SARAH PONTE PEREIRA
O TEXTO LITERÁRIO NOS MANUAIS DIDÁTICOS
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso
de Letras da Universidade Católica de Brasília, como
requisito para a obtenção de título de licenciado em
Letras, Habilitação Português e respectivas Literaturas
Orientadora: Profª. Drª. Mariza Vieira da Silva
Brasília
2006
BANCA EXAMINADORA
______________________________________________
Dra. Mariza Vieira da Silva
______________________________________________
MSc. Lívila Pereira Maciel
______________________________________________
MSc. Marcos Sílvio Pinheiro
Dedico
Com muito amor e carinho, ao meu querido pai.
À minha mãe, que sempre me incentivou.
Ao meu namorado,
maravilhoso e companheiro em todos os momentos.
4
Agradeço
Primeiramente a Deus,
por ter me concedido sabedoria.
Em especial, à professora Mariza Vieira da Silva,
pela dedicação e paciência durante todo o semestre.
Às colegas da graduação Bethseba e Waldênia,
por partilharem o mesmo sonho.
A todos os colegas e professores da graduação,
que de alguma forma contribuíram para
o meu crescimento profissional e pessoal.
Não esquecendo das grandes amigas,
a quem reneguei um tempo precioso
em busca dessa conquista tão desejada.
5
É à literatura, como linguagem e como instituição, que se
confiam
os
diferentes
imaginários,
as
diferentes
sensibilidades, valores e comportamentos através dos
quais uma sociedade expressa e discute, simbolicamente,
seus impasses, seus desejos, suas utopias.
(Lajolo, 1997)
6
Resumo
O presente trabalho acadêmico-científico tem como objeto de estudo o texto literário
na Escola e, como objetivo principal, compreender como este texto ali circula, através da
análise de um livro didático, colocando em discussão os vários elementos que estruturam e
fazem funcionar o Discurso Pedagógico e o ensino de Português no Brasil em diferentes
momentos históricos. Nele, apresentamos, inicialmente, os resultados de uma pesquisa
bibliográfica, em que mostramos a relação entre o texto literário, a escola e a sociedade, por
meio de diferentes práticas de leitura, estando aí incluídas a dos livros didáticos, produzindo
determinados efeitos de sentido, efeitos estes que irão produzir e reproduzir representações de
literatura, de texto literário, de leitura literária. Apresentamos, também, no desenvolvimento
deste Trabalho de Conclusão de Curso, o caminho de leitura e interpretação que percorremos
na leitura da bibliografia, na descrição e análise do corpus selecionado e nos recortes feitos,
ou seja, alguns conceitos da Análise do Discurso francesa. O corpus foi formado pelo livro
didático “Português: Linguagens”, de William Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães, e
por entrevistas realizadas com quatro professores da 8ª série do Ensino Fundamental, de
escolas públicas da Cidade Satélite do Gama, Distrito Federal. A análise nos permitiu chegar
a alguns resultados sobre o funcionamento do Discurso Pedagógico da e sobre a Literatura,
como a noção de texto e de texto literário na Escola, o seu uso e função na aula de Língua
Portuguesa. E, então, concluir que há uma noção de texto dominante na Escola em que a
Literatura entra de determinado modo; que um Discurso Pedagógico conservador não se cansa
de reproduzir certas representações de Literatura, reforçando o imaginário do leitor, que é
sobredeterminado pelo contexto sócio-histórico; que a estrutura e o funcionamento do livro
didático parecem vir se conservando ao longo do tempo, de diferentes formas, ajudando a
perpetuar essas (e outras) representações.
Palavras-chave: 1. Literatura e representações; 2. Livro didático; 3. Texto literário; 4. Análise
de discurso.
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Abstract
The present academic-scientific work has as study object the literary text in the School
and, as objective main, to understand as this text circulates there, through the analysis of a
didactic book, placing in quarrel the some elements that they structuralize and they make to
function the Pedagogical Speech and the education of Portuguese in Brazil at different
historical moments. In it, we present, initially, the results of a bibliographical research, where
we show the relation between the literary text, the school and the society, by means of
different practical of reading, being there enclosed of didactic books, producing determined
direction effect, effect these that will go to produce and to reproduce representations of
literature, literary text, literary reading. We present, also, in the development of this Work of
Conclusion of Course, the way of reading and interpretation that we cover in the reading of
the bibliography, the description and analysis of the selected corpus and in made clippings,
that is, some concepts of the Analysis of the French Speech. The corpus was formed by
Portuguese the didactic book: “Languages”, of William Robert Cereja and Thereza Cochar
Magalhães, and for interviews carried through with four professors of 8ª series of Basic
Ensino, of public schools of the City Satellite of Gamma, Federal District. The analysis in
allowed them to arrive at some results on the functioning of the Pedagogical Speech of and on
Literature, as the notion of text and literary text in the School, its use and function in the
lesson of Portuguese Language. E, then, to conclude that it has a notion of dominant text in
the School where Literature enters in definitive way; that the one Pedagogical Speech
conservative is not gotten tired to reproduce certain representations of Literature,
strengthening the imaginary one of the reader, who is sobredeterminado by the context
partner-description; that the structure and the functioning of the didactic book seem to come if
conserving throughout the time, of different forms, helping to perpetuate these (and others)
representations.
SUMÁRIO
Resumo_______________________________________________________________6
Abstract______________________________________________________________ 7
Introdução_____________________________________________________________9
Capítulo 1 - A relação texto literário, sociedade e escola________________________ 12
Capítulo 2 - Um caminho de leitura e interpretação_____________________________22
Capítulo 3 - O texto e o texto literário no livro didático_________________________ 30
Conclusão_____________________________________________________________51
Referências Bibliográficas________________________________________________ 53
Anexo 1______________________________________________________________ 55
Anexo 2_______________________________________________________________58
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INTRODUÇÃO
Durante toda a minha trajetória na Educação Básica, especialmente no Ensino
Fundamental, os textos literários foram algo muito ausente. Sem muita surpresa, revelo:
recordo-me de ter lido um único livro: “Iracema”, de José de Alencar. No Ensino Médio, com
efeito, a literatura se restringia a estudar datas, estilos e características de determinada época.
Assim, nesse período escolar, esse tipo de linguagem mostrava-se, de certa forma, bastante
limitada e superficial. Ademais, sob o meu ponto de vista, a falta de um estudo mais adequado
para a literatura me deixou seqüelas que, felizmente, no Ensino Superior, pude torná-las, em
boa parte, reversíveis.
Se dentro da escola o incentivo para a leitura era quase nulo, imagina fora desse
ambiente! Em casa, ninguém queria saber de livros, com exceção do meu irmão que cursava
Economia. Ademais, não se dava muita importância a livros e a leituras. Desse modo, a leitura
aconteceu mesmo para mim, somente na Universidade. Comecei assim, o Curso de Letras
sem praticamente nenhuma base literária. Foi complicado, principalmente quando me deparei,
no início, com a disciplina Teoria da Literatura I. Logo, notei que a Literatura vista no
contexto escolar recebia tratamento totalmente diferente do contexto universitário, pois, na
Escola, são vistos terminologias, conceitos, cronologia para serem decorados.
Pude observar que no contexto universitário, a Literatura está muito além de datas e
conceitos descontextualizados. Aqui se estudam as teorias literárias, a Literatura Brasileira, a
Literatura Portuguesa, a Literatura Infanto-Juvenil, e muitas outras coisas. Na Universidade, a
Literatura é problematizada. Cursando Letras, aprendi a dar valor maior a esse tipo de
linguagem, de suma importância para a vida humana, pois, mostra um mundo fantástico que
reflete (e retrata) um outro, não fantástico. Mas porque a Escola não a valoriza? Ou ainda. Por
que ao afirmar que a valoriza, nega o que nela há de fundamental?
No momento, então, de fazer o meu Trabalho de Conclusão de Curso – TCC, decidi
compreender melhor essa questão, procurando respostas para essa e para outras perguntas que
ao longo do trabalho foram sendo formuladas.
Sem dúvida, a necessidade de trabalhar a Literatura como literatura é possibilitar ao
aluno a leitura de um texto, o qual favorece o desenvolvimento sistemático de seu senso
crítico e de seu posicionamento no mundo, na sociedade, sob um ponto de vista, sobre
qualquer assunto. Isso desmistificaria certas afirmações freqüentes dentro e fora da Escola, de
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que a Literatura é muito difícil e não pode ser compreendida por qualquer um, quer dizer,
alunos de escola pública.
Este é, pois, um tema que tem relevância literária, mas também pedagógica e social.
Ensinar o aluno a ler, orientando-o na escolha de materiais de leitura, aí estando incluídos
textos dos livros didáticos, há de ser uma das principais prioridades da escola. Apesar de
mudanças ocorridas, nos últimos anos, nas políticas públicas de avaliação do livro didático,
parece que, ainda há um investimento maior na quantidade, quando se pensa na produção,
distribuição e utilização de uma das principais tecnologias de ensino: o livro didático.
De certo, o projeto pedagógico de cada escola tem de contribuir para que seus
educadores se sintam verdadeiramente responsáveis pelo estímulo e abertura de novos
caminhos, perspectivas, no que diz respeito ao trabalho com a Literatura. Sendo assim, se faz
necessário que esses educadores, leiam e tenham conhecimento das teorias literárias e, ao
mesmo tempo, levem aos seus educandos procedimentos atualizados e eficientes, os quais
possam enriquecê-los em conhecimentos, habilidades, atitudes e interesses.
No que concerne à relevância social, retomo o que disse anteriormente. Vê-se que a
Literatura parece ser terminantemente vista pela escola e pela sociedade como algo muito
complexo, bem elaborado, complicado. Criou-se sobre ela um imaginário – sentidos
estabilizados – que produzem efeitos negativos, pois, por conseqüência, um grande número de
professores do ensino público passa a acreditar que seus alunos são incapazes de compreender
a linguagem literária.
A essa imagem da Literatura, acrescenta-se uma imagem negativa do estudante que
circula na escola pública atualmente, qualificando-o como um indivíduo, um cidadão, incapaz
de ler e de compreender porque tem pouco conhecimento, pouca cultura. Com efeito, só deve
ser oferecido a esse estudante algo tido como fácil de ler, porque não é capaz de entender o
difícil, o complexo, como se viver nesta sociedade, com tão pouco grau de escolaridade, fosse
tarefa mais simples, não complexa.
Sem dúvida, quanto à relevância literária do tema proposto – o texto literário no livro
didático de 8ª série -, podemos assinalar o quanto é importante estudar literatura no Ensino
Fundamental, pois, nesse período, se os textos literários fossem trabalhados com mais
qualidade, os alunos iriam apreendendo esse espaço simbólico em relação a ele mesmo e ao
mundo, e chegariam ao Ensino Médio com maior possibilidade de compreender o lugar da
Literatura na construção do conhecimento e o papel social e político de suas representações.
Sabendo da importância da leitura, em especial, da literária, desejo com este trabalho
compreender – analisando - a estrutura e o funcionamento do texto literário no livro didático
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de 8ª série (e seus efeitos) e, poder, assim, apontar caminhos para que o profissional de
Língua Portuguesa possa trabalhar o texto literário como Literatura, de forma a ampliar,
transformar e enriquecer a sua prática pedagógica.
No primeiro Capítulo, faço uma resenha do trabalho de alguns autores que me ajudaram
a compreender a relação estreita e complementar existente entre o texto literário, a sociedade
e a escola e, tratar meu objeto de estudo – o texto literário na escola – como um objeto
histórico.
Essa leitura se tornou possível, considerando o referencial teórico e metodológico que
uso neste TCC: a Análise de Discurso. Como iniciante nessa disciplina, aponto, no Capítulo 2,
alguns conceitos que me permitiram a análise da bibliografia sobre o tema e do corpus
selecionado.
No Capítulo 3, descrevo e analiso esse corpus, constituído por um dos livros mais
adotados na rede de ensino do Distrito Federal e de algumas entrevistas. Os resultados
encontrados, mesmo em curo espaço de tempo, me permitiram um outro olhar sobre o livro
didático e sobre o modo como ele ali se organiza, produzindo e reproduzindo determinadas
representações sobre literatura e sobre texto.
Finalmente, poderia concluir, dizendo que há uma noção de texto dominante na Escola
em que a Literatura entra de determinado modo; que um Discurso Pedagógico conservador
não se cansa de reproduzir certas representações de Literatura, reforçando o imaginário do
leitor; que a estrutura e o funcionamento do livro didático parecem vir se conservando ao
longo do tempo, de diferentes formas, ajudando a perpetuar essas (e outras) representações.
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CAPÍTULO 1
A relação tex to literário , so cieda de e escola
Pensar, analisar e compreender o modo como o texto literário é trabalhado na Escola,
através de diferentes práticas de leitura, é trazer para a discussão vários elementos que
estruturam e fazem funcionar o Discurso Pedagógico do ensino de Português no Brasil em
diferentes momentos históricos. No caso deste Trabalho de Conclusão de Curso, estamos nos
situando neste final/início de século, em um momento em que não escolarizamos ainda todos
os cidadãos brasileiros, em termos de capacidade de leitura e compreensão de um texto.
Compreensão que se torna mais precária, dizem, quando se trata de uma obra ou texto
literário.
Neste capítulo, vamos, pois, apresentar os resultados de um trabalho bibliográfico, para
que possamos situar o nosso objeto de estudo, considerando um pouco do que já está
produzido sobre o tema, bem como compreendendo de forma mais efetiva o nosso material de
descrição e análise.
No que diz respeito à relação escola e sociedade, Zilberman (1991) afirma que a Escola
atua, desde o século 18, como mediadora entre a criança e a cultura, sendo que a leitura é a
ponte de ligação entre as duas, funcionando como porta de entrada do jovem no universo do
conhecimento. Por conseguinte, a instituição escolar é, para muitos, como é o caso do Brasil,
a única possibilidade de acesso à leitura, principalmente a literária. O modelo de texto que
circula neste ambiente, no qual está fixado um conjunto de padrões literários e sociais, é
definido pela proposta político-pedagógica da instituição, que rege todas as atividades
desenvolvidas dentro da mesma.
