Quando a intensidade dos exercícios aumenta acima do limite aeróbico suportável, a energia é produzida anaerobicamente e a fadiga se instala com rapidez. O calor é sempre produzido, não importando se a energia é produzida por via aeróbica ou anaeróbica. No cavalo normal, este calor é dissipado pela evaporação do suor. Se os elementos perdidos pelo suor durante o exercício prolongado não forem substituídos, principalmente sob alta temperatura e umidade ambientais, ocorrerão distúrbios metabólicos associados à exaustão. É difícil medir-se a perda de fluidos; entretanto, alterações no peso corporal fornecem um bom indicador quantitativo sob circunstâncias prevalentes. Os sinais clínicos de desidratação tornam-se aparentes quando 4 a 5% do peso corporal é perdido e os sinais são severos quando há perda de , 10%. As concentrações de potássio e de cloreto são maiores no suor que no plasma; portanto perdem-se mais rapidamente que o sódio. O cloreto é mais importante e sua perda resulta em alcalose conforme o organismo conserva os íons de bicarbonato para compensar o ânion perdido. As alterações na composição plasmática que ocorrem durante os enduros variam com a duração da corrida, temperatura e umidade ambientais, vigor da Exaustão Física 547 corrida e acesso à água (com ou sem a adição de eletrólitos) durante o decorrer da competição. A tendência geral para os eletrólitos é ocorrer uma pequena alteração durante as corridas de 100km, contanto que não esteja tão quente. Quando a temperatura é morna ou quente e a sudorese é profusa, as concentrações eletrolíticas plasmáticas podem declinar significantemente. Entretanto, as concentrações de cálcio e de magnésio diminuem e a de fósforo pode aumentar significantemente. Além disso, as concentrações de proteína plasmática e de albumina aumentam, como reflexo da desidratação. Este mesmo efeito também ocorre nos eritrócitos e leucócitos, durante e após a corrida. O aumento das concentrações plasmáticas de creatinina, uréia e bilirrubina também reflete os efeitos da desidratação, enquanto o aumento de CPK e AST(SGOT) indica a perda aumentada a partir das fibras musculares. Em cavalos normais, estes valores retornam ao normal após a corrida; se isto não ocorrer, é sinal de exaustão. Elevações persistentes de CPK ou AST indicam lesão muscular, como ocorre na rabdomiólise (ver pág. 667), o que pode fazer parte do processo de exaustão. Acompanhando estas alterações, o aumento do pH sangüíneo, bicarbonato e do excesso de bases, principalmente durante o meio da corrida, indicam o desenvolvimento de alcalose metabólica. Queda marcante na glicemia e aumento na concentração de ácidos graxos livres e de glicerol, principalmente no final de corridas longas, refletem o aumento da contribuição do metabolismo lipídico para a produção de energia, conforme declinam gradualmente as fontes de carboidratos no fígado. Dentro das fibras dos músculos locomotores, a produção de energia depende de mecanismos aeróbicos ou anaeróbicos. Sob níveis submáximos de trabalho em condições aeróbicas, a duração do trabalho é limitada por fatores que governam o suprimento de glicose (de glicogênio hepático e IM) e/ou de ácidos graxos não esterificados (dos lipídios corporais armazenados). Quando a capacidade de produzir energia por via aeróbica é excedida, devido a um suprimento insuficiente de oxigênio ou por um trabalho que exceda a capacidade aeróbica do animal, a diferença nas necessidades energéticas é encontrada pelas vias anaeróbicas. Como resultado, o ácido láctico é produzido, iniciando-se o processo de fadiga. Este processo possui dois estágios: 1. a dificuldade de liberação do cálcio do retículo sarcoplasmático e sua ligação pela troponina; e 2. o turnover da actina-miosina através das pontes. Ambos os estágios requerem energia das reações de ATPase e são inibidos quando