O PROCESSO DE SIGNIFICAÇÃO DO DESENHO INFANTIL Larissa Oliveira Lopes RESUMO: O objetivo da pesquisa e que o desenho de uma criança tem significado, e que este recurso pode contribuir para aperfeiçoar a educação e promover o desenvolvimento da criança, principalmente àquela que ainda não utiliza a linguagem verbal. Visto que o desenho pode ser um ato espontâneo de expressão da subjetividade da criança, antes da linguagem e da escrita, pois é pela revelação dos desejos que ela pode explorar as possibilidades do mundo interior, bem como projetar suas experiências por meio de traços e imagens, estimulando assim sua criatividade, imaginação, e tomada de consciência enquanto sujeito que aprende na família, escola e sociedade. Palavras-chave: Educação Infantil. Desenho. Desenvolvimento. Estimulação. 1 INTRODUÇÃO O ensino da expressão artística é fundamental para o desenvolvimento integral da criança. Por esse modo de expressão envolve toda a cognição: pensamento, percepção, linguagem, memória, sensibilidade e sentimento estético, experiência sensório-motora, etc. Para Lowenfeld (1977), a arte desempenha um papel vital na educação das crianças; porque, desenhar, pintar ou construir uma escultura ainda que tosca, constitui um complexo cognitivo em que a criança reúne diversos elementos de sua experiência, para formar um novo e significativo todo. Portanto, o ato de desenhar está ligado diretamente com atividades relacionadas à expressão artística; mas tal ato expressivo se situa para além das convenções estéticas e das escolas de artes. Desta forma, cada vez mais cedo, a criança recebe informações e incentivo dos pais, professores e coleguinhas, para desenvolver suas habilidades. O olhar da educação formal de nossa época considera que a arte possui uma forte influência sobre o desenvolvimento da personalidade e principalmente em relação à criança, que deve ser auxiliada para desenvolver suas capacidades tanto no Trabalho de conclusão de curso apresentado ao curso de Pedagogia, da Universidade Estadual de Maringá - Campus Regional de Cianorte, sob a orientação do Prof. Dr. Raymundo de Lima. Acadêmica do curso da Pedagogia da Universidade