As propostas político-pedagógicas voltam-se, quase sempre, para os interesses da(s)
classe(s) dominante(s), veiculando suas ideologias. No que se refere à aprendizagem da
leitura nas séries iniciais, de acordo com Zilberman (1991), “A alfabetização significa superar
um estágio de ignorância e atraso, não para negar os padrões dentro dos quais o analfabeto
convive e se desenvolve, mas para ter ingresso na cultura dominante”. (p. 15).
Orlandi (1996), Zilberman (1991, 1989 e 1998), Lajolo (1997), Paulino (2001) e
Chartier (1997) tratam desse assunto, colocando em cena uma discussão sobre leitura e leitura
literária ancoradas basicamente nas relações escola/sociedade, ou seja, tratam-nas como
objetos históricos.
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Para Zilberman (1991), a questão da relação escola/sociedade se dá em um processo,
quase sempre, dependente das práticas sociais e das políticas pedagógicas. Estas omitem, por
meio, principalmente, do funcionamento do discurso pedagógico, as divisões sociais e
políticas que perduram historicamente. De um lado, predominam os interesses econômicos e
ideológicos do capitalismo, visando ao lucro, para assim, garantir o poder; de outro, a
distribuição desigual do conhecimento que não é para todos, pois, a sociedade valoriza
aqueles que adquirem uma boa formação intelectual, traduzida em diplomas universitários.
Destarte, nota-se que o aparelho escolar se organiza, de modo geral, em função dos indivíduos
pertencentes à elite da sociedade.
Soares, citada por Paulino (2001), diz que a leitura para os indivíduos de classes sociais
menos favorecidas economicamente é um fator de elevação social, ou “instrumento para
obtenção de melhores condições de vida”. (p. 25), também denominada leitura funcional. Já
para os membros de classes sociais privilegiadas, a leitura é vista como produção de
conhecimento, de intelectualidade, ou “uma alternativa de expressão, de comunicação, nunca
como uma exigência do e para o mundo do trabalho”. (p.25).
Logo, pode-se perceber que a sociedade só legitima o conhecimento voltado para a
formação intelectual, que é adquirida por meio do universo dos livros, pois, segundo Soares
(apud PAULINO, 2001) “É a leitura caracterizada como produção de conhecimento que a
sociedade legitima”. (p.25).
Nesse processo, existe um movimento interessante, tendo de um lado o instituído e de
outro o que institui. Esses dois eixos são articulados de acordo com as exigências, que variam
conforme o movimento histórico. O mundo atual exige um processo educativo baseado na
informação com crescente apropriação social, econômica, científica e tecnológica de bens
culturais. Por outro lado, a informação, os bens culturais são distribuídos de uma forma
desigual, às vezes, precária, para grande parte da população.
Segundo Zilberman (1989), a indústria cultural é o agente mais poderoso da economia
capitalista. Esta dá ao sujeito à ilusão de que todos são iguais, quando na verdade, há uma
distinção de classes, que impossibilita as pessoas de pensarem e agirem por si próprias, ou
seja, em nossa sociedade, nega-se a possibilidade ao cidadão de se tornar um sujeito
autônomo e autodeterminado.
A Escola brasileira vem se defrontando com a realidade inquietante de uma sociedade
denominada pós-moderna, cuja característica básica tem sido a pulverização da consciência
individual, convertida numa partícula de massa. A mesma autora afirma que a sociedade pósmoderna é profundamente coisificada, manipuladora e extremamente individualista. Nas
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sociedades capitalistas, há um consumo em e de massa que produz indivíduos submissos, ou
como diz a Análise do Discurso, os indivíduos são livres para se submeterem. O que
contribui, decisivamente, para que se tenha anulada a noção de sujeito como ser ativo,
político, participante e pensante.
A sociedade atual se sustenta no individualismo, em que as pessoas buscam sua própria
satisfação pessoal, pensam apenas em seus sentimentos, em seu crescimento profissional.
Assim, seu compromisso com o social e o político é excluído. A Escola, nesse contexto, tem
como objetivo, antes de tudo, formar os indivíduos tecnicamente (ensino utilitarista), de
acordo com os interesses econômicos e dominantes. Como resposta a esses interesses, o
ensino organiza-se em torno da competência técnica e a escola reproduz as diferenças sociais
e as representações dominantes, no momento em que estabelece de um lado o conhecimento
legítimo (literário) e de outro, o conhecimento não legítimo (não-literário).
No que tange à questão do texto literário, encontramos algumas questões, que nos
levaram a um outro ponto importante para este TCC: o de conceituar o texto literário.
Podemos, então, perguntar com Lajolo (1997), “Para uma coisa ser considerada literatura tem
que ser escrita? Tem que ser editada? Tem de ser impressa em livro e vendida ao público?”.
(p. 14).
Segundo o dicionário Aurélio Buarque de Holanda (2001), esse conceito é bastante
amplo:
“1. A literatura é a arte de compor ou escrever trabalhos artísticos em prosa ou verso; 2. O
conjunto de trabalhos literários dum país ou duma época; 3. Os homens de letras: A
literatura brasileira fez-se representar no colóquio de Lisboa; 4. A vida de literário; 5. A
carreira das letras; 6. Conjunto de conhecimentos relativos às obras ou aos autores
literários: estudante de literatura brasileira; 6. Manual de literatura portuguesa; 7.
Qualquer dos usos estéticos da linguagem; 8. Literatura oral; 9. Irrealidade, ficção:
sonhador, tudo o quanto diz é literatura”. (p.429).
Um outro caminho para buscar respostas às perguntas anteriormente feitas é o da
etimologia. A palavra “literatura” formou-se da palavra latina “littera”, significando letra ou
caráter da escritura. A arte de escrever e ler, conforme, Eagleton (2001), deixando pressuposto
que literatura tem relação com a língua escrita (LAJOLO, 1997), será uma manifestação
artística voltada mais para a escrita do que para a oralidade. Dessa forma, tudo o que não é
escrito perde o seu valor literário.
A escola produz e reproduz esta representação do que seja literário, porque valoriza
mais à linguagem verbal, não permitindo ou não criando condições para que o aluno se
expresse por intermédio de outras formas de linguagens. Isso mostra a expressão do
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maniqueísmo escolar, que vê em outras formas de linguagem sua manifestação rebaixada.
(ORLANDI, 1996). No que tange a questão da produção dos textos literários, Lajolo (1997)
assevera que:
“Parece que já naqueles tempos remotos os textos literários eram produzidos e
consumidos por poucos. Os poucos que tinham acesso à palavra. É o velho vício flagrado
em público: chamar de literatura apenas a produção verbal que circula e é aplaudida pelos
poucos eleitos...” (p. 59).
Portanto, como podemos observar, desde os tempos da produção literária latina, o
homem já valoriza mais a escrita do que a oralidade. O fato de que a escola atual rejeita a
linguagem oral na relação do aluno com o mundo, é uma herança. Temos uma história e uma
memória funcionando em diferentes discursos das sociedades letradas, significando o texto
literário de determinada maneira.
Lajolo (1997) afirma que “É na Grécia antiga que se costumam localizar as primeiras
reflexões mais sistemáticas sobre aquilo que ainda hoje chamamos de literatura”. (p. 53).
Nota-se, portanto, que, desde a Grécia antiga, o homem já buscava produzir conhecimento
sobre o fato literário, contribuindo para a produção de representações sobre o texto literário.
Observamos que não há um conceito único e exato de literatura, já que tal significação
depende, antes de tudo, do momento histórico que se define não só pelo gosto individual de
quem lê, conforme já vimos. Segundo Lajolo (1997), “Cada tempo, cada grupo social tem sua
resposta, sua definição para a literatura”. (p. 25).
Sem dúvida, muitos conceitos dados pelos povos antigos para a literatura, continuam
vivos até hoje. Segundo Lajolo (1997), “Este conceito e esta prática de literatura como
alguma coisa que toca profundamente as pessoas, como transbordamento de uma alma para a
outra, parece durar até hoje.” (p. 70). Basta perguntar para um aluno ou quem sabe um
professor sobre o que representa para ele, a Literatura. As respostas quase sempre são as
mesmas: a literatura está relacionada com amor, sentimento, subjetividade, emoção,
imaginação, poesia, suspiros, lágrimas e fantasia, como observarmos em entrevistas realizadas
para compor nosso corpus e que serão analisadas no terceiro capítulo.
Pode-se dizer, como uma primeira conclusão, que o texto literário desenvolve a
capacidade crítica e favorece a formação do indivíduo, pois, o auxilia na reflexão acerca de si
e do mundo. Além disso, aguça a imaginação, a criatividade, o domínio da linguagem, sendo,
portanto, um requisito indispensável para o aperfeiçoamento intelectual e ético. A Escola
constitui-se como o espaço institucional e social para a construção do horizonte de
expectativas dos jovens de uma nação.
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Uma outra questão para o nosso trabalho foi também a de “leitura”, se estamos
pensando no texto literário na escola. A leitura é um processo de construção de sentidos, por
um sujeito determinado e limitado a determinadas condições sócio-históricas. Orlandi (1996)
assevera que “O leitor atribui sentidos ao texto. Ou seja: considera-se que a leitura é
produzida” (...). (p. 37). Por sua própria natureza e especificidade constitutiva, a leitura tende
a ser múltipla, a ser plural, a ser ambígua. A referida autora mostra que o próprio significado
da palavra leitura remete a múltiplas significações:
“Leitura pode ser entendida como ‘atribuição de sentidos’. Daí ser utilizada tanto para a
escrita como para a oralidade. Pode-se falar, então, em leitura tanto da fala cotidiana da
balconista como do texto de Aristóteles. Por outro lado pode significar ‘concepção’, e é
nesse sentido que é usada quando se ‘leitura de mundo’. No sentido mais restrito, mais
acadêmico, ‘leitura’ pode significar a construção de um aparato teórico e metodológico de
aproximação de um texto: são as várias leituras de Saussure, as possíveis leituras de um
texto de Platão, etc. Em um sentido ainda mais restritivo, em termos agora de
escolaridade, pode-se vincular leitura à alfabetização (aprender a ler e a escrever) e leitura
pode adquirir então o caráter de estrita aprendizagem formal. Como se vê, poderíamos
fazer uma longa enumeração de sentidos que se podem atribuir à própria noção de leitura.
(p. 7).
Toda essa discussão criou condições para que pudéssemos compreender e centrar
nossa atenção na leitura literária como objeto histórico e social e trabalhá-la, posteriormente,
na análise do livro didático selecionado como corpus. É importante frisar, de acordo com
Lajolo (1997), que a literatura, assim como a leitura, é um objeto histórico e social.
Atualmente, a produção da obra literária envolve muitos sujeitos, os quais não são
apenas indivíduos empíricos e, sim, falando discursivamente, lugares sociais de fala, em que
há representações funcionando. Temos várias posições de sujeito que participam do processo
de elaboração de um livro didático, o editor, o distribuidor, os livreiros, os quais estão
envolvidos na produção de sentidos. Conforme Lajolo (1997), somente depois de passar por
estas “alfândegas”, acontece a circulação no meio social.
Além disso, a mesma autora afirma que “É desse cruzamento do mundo simbolizado
pela palavra em estado de literatura com a realidade diária dos homens que a literatura assume
seu extremo poder transformador.” (1997, p. 65). Conforme as idéias dela, podemos dizer que
a literatura tem uma tarefa muito importante a cumprir em todas as sociedades, que estão
sempre em transformação: a de servir como agente de formação, seja no espontâneo convívio
leitor/livro, seja no diálogo leitor/texto estimulado pela Escola. Certamente, é ao livro, à
palavra escrita que se atribui maior responsabilidade na formação da consciência de mundo
das crianças e jovens. Logo, vê-se que ler é dar sentido às coisas.
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Se ler é produzir sentidos, então, a leitura é um processo histórico porque sua produção
se dá em condições sócio-históricas determinadas, pois, lê-se um mesmo texto de formas
diferentes em épocas diferentes.
Para Chartier (1997), a leitura possui uma história social e cultural e, de acordo com
as capacidades, códigos e convenções de leitura próprias às diferentes comunidades de
leitores, o mesmo texto muda seu sentido. Assim, o importante na história da leitura é pensar
na distância que há entre o sentido atribuído pelo seu autor e seu leitor, ou seja, que o mesmo
texto, não possui o mesmo significado para os diferentes leitores que dele fazem uso. Por
conseguinte, o sentido e a compreensão dada ao texto pelo leitor também diferem, ou seja, se
transformam com o passar dos tempos.
Visto que, a leitura sempre teve e tem um papel social de grande importância na
sociedade, ler não é apenas passar os olhos por algo escrito, nem decodificar algo pronto, feito
pelo autor. A leitura garante ao indivíduo um espaço na sociedade para a atribuição de
sentidos, para a interação sistemática, cotidiana. Assim, contribui para a formação de cidadãos
críticos na construção e reconstrução de novos conhecimentos e da sociedade, fazendo com
que o indivíduo perceba-se como ser histórico-social. Conforme Orlandi (1996), “A leitura,
portanto, é uma questão de natureza, de condições, de modos de relação, de trabalho, de
produção de sentidos, em uma palavra: de historicidade”. (p. 9).
Com relação ao texto literário, Lajolo (1997) assevera que “O texto literário, ao mesmo
tempo em que significa, dribla o leitor, sugerindo-lhe que o que diz é e não é”. (p. 39).
Percebe-se que a complexidade do texto literário está em desvendar o que não está dito, por
isso, causa estranhamento, ou dizendo, discursivamente, ao analisar e compreender o dito em
relação ao não-dito, o leitor é levado a um desafio: romper com a linearidade e a literalidade.
Não é difícil, assim, perceber porque alguns professores de Língua Portuguesa se recusam a
trabalhar com o texto literário e significam o desafio como algo bastante “complicado”,
“abstrato”, “impenetrável”. Neste caso, a dificuldade seria, portanto, do professor e não do
aluno.
Com relação à questão da leitura do livro didático, nota-se que o aluno e, até mesmo, o
professor, são, na maioria das vezes, subordinados à sua autoridade, imposição. Ambos
acreditam que “a verdade absoluta” encontra-se pronta e acabada nos livros. De acordo com
Orlandi (1996):
“Atualmente, a leitura ideal do professor está amarrada àquilo que é fornecido pelo livro
didático. Ou seja, o professor orienta-se por àquilo que é fornecido, pronto-a-mão, no
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livro de respostas do livro didático. A autoridade imediata, nesse caso, é o autor do livro
didático adotado”. (p.43).