a quantidade de ATP é pequena, quando inibidores da ação da ATPase atingem níveis suficientes para inibi-la, ou quando o pH muscular diminui a níveis inibitórios. O pH baixo também diminui a liberação do cálcio e sua afinidade pela troponina. Durante um exercício prolongado, sob condições aeróbicas sem acúmulo de ácido láctico, a fadiga ocorre quando o estoque de glicogênio é esgotado. Entretanto, a fadiga também ocorre quando as reservas de substratos energéticos são adequadas, não há acúmulo de ácido láctico e o pH encontra-se baixo. O acúmulo de íons de potássio ou a depleção de sódio no espaço extracelular ou no sistema sarcotubular pode resultar em fadiga, afetando ou prevenindo a propagação dos potenciais de ação. Uma disseminação irregular da excitação tubular e, portanto, uma ativação miofibrilar podem ocorrer. Além disso, o papel do acúmulo de fósforo inorgânico durante o exercício, e sua ação no processo de fadiga, principalmente na ausência de alta concentração do íon de hidrogênio, necessita de mais estudos. Achados clínicos – Tipicamente, um cavalo exausto encontra-se letárgico e mostra-se pouco interessado no ambiente. As córneas estão vitrificadas, as orelhas sem expressão e a face parece ansiosa, refletindo a presença de cólicas ou de espasmos musculares. Os animais geralmente estão anoréticos e com freqüência, apesar de desidratados, não bebem água. A hipertermia geralmente está presente, Exaustão Física 548 apesar da temperatura retal poder ser enganosa se o reto estiver dilatado por ar devido a uma diminuição do tono do esfíncter anal. O reflexo do esfíncter anal pode estar ausente. Taquicardia e taquipnéia persistentes são evidentes. Uma respiração superficial e mais rápida que a taxa cardíaca pode causar uma troca gasosa ineficiente. Ritmo diafragmático agitado, arritmias, murmúrios e pulso jugular evidente podem ser sinais adcionais de insuficiência dos sistemas cardiovascular e pulmonar na tentativa de restabelecer a função normal. O achado clínico mais evidente é a desidratação, que se reflete pela perda da elasticidade cutânea, enoftalmia e membranas mucosas secas. Estas alterações indicam uma perda de 7 a 10% do peso corporal, podendo chegar a até 30 a 40L de água. Esta perda é complicada pelo desequilíbrio eletrolítico severo que se segue. Fadiga, fraqueza, tremores, cansaço, rigidez, dor e possivelmente paralisia são os sinais musculares habituais. Se não for administrada uma terapia de suporte apropriada com fluidos e eletrólitos, pode ocorrer insuficiência renal por exaustão, disfunção hepática, rabdomiólise e mesmo laminite. O desenvolvimento desses problemas é detectado por altas concentrações plasmáticas de creatinina, uréia, CPK e AST(SGOT) por vários dias após a corrida. A redução do fluxo e a concentração urinária ocorrem durante o curso da corrida, retornando ao normal com a restauração da hidratação. Virtualmente, não há nenhuma alteração na composição da urina entre cavalos normais e exaustos,exceto quando há sangue na urina em animais com mioglobinúria. “Flutter” diafragmático sincronizado (“soluços”) – Freqüentemente relacionado ao estresse atlético e não raro visto em corridas de enduro, isto também ocorre em outras condições, incluindo pressão traumática no nervo frênico, êmese persistente, desequilíbrio eletrolítico e estados de hipocalcemia, como na paresia da parturiente. As 3 alterações fisiopatológicas comuns são alcalose (geralmente metabólica), hipocalcemia e desequilíbrio eletrolítico. Os cavalos podem ser retirados durante o enduro devido a este problema, quando eles estão provavelmente alcalóticos, normocalcêmicos e em graus variáveis de desidratação. Eles encontramse quase com certeza cansados, mas não necessariamente exaustos. Qualquer que seja a causa específica, o mecanismo que leva ao “flutter” diafragmático sincronizado é