CAPÍTULO VII POROSIDADE E DENSIDADE DE MATERIAIS CERÂMICOS Estrutura e Propriedades de Materiais Cerâmicos Capítulo VII: Propriedades Físicas Prof. Angelus G. P. da Silva POROSIDADE E DENSIDADE DE MATERIAIS CERÂMICOS Algumas propriedades dos materiais cerâmicos estão relacionadas à densidade e à existência de poros em sua estrutura. Este assuntos serão vistos a seguir: 7.1. Porosidade O método de fabricação de materiais cerâmicos (sinterização) caracteriza-se por produzir estruturas contendo poros. Estes poros desempenham papel importante. Em algumas ocasiões, os poros são desejáveis. Por exemplo, poros devem existir em azulejos para promover sua fixação às paredes através do cimento. Em outras, os poros promovem apenas a queda da resistência mecânica. Em decorrência da existência de poros, a densidade dos materiais e os métodos mais usados para sua determinação devem levar em consideração levar em consideração este fator. 7.1.1. Tipos de Porosidade Considere uma estrutura contendo poros. Ela é constituída por uma fração sólida, que pode consistir de uma ou de várias fases e de espaços vazios, os poros. Estes poros podem ou não estar em contato com a superfície do material. Ou seja, eles podem ter conexão com exterior. Isto é importante, pois poros conectados com a superfície são condutores de material entre o interior e o exterior da estrutura. Por exemplo, umidade pode ser conduzida para o interior da estrutura e dissolver a fase sólida. Este é um problema relacionado a uma falha em produtos de cerâmica vermelha denominada eflorescência. Poros conectados à superfície são mais prejudiciais à resistência mecânica, visto que muitas fraturas têm início em falhas estruturais superficiais, tais como poros. Os poros conectados com a superfície são denominados abertos Poros não conectados com a superfície são denominados fechados, mesmo que eles sejam conectados internamente. Poros fechados podem ser causados pelo fechamento de poros abertos, devido à evolução da sinterização, ou podem ser causados pela evolução de gases da fase sólida e estes gases não conseguem sair da estrutura. Estes últimos tendem a assumir forma esférica. No decorrer da sinterização, a porosidade, que no início era toda praticamente aberta, vai diminuindo de volume e certas conexões entre poros desaparecem. Os poros vão se isolando. A conexão com o exterior tende a desaparecer. Os últimos poros da estrutura são fechados, ou seja, uma estrutura que não aparenta possuir poros na superfície pode possuir uma quantidade significativa de poros fechados. A Figura 7.1 ilustra uma estrutura na qual são vistas a fase sólida e as porosidades aberta e fechada. O volume total da estrutura é a soma dos volumes do sólido, dos poros abertos e dos poros fechados V = VS + VPA + VPF (1) em que VS é o volume da fase sólida, VPA é o volume dos poros abertos e VPF é o volume dos poros fechados. Devido a sua importância para alguns produtos cerâmicos, a porosidade é representada através de determinados parâmetros. • Absorção de água: quando em contato com líquidos, a estrutura tende a absorvê-los devido a forças de capilaridade. A absorção de água é definida como o ganho percentual de massa que tem a amostra, quando absorve o máximo de água. Sua determinação é feita medindose o peso da amostra seca e em seguida mergulhando-a em água por certo tempo. Neste período, a água inunda os poros abertos. A amostra é suspensa e a água que escorre em sua superfície é seca por pano úmido. Supõe-se que toda a água nos poros abertos permanece lá. 173 Estrutura e Propriedades de Materiais Cerâmicos Capítulo VII: Propriedades Físicas Prof. Angelus G. P. da Silva O peso da amostra com água absorvida é determinado. A absorção de água é calculada através de P − PA AA = U 100 (2) PA onde PA é o peso da amostra seca e PU é o peso da amostra úmida, com água absorvida. • Porosidade aparente: é definida como o percentual volumétrico de porosidade aberta existente na amostra. Sua medição é feita pelo método gravimétrico, segundo a expressão P − PA V 100 = P 100 (3) PA = U PU − PI V onde PI é o peso da amostra quando imersa em água. PU e PA têm o mesmo significado do caso anterior. A expressão à direita da segunda igualdade é simplesmente o significado da porosidade aparente expresso matematicamente, que é equivalente à expressão à esquerda. Figura 7.1: Amostra contendo poros abertos e fechados. O volume total da amostra é representado pelo contorno da amostra. O volume da porosidade é a soma dos volumes de poros abertos e fechados. 