O livro pode ser produtivo como roteiro, mas deve sujeitar-se à críticas, que teriam
como objetivo melhorar a qualidade dele e, assim, melhorar a qualidade do ensino de Língua
Portuguesa. No entanto, para isso, é necessário que o professor conheça não só os textos ali
utilizados, mas também a estrutura e o funcionamento do livro didático em termo de efeitos
de sentido.
Agora, passamos a tratar de uma outra questão relevante, presente nos textos lidos: a
da democratização da leitura. Conforme Paulino (2001), à expansão da leitura, que ocorreu
com o advento da sociedade burguesa, foi o processo responsável por transformar os livros
em um lucrativo mercado. De um lado, a expansão cedeu espaço para novos leitores que antes
não tinham acesso aos livros, e grande parte da população foi alfabetizada; de outro, o
crescimento acelerado de novos leitores impulsionou o mercado a produzir mais e mais livros.
Apesar da inclusão de novos leitores, desde o século XIX, os grupos dominantes de uma dada
sociedade manipulavam (e continuam manipulando) a leitura, para assim, controlar os
sentidos, o mercado: ter poder. A expansão teve e tem, pois, vários aspectos positivos,
negativos, contraditórios a serem considerados e compreendidos pelo professor.
A Escola é uma das instâncias fundamentais no que se refere à mediação entre o autor
e o leitor, tornados, em uma sociedade como a nossa, em produtor e consumidor de obras
literárias. Evidencia-se, assim, a sua atuação como avalista e fiadora dos livros que circulam
no meio social. Enfim, a instituição escolar é uma das responsáveis pela mercantilização da
literatura. Ela também dá mais espaço para os textos literários ditos clássicos. Assim, impõe o
que é literário (bom) e o que não é literário (ruim).
Nota-se, portanto, que no sistema capitalista de produção, a Literatura é tratada, ou em
outras palavras, vendida como um produto qualquer. Para isso, é preciso contratar, como
afirma Lajolo (1997), os “canais competentes”. Ela assevera que um texto só pode ser
denominado literário se e somente se for aprovado por determinadas entidades
(institucionalizadas ou não), ou seja, pelos intelectuais, pela crítica, pela universidade, pela
academia, pelos sistemas de ensino.
“(...) os canais competentes são todas aquelas instâncias às quais cumpre referendar a
literariedade. Às quais compete, por uma espécie de acordo entre cavalheiros, estabelecer,
o valor ou a natureza artística e literária de uma obra considerada literária por seu autor
ou eventuais leitores”. (p. 17).
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No que se refere ao livro didático de literatura, tomando como base os textos de
Zilberman, Aguiar e Lajolo, “A leitura em crise na escola” (1991) e “A leitura rarefeita”
(1991), e Zilberman “Livro didático, Literatura e Pós-modernidade” (1989), percebe-se, que o
uso do livro didático de literatura transcendeu a sala de aula e, na verdade, sua utilidade
deixou de ser apenas educacional. Tornou-se uma fonte de renda para autores, editoras, enfim,
um comércio bastante lucrativo. Por isso, é consumido tão rapidamente, fazendo crescer o
lucro da indústria livreira. Desde o século XVIII, a Literatura vem sendo transformada em um
proveitoso negócio, ou seja, a Literatura foi e ainda é vista como mercadoria. Com relação ao
caráter pedagógico da Literatura, segundo Zilberman (1989):
“No espaço restrito do ensino de literatura, o esquema repete-se e as fórmulas repassadas
aos alunos reforçam a ausência do sentido da história, através da transmissão de
categorias estáticas de conteúdo. (...). O texto literário perdeu seu poder de influência
sobre os processos de produção e recepção posteriores, neutralizando-se, pois, sua
condição histórica. Por essas vias, o ensino de literatura contribui para a formação de
mentalidades que não se devem renovar, mas aceitar passivamente os produtos que a
indústria cultural oferece ao consumo. A busca da transformação, que o sentido da
história restaura, implica a mudança de aspirações e, em conseqüência, o perigo de se
estagnarem estoques”. (pp. 29-30).
É preciso, pois, avançar na compreensão dessa relação mercado x escola. Não basta
ser contra porque esta é a sociedade em que vivemos. Para atuarmos, mesmo no espaço
restrito de nossa sala de aula, precisamos dessa compreensão abrangente, para agirmos
efetivamente. Vê-se que é necessário inovar o estudo de literatura nas escolas, por meio da
recuperação do conceito de história, ou seja, deve-se levar em conta sua repercussão através
dos tempos, para a compreensão da obra literária.
Conforme Lajolo (1997), “Certos livros são muito conhecidos. Estão à venda em
qualquer livraria, todos conhecem o nome de quem os escreveu”. (p. 11). Certamente, apenas
uma pequena parcela da população brasileira tem acesso aos “bons livros”, de escritores
reconhecidos, ou seja, ao conhecimento dito legítimo, o que redunda em termos poucos bons
leitores.
Vale recordar que saber ler e ser um leitor são duas coisas distintas e com sentidos
distintos, dependendo do momento histórico (Zilberman, 1991). Logo, é considerado um bom
leitor pela sociedade aquele que lê obras literárias de escritores conhecidos no meio
acadêmico. Desse modo, cria-se uma ideologia que influencia (e muito) no conceito de
representação literária contida no livro didático.
Volto-me novamente para a questão da leitura literária, que é o objeto de análise do
meu Trabalho de Conclusão de Curso. Conforme Lajolo (1997):
20
“Numa última perspectiva, o desencontro literatura/jovens que explode na escola parece
mero sintoma de um desencontro maior, que nós – professores – também vivemos. Os
alunos não lêem, nem nós; os alunos escrevem mal e nós também”. (p. 16).
A partir dessa afirmação, evidencia-se um dos problemas da leitura do texto literário
na Escola. Alguns educadores, nem sempre se apropriam do acervo literário disponível no
mercado, alegando baixos salários, outros, no entanto, não o fazem por falta de interesse, pois,
não gostam de ler.
Certamente, é essencial que o jovem principiante esteja constantemente em contato
com um leitor assíduo de textos literários, de modo que, possa adquirir o hábito da leitura. É
função do educador, compartilhar com os alunos o que lê, fazendo comentários acerca de
poemas, crônicas, contos, romances. O professor precisa se dar conta de sua importância no
processo de formação de leitores, o que implica que ele também seja um leitor, pois, é o
mediador entre o livro e o leitor na escola. Ainda podemos destacar outros problemas, como
por exemplo, bibliotecas mal equipadas, métodos de leitura equivocados e políticas
pedagógicas voltadas unicamente para o pedagogismo1.
Zilberman (1991) também assevera que a entidade responsável por ensinar o aluno a
ler é a Escola e esta restringe, quase sempre, o ensino da leitura ao seu caráter mais técnico,
ou seja, utiliza um método de leitura mecânico e estático. Portanto, a leitura é simplesmente
um instrumento de trabalho (muitos exercícios, textos literários ou não) em sala de aula. É
necessário fazer um movimento contrário e selecionar o que se pretende ler e “como” ler, uma
vez que, a Escola deve dar espaço para o diálogo acerca da obra literária, para exercitar a
liberdade de expressão e não mais consentir com o silêncio da interpretação única proposta
pelo livro didático e levada, muitas vezes, ao pé da letra pelo educador2.
Para o historiador Chartier (1997), a mesma obra pode possuir múltiplos sentidos,
logo, o mesmo texto, circula em meio a diferentes públicos e assim, tem inúmeras
possibilidades de interpretações de sentido. Mas, não qualquer um porque o sujeito-leitor está
situado historicamente. O mesmo autor afirma que remontar a uma história da leitura dos
gêneros é considerar as diferentes apropriações (o modo de ler) dos textos, considerando a
história de leitura do texto e também a história de leitura do leitor, onde autor e leitor
encontram-se imersos na sua interpretação.
1
. Ver texto de Orlandi, denominado: “Leitura: questão lingüística, pedagógica ou social?” (1988).
2
. Na descrição e análise do livro selecionado, pudemos observar esse funcionamento e seus efeitos.
21
Esta resenha bibliográfica abriu perspectivas para novas leituras e apontou para a
necessidade de explorar novos caminhos teóricos no que diz respeito ao texto literário dentro
e fora da Escola.
Veremos nos próximos capítulos, como o texto literário se estrutura e organiza no
livro didático para ser lido e compreendido. E mais. Que tipo de leitor se produz nesse modo
de organização? Quais os efeitos de sentidos desse funcionamento?
22
CAPÍTULO 2
Um ca minho de leitura e interpretação
Como estamos tratando de texto literário na Escola, logo, de leitura na Escola,
precisávamos de um referencial teórico e de procedimentos metodológicos de descrição e
análise de dados focados na questão mesmo da “leitura”, ou seja, precisávamos de um
dispositivo que nos permitisse aproximar do texto de forma menos ingênua face à
complexidade do que ali está presente. Não se tratava de um mero decifrar ou decodificar de
um somatório de palavras, frases e palavras, mas de ler o modo como o texto literário se
estrutura e organiza no livro didático para ser lido e compreendido pelo professor e pelo
aluno.
E mais, precisávamos de um dispositivo que nos ajudasse a formular perguntas
pertinentes nesse ir e vir entre o conhecimento já produzido sobre o tema e os dados que
tínhamos para descrever e analisar. Que tipo de leitor se produz nesse modo de organização
próprio do livro didático? Não se tratava, portanto, apenas de questão de conteúdo, mas da
forma pela qual um manual se estrutura, quer dizer, seleciona, distribui, propõe atividades:
trabalha o texto literário. Que relação há entre a forma do livro didático e o que o leitor
irá/poderá ler? Até que ponto essa organização e esse funcionamento irão fechar – ou abrir as possibilidades de leitura de um texto literário, que se caracteriza por ser eminentemente um
espaço de múltiplas interpretações?
Nesse sentido, nos dispusemos a trabalhar com a Análise do Discurso – AD, fundada
nos trabalhos de Michel Pêcheux, na França, na década de 1960. Ela é uma teoria e um
instrumento de análise e, como toda teoria, possui um objeto de estudo, no caso, o discurso, e
um corpo de conceitos e uma forma de constituir e descrever-analisar um corpus. Dentre os
seus conceitos, tendo em vista o nosso trabalho e o tempo disponível, selecionamos os de
língua, de texto, de formação imaginária, de condições de produção e de sujeito, que iremos
explicitar e discutir neste capítulo. Os conceitos são fundamentais para que possamos
compreender o funcionamento do livro didático, objeto de análise no Capítulo que se segue.
Sabemos que o termo “discurso” é muito comum atualmente em diferentes textos que
tratam das políticas de língua, como os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e das
práticas pedagógicas. É preciso, portanto, definir o que é “discurso” trata a AD. Quase
23
sempre, a noção de discurso remete à noção de informação, mensagem e, também, à noção de
fala em oposição à língua. Dizemos mesmo “o meu discurso”, “o discurso de fulano”.
Esse conceito não é o proposto pela AD. Para a AD, a linguagem não é transparente, o
sentido não está colado às palavras, o sujeito não controla tudo o que fala, e não há apenas
troca de informação na relação entre os interlocutores. Para Pêcheux (1990), desde sua
primeira proposta em 1969, o discurso é efeito de sentidos entre interlocutores. Em
conformidade com Orlandi (2005), “Quando digo que o discurso é efeito de sentidos entre
locutores, estou assim pensando o efeito produzido pela inscrição da língua na história, regida
pelo mecanismo ideológico”. (p. 63).
Portanto, o discurso é entendido como um objeto histórico que se manifesta
materialmente por meio da língua. Sendo assim, no discurso se cruzam e se determinam
língua e história, e os elementos externos – situação, contexto, sujeito, história – não são
vistos como estando fora da língua, mas, sim, ali, materializados. E essa exterioridade –
interlocutores, situação empírica e contexto sócio-histórico - constitui as “condições de
produção” do discurso, e os seus possíveis sentidos.
Segundo Silva (2002), “A AD lida com um objeto específico: o discurso, um objeto da
ordem da linguagem que se constitui na materialidade lingüística que, por sua vez, é referida a
diferentes ordens: a da língua, a do político, a do histórico”. (p. 19). Vê-se que a língua não é
somente um sistema de signos lingüísticos enquanto uma construção acabada, mas também
um objeto histórico (como a Literatura, conforme vimos no Capítulo anterior), não só porque
com o passar do tempo ela sofre transformações, mas porque em cada momento histórico
(sincronia) a história está presente, marcando a língua em termos de estruturação e
funcionamento.
Logo, nota-se que tanto a língua quanto o discurso não são resultados apenas de
expressão individual e, sim, construções sociais. A língua, para a AD não é um sistema com
autonomia completa em relação a sua exterioridade, mas com autonomia relativa, porque
afetada pela história. A língua independe, assim como o discurso, da vontade individual do
falante, porque ninguém inventa um discurso ou uma língua sozinho.
Vale lembrar que, desde quando nascemos e nos tornamos falantes de uma língua, essa
língua já esta estruturada e funcionando de determinada forma e o mundo e o homem
significando dentro de uma determinada sociedade. Por isso falamos, antes, em herança de
representações e de sentidos sobre a Literatura e, por isso, falamos que naquilo que dizemos já
tem interpretação, as palavras já estão significando em determinada direção.
24
Já que estamos falando em discurso, vamos, então, tratar de um discurso específico
que diz respeito ao nosso trabalho: o Discurso Pedagógico - DP. Conforme Orlandi (1987),
este tipo de discurso reproduz a(s) ideologia(s) – sentidos estabilizados - dos grupos
dominantes de uma determinada sociedade.
O DP é tomado, no entanto, como um discurso neutro que apenas transmite
informação. Porém, de acordo com a mesma autora, ele não é neutro, nem só transmite
informações, porque há uma repressão da polissemia, ou seja, a Escola propõe que o aluno
apreenda apenas um único sentido no(s) texto(s) das diferentes atividades que ali se
desenvolvem, como as propostas pelo livro didático. Assim, os sentidos do DP se pretendem
únicos. E o funcionamento do DP acaba escondendo o referente, no caso, o texto literário
enquanto objeto essencialmente polissêmico e histórico.