provavelmente uma estimulação do nervo frênico pela descarga elétrica cardíaca. O diafragma se contrai simultaneamente com o batimento cardíaco. Tratamento e prevenção – Os cavalos se manterão hidratados, dentro de limites razoáveis, se um suprimento hídrico adequado for fornecido a intervalos freqüentes durante a corrida. Beber pequenas quantidades de água a intervalos regulares é melhor do que beber grandes quantidades ocasionalmente. Suplementar a água com sal ou eletrólitos também é vantajoso. Se ocorrerem a desidratação e a exaustão, deve-se imediatamente restabelecer o volume hídrico corporal e o equilíbrio eletrolítico. Os cavalos que estão prontos para beber podem ser tratados com uma solução eletrolítica balanceada por via oral e depois devem ter acesso à água à vontade. Como resultado da perda de eletrólitos e das concentrações plasmáticas (por exemplo, baixo nível de sódio), o animal poderá não ter sede, devendo ser tratado por gavagem até que a mesma retorne. Nos cavalos afetados severamente, pode ser necessário um tratamento inicial EV para restaurar a hidratação rapidamente; a terapia de manutenção é depois mantida por via oral. Quando complicada pelo “flutter” diafragmático sincronizado e se a hipocalcemia fizer parte do desequilíbrio metabólico, a administração de borogliconato de cálcio é importante para bloquear os “soluços”. Geralmente, a simples correção da alcalose interrompe os “soluços”. Se houver evidência de mioglobinúria, deve-se administrar uma fluidoterapia rigorosa para aumentar a diurese substancial a fim de reduzir o grau da lesão tubular renal provocada pela mioglobina filtrada. Se houver sinais clínicos de dor, podem-se Toxemia da Prenhez em Vacas 549 administrar analgésicos. Em termos gerais, um cavalo que termina uma corrida de 80 a 160km e está moderadamente desidratado necessita de fluidos por via oral (20 a 50L), contendo de 13 a 30g de cloreto de sódio e 8 a 20g de cloreto de potássio por litro, para restaurar a hidratação. Se estiver severamente desidratado, também deve-se administrar uma solução eletrolítica balanceada, EV (por exemplo, solução de lactato de Ringer) em 10 a 20L. Treinamento e condicionamento adequados do cavalo, acompanhamento cuidadoso dos eventos durante a corrida e fornecimento de água durante a mesma, principalmente nas superiores a 50km, contribuem substancialmente para a prevenção da exaustão e de suas complicações. HEMOGLOBINÚRIA PÓS-PARTO Trata-se primariamente de uma doença de vacas de alta produção leiteira que ocorre 2 a 4 semanas após o parto. É caracterizada por hemólise intravascular, hemoglobinúria e anemia. A causa é desconhecida. A doença é rara em animais de corte ou em animais < 3 anos; é incomum num período > 4 semanas após o parto. A incidência é geralmente baixa, porém até 50% dos animais afetados podem morrer. Dietas com alta quantidade de plantas crucíferas (colza ou couve) ou polpa de beterraba, e alimentação prolongada com dietas deficientes em fósforo são fatores predisponentes. Na América do Norte, a doença pode ocorrer após longa estabulação. Acredita-se que a hemoglobinúria seja associada à hipofosfatemia devido aos níveis séricos de fósforo sempre subnormais (0,8 a 1,4mg/dL) em vacas agudamente doentes. Na Nova Zelândia, a deficiência nutricional de cobre é a causa mais comum, embora a deficiência de selênio também possa ser responsável. A explicação mais plausível para estas observações de campo é que os agentes hemolíticos ocorrem na pastagem, bem como na colza, nabo e outras plantas crucíferas, e que o estado de hipofosfatemia ou hipocuprose confere às hemácias maior suscetibilidade a estas hemolisinas. A hemólise EV rápida leva a hemoglobinúria, palidez acentuada e pulso rápido. Desidratação, fraqueza e marcante queda na produção do leite são sinais proeminentes. A temperatura pode ser elevada a 39,5°C. Uma certa angústia respiratória pode ser observada. A hemólise intravascular continua por 3 a 5 dias, e em vacas que se recuperam, o retorno ao normal é vagaroso. A icterícia pode ocorrer em estágios tardios. Sem tratamento, a morte é freqüente. A transfusão de largas quantidades de sangue total pode ser o único tratamento efetivo de animais severamente afetados. Nos casos menos graves, 60g de fosfato de ácido sódico em 300mL de água destilada podem ser administrados endovenosamente, seguidos por injeções subcutâneas a cada 12h ou por doses orais diárias da mesma quantidade de fosfato. Se injetado subcutaneamente, o fosfato de ácido sódico deve ser bem distribuído para evitar necrose tecidual. Farinha de osso deve ser adicionada à ração. É importante evitar a deficiência de cobre ou fósforo na dieta e prevenir o acesso das vacas a plantas que obviamente contêm hemolisinas. TOXEMIA DA PRENHEZ EM VACAS É uma doença esporádica que ocorre mais comumente em vacas que se tornaram obesas devido à alimentação intensa no início da prenhez, mas que sofrem Toxemia da Prenhez em Vacas 550 um estresse nutricional grave durante os 2 meses que antecedem a parição (ver também SÍNDROME DA VACA OBESA, pág. 536). A morbidade é baixa, tornando-se maior quando o gado alimentado no pasto fica sem alimentação natural e não é suplementado. Quando a doença torna-se clinicamente aparente, está usualmente muito avançada e o tratamento neste estágio não é compensador; a mortalidade é virtualmente de 100%. Nos últimos estágios da prenhez, as vacas afetadas estão invariavelmente obesas, completamente anoréticas e em geral carregando gêmeos. Há um período transitório de inquietação e incoordenação, o pulso é fraco e rápido, e as fezes são pequenas e firmes. Segue-se decúbito esternal. Há um volume de descarga nasal clara maior que o normal, a pele do focinho apresenta-se seca, com rachaduras existe a possibilidade de sua perda ; os movimentos respiratórios são rápidos e com grunhidos. A condição do animal permanece imutável por 7 a 10 dias. Terminalmente, as fezes se tornam moles e malcheirosas, tendem a ser alaranjadas e permanecem pequenas no tocante ao volume; a vaca torna-se comatosa e morre silenciosamente. Os achados laboratoriais são cetonemia e cetonúria marcantes, hipoglicemia e proteinúria. Os níveis de enzimas hepáticas no soro são elevados e, na fase terminal, o nível de glicose sangüínea está freqüentemente muito elevado. À necropsia, há um aumento do volume do fígado, o qual tem aspecto gorduroso. A ostertagíase é com freqüência uma doença concomitante significativa e a mucosa do abomaso pode estar obviamente anormal. O tratamento é em geral ineficaz, sobretudo se a vaca já está em decúbito. Os esteróides anabólicos têm a melhor reputação, e a terapia de suporte com glicose, fluidos e eletrólitos (EV ou VO) e propilenoglicol (VO) é recomendada. Embora seja provável a perda do bezerro, a vida da vaca pode ser protegida por indução do parto com corticosteróides ou por secção cesariana. Esta patologia pode ser prevenida com uma suplementação adequada de concentrados na alimentação, durante o último trimestre da gestação. TOXEMIA DA PRENHEZ EM OVELHAS (Cetose ovina) É uma doença de ovelhas parturientes, caracterizada primariamente por sintomas neurológicos. Etiologia – A causa primária predisponente é a subnutrição no final da prenhez. Ovelhas superalimentadas, carregando gêmeos ou trigêmeos, são mais suscetíveis que ovelhas em condições ruins e aquelas que carregam um único cordeiro. Qualquer elemento que interrompa o aporte alimentar (por exemplo, tempestades, transporte, outras condições da doença) pode induzir a patologia. A lesão primária é uma encefalopatia hipoglicêmica, que resulta da inabilidade da ovelha para suprir glicose suficiente (provinda dos produtos da digestão ou de