7.2 Densidade A densidade é definida simplesmente como uma razão de massa e volume. No entanto, de acordo com o método usado para determinar ambos os valores, a densidade pode assumir diferentes significados, como se verá em seguida. 7.2.1. Densidade cristalográfica Suponha um monocristal sem defeitos. Ele é um arranjo ordenado de átomos. É possível definir para esta rede cristalina uma célula unitária. Esta célula possui um certo número de átomos e um certo volume. Dividindo-se a massa dos átomos da célula pelo volume desta célula encontra-se a densidade cristalográfica. Note que esta densidade diz respeito ao arranjo cristalino apenas. Para isto, supõe-se que o material é monocristalino e livre de defeitos cristalinos, desconsiderando assim a existência de defeitos típicos de uma estrutura real. Cada átomo está ligado a um certo número de átomos circunvizinhos. O tipo de ligação existente entre os átomos determina o número de vizinhos de cada átomo e a distância entre os átomos, ou seja, o empacotamento da estrutura. A estes fatores, some-se o tamanho dos átomos e íons. A massa está diretamente relacionada à massa atômica dos constituintes da estrutura. Isto significa que a densidade cristalográfica de estruturas constituídas por átomos de elevada massa 174 Estrutura e Propriedades de Materiais Cerâmicos Capítulo VII: Propriedades Físicas Prof. Angelus G. P. da Silva atômica é, em geral, superior à densidade de estruturas constituídas de átomos leves. Como exemplo veja o ZrO2 e o HfO2. Ambos possuem a mesma estrutura cristalina e parâmetros de rede muito próximos, entretanto a massa atômica do Zr é 91,22 e do Hf é 178,49. A densidade do ZrO2 é 5,83g/cm3 e a densidade do HfO2 é 10,11g/cm3. Pode-se dizer também que quanto maior for o empacotamento dos átomos maior será a densidade da estrutura. Veja o caso do diamante e do grafite. Ambas as fases contêm apenas carbono, mas a estrutura do diamante é compacta. A estrutura do grafite é bem menos compacta. O diamante tem densidade cristalográfica de 3,52g/cm3, enquanto o grafite possui densidade de 2,27g/cm3. 7.2.2. Densidade teórica Considere um corpo que não contenha poros, mas que possa conter todos os defeitos cristalinos que uma estrutura real possa ter. A densidade teórica é definida como a razão entre a massa e o volume por ela ocupado. Note que esta definição elimina a possibilidade de haver vazios tais como poros e trincas isolados no corpo. Em um corpo real que contem poros, a densidade teórica é dada por m ρP = (4) VS Note que para se determinar esta densidade, deve-se conhecer o volume da fase sólida, VS. Na prática, a técnica sada para medir a densidade deve eliminar os poros fechados e abertos. Isto é algo difícil de ocorrer. 7.2.3. Densidade ou densidade bulk Nesta definição de densidade se enquadram as situações reais, nas quais a amostra é composta por poros, trincas, defeitos cristalinos, fases amorfas, etc. A densidade bulk é simplesmente a razão entre a massa da amostra por seu volume total exterior. O método usado para determinar esta densidade deve considerar todos os tipos de porosidade presentes na amostra. 