De certo, o Discurso Pedagógico autoritário, ainda é regra e domina em quase todos os
níveis da Escola, e entra triunfante em grande parte das Universidades. O arcabouço do
sistema permanece: o professor é o profissional que sabe mais e é pago para transferir aos
alunos a sua sabedoria; logo, o aluno sabe menos, cabendo a ele, receber um conteúdo
transbordante de conhecimento.
Nota-se que a autoridade do professor está acima de tudo, reproduzindo na Escola,
sistemas mais amplos de autoritarismo. Logo, o professor também está submetido a esse
modo de se relacionar com o conhecimento. Não se trata, portanto, de uma simples batalha
entre dominadores e dominados. Os alunos moldados, desde as séries iniciais nesse sistema,
mesmo identificando-o, têm dificuldades para romper com ele, pois, se existir espaço para a
criação, emergem bloqueios.
Agora, passo a tratar de outro conceito relevante para este TCC, o de “texto”, com
uma afirmação de Orlandi (2005), lembrando que para a AD ele é, também, sua unidade de
análise.
“Para o leitor, é a unidade empírica que ele tem diante de si, feita de som, letra, imagem.
(...). O texto não mais será uma unidade fechada nela mesma. Ele vai-se abrir, enquanto
objeto simbólico, para as diferentes possibilidades de leitura”. (p. 64).
Por conseguinte, é o texto que materializa os discursos, abrange o horizonte social,
integrando, assim, diferentes formações ideológicas e outras formas de linguagem. Um texto é
uma unidade bastante complexa, por isso, não é possível atribuir-lhe uma simples
significação. Segundo Orlandi (1996), o texto é “definido pragmaticamente como a unidade
complexa de significação, consideradas as condições de sua produção. O texto é considerado
um processo de interação entre sujeitos”. (p. 21).
25
Assim, o texto, na Análise do Discurso, ultrapassa a noção de informação porque não
é ele que determina a leitura (mesmo com todas as pistas que oferece) e, sim, as posições de
sujeito definidas por contextos sócio-históricos. Uma posição de leitor determinada por uma
formação discursiva construída por um domínio de conhecimentos que considera a obra
literária como resultante da intenção de um autor empírico, certamente irá ler de determinada
maneira um romance, uma poesia.
Ou então, uma posição de sujeito-leitor marcada por determinadas representações de
leitura, de poesia, de conto etc. Se, como dissemos, a leitura é produzida pelo leitor e suas
histórias de leitura têm importância fundamental, bem como a história de leitura do próprio
texto, não fica difícil entender o que estamos dizendo.
“No modo como penso a Análise do Discurso, esta, ao tomar em consideração o texto
como forma material, manifestação concreta do discurso, torna possível a análise de seu
funcionamento.”, diz Orlandi (1996, p.78). Como podemos perceber a Análise do Discurso
não descreve a função, mas o funcionamento (SAUSSURE, 1974), já que considera o
discurso como parte de um mecanismo de funcionamento geral, correspondendo a um certo
lugar no interior de uma certa formação social.
Esse funcionamento refere-se à estruturação de um discurso por um falante
determinado, para um interlocutor determinado e com finalidades específicas. “O objetivo da
análise de discurso é descrever o funcionamento do texto. Em outras palavras, sua finalidade é
explicitar como um texto produz sentido”. (ORLANDI, 2005, p. 23).
Os contextos sócio-históricos, ou seja, as formações ideológicas, que são o conjunto
de valores, crenças e hábitos pertencentes a um determinado grupo social, geram as formações
discursivas, as quais determinam o que pode e o que deve ser dito pelo sujeito de uma
determinada posição. O que podemos e devemos dizer do lugar de professor, de aluno, de
diretor, de esposa, de mãe etc.
O sujeito pensa ter o domínio sobre o que diz (ilusão subjetiva), mas na verdade, o
discurso do sujeito é determinado por contextos sócio-históricos que para ele produzem uma
posição e sentido(s). Há, pois, uma relação tensa entre a singularidade do sujeito e a posição
de que fala-ouve, lê-escreve.
Pode-se dizer que ao longo dos tempos, o homem, em sociedade, foi constituindo
determinados padrões ideológicos ou padrões de "pensamento", que estabelecem o modo de
ver e dizer o mundo. A relação que se estabelece entre os interlocutores e entre estes e o
referente – do que se fala – se dá através de formações imaginárias, que ajudam a construir
um imaginário de sentidos estabilizados, “evidentes”, os quais determinam a chamada visão
26
de mundo do sujeito e parecem “naturais”, transparentes. Porém, são efeitos ideológicos,
sentidos de determinados grupos que se tornam gerais, universais, evidentes.
A (des-)construção desses sentidos “evidentes” é uma tarefa bastante complexa, pois,
essas formações imaginárias que estão em jogo no processo de interlocução, de interação, no
nosso caso, do que seja Literatura, são históricas e vêm passando de geração em geração.
Conforme Orlandi (1997), “o que podemos dizer é apenas que todo processo discursivo supõe
a existência dessas formações imaginárias”. (p. 83).
Pêcheux, em sua primeira proposta de AD, em 1969 (1990), partindo do esquema de
comunicação, como trabalhado por Jakobson, repensa os elementos desse esquema à luz dos
fundamentos da Análise de Discurso, conceitua o discurso, fala das condições de produção e
trata dessas formações imaginárias presentes em todo processo discursivo, através de um
Quadro, que reproduzimos a seguir.
Quadro I
Neste Quadro, Pêcheux está tratando das formações imaginárias em relação aos
interlocutores, no nosso caso, do autor e do leitor do livro didático, e mostrando como o que
está ali representado não é o indivíduo empírico, mas o lugar que A e B se atribuem a cada
um e a si mesmo, e que fazem parte das condições do discurso. Assim, o lugar que o professor
e o aluno atribuem a cada um (aluno pobre, por exemplo, não sabe lidar com texto complexo
como o literário) e a si mesmo faz parte das condições de produção do Discurso Pedagógico,
do qual o livro didático faz parte.
27
De acordo com Orlandi (1999 e 1996), apoiada nesta proposta de Pêcheux, “o discurso
é o lugar das representações sociais, isto é, efeitos de sentidos entre interlocutores”, que se
produzem em condições específicas envolvendo os próprios interlocutores, a situação de
produção, o contexto sócio-histórico, aí constituindo a significação discursiva.
Portanto, as condições de produção, fazem parte dos efeitos de sentidos, da
significação discursiva. Esta depende dos interlocutores (eu/tu), no caso do livro didático
analisado no Capítulo 3, do editor, do distribuidor, dos livreiros; da situação de produção, ou
seja, do aqui-e-agora, que são, por exemplo, as teorias, as políticas pedagógicas (PCN); do
contexto sócio-histórico mais amplo, ou seja, das diferentes discursividades, como o discurso
da literatura, da língua, do livro didático, construídos ao longo da história.
“O sujeito, na análise do discurso, é posição entre outras, subjetivando-se na medida
mesmo em que se projeta de sua situação (lugar) no mundo para sua posição no discurso.
Essa projeção-material transforma a situação social (empírica) em posição-sujeito
(discursiva). Vale lembrar que sujeito e sentido se constituem ao mesmo tempo, na
articulação da língua com a história, em que entram o imaginário e a ideologia”.
(ORLANDI, 2005, p. 99).
Em outras palavras, o sujeito na AD não é o indivíduo empírico e, sim, o lugar social
de fala. Esses lugares estão representados por meio de determinadas posições (posiçãosujeito), as quais se manifestam no discurso através da forma textual. As formações
imaginárias produzem a imagem que um indivíduo pode/deve ocupar em um determinado
discurso, ou seja, a imagem que o indivíduo faz da posição que ocupa, da posição do outro e
do referente do discurso. No que diz respeito às formações imaginárias, Orlandi (1996)
assevera que:
“Em termos do que denominamos ‘formações imaginárias’ em análise do discurso, tratase aqui do leitor imaginário, aquele que o autor imagina (destina) para seu texto e para
quem ele se dirige. Tanto pode ser um ‘cúmplice’ (sujeito que apenas reproduz o sentido)
quanto seu ‘adversário’ (sujeito que atribui outros sentidos)”. ( p. 9).
Pêcheux estende essa noção de formação imaginária também ao “referente” da
comunicação, aquilo de que se fala, porque ele também pertence às condições de produção do
discurso, elaborando também um Quadro, que apresentamos a seguir. Isso nos ajudou a
pensar no nosso referente – o texto literário -, ou seja, no modo como em que ele é visto pelos
interlocutores do livro didático.
28
Quadro II
Orlandi (1983) afirma que o discurso explicita o modo de existência da linguagem que
é social. Logo, os processos que a constituem são histórico-sociais. Para essa autora, existem
dois processos na produção da linguagem: no primeiro, o sujeito reproduz o(s) sentido(s)
estabilizado(s), sedimentado(s) por diferentes meios, como o dicionário, a gramática, a escola,
a crítica literária etc. (processo parafrástico); no segundo, o sujeito atribui outro(s) sentido(s)
ao texto (processo polissêmico). Eles são considerados a tensão básica do discurso, tensão
entre o texto e o contexto histórico-social.
Nota-se, portanto, de um lado o estabilizado (o ideológico), ou seja, o processo
parafrástico; de outro, a multiplicidade de sentidos (o diferente), ou seja, o processo
polissêmico. Segundo Orlandi (1996), “O leitor não apreende meramente um sentido que está
lá; o leitor atribui sentidos ao texto. Ou seja: considera-se que a leitura é produzida e se
procura determinar o processo e as condições de sua produção”. (p. 37). Deve-se levar em
conta nesse processo dois aspectos: a história da leitura do leitor e a história da leitura do
texto, reafirmando o dito por Chartier (1997).
“A leitura é produzida em condições determinadas, ou seja, em um contexto sóciohistórico que deve ser levado em conta. (...) Leituras que são possíveis, para um mesmo
texto, em certas épocas não o foram em outras e leituras que não são possíveis hoje o
serão no futuro”. (p. 86).
Os sentidos não estão apenas no que pode ser lido no texto, ou seja, o sentido pode
estar implícito, no dito não está tudo, pois a linguagem não é transparente e o sujeito não
controla plenamente o que diz-ouve, lê-escreve. Além do fato, que não se pode dizer tudo
sobre algo. Acerca desse assunto, Orlandi (1996) assevera que:
“Quando se lê, considera-se não apenas o que está dito, mas também o que está implícito:
aquilo que não está dito e que também está significando. E o que não está dito pode ser de
várias naturezas: o que não está dito, mas que de certa forma, sustenta o que está dito; o
29
que está suposto para que se entenda o que está dito; aquilo a que o que está dito se opõe;
outras maneiras diferentes de se dizer o que disse e que significa com nuances distintas,
etc”. (p. 11).
Além disso, Orlandi (1996) também critica a leitura meramente decodificadora, que
não leva em consideração o universo do sujeito leitor e sua experiência de vida ou, ainda, seu
conhecimento prévio de leitura. Ela enfoca duas questões relevantes: 1° de que na formação
do sujeito-leitor, a escola exclui a relação do aluno com a linguagem não-verbal e o ato de ler
fora do ambiente escolar; 2º de que a escola supõe e ao mesmo tempo rejeita e desqualifica o
conhecimento prévio do aluno como leitor. Portanto, não reconhece a existência da história de
leitura do leitor, criando, assim, uma imagem negativa do mesmo.
Essa imagem, essa posição de sujeito-aluno é histórica, assim como a do professor.
Logo, o professor é visto como autoridade detentora do saber e o estudante como estando no
grau zero; assim como o texto é tomado como mero objeto da aprendizagem, um conteúdo.
30
CAPÍT UL O 3
O tex to e o texto literá rio na escola
O nosso objeto de estudo é o texto literário na Escola. E buscamos compreender como
o Discurso Pedagógico funciona no livro didático, produzindo determinados efeitos de sentido
que irão contribuir para produzir e reproduzir determinadas representações de literatura, de
texto literário, de leitura literária, com suas conseqüências, para o professor e o aluno, logo
para a qualidade do ensino ministrado nas escolas do Ensino Fundamental.
A Análise de Discurso –AD - é uma teoria e um instrumento de leitura, descrição,
análise e compreensão de textos. Para tanto, ela dispõe de conceitos próprios, dos quais
falamos no Capítulo anterior e que iremos utilizar para a descrição e análise dos dados.
Quanto aos chamados procedimentos, à metodologia de descrição e análise, não temos em AD
algo previamente pronto. O dispositivo analítico constrói-se junto com a compreensão do
tema (Capítulo 1) e do referencial teórico (Capítulo 2), a formulação de questões e do
objetivo, e a escolha do que irá se constituir em dados de análise, que chamamos corpus.
Desde o início, tínhamos interesse no livro didático, por motivos já expostos na
Introdução. Mas, precisávamos fazer escolhas e recortes neste instrumento didático tão amplo.
E assim fizemos. Escolhemos como nosso corpus o livro didático “PORTUGUÊS:
Linguagens”, de William Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães, da Editora Atual,
edição de 2004.
Tal manual didático foi escolhido pelo fato de ser o mais utilizado na rede de ensino
público do Gama, Cidade Satélite do Distrito Federal, entre outras cidades, segundo
informações obtidas no Centro de Ensino Fundamental n° 08, local onde cumpri o Estágio
Supervisionado II do Curso de Letras. Esse trabalho de observação e de regência, feito na
referida escola, me influenciou bastante na escolha do tema desse Trabalho de Conclusão de
Curso - TCC. Optei pela 8ª série porque de certo modo, atribui-se a esta série uma maior
responsabilidade com relação à Literatura, pois, é nela que o aluno deveria adquirir um maior
embasamento literário para ingressar no Ensino Médio.
