Ambiente turfoso Musgo - Bryum alpinum Ao nível dos nossos pés ou do nosso nariz, os musgos e os líquenes acompanharam sempre a epopeia da espécie humana, partilhando discretamente todos os nossos nichos de vida. Na literatura são os tapetes mágicos de duendes e fadas, nas muitas guerras do passado serviram de compressas no tratamento de feridos e foram no dia-a-dia usados no fabrico de produtos de higiene como fraldas de bebés, supositórios, sabões ou mesmo perfumes. São até usados como sensores da poluição e da mudança do clima. Ainda assim, hoje são ilustres desconhecidos. Aqui, as Autoras, biólogas e fotógrafas, convidam-no a espreitar os detalhes mais escondidos destes organismos e ensinam-nos a tratar por tu diversas espécies, quando em plena Década da Biodiversidade muitas delas correm o risco de desaparecer. Musgos e Líquenes — uma vida às escondidas Ambiente saxícola Musgo - Sphagnum auriculatum Musgo - Polytrichum commune Líquen - Lecanora muralis Ambiente fluvial Hepática - Riccardia multifida Antócero - Phaeoceros laevis Musgo - Grimmia montana Ambiente saxícola Por Cristiana Vieira, Helena Hespanhol e Joana Marques Musgo - Fontinalis squamosa O que são? O que é um líquen? Como se reproduzem? Que papel desempenham no nosso dia-a-dia? Um líquen é o resultado de uma parceria entre um fungo e uma alga da qual Por reprodução sexual e assexual (vegetativa). Entre estes organismos, o pro- As briófitas e os líquenes são utilizados desde a Antiguidade como fonte de resultam benefícios para ambos. O fungo forma grande parte do corpo do líquen, cesso de reprodução sexual tem como resultado final o desenvolvimento de medicamentos, alimento, tintas e perfumes. No Período Romano foram empre- envolvendo e protegendo a alga do excesso de radiação solar e desidratação, esporos que se dispersam pelo vento ou pela água. gues em cestaria e nas Idades do Bronze e do Ferro como isolantes de embarca- mas depende do fornecimento de nutrientes produzidos pela alga no processo Os esporos são capazes de permanecer em estado de dormência durante épo- ções. Há registo do uso destes organismos como forro de calçado (até ao século de fotossíntese. cas desfavoráveis e germinar apenas quando se reúnem condições ambientais XVI), colchões e almofadas, ou como preenchimento de paredes e chaminés propícias ao crescimento. pensando-se que preveniam a proliferação de incêndios. Graças à sua elevada O que é um musgo? A reprodução assexual é feita através de pequenas partes do corpo que se capacidade absorvente e propriedades antissépticas, algumas espécies de Musgo é o nome pelo qual são conhecidas vulgarmente as briófitas, plantas rompem e libertam ou gemas especificamente formadas para o efeito. briófitas foram também usadas para manufaturar as primeiras fraldas no Norte essencialmente terrestres que se distinguem das restantes plantas por não da América e Pólo Norte e emplastros para curar os ferimentos dos soldados possuírem tecidos condutores de seiva. A dimensão das briófitas varia entre o milímetro e o metro e a cor, embora geralmente verde, pode ser esbranquiçada, durante a I Guerra Mundial. Ambiente humanizado A turfa, formada pela compactação de musgos mortos, é uma importante fonte vermelha, vermelha-acastanhada ou quase preta, consoante a espécie. de combustível explorada em países do Norte da América e da Europa e contribui Ambiente florestal para o famoso aroma do uísque escocês. Atualmente, briófitas e líquenes são objeto de investigação na área das ciências da saúde com vista à obtenção de substâncias antitumorais, antibióticas e antifúngicas. A aplicação destes organismos como indicadores ecológicos e de alterações ambientais é, no entanto, a mais corrente e à qual continua a ser dedicado maior esforço de investigação. Ambiente costeiro Líquen - Degellia plumbea Líquen - Lobaria pulmonaria De um modo geral, as briófitas incluem os musgos, as hepáticas e os antóceros. Líquen -Xanthoria parietina Líquen - Teloschistes chrysophthalmus Líquen - Rocella physopsis Líquenes em sinal trânsito Musgo - Campylopus introflexus Musgos em bota O que as ameaça? A destruição dos habitats naturais por desflorestação, uso de herbicidas, fogo e poluição, atmosférica e aquática têm conduzido ao desaparecimento de um elevado número de espécies de briófitas e líquenes. A colheita intensiva de algumas espécies para uso em floricultura e com fins ornamentais é igualmente preocupante já que as populações colhidas, muitas vezes em estado fértil, podem Musgo - Ulota crispa Líquen - Pannaria rubiginosa Musgos em muro Musgos em pavimento demorar décadas a retomar o tamanho inicial. A presença de briófitas e líquenes está muitas vezes associada a sensações de Onde se encontram? serenidade e qualidade ambiental. A beleza de rochas “vestidas de líquen” e Pioneiros na colonização de solos, rochas nuas e troncos de árvores, as briófitas florestas com “musgo macio onde apetece cair e rolar” tem sido exultada por e os líquenes estão presentes em todos os ambientes exceto o marinho, sejam poetas e escritores. No Oriente, são bastante populares os “jardins de musgo”, estes naturais ou humanizados, e chegam até aos lugares mais hostis do planeta, como espaços de refúgio e lazer, incluindo a prática de artes marciais. onde fixam partículas e estabilizam o solo ou protegem contra a ação do vento É necessário tomar consciência do valor deste micromundo e alertar para os e chuvas intensas. Algumas espécies acumulam matéria orgânica e facilitam a recuperação de habitats degradados. riscos a que muitas espécies de briófitas e líquenes estão votados em Portugal. Musgo - Homalothecium sericeum Hepática - Marchantia polymorpha Defenda-os e divulgue: que a vida de musgos e líquenes deixe de ser às escondidas!...