tecidos catabolizados) para cobrir a demanda de carboidratos dos fetos múltiplos e grandes e de si mesma. O defeito parece estar na manutenção do nível de glicose sangüínea, uma vez que a utilização da glicose disponível não está impedida. Com o progresso da doença, cetose grave e acidose podem se desenvolver, juntamente com distúrbios hepáticos, renais e, possivelmente, endócrinos. A glicose sangüínea pode se elevar sem aliviar os sinais de encefalopatia. Neste estágio, a ovelha é refratária ao tratamento. Achados clínicos e diagnóstico – Sinais clínicos precoces podem ser erráticos e difíceis de detectar. O curso usual, que dura 2 a 5 dias, inclui indiferença, inapetência, andar sem direção, “estacamento” contra qualquer tipo de obstrução, Tetania Puerperal 551 contrações musculares (das orelhas, ao redor dos olhos e talvez de outras partes), posturas incomuns, ranger dos dentes, perda progressiva de reflexos, cegueira, ataxia e, finalmente, decúbito esternal, coma e morte. Os testes laboratoriais geralmente revelam hipoglicemia nos estágios iniciais, com normoglicemia ou hiperglicemia na fase final, e hipercetonemia. A acidose e elevação do nitrogênio não proteico sangüíneo são achados concomitantes variáveis. Achados de necropsia incluem fígados de aspecto gorduroso, indistingüíveis daqueles achados algumas vezes em ovelhas aparentemente sadias, subalimentadas e perto da parição. As glândulas adrenais podem estar aumentadas, hiperêmicas ou acinzentadas. Alterações pulmonares estão associadas ao decúbito. A hipocalcemia aguda antes da parição é o principal diagnóstico diferencial. Nesta, a duração é curta (a morte ocorre em 24h), e usualmente há uma resposta acentuada, imediata e persistente à terapia com cálcio EV. Tratamento – Uma vez que sinais avançados se desenvolvem, nenhum tratamento é altamente eficaz. A mortalidade dos casos não tratados é de , 80%. Com o diagnóstico precoce, que pode ser obtido por movimentação cuidadosa do rebanho, particularmente quando a doença foi induzida por um jejum relativamente súbito, o glicerol ou o propilenoglicol (120mL em 2 vezes ao dia por VO) reduzem a mortalidade. Os melhores resultados são obtidos com a combinação de um desses medicamentos com um esteróide anabólico e fluidoterapia para controlar a acidose, mas mesmo assim a mortalidade pode ser de aproximadamente 50%. A cesariana ou a indução do aborto no início do curso da doença geralmente leva à recuperação e, se próximo ao parto, a cria pode ser salva. Deve-se providenciar alimentação palatável, água e proteção contra os extremos climáticos. Duas vezes ao dia, alimentação forçada com pastagem seca, finamente moída, administrada pelo tubo gástrico, pode ser uma prática válida, especialmente com animais valiosos; o tratamento deve ser continuado até que o apetite retorne. Profilaxia – No início da prenhez, a obesidade deve ser evitada, e um suplemento bom e adequado deve ser administrado nas últimas 6 semanas. A suplementação alimentar depende da condição da pastagem e do peso das ovelhas. Quando as pastagens se tornam ruins, uma suplementação em quantidade maior pode ser necessária. Se uma alimentação adequada não estiver disponível para todo o rebanho ao final da prenhez, casos prematuros podem ser identificados por um manejo cuidadoso. Estes indivíduos podem ser separados do rebanho e receber cuidados especiais e boa alimentação, porém qualquer interrupção do aporte alimentar deve ser evitada. Quando a doença ocorre em ovelhas obesas em boas pastagens, talvez associada a problemas nos membros, uma caminhada leve por 30min pode prevenir o desenvolvimento de casos incipientes a partir da elevação da glicose sangüínea por um período. Quando a suplementação alimentar pode ser provida como profilaxia, é importante prevenir a hiperalimentação, a qual pode causar acidose láctica e laminite. Ambas as doenças são possíveis se os grãos estiverem disponíveisad lib. TETANIA PUERPERAL (Eclâmpsia) É uma doença encontrada mais freqüentemente em pequenas e excitáveis raças de cães como chihuahuas, poodles toy e pequenos terriers, particularmente de 1 a 3 semanas após o parto. Também ocorre esporadicamente em cães maiores e gatos. Tetania Puerperal 552 Etiologia e patogenia – Consideravelmente pouco é conhecido sobre a patogenia das síndromes pós-parturientes hipocalcêmicas em cães e gatos em comparação à doença que ocorre no gado (ver pág. 544). Existe pouca evidência para sugerir que a tetania puerperal em cadelas lactantes é o resultado de uma interferência na secreção do hormônio paratireóideo (PTH); de fato, os níveis de PTH parecem ser aumentados em resposta à hipocalcemia. A hipocalcemia e hipofosfatemia severas, que se desenvolvem junto ao pico de lactação (1 a 3 semanas pós-parto), provavelmente são o resultado de um desequilíbrio entre as taxas de entrada e saída do “pool” de cálcio extracelular. Os distúrbios funcionais associados à hipocalcemia na cadela são, primariamente, o resultado da tetania neuromuscular aumentada, em contraste àqueles observados na vaca, na qual os sinais clínicos são dominados por paresia muscular. A ocorrência de tetania ou paresia, em resposta à hipocalcemia, parece ser o resultado de diferenças fisiológicas básicas entre a cadela e a vaca na função da junção neuromuscular. Em vacas, a liberação de acetilcolina e a transmissão dos impulsos nervosos através das junções neuromusculares são bloqueadas pela hipocalcemia grave, que leva à paresia muscular. O cão parece ter uma margem de segurança maior na transmissão neuromuscular, na qual o grau, cujo potencial final de placa excede o limiar de disparo, é maior que na vaca. Na cadela com hipocalcemia, a ligação excitação-secreção é mantida na junção neuromuscular. A tetania ocorre como resultado de disparos repetitivos espontâneos das fibras motoras nervosas. Como resultado da perda de cálcio estabilizador ligado às membranas, as membranas nervosas se tornam mais permeáveis aos íons e requerem um estímulo de menor magnitude para se despolarizarem. Achados clínicos e diagnóstico – O curso clínico na hipocalcemia da parturiente canina é rápido, com apenas 8 a 12h de intervalo entre o aparecimento dos sinais clínicos iniciais e o desenvolvimento da tetania. Os sinais premonitórios incluem intranqüilidade, arquejo excessivo e comportamento excitável. Em poucas horas, os sinais podem progredir para ataxia, tremores, tetania muscular e convulsões. A hipertermia está freqüentemente associada ao aumento da atividade muscular; elevações da temperatura para 42°C não são incomuns. Na maioria dos casos, o diagnóstico é baseado na história, sinais clínicos de excitabilidade neuromuscular aumentada e resposta à terapia. Se os recursos laboratoriais estiverem prontamente disponíveis, a demonstração de hipocalcemia com níveis séricos de cálcio < 7mg/dL é confirmatória. O fósforo sérico está freqüentemente diminuído a um grau comparável. A glicose sangüínea está no parâmetro normal-baixo ou diminuído como resultado da intensa atividade muscular associada à tetania. Tratamento – A administração EV lenta de uma solução de cálcio orgânico, como o gliconato de cálcio, deve resultar numa rápida melhora clínica e cessação dos espasmos tetânicos em 15min. Na maioria das cadelas pesando de 5 a 10kg, 5 a 10mL de gliconato de cálcio a 10% proverão cálcio suficiente. A administração deve ser procedida vagarosamente para evitar a indução de fibrilação ventricular e parada cardíaca. Os cãezinhos devem ser removidos das cadelas por 24h para reduzir o dreno lactacional de cálcio. Durante este período, eles devem ser alimentados com sucedâneo lácteo ou outra dieta apropriada; se eles forem suficientemente maduros, é aconselhável desmamá-los. Dietas suplementares de cálcio e vitamina D provaram ser úteis na prevenção de recidivas em certas cadelas. Embora alguns clínicos preconizem o uso de corticosteróides além do cálcio e da vitamina D para prevenir recidivas após a terapia original, o seu valor é questionável; eles podem interferir no transporte intestinal de cálcio e aumentar a perda urinária do mesmo. Tetania do Transporte em Ruminantes 553 Prevenção – Durante a gestação, uma dieta balanceada de boa qualidade, com relação cálcio–fósforo de ≤ 1:1 que provê a quantidade requerida de cálcio (porém não excessiva), pode suprir um mecanismo homeostático de Ca mais responsivo ao incremento marcante na demanda lactacional. Experiências clínicas em vacas sugerem que o maior controle da homeostasia do cálcio pela secreção de PTH, em animais alimentados com dietas balanceadas ou relativamente baixas em cálcio durante a gestação, ocorre com a aproximação do parto e o início da drenagem lactacional. TETANIA DO TRANSPORTE EM RUMINANTES (Doença da estrada de ferro, Mal-estar da estrada de ferro, Cambaleios) É uma condição que afeta vacas e ovelhas bem alimentadas em estágios avançados de prenhez, durante ou imediatamente após longo transporte e estresse. É também relatada em carneiros durante o transporte para confinamento. A causa específica é desconhecida, mas acredita-se ser uma forma aguda de hipocalcemia trazida por condições adversas durante o embarque. Outros acreditam que a hipomagnesemia seja a causa precipitante. Vagões ou caminhões superpopulosos, quentes, pobremente ventilados e sem provisão alimentar ou água parecem ser fatores contribuintes. A evidência da condição é mais comumente observada na chegada, mas pode se desenvolver enquanto em trânsito. Sinais precoces de inquietação e movimentos incoordenados são seguidos por uma paralisia parcial dos membros anteriores e andar cambaleante. Mais tarde, o animal é incapaz de se levantar e assume uma atitude similar àquela observada na paresia da parturiente em vacas. A freqüência do pulso de 100 a 120 pode ser notada enquanto a respiração é rápida e laboriosa. A temperatura pode estar levemente elevada e a congestão das membranas mucosas ocorre comumente. Sede extrema pode se desenvolver, enquanto a anorexia é regularmente observada; pode haver redução ou completa cessação das atividades peristáltica e ruminal. O aborto pode ocorrer como complicação. A paralisia progressiva, a perda gradual de consciência e a morte resultam em poucos dias, a menos que o tratamento adequado seja empreendido logo após o início. Animais em prenhez avançada devem receber apenas comida seca que contenha magnésio e cálcio adequados por 1 a 2 dias antes do embarque. O carregamento deve ser realizado com o mínimo de excitação; veículos superpopulosos e pobremente ventilados devem ser evitados. Se o tempo de trânsito for muito longo, arranjos deverão ser feitos para se ter os animais alimentados, hidratados e descansados. Cloridrato de promazina ou outros atarácticos adequados (a menos que o transporte seja para abate), administrados intramuscularmente 30min antes do carregamento, são eficazes para avaliar o estresse do transporte e podem ajudar a prevenir a doença. Para o tratamento, injeções EV de borogliconato de cálcio (solução a 25%, 400 a 800mL/vaca, , 100mL/ovelha) ou borogliconato de cálcio com sulfato de magnésio (solução a 5%, mesmos volumes), administradas vagarosamente, de preferência com 250 a 500mL de solução de dextrose a 50%, são recomendadas, mas os resultados são ruins. Em vacas afetadas, injeções de soluções de eletrólito EV repetidas devem ser administradas e a vaca removida para um leito macio com a pata segura por baixo. A indução da parição é um tratamento lógico, mas ineficaz na maioria dos casos. A sedação é indicada se os animais estão hiperexcitados.