Os primeiros contatos com esse Manual e o estranhamento que a organização e o
tratamento dos textos ali contidos nos provocaram, levaram-nos a fazer algumas entrevistas
com professores, poucas, considerando o tempo disponível para este TCC, como forma de
estabelecer um outro espaço de interlocução, além do livro didático, e avançar na reflexão e
31
compreensão do tema. Assim, também utilizaremos como dados de pesquisa, essas entrevistas
realizadas com quatro professores da 8ª série do Ensino Fundamental, de escolas públicas do
Gama/DF. (Ver Anexo 1)
Esse estranhamento a que nos referimos acima foi muito importante, pois serviu como
elemento de desestabilização e, ao mesmo tempo, de estímulo para o desenvolvimento deste
TCC e para compreensão da atividade de pesquisa. De desestabilização em relação a sentidos
já estabelecidos em relação ao livro didático, ao texto literário, e de estímulo para a leitura de
textos sobre o tema e sobre o referencial teórico e metodológico. Gostaríamos, assim, de fazer
uma breve narrativa sobre o fato.
Uma das primeiras atividades propostas pela Orientadora foi a de fazer uma
“descrição” minuciosa do livro, partindo da capa e indo até a primeira Unidade, após algumas
leituras, reflexões e discussões sobre o tema proposto. Assim o fizemos, concluindo de saída
que o livro tinha poucos textos literários, pois ao fazer a descrição da primeira Unidade,
registramos que o texto da Lya Luft era o “primeiro” e “único” texto literário que ali aparecia.
Fui, então, interpelada sobre a natureza do texto de Ignácio de Loyola Brandão e de Carlos
Queiroz Telles, me senti muito desconfortável com aquela situação e me perguntava, sem
cessar, como não havia “visto” que eram textos literários.
Esse “não ver” nos provocou em duas direções: a de compreender que havia uma
forma de estruturação e funcionamento do livro didático que produzia esse “efeito-leitor”, e a
de ouvir outras pessoas para certificar-me de que a “cegueira” era algo mais complexo do que
falta de óculos. Daí veio o interesse em ouvir outras pessoas, e fizemos duas entrevistas, com
uma professora (Professor 1) e um professor (Professor 2), que lecionam no Centro de Ensino
Fundamental 08 do Gama/DF, as quais foram incorporadas ao corpus. Posteriormente,
realizamos mais duas entrevistas, também com um professor (Professor 3) e uma professora
(Professor 4), que lecionam no Centro de Ensino Fundamental 11 do Gama/DF, para
refletirmos sobre a questão da crônica e do conto, que julgamos importante, considerando o
que estava sendo analisado no Capítulo 1 da Unidade 1.
Iniciando nosso trabalho de descrição e análise do livro didático de Cereja e
Magalhães, gostaríamos de dizer que, sempre que necessário, iremos trazendo também as
falas das entrevistas mencionadas e esclarecendo esse deslocamento inicial. Ressaltamos,
ainda, que a significação do livro resulta da utilização da linguagem verbal e da linguagem
não-verbal e da relação que entre elas se estabelece. Vamos nos deter, contudo, dados os
limites deste TCC, na estrutura e funcionamento da linguagem verbal.
32
Vejamos o nome que é dado ao livro, o qual aparece logo na capa, pois, é a partir dele
que se pode começar a compreender a noção de ensino de língua e de literatura que ali se
pretende desenvolver. A capa é a “porta de entrada” para despertar a atenção do leitor, no
caso, tanto o professor como o aluno. Nomear algo trata da relação da linguagem com as
coisas, com o mundo, como algo próprio das relações de linguagem, como algo referente ao
simbólico. O livro se intitula “PORTUGUÊS: Linguagens”.
O que podem significar esses dois pontos? Segundo Cunha (1975), os dois pontos
servem para anunciar uma citação, uma enumeração explicativa, um esclarecimento. O que
estariam neste contexto, os dois pontos anunciando, explicando ou esclarecendo? E a respeito
de quê? Da Língua Portuguesa ou da disciplina Português?
Algumas imagens presentes, na capa, podem nos ajudar a compreender esses dois
pontos. Aparecem diferentes situações de comunicação em que se usa a linguagem verbal –
pessoas conversando, trocando informações, escrevendo um texto –, e a linguagem não-verbal
– música, gestos, símbolos. Observamos aí que o livro como começa a delimitar essas
linguagens, restringindo-as a tipos de interações mais comuns, consideradas como sendo de
comunicação.
A referência à Literatura se faz por uma charge de Luís Fernando Veríssimo que, a
julgar por nós, não é conhecido por todo e qualquer professor e estudante. Ali, ele aparece,
reproduzindo o que parece ser a profissão de um escritor: uma máquina de escrever e alguns
livros encadernados.
Aparece, ainda, um selo do Ministério da Educação, indicando que o livro foi
analisado e aprovado pelo Estado, o que contribui para a sua legitimação e adoção, logo, para
sua venda e consumo. Um outro selo aparece na capa em que se diz que se trata de um “livro
não consumível”, o que indica que existem livros consumíveis. No caso, sabemos que se
refere ao fato de que o livro deverá ser utilizado por outros alunos, o que irá aparecer no verso
da capa, nas palavras dirigidas ao aluno. Para as escolas públicas, livros não consumíveis;
para as de elite, livros consumíveis. Vejamos abaixo a capa do referido livro didático.
33
Poderíamos, ainda, dizer que a “porta de entrada” nos diz que iremos ler um livro que
está em conformidade com as teorias mais modernas e com as políticas públicas de ensino da
língua3 que falam em linguagens, em multiplicidade.
Continuemos observando a estrutura e funcionamento desta “porta de entrada”,
descrevendo e analisando a primeira página do livro, em que as condições de produção do
produto “livro didático” vão continuando a se mostrar. Ali encontramos um breve curriculum
dos autores da obra. William Roberto CEREJA é graduado em Português e Lingüística,
licenciado em Português pela USP; mestre em Teoria Literária pela USP; doutorado em
Lingüística Aplicada e Análise do discurso na PUC/SP; professor da rede particular de ensino
em São Paulo, Capital. Já Thereza Cochar MAGALHÃES é professora graduada em
3
. Os Parâmetros Curriculares para o Ensino Médio relativos a nossa área, denominam-se “Linguagens, Códigos
e suas Tecnologias”, 2006.
34
Português e francês; mestre em estudos literários pela UNESP de Araraquara, SP; professora
da rede pública de ensino em Araraquara, SP. Além disso, são mencionadas outras obras
publicadas por eles, voltadas para o Ensino Fundamental e Médio.
Todas essas informações acerca da formação acadêmica dos autores contribuem para
que o leitor se antecipe na sua avaliação (boa) do livro didático. A menção dos títulos –
mestre, doutor – e das universidades em que estudaram – instituições de prestígio nacional –
contribuem para produzir a legitimação, referendar uma possível qualidade do livro. Ajudam
a construir um sentido positivo. Além disso, nesta página, encontramos que se trata já de uma
edição revista e atualizada, que está na 7ª reimpressão, em 2004. O livro está tendo, pois, boa
aceitação entre professores.
Estamos, aí, no campo das representações, do que chamamos em AD, conforme
dissemos no Capítulo anterior, de formações imaginárias. Em outras palavras, não está dito
explicitamente que o livro é bom, mas a representação do não-dito está significando no
imaginário de quem lê. Está funcionando aí uma imagem do leitor para qual o livro se destina,
em que se estabelece uma relação entre boa formação acadêmica e científica e qualidade da
obra, o que, conseqüentemente, fará com que o leitor (re)conheça o livro como sendo de boa
qualidade e devendo ser adotado.
Avancemos em nossa descrição e análise, observando, agora, a estrutura e
funcionamento global do livro de Cereja e Magalhães, manifesta no Sumário, que está
disposto em quatro Unidades que se subdividem, cada uma delas, em três Capítulos. As
quatro unidades temáticas do livro possuem basicamente a mesma estrutura. Cada uma trata
de assuntos específicos, os quais, parecem não possuir relação com o tema da unidade
anterior. Dizemos parece, porque precisaríamos de mais tempo para uma afirmação
generalizante, para apresentação de resultados de análise conclusivos. Elas estão assim
dispostas:
Unidade 1 – JUVENTUDE
Unidade 2 – VALORES
Unidade 3 – AMOR
Unidade 4 – SÉCULO XXI
Decidimos fazer um recorte de análise, considerando o tempo que dispúnhamos para a
realização deste TCC, que incidiu sobre o Capítulo 1 da Unidade 1, por onde começáramos e
que nos causara aquele estranhamento inicial, observando o modo de dispor, organizar,
trabalhar os textos literários. A Análise do Discurso não trabalha com a distribuição
35
segmental, mas com recortes, que são as unidades discursivas a serem analisadas e
compreendidas.
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Sabemos que não teremos resultados sobre o livro passíveis de serem generalizados,
mas mesmo assim consideramos importante a realização dessa análise em termos acadêmicos
e científicos. Embora os resultados não sejam conclusivos, teremos aprendido como caminhar
de forma a se obter uma análise mais consistente sobre o texto literário.
Apresentaremos, inicialmente, um Quadro Geral com o 1º Capítulo de cada uma das
quatro Unidades para que o leitor possa observar como eles se organizam, as partes que se
mantêm fixas e aquelas que são, diríamos, móveis. No Anexo 2, estão os Quadros com os
outros capítulos das outras unidades para posterior descrição e análise.
Podemos observar que se mantém aquela antiga estrutura dos livros didáticos, ou seja,
uma divisão em Texto, Estudo do Texto, Produção de Texto e Gramática. A novidade estaria,
a grosso modo, na seção “Divirta-se”, significando, pelo não-dito, que não há diversão,
prazer, em ler e escrever, em adquirir conhecimento sobre a língua. No Capítulo 1 da Unidade
3, há uma seção que não aparece nas outras, denominada: “Lendo textos do cotidiano: o
folheto”.
A fragmentação do trabalho de leitura e produção de texto também se mantém no
livro. O Estudo do Texto se divide em Compreensão e interpretação, A linguagem do texto,
Cruzando linguagens e Trocando idéias. O trabalho de escrita se fragmenta em dois:
Produção de texto e Para escrever com..., parecendo que é possível produzir um texto que
não seja adequado, expressivo, coerente e/ou coeso. Ou ainda, que o “adequado” não é
“expressivo”, não é “coerente e coeso”. Temos, aí, pois uma concepção de linguagem, de
leitura e de escrita como algo que pode ser cortado, analisado separadamente; algo
plenamente controlável pelo autor e pelo leitor. Uma indicação do predomínio do processo
parafrástico.
Quanto à língua, aparece separada do Estudo do Texto e da Produção de Texto, e as
subdivisões indicam que estamos falando mesmo é de “gramática” e da dita Gramática
Tradicional. O nome fala em “A língua em foco”. Que foco seria este? O mesmo de sempre?
Interessante, ainda, como essas divisões parecem reforçar certo imaginário, pois “Para
escrever com expressividade” está na Unidade 3, intitulada AMOR e subdividida em noções
mais utilizadas no tratamento de poemas - versificação, verso e estrofe, métrica, rima, ritmo -,
ignorando, assim, a expressividade da prosa literária. Além disso, no Estudo do texto, também
aparece a Leitura expressiva. Para escrever sobre “Juventude”, “Valores” e “Século XXI”,
não se precisa de “expressividade”? E como tratar o texto literário sem expressividade?
Mas, vamos nos deter, agora, no Capítulo 1, da primeira Unidade, dedicada à
JUVENTUDE. Os autores introduzem a Unidade 1 do livro com um poema intitulado
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“Estação primavera”, de Carlos Queiroz Telles, sem nenhuma atividade para ser
desenvolvida. Parece estar ali como uma epígrafe, ou quem sabe, como um “enfeite”, como
palavras e imagens bonitas, algo bem próprio do ambiente escolar. Este foi o primeiro texto
literário que inicialmente não “víramos” como tal ao iniciarmos a descrição. Tomá-lo como
enfeite seria uma forma, na verdade, de não tratá-lo como literário, muito embora estivesse
valorizando-o, colocando-o como abertura de toda a Unidade?
Este parece que tem sido um funcionamento do Discurso Pedagógico da e sobre a
Literatura: valorizar o texto literário como algo “belo”, mas que não faz parte do principal da
aula de Português. Belo mas não útil para se aprender Português. Começamos a nos dar conta
de que a questão a que nos propuséramos analisar e compreender era bem mais complexa, ou
melhor, estava sempre a nos pôr novos questionamentos, o que não invalidava este trabalho
inicial.
Além disso, pode-se dizer que pelo fato de o autor ser desconhecido do grande
público, o poema seja ocultado, ou melhor, quase não seja notado por quem abre o livro e
inicia sua leitura? Em conformidade com Lajolo (1997), “Certos livros são muito conhecidos.
Estão à venda em qualquer livraria, todos conhecem o nome de quem os escreveu”. (p. 11).
Pode ser por isso que o poema de um autor desconhecido passou/passa, quase, sem ser
notado.
De acordo com a Análise do Discurso, já está no imaginário do leitor, que é
sobredeterminado, a possibilidade de distinguir o que é do que não é Literatura. A partir de
determinados conceitos criam-se representações imaginárias que determinam o que pode e o
que deve ser dito (visto) pelo sujeito.
Podemos perceber essa representação presente no imaginário do sujeito em uma das
entrevistas feitas com professores do Ensino Fundamental. Vejamos o que o Professor 2 disse
a respeito do poema de Carlos Queiroz, que introduz a literatura no livro do Cereja e da
Magalhães:
“O poema é bem interessante, mas considero que poderiam ter escolhido outro, com uma
linguagem mais jovem, ou melhor, não precisava de poema e sim de uma música bem
atual que falasse a respeito do jovem. Enfim, o poema é bonzinho, porém, o autor é
desconhecido, nunca ouvi falar nele, isso faz com que os alunos se desinteressem. Já
pensou se fosse um João Cabral de Melo Neto ou quem sabe Manuel Bandeira, são tantos
autores conhecido”. (grifos nossos)
No que diz respeito à distinção do que é linguagem literária e não literária, Lajolo
(1997) assevera que:
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“A linguagem parece tornar-se literária quando seu uso instaura um universo, um espaço
de interação de subjetividades (autor e leitor) que escapa ao imediatismo, à
predictibilidade e ao estereótipo das situações e usos da linguagem que configuram a vida
cotidiana”. (p. 38).
Com relação ao conceito de literatura do livro didático, novamente, faço uso de um
fragmento das entrevistas. Segundo outro entrevistado, “A literatura se refere principalmente
aos poemas, cuja linguagem é bem elaborada, emotiva. Tudo que não faz parte do mundo real
é literário, nos livros de ensino fundamental pouco se vê isso”. (Professor 1 – grifos nossos)
De acordo com as entrevistas, percebemos que muitos professores possuem uma
imagem de Literatura totalmente ligada a um modo de tratar o Romantismo que foi passando
e ainda se mantém, o que não significa que o Romantismo seja isso ou só isso. É comum
escutar coisas do tipo: “literatura é coisa para mulher, piegas, coisa de apaixonado, de pessoas
românticas”.
O gênero romântico era/é considerado coisa menor, não valorizado, muito embora
saibamos que o que se difundiu foi uma versão banalizada e simplificada deste gênero. Será
que é por este motivo que a Literatura passa sem ser notada no livro didático? Ou será que é
pela permanência de um modo de ver/sentir do Romantismo marcado pelo reducionismo? Até
que ponto o conservadorismo do Discurso Pedagógico não se cansa de reproduzir essa
representação tão antiga e com um embasamento teórico também ultrapassado? Ou quem sabe
o que está em questão é a própria noção de texto na Escola?
Prosseguindo com nossa análise, retornamos ao Quadro Global das Unidades e
Capítulos do livro de Cereja e Magalhães, construído a partir do Sumário, e destacamos
apenas o Capítulo 1 da primeira Unidade.
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UNIDADE 1
JUVENTUDE
O jovem, o sonho, a utopia
Texto: “O sim, o não, a felicidade”, de Ignácio de Loyola Brandão
Estudo do texto
→ Compreensão e interpretação
→ A linguagem do texto
→ Cruzando linguagens
→ Trocando idéias
Produção de texto
→ O conto
Para escrever com adequação
→ O discurso citado: o discurso indireto livre
A língua em foco
→ As orações subordinadas substantivas
→ Classificação das orações substantivas
→ Orações substantivas reduzidas
→ As orações substantivas na construção do texto
→ Linguagem e interação
Divirta-se
A primeira coisa que podemos observar é que há uma seção chamada “Texto” em que
aparece o título e o nome do autor, seguido de uma outra seção, a de “Estudo do texto” e, logo
depois, na “Produção de texto”, encontramos uma subdivisão não mais com um título de texto
e seu autor, mas um gênero literário: “O conto”. É como se o livro dissesse: “agora é hora de
literatura”. Parece haver, pois, uma separação entre o que é “texto” – algo para estudar,
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compreender, interpretar – e o que é “texto literário”, no caso do livro analisado, algo pra
provocar a “produção de texto”. Mas, vamos compreender isso melhor.
O primeiro texto trabalhado é “O não, o sim, a felicidade”, de Ignácio de Loyola
Brandão. Trata-se de uma crônica, de outro gênero literário, mas que não é nomeado como tal.
No “Estudo do texto”, os exercícios propostos não tratam o texto de Loyola (reconhecem,
nomeiam) como crônica, um gênero literário. Dessa forma, acabam contribuindo para que o
leitor – aluno e professor - pense (representações imaginárias) que a crônica é um texto
informativo e não um texto literário. De novo esse efeito de sentido: a separação entre texto
para leitura e estudo e literatura. Literatura não é texto e vice-versa?
As crônicas, em geral, possuem relação direta com fatos do cotidiano, mas o seu
elemento básico é a função poética e não a informação, como afirma Sá (1992): “O cronista
não fantasia sensações, registra-as usando os seus recursos estilísticos, mas sempre consciente
de que a crônica oscila entre o visto e o imaginado”. (p. 71). Por isso, existe uma certa
confusão entre crônica e texto jornalístico. Conforme Campos, citado por Sá (1992), no que se
refere à diferença entre o texto jornalístico e a crônica:
“A função do jornal é abrir uma janela para o mundo, transformando-nos em homens
públicos. Acontece, porém, que a preocupação básica do jornal é com a notícia, com o
fato em si, deixando em segundo plano as pessoas que participaram da cena. (...). A
função da crônica é aprofundar a notícia e deflagrar uma profunda visão das relações
entre o fato e as pessoas, entre cada um de nós e o mundo em que vivemos e morremos,
tornando a existência mais gratificante”. (p. 56).
O mesmo autor acrescenta:
“O cronista não se limita a descrever o objeto que tem diante de si, mas o examina,
penetra-o e o recria, buscando sua essência, pois o que interessa não é o real (...). É
preciso ir mais longe, romper as conceituações, buscar exatamente aquilo que caracteriza
a poesia: a imagem”. (...). Quando narramos apenas o que todos podem ver, ou quando
simplesmente fazemos referência a seres e objetos cuja existência é tão palpável que
qualquer pessoa pode comprová-la, torna-se impossível alcançar o plano da poesia”. (pp.
48-49).
No entanto, não é isso que observamos no material analisado: livro e entrevistas. Diz
um dos professores entrevistados: “A crônica é um tipo de texto literário, cuja leitura é bem
simples, pois, possui temas relacionados ao cotidiano e, por isso, não remetem à
complexidade da literatura clássica”. Teríamos, então, uma divisão entre o que literatura de
primeiro grau - a clássica –, e uma de segundo, a crônica, por exemplo. E o critério para essa
divisão seria uma suposta simplicidade da crônica. Suposta, pois de acordo com Sá (1992):
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“Todo texto literário pressupõe várias leituras, sendo que a primeira costuma ser bastante
superficial. Apenas para tomar conhecimento de que se trata num primeiro registro,
assumimos a posição de leitor ingênuo – e lemos sem esperar do ato de ler nada mais do
que o simples ato de ler. De acordo com a intensidade do texto repercutido em nós é que
faremos duas ou mais leituras, tantas quantas sentirmos necessidade e sempre sabendo
que as possibilidades são múltiplas, embora não sejam totalmente arbitrárias, Dentro
dessa liberdade de escolha dos caminhos, substituímos a ingenuidade pelo senso crítico –
e começamos a fazer a leitura propriamente dita. (...). A crônica – apesar de toda a sua
aparente simplicidade – só pode ser valorizada quando a lemos criticamente, descobrindo
a sua significação”. (p. 78-79).
Voltando ao livro de Cereja e Magalhães, podemos refletir sobre o subtítulo
“Compreensão e Interpretação”, tomando como referência as propostas de Orlandi (1996),
mencionadas no Capítulo 2, quando ela diz que na escola não é permitido compreender,
porque a partir do momento que o aluno compreende, ele se posiciona criticamente e com
isso, atribui outros sentidos ao texto, além dos que estão lá prontos. Desse modo, ele
desconstrói a ideologia que inibe a inovação, a crítica, ou em outras palavras, coloca em
disputa verdades, construindo um novo sentido a partir das suas histórias de leitura
juntamente com as histórias de leitura do texto.
Após o texto de Loyola, seguem-se palavras soltas consideradas de difícil
compreensão pelos autores, com seus respectivos significados, também descontextualizados,
prática comum dos livros didáticos no tratamento de questões lexicais e semânticas. E em
seguida, temos o Estudo do Texto, dividido em quatro seções.
Vejamos alguns exercícios que explicitam o que vem sendo dito sobre essa relação
entre texto para leitura e estudo (literário e/ou não-literário) e texto para estudar Literatura e
produção textual. Para tanto, vamos tomar os exercícios de Compreensão e interpretação.
Preferimos transcrevê-los na íntegra, mesmo sendo um pouco longo, para que o leitor possa
acompanhar nossa reflexão e análise de forma mais detalhada, e observar que, apesar das
aberturas que as questões propostas pelos autores trazem, alguns pontos parecem reforçar uma
leitura parafrástica.
1. O texto põe em discussão a mudança de atitudes e valores que ocorreu nas últimas
décadas, opondo duas gerações: a geração de quarenta anos atrás, quando o narrador era
jovem, e a geração dos jovens de hoje. Observe o título do texto. Qual é a geração do
“sim” e qual é a do “não”?
2. Nos primeiros parágrafos do texto, o autor descreve como era a educação familiar no
passado. Nos parágrafos seguintes, compara-a com a educação atual. Comente as
diferenças nas situações vividas pelos jovens quanto aos seguintes aspectos:
a) horário para voltar e acesso à casa após saídas à noite;
42
b) dinheiro dado pelos pais;
c) consumo de coisas proibidas, como o cigarro;
d) forma de tratar os pais;
e) uso de palavrões na linguagem.
3. Segundo o narrador, no passado o relacionamento entre pais e filhos era difícil e
autoritário, e o jovem tinha pouca liberdade. Apesar disso, o narrador, hoje, não vê apenas
o lado negativo daquele tipo de relacionamento. Releia estes trechos:
● “Totalitarismo? Em parte sim, em parte não.” (6º parágrafo)
● “Era ruim para nós? Era. Uma camisa-de-força, um cerco apertado constituído por nãos.
Era bom? Era.” (7º parágrafo)
De acordo com as idéias gerais do texto, explique:
a) Porque era ruim aquele tipo de educação familiar?
b) E por que era bom?
4. Muitas vezes, o não gerava a mentira e a hipocrisia.
a) Com que finalidade se mentia naquela época?
b) Nesse contexto, mentir era bom ou ruim?
5. Segundo o texto, os jovens de hoje sabem de muitas coisas e “perguntam para os pais e
professores coisas que fariam um jovem – não de 13, mas de 18 – ser expulso de casa no
nosso tempo (ao menos espera-se que não comentam erros infantis)”.
6. No penúltimo parágrafo, o narrador opõe as angústias dos jovens de antes às dos jovens
de hoje e afirma que, no passado, essas angústias eram mais bem definidas e concretas.
Por que o narrador vê as angústias dos jovens atuais como mais complexas que as dos
jovens do passado?
7. No mesmo parágrafo, o narrador afirma que o futuro era a grande preocupação dos
jovens: “Vão dar certo nossos sonhos? Era a grande pergunta, porque havia sonhos”.
a) Qual é o ponto de vista do narrador a respeito dos sonhos dos jovens atuais?
b) Em contraposição aos sonhos, alimentados pela geração de antes, qual é o projeto da
geração atual, segundo o narrador?
c) Comparada à geração atual, que qualidade o narrador vê nos jovens da sua geração?
8. Para o narrador, “confundiu-se liberdade com permissividade”. Qual é a diferença entre
elas?
9. Ao afirmar “O não que nos traumatizou, nos conduziu a dizer um sim complexo para
nossos filhos”, o narrador revela estar seguro ou inseguro quanto ao modo como os pais
de hoje têm educado os filhos?
10. O texto põe em discussão duas formas de educar os filhos e, em vez de apresentar
respostas na sua conclusão, termina com perguntas: “Uma geração teve o não. A outra
teve o sim. Somos felizes? Nossos filhos serão?”.
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a) O narrador deixa clara sua posição sobre qual melhor maneira de educar os jovens?
b) O fato de o texto ser encerrado com perguntas confirma ou nega sua resposta anterior?
c) Observe o título do texto. De acordo com as idéias gerais apresentadas pelo narrador,
que sentido ele tem? (pp. 16-17 – grifos nossos)
Em primeiro lugar, observamos que os autores só referem ao texto como “texto” e
nunca como “crônica”. Vê-se, retomando os comandos, que o leitor é levado, quase sempre, a
interpretar o texto de acordo com as opções dadas pelo livro, ou seja, a dar uma resposta
condicionada. Como estamos entendendo tal afirmativa?
Pode-se perceber nestes exercícios e, em quase todos da Unidade 1, ou melhor,
praticamente em todos os exercícios do livro, que se referem aos textos literários, dois
aspectos relevantes. O primeiro, diz respeito ao fato de que os autores trabalham o texto de
forma fragmentada, apagando o referente “texto literário”, como um objeto simbólico, social e
histórico. Seguindo um velho funcionamento dos livros didáticos, induz o aluno a acreditar
que há uma resposta (mesmo que aberta) e que ela está “localizada” em determinada parte do
texto (parágrafo tal, por exemplo). Vejam os nossos grifos. O texto parece que, assim, perde
sua unidade, sua identidade. Como disse Sá (1992):
“Quando narramos apenas o que todos podem ver, ou quando simplesmente fazemos
referência a seres e objetos cuja existência é tão palpável que qualquer pessoa pode
comprová-la, torna-se impossível alcançar o plano da poesia”. (pp. 48-49).
O segundo aspecto diz respeito a presença desse “narrador” que tudo sabe e tudo
pode, que controla os sentidos do texto: “segundo o narrador”, “para o narrador”, “de acordo
com as idéias gerais do texto”, excluindo a possibilidade de outra interpretação. E o livro
didático (seus autores?) sabe quais são os sentidos verdadeiros, corretos que o narrador, o
texto quis dar. Ler é “encontrar” esses sentidos. Mas, a leitura não é produzida pelo leitor?
Como são tratadas as próprias dúvidas e ambigüidades do narrador? O texto termina com uma
interrogação4.
Vale lembrar que “Toda leitura tem sua história. Todo leitor tem sua história de
leitura”. (Orlandi, 1996, p. 43). E, no caso do texto de Loyola, há uma defasagem entre o
autor e o leitor em relação a essas histórias: 40 anos de diferença. Zilberman (1991) também
nos dá elementos para essa reflexão ao afirmar que:
4
. Estamos aqui nos referindo ao modo como o livro didático trata a figura do “narrador”, como um sujeito
intencional, que tudo sabe e que controla a narrativa plenamente, diferentemente do modo como é tratado pelas
diferentes teorias literárias.
44
“O livro didático exclui a interpretação e, com isto, exila o leitor. Propondo-se como
auto-suficiente, simboliza uma autoridade em tudo contrária à natureza da obra de ficção
que, mesmo na sua autonomia, não sobrevive sem o diálogo que mantêm com seu
destinatário. (...) A interpretação se imobiliza em respostas fechadas, de escolha simples,
promovidas por fichas de leitura, sendo o resultado destas a anulação da experiência
pessoal e igualitária com o texto”. (p. 21).
E o professor em que posição fica face a esse narrador que encaminha e determina a
significação? De que geração ele estará mais próximo: da do autor ou da dos alunos?