7.2.4. Densidade relativa É a razão entre a densidade bulk da amostra e a densidade teórica do material. DR = ρB 100 ρT (5) 7.3 Métodos para medir densidade Dois métodos de medição de densidade serão descritos aqui. 7.3.1. Picnômetro O picnômetro é um equipamento que mede a densidade de sólidos e de líquidos. Existem picnômetros a gás e a líquidos. Somente picnômetros a líquidos serão descritos aqui. O picnômetro é um recipiente de vidro com volume conhecido com precisão. A medição da densidade consiste dos seguintes passos: 1- A amostra a ser medida é pesada, MA. 2- O picnômetro é cheio com um líquido de densidade conhecida, geralmente água. A massa do líquido é medida, ML. 3- O picnômetro é esvaziado. A amostra é colocada em seu interior e seu volume é completado com o líquido. A massa do conjunto líquido-amostra é medida, MLA. 4- A densidade teórica é determinada pela expressão 175 Estrutura e Propriedades de Materiais Cerâmicos Capítulo VII: Propriedades Físicas Prof. Angelus G. P. da Silva ρA = ρLM A (6) M L − M LA + M A onde ρA é a densidade teórica da amostra e ρL é a densidade do líquido. Deve-se ter certeza que a amostra não contenha poros internos (poros fechados). Por isso a amostra é usualmente quebrada em pequenos pedaços e o líquido é aquecido para eliminar as bolhas. Um detalhe importante deve ser observado na utilização do picnômetro. Se a amostra possui poros abertos e fechados, quando a amostra é imersa, os poros abertos tendem a ser inundados e o volume da porosidade aberta é eliminado. Porém os poros fechados não são inundados. Por isso seu volume é medido. Desta forma, a densidade medida é equivalente á expressão m ρ= (7) VS + VPF Isto nem é densidade bulk nem é densidade teórica. 7.3.2. Método de Arquimedes ou gravimétrico Os passos para se medir por este método são os seguintes: 1- A amostra é pesada. 2- A amostra é colocada em um porta-amostra e mergulhado em água. O peso dela suspensa e mergulhada é medido. 3- A densidade é dada pela expressão abaixo ρ ag PA ρ= (8) PA − PI onde ρag é a densidade da água, PA é o peso da amostra seca e PI é o peso da amostra imersa na água. Esta medição tem o mesmo problema da técnica anterior. A técnica consegue eliminar a porosidade aberta, mas não a fechada. Isto significa que a densidade medida é aquela dada pela expressão (7). 7.4. Densidade de materiais multifásicos. Para amostras constituídas por duas fases distintas, A e B, sendo ρA e ρB as densidades teóricas destas fases, νA e νB as frações em volume de cada fase, ωA e ωB as frações em massa de cada fase na amostra, a densidade teórica da amostra pode ser dada pelas expressões seguintes: ρ = υ Aρ A +υB ρB (9) 1 ωA ωB = + (10) ρ ρA ρB 176 Estrutura e Propriedades de Materiais Cerâmicos Capítulo VII: Propriedades Físicas Prof. Angelus G. P. da Silva 7.5. Exercícios 1- Demonstre que a porosidade aparente, calculada como PA = PU − PA é matematicamente igual PU − PI VP , sendo PU o peso úmido da amostra, PI seu peso imerso em água, PA o peso da amostra V seca, V o volume da amostra e VP o volume da porosidade aberta. à 2- Demonstre que uma densidade relativa definida por DR = ρA pode ser determinada pela ρB PA − PI , sendo PA, PI e PU, os mesmo do exercício anterior e ρA e ρB as PU − PI densidades aparente e bulk do material. A densidade aparente é definida como a razão entre a massa da amostra e seu volume total, o que considera o volume do sólido e os volumes das porosidades aberta e fechada. expressão DR = 3- Uma barra de alumina de dimensões 1cm x 1cm x 5cm é pesada a seco, dando 0,1678N. Esta barra é imersa em água fervente por duas horas. Depois, a barra é levantada, sua superfície é enxugada e seu peso úmido é medido, dando 0,1704N. Depois a amostra é imersa em água na temperatura ambiente e o peso imerso é medido, dando 0,1204N. Levando em consideração que a densidade teórica da alumina é 3,95g/cm3, determine: a) a absorção de água b) a densidade bulk c) a porosidade aparente d) a densidade relativa definida pelo exercício anterior e) fração de volume ocupado pela porosidade total f) fração de volume ocupado pela porosidade fechada. 177 Estrutura e Propriedades de Materiais Cerâmicos Capítulo VII: Propriedades Físicas Prof. Angelus G. P. da Silva 7.6. Referências D.W. RICHERSON, Modern Ceramic Engineering. Properties, Processing and Use in Design. Segunda Edição. Editora Marcel Dekker. 1992. 178