Conforme vimos no Capítulo anterior, segundo Orlandi (1987), os conceitos no livro didático
se mostram como prontos e acabados e, desse modo, trabalham um conhecimento préfabricado. Com efeito, a escola estabelece o estatuto científico do saber, onde só é válido o
que está no livro (e não pode e nem deve ser contestado!). Logo, institui-se o conhecimento
denominado legítimo.
No caso deste livro didático, percebe-se que predomina o processo parafrástico e,
quando alguma atividade do livro dá espaço para outras interpretações ou trabalha com a
linguagem não-verbal, os professores não realizam tal atividade como constatamos por meio
das entrevistas.
“Os autores estão propondo muitas atividades de interação e isso é essencial para um
aluno de 8ª série. Os exercícios são legais, só não sei se estão adequados para alunos da
rede pública de ensino. O motivo é simples: eu como professora sei que é muito
complicado trabalhar inúmeras atividades dentro de sala de aula (imagine fora!). E esses
meninos, na maior parte do tempo, não querem fazer nada! Mas, enfim, nós tentamos
passar pelo menos metade do que é pedido pelo livro”. (Professor 1)
Nesse sentido, outra importante questão que vale a pena ser mencionada, é o fato de a
escola restringir a leitura ao seu caráter mais técnico ao pensar exclusivamente em soluções
pedagógicas para a leitura, o que acaba conforme Orlandi (1996), por desvincular a leitura de
seu caráter histórico mais amplo. Trata-se do reducionismo pedagógico analisado por esta
autora. De certo, podemos notar o reducionismo pedagógico no manual analisado porque os
autores propõem muitos exercícios, aparentemente intermináveis, que visam a um trabalho
imediato por parte do aluno. Ou em outras palavras, o objetivo parece ser manter os alunos
ocupados todo o tempo, fazendo todos os exercícios, o mais rápido possível.
Vê-se, portanto, que são excluídos os domínios lingüístico e social, que atestam a
história das relações com o conhecimento e como ele se dá na sociedade. Isso pode tornar a
aula de Língua Portuguesa pouco atrativa, causando nos alunos falta de interesse pela leitura.
É possível dizer que quando se trata de leitura literária, o leitor precisa de estímulo adequado,
isto é, a escola deve criar condições de produção efetivas para prática de leitura polissêmica.
45
A partir disso, pode-se supor que a interpretação é programada, condicionada, como
dissemos anteriormente. Conforme Paulino (2001), a leitura pouco a pouco transformou-se
em um ato individual e solitário. Porém, mesmo vista como uma prática individual, ela se
mantêm no âmbito social, pois, depende das condições sócio-históricas. Na verdade, a Escola
tenta impor (ou impõe mesmo?) regras para determinar o modo de leitura das pessoas e,
assim, determinar o sentido de um dado texto.
Seguindo a estruturação do livro de Cereja e Magalhães, chegamos finalmente ao texto
literário, reconhecido e tratado como tal. Na parte de “Produção de texto”, há um conto da
Lya Luft, “Ao apagar das luzes”, que é nomeado e trabalhado como literatura. Ele é muito
semelhante à crônica de Loyola porque fala de coisas relacionadas ao cotidiano. Além disso,
tem ação, personagens, narração, tempo. Vejamos o conto:
AO APAGAR DAS LUZES
“Ele tinha, sem nada avisar, sem combinação nenhuma, que naquela noite haveria o
grande desvendamento.
Ele ia-se revelar, pronunciar a dura verdade, abrir o peito, rasgar as vestes da postura
contida, e abrir as pernas e parir a si mesmo e suas verdades na cara dos demais.
Eram uma família normal, uma gente cotidiana, que trabalhava para pagar suas contas,
que transava comedidamente sem maior alegria, mantinha um tipo de fidelidade devida
antes ao cansaço e à resignação que à lealdade e ao amor.
Pais e filhos, uns casados, outros solteiros, reuniam-se cada domingo assim, para
atenderem ao desejo da mãe, à ordem do pai, e à sua própria resignação.
O pai era um homem normal, cumpridor metódico de seus deveres, prazeres poucos, e ao
cabo de tantos anos já não sabia direito o que eram os seus desejos, se tinha sonhos, se
tudo se fundia na realidade tediosa.
A mãe era uma dona de casa também comum, agora andava vendendo perfume para as
amigas e vizinhas do bairro – pois as coisas não andavam fáceis.
Os filhos, dois casados, duas solteiras, pouco se viam, desde pequenos mais envolvidos
com suas atividades e amizades, considerando a família uma espécie de mal necessário,
até que a deles não era a pior.
Pelo menos na superfície.
Por baixo as águas corriam escuras, turvas as emoções, raízes de mágoa enredavam-se
perturbando o florescer dos aguapés no alto.
Sentaram-se à mesa, depois de trocarem os cumprimentos habituais, as brincadeiras de
sempre, os elogios forçados:
- Cada vez mais jovem, mãe!
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- Pai, cad vez mais forte, heim?
- Filha você emagrece!
- Você foi elogiado pelo patrão filho?
Um clichê de família.
A comida de sempre, a empregada de sempre, os móveis de sempre, a vida de sempre.
Vontade de fugir, de sumir, estar em outra parte ou em parte nenhuma.
Dever, não afeto: costume, não desejo de partilhar; isolamento, não cumplicidade.
(Eram ao menos originais?)
A mãe sempre servia a todos da primeira vez, depois era cada um por si, a mãe brincava –
como sempre:
- Depois ataquem!
A comida igual, todo domingo era galinha e massa e maionese, sobremesa sorvete que
um deles era sempre encarregado de trazer.
Ao sabor da comida misturava-se o ressaibo dos rancores secretos crescendo como ervas
malignas cobrindo as almas. O pai me batia, minha mãe não me entendia, o meu filho
estava bêbado na sua formatura e eu me sacrifiquei tanto por ele, a mão enxotou meu
namorado por implicar demais com ele, nunca entendi o que minha filha afinal quer da
vida, a mãe sempre preferiu a outra, o pai é um medíocre, a mãe um atrasada.
(Não eram nada originais)
De repente, o filho mais moço, que ainda não estava resignado, que ainda esperava, que
ainda acreditava, ainda queria transformar aquele grupo de estranhos frios em família (ali
onde mesmo que não me entendam me amam), estendeu a mão e não era para o prato, era
para pedir atenção, era para desencadear um terremoto, era para transformar a vida:
- Gente, hoje eu tenho uma coisa para dizer.
Todos se calaram, as mãos pararam entre prato e boca, de repente estavam acordados,
aqueles olhares, interessados.
- Fala, rapaz, o que foi?
E quando ele ia se levantar largando o guardanapo sobre a mesa, e abrir a boca e o
coração e as entranhas da alma, e chamar e gritar: vivam, acordem, sejam vocês mesmos,
sejam gente, sejam humanos!!!!!!
- quando todos perceberam na raiz de seus corações que a partir desse momento algo ia
mudar, tinha de mudar...
... nesse momento as trevas baixaram sobre eles”.
(O Estado de São Paulo, 10/04/2002.)
47
Com relação aos gêneros narrativos curtos, em específico, o conto, de acordo com
Piglia (2004):
“O conto é um relato que encerra um relato secreto. Não se trata de um sentido oculto que
dependa de interpretação: o enigma não é outra coisa se não uma história contada de um
modo enigmático. A estratégia do relato é posta a serviço dessa narrativa cifrada (...). A
história secreta é contada cada vez de um modo mais elusivo (...). O mais importante
nunca se conta. A história é construída como o não-dito, com o subentendido e a alusão”.
(pp. 91-92).
E ainda acrescenta que:
“O conto é construído para revelar artificialmente algo que estava oculto. Reproduz a
busca sempre renovada de uma experiência única que nos permite ver, sob a superfície
opaca da vida, uma verdade secreta”. (p. 94).
Após o conto, é proposta uma atividade, como se fosse o “Estudo do conto”, mas que
não recebe nenhuma titulação. As questões estão intercaladas com “boxes” explicativos. Estes
destacam informações, conceitos sobre o conto, como por exemplo, estrutura do enredo,
desfecho, entre outros, mas de forma bastante superficial, como é superficial a forma como a
própria Literatura é tratada no livro. A impressão que se tem ao ler essas informações e
conceitos é que foram feitos para serem decorados, memorizados.
Podemos observar que diferentemente da crônica, os exercícios são voltados para o
que se considera “literatura”.
1. Como a crônica, o conto é um texto curto que pertence ao grupo dos gêneros narrativos
ficcionais. Caracteriza-se por ser condensado, isto é, por apresentar poucas personagens,
poucas ações e tempo e espaço reduzidos.
a) Quais são as personagens envolvidas nessa história?
b) Onde acontecem os fatos narrados?
c) Há, no conto, expressões que indicam o tempo em que se desenrolam as ações. Que
expressões são essas?
2. Do mesmo modo que a crônica, o conto pode ter tanto narrador-observador quanto
narrador-personagem. Que tipo de narrador o conto “Ao apagar as luzes” apresenta?
Justifique sua resposta.
3. Enquanto na crônica as personagens são, em geral, mostradas de forma superficial, no
conto elas apresentam maior profundidade, por receberem um tratamento que lhes confere
características psicológicas mais complexas.
48
a) O conto lido apresenta uma personagem coletiva. Qual é essa personagem e como é
caracterizada?
b) Caracterize psicologicamente o filho mais moço.
4. Nos gêneros narrativos, a seqüência de fatos que mantêm entre si uma relação de causa
e efeito constitui o enredo. Um dos mais importantes elementos que compõem o enredo é
o conflito. Leia o boxe lateral e, a seguir, identifique o conflito do conto “Ao apagar das
luzes”.
5. O enredo do conto tradicional estrutura-se com base nas seguintes partes: introdução,
complicação, clímax e desfecho. O conto moderno caracteriza-se por subverter essa
estrutura, podendo invertê-la, eliminar partes, fazer o desfecho coincidir como clímax, etc.
“Ao apagar das luzes” é um conto moderno, e seu enredo segue a estrutura tradicional.
Entretanto, é possível observar nele algumas daquelas partes. Identifique nesse conto o
clímax, isto é, o momento de maior tensão.
6. No desfecho do conto geralmente ocorre a solução do conflito ou uma revelação para a
personagem. A revelação acontece quando um fato ou uma situação muda o modo de
pensar ou agir da personagem, levando-a a romper com determinados valores, a questionar
seu modo de vida, etc.
a) No desfecho do conto lido ocorre a solução do conflito ou uma revelação? Justifique.
b) Considerando as características da família, dê uma explicação coerente às trevas que
“Baixaram sobre eles”.
7. Esse conto foi escrito por encomenda do jornal O Estado de São Paulo, que convidou
alguns escritores a abordarem de alguma maneira a escassez de energia elétrica ocorrida
no Brasil entre os anos de 2001 e 2002. Considerando esses dados, que outro sentido
ganha o desfecho do conto lido?
8. Enquanto a crônica busca seus assuntos no noticiário de jornais ou em situações do
cotidiano e é normalmente publicada em jornais e revistas, o conto tem como matéria a
ficção, ou seja, é fruto da imaginação inventiva de um autor e é publicado em livros.
Troque idéias com os colegas: apesar de o conto “Ao apagar das luzes” ter sido publicado
em um jornal, qual é o tipo de leitor que normalmente se interessa por contos?
9. Observe a linguagem do conto lido.
a) Que tipo de variedade lingüística foi empregada?
49
b) Que tempo verbal predomina?
10. Reúna-se com os colegas de grupo e concluam: Quais são as características do conto?
De certo, muitos leitores podem pensar que o conto é a parte introdutória da Literatura
no livro. Enganam-se como nós nos enganamos no princípio. Ficáramos apenas no dito,
supondo a transparência da linguagem e acreditando que o leitor pode dar qualquer sentido ao
que lê. Não sabíamos que determinada forma textual produz determinado efeito leitor.
Vê-se que o conto é reconhecido como literatura porque está escrito no livro que é um
conto, que faz parte do gênero narrativo. No caso da crônica não estava escrito
explicitamente. Podemos perceber esse fato na entrevista, quando a professora diz o seguinte:
“Os autores basicamente não trabalham com o texto literário. É por meio do conto de Lya
Luft que eles colocam o literário propriamente dito. Durante todo o Ensino Fundamental,
os alunos praticamente não estudam obras literárias, como Machado de Assis, José de
Alencar, entre outros. Isso fica reservado para o Ensino Médio. Aqui se vê mais textos e
exercícios do que literatura”. (Professor 1).
Mas, não nos esqueçamos de que o conto está ali para motivar, criar condições para a
“produção de texto”, para ensiná-lo a escrever um conto. E como isso é feito? Que relação é instaurada
entre autor-leitor-autor? Aí, novamente, vemos retornar velhos funcionamentos do livro didático, a
partir mesmo do título dado à proposta de escrita. Vejamos. Após o comando, são dados dois
fragmentos de textos, mas transcrevemos apenas o primeiro, por acreditarmos ser suficiente para que o
leitor possa acompanhar nossa análise.
AGORA É A SUA VEZ
Apresentamos, a seguir, o início de dois contos de escritores brasileiros. Escolha um deles
e dê continuidade à narrativa. Se preferir, escreva um conto com um assunto diferente dos
propostos. (Como escrever algo diferente do proposto ou imposto).
“Quando eu e a minha prima descemos do táxi, já era quase noite. Ficamos
imóveis diante do velho sobrado de janelas ovaladas, iguais a dois olhos
tristes, um deles vazado por uma pedrada. Descansei a mala no chão e
apertei o braço da prima.
- É sinistro.
Ela me impeliu na direção da porta. Tínhamos outra escolha? Nenhuma
pensão das redondezas oferecia um preço melhor a duas pobres estudantes
(...)”.
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(Lygia Fagundes Telles. Venha ver o pôr-do-sol
e outros contos. 5ª ed. São Paulo: Ática,
1991, p. 35).
O aluno, como nos outros exercícios, é levado a concordar com os autores, pois, a
partir do momento que se diz “Escolha um deles e dê continuidade à narrativa”, quem lê,
automaticamente, está sendo condicionado a reproduzir, ou seja, a interpretar conforme os
autores. Acrescente-se a isso, as instruções que seguem os dois fragmentos propostos, que
buscam “cercar” ainda mais a produção textual, de forma a dar-lhe uma direção determinada.
A análise nos permitiu chegar a alguns resultados sobre o funcionamento do Discurso
Pedagógico da e sobre a Literatura, como a noção de texto e de texto literário na Escola, o seu
uso e função na aula de Língua Portuguesa, nos limites do corpus selecionado e do tempo
disponível. E, então, concluir que há uma noção de texto dominante na Escola em que a
Literatura entra de determinado modo; que um Discurso Pedagógico conservador não se cansa
de reproduzir certas representações de Literatura, reforçando o imaginário do leitor, que é
sobredeterminado pelo contexto sócio-histórico; que a estrutura e o funcionamento do livro
didático parecem vir se conservando ao longo do tempo, de diferentes formas, ajudando a
perpetuar essas (e outras) representações.
51
CONCL USÃO
Pode-se dizer que falar de texto literário, de leitura, em especial, de leitura literária, é
situar-se, parece, em um campo abrangente e sem restrições. Como vimos, muitas são as áreas
que tratam desse tema: Análise do Discurso, Literatura, História, sob variadas perspectivas e
defendendo pontos de vista específicos, mas que se cruzam em diversos aspectos. Mas, por
outro lado, existem as restrições. Não se pode dizer tudo sobre o tema; então, se faz escolhas,
consciente ou inconscientemente. E aí temos as divisões, e aí temos o que chamamos de
político.
Este trabalho científico, de pesquisa, teve como ponto de partida, uma vontade de
analisar o livro didático. Mas, fomos vendo que ele é mais um meio em que os conhecimentos
sobre a Língua e a Literatura, suas representações e práticas, se materializam, e que
precisávamos de um instrumento de leitura para lê-lo de uma outra forma. E a Análise do
Discurso, que antes não fazia nenhum sentido para nós, foi se revelando fundamental para sair
de certos sentidos estabilizados, para formularmos mais e mais perguntas sobre questões sobre
as quais nunca pensáramos. O que não significa que, para prosseguirmos na pesquisa desta
temática, não precisemos também de buscar outros referenciais teóricos no que diz respeito à
Literatura.
Quais as condições de produção do produto “livro didático”? Como o texto literário se
estrutura e se organiza no livro didático para ser lido e compreendido? Que tipo de leitor se
produz nesse modo de organização? Quais são as representações de Literatura que o livro
didático produz e reproduz? Quais os efeitos de sentidos desse funcionamento?
Interessante também foi apreender a articulação que havia entre a Análise de Discurso
e os textos de autores que tratam do meu objeto de análise. Chegar, portanto, junto com eles, a
compreensão do texto literário como objeto histórico.
A descrição e análise do livro e das entrevistas levaram-nos a alguns pontos
importantes para a formação do professor. Um deles foi como começar a responder a algumas
perguntas anteriormente formuladas, como a das representações de Literatura do livro
didático. Vimos que uma representação de literatura contida no livro (talvez, a principal) está
relacionada com o amor, sentimento, expressividade, emoção, imaginação, poesia, suspiros,
fantasia, coisa de mulher (imagem simplista e reducionista). Observamos, ainda, que tem sido
um funcionamento do Discurso Pedagógico da e sobre a Literatura, o de valorizar o texto
52
literário como algo “belo”, mas que não faz parte do principal da aula de Português. Belo,
porém, sem utilidade. Desse modo, cria-se uma ideologia que influencia (e muito) no conceito
de representação literária que circula dentro e fora da Escola.
O conservadorismo do Discurso Pedagógico não se cansa de reproduzir essa
representação tão antiga. Logo, reforça o imaginário do leitor, já marcado por determinados
sentidos estabilizados (e ficam ainda mais). A estrutura e o funcionamento do livro didático
também fortalecem esse imaginário porque vem se conservando ao longo do tempo, de
diferentes formas, perpetuando essa e outras representações. O livro didático vai, assim,
contribuindo para construir e reconstruir certa(s) ideologia(s), pois, parece, que não há
mudanças significativas na estrutura e funcionamento dos manuais. Vimos que são excluídos
os domínios lingüístico e social, que atestam a história das relações com o conhecimento e
como ele se dá na sociedade.
Isso torna a aula de Língua Portuguesa, quase sempre, pouco atrativa, causando nos
alunos falta de interesse pela leitura e, principalmente, pela leitura literária, como já dissemos
anteriormente e gostaríamos de repetir ao final deste TCC. É possível dizer que quando se
trata de leitura literária, o leitor precisa de estímulo adequado, isto é, a escola deve criar
condições de produção efetivas para prática de leitura polissêmica. A leitura é um processo de
construção de sentidos, por um sujeito determinado e limitado a determinadas condições
sócio-históricas. Quem dá sentido ao texto é quem lê, por isso, tanto a o texto literário quanto
a leitura literária são objetos históricos.
Na elaboração deste TCC, pudemos aprender realmente como se faz um trabalho
acadêmico-científico e sentir o prazer da descoberta. E mais do que isso. Termos visto que o
tempo não seria suficiente para tratar de forma adequada de tudo que íamos descobrindo nessa
caminhada, e que ele, portanto, não se encerrava aqui. Ele deixava muitas portas abertas para
futuros trabalhos.
53
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CEREJA, W.R. e MAGALHÃES. Português: Linguagens. São Paulo: Atual, 2004.
CHARTIER, R. Crítica textual e história cultural: o texto e a voz, séculos XVI-XVII. Trad.
Celene Margarida Cruz e João Wanderley Geraldi. Revista semestral da Associação de
Leitura do Brasil: Campinas, São Paulo, n. 30, dez. 1997.
CUNHA,C.F. da. Gramática da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Fundação Nacional de
material escolar, 1975.
EAGLETON, T. Teoria da Literatura: uma introdução. Trad. Waltensir Dutra. São Paulo:
Martins Fontes, 2001.
FERREIRA, A. B. de H. Mini dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 2001.
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LAJOLO. Do mundo da leitura para a leitura do mundo. São Paulo: Ática, 1997.
LAJOLO, M. [e outros]. Leitura em crise na escola: as alternativas do professor. Porto
alegre: Mercado aberto, 1991.
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Brasiliense, 1991a.
ORLANDI, E. P. Discurso e texto: formulação e circulação dos sentidos. Campinas, SP:
Pontes, 2005.
ORLANDI, E.P. Análise de discurso: princípios & procedimentos. Campinas, SP: Pontes,
1999.
ORLANDI, E. P. Discurso e leitura. São Paulo: Unicamp, 1996.
ORLANDI, E. P. “Para quem é o Discurso Pedagógico?”. A linguagem e seu funcionamento:
as formas do discurso. São Paulo: Brasiliense, 1983.
PAULINO, Graça. Pensando a leitura: tipos de textos, modos de leitura. Belo Horizonte:
Formato editorial, 2001.
PÊCHEUX, M. Análise automática do discurso (AAD-69). IN: GADET, F e HAK, T. Por
uma análise automática do discurso: uma introdução a obra de Michel Pêcheux. Trad.
Bethânia S. Mariani... [e outros]. Campinas, SP: Unicamp, 1997, (p. 61-163).
PIGLIA, R. Formas breves. Trad. José Marcos Mariani de Macedo. São Paulo: Companhia da
Letras, 2004.
SÁ, Jorge. A crônica. São Paulo: Ática, 1992.
54
SILVA, M. V. da. Alfabetização: uma travessia. Brasília: Universa, 2002.
ZILBERMAN, R. Livro didático, Literatura e Pós-modernidade no Brasil. Porto Alegre,
Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 1989.
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ANEXO 1
ENTREVISTAS
Professor 1 (professora 8ª série)
Centro de Ensino Fundamental 08 do Gama-DF
1. O que você considera mais interessante na Unidade 1 do manual didático “Português:
Linguagens”, de William Cereja e Thereza Cochar?
Gostei da capa do manual, pois é bastante sugestiva. Além disso, os autores estão
propondo muitas atividades de interação e isso é essencial para um aluno de 8ª série. Os
exercícios são legais, só não sei se estão adequados para alunos da rede pública de ensino. O
motivo é simples, eu como professora sei que é muito complicado trabalhar inúmeras
atividades dentro de sala de aula (imagine fora!). E esses meninos, na maior parte do tempo,
não querem fazer nada! Mas, enfim, nós tentamos passar pelo menos metade do que é pedido
pelo livro.
2. Na Unidade 1, os autores apresentam alguns textos, o que esses textos representam?
Bem, eu li apenas o primeiro “o não, o sim, a felicidade”. É um excelente texto porque
tem tudo a ver com os alunos dessa série. Considero ele apenas longo demais, os alunos vão
enrolar, enrolar e acabam por não ler.
3. Qual o seu conceito de texto? E de literatura?
O texto é como esse primeiro, um conjunto de palavras que tem algum significado,
demonstrar alguma coisa, no caso, coisas do dia-a dia. A literatura se refere principalmente
aos poemas, cuja linguagem é bem elaborada, emotiva. Tudo que não faz parte do mundo real
é literário, nos livros de ensino fundamental pouco se vê isso.
4. Comente: Texto é uma coisa e literatura é outra.
Veja bem, o texto pode ser qualquer coisa, por exemplo, o que está escrito numa placa,
ou uma propaganda política. Já o texto literário tem que ser algo mais complexo, não está
estampado em qualquer lugar. É mais formal, entende?????
5. De que forma a literatura é introduzida na primeira unidade?
Os autores basicamente não trabalham com o texto literário. É por meio do conto de Lya
Luft que eles colocam o literário propriamente dito. Durante todo o ensino fundamental, os
alunos praticamente não estudam obras literárias, como Machado de Assis, José de Alencar,
entre outros. Isso fica reservado para o ensino médio. Aqui se vê mais textos e exercícios do
que literatura.
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Professor 2 ( professor 8ª série)
Centro de Ensino Fundamental 08 do Gama-DF
1. O que você considera mais interessante na Unidade 1 do manual didático Português:
Linguagens, de William Cereja e Thereza Cochar?
O poema é bem interessante, mas considero que poderiam ter escolhido outro, com uma
linguagem mais jovem, ou melhor, não precisava de poema e sim de uma música bem atual
que falasse a respeito do jovem. Enfim, o poema é bonzinho, porém, o autor é desconhecido,
nunca ouvi falar nele, isso faz com que os alunos se desinteressem. Já pensou se fosse um
João Cabral de Melo Neto ou quem sabe Manuel Bandeira, são tantos autores conhecidos.
Ah, não posso me esquecer de falar das atividades, são dinâmicas, mas na prática, muitos
exercícios, são eliminados, pois, não são adequadas para os alunos da escola pública.
Ninguém gosta de ler nem na sala, imagine fora dela, pesquisar, ver filme desconhecido, nem
adianta, só raramente passo pesquisa para os meus alunos. Na maioria das vezes, passo os
textos e no máximo, as atividades que utilizam a escrita, eu gosto mesmo é de falar e vê-los
prestando atenção na aula. O tempo é muito curto!
2. Na Unidade 1, os autores apresentam alguns textos, o que esses textos representam?
Os textos são legais e podem ser significativos para os alunos, depende da forma como
serão trabalhados em sala. Gostei porque não são muito extensos e, por isso, a leitura se torna
mais significativa e muita mais prazerosa.
3. Qual o seu conceito de texto? E de literatura?
No livro podemos ver muitos textos informativos, falam do cotidiano, palavras que
possuem alguma significação quando juntas. Existem diversos tipos de texto, aí incluem-se os
da unidade 1 que são informativos, pois, transmitem, no caso, informações acerca da
juventude. No Ensino Fundamental isso é muito comum.
Bem, se você perguntar para um dos meus alunos o que é literatura, de certo, eles vão
responder que é coisa de mulher, e mulher fresca que está apaixonada! Eu não penso assim,
pois, já tenho uma representação do seja literário formada, a literatura muitas vezes foge ao
real, ao cotidiano, é possível dizer que é bastante complexa, por este motivo, os meninos não
querem nem ler. Sempre faço uma ligação entre literatura e ficcional, já viu nos livros alguma
coisa de literatura que fale de experiências que literalmente aconteceram. Esse conceito de
literatura existe desde a época da minha bisavó.
4. Comente: Texto é uma coisa e literatura é outra.
Texto não pode ser literatura e existe um texto que é literário. E esses textos literários
possuem uma linguagem bem diferenciada, não é comum.
5. De que forma a literatura é introduzida na primeira unidade?
O poema, acho que não, pois, é tão simples. Depois do texto informativo, no caso, é
aquele primeiro, tem um conto bem legal, daquela escritora maravilhosa, que é a Lia Luft, já
li uma porção de livros dela, desse outro (Carlos Queiroz Telles) nunca nem ouvi falar.
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Professor 3 (professor 8ª série)
Ensino Fundamental 11 do Gama-DF
1. O que você entende por crônica?
A crônica é um tipo de texto literário, cuja leitura é bem simples, pois, possui temas
relacionados ao cotidiano e, por isso, não remetem à complexidade da literatura clássica.
2. E qual o conceito de conto? Pertencem ao mesmo gênero?
O conto é bem parecido com a crônica, só que todo mundo sabe que conto é literatura.
Os contos de fadas, por exemplo, são histórias totalmente irreais, imaginárias, por isso,
considerados, desde muito tempo, literatura. Já as crônicas falam de coisas que não nos fazem
voltar ao passado, “viajar” no tempo, enfim, imaginar, sair do mundo real.
PROFESSOR 4 (professora 8ª série)
Centro de Ensino Fundamental 11 do Gama-DF
1. O que você entende por crônica?
Sob o meu ponto de vista, a crônica é quase um conto, mas não é assim, digamos,
literatura mesmo, pois, faz uso de uma linguagem simples, repleta de elementos presentes no
cotidiano. Não adianta dizer para um menino que crônica é um tipo de texto literário, ele
jamais vai compreender isso porque a imagem que possuem de literatura é histórica, qual
imagem? Aquela bem antiga, do tempo da vovó, literatura são poesias, romances, enfim, são
histórias que nada tem a ver com a realidade.
2. E qual o conceito de conto? Pertencem ao mesmo gênero?
A crônica é bem semelhante ao conto, pois ambos são textos literários práticos, ou
melhor, não utilizam a linguagem poética, que é muito complexa.
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ANEXO 2
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Download

o texto literário nos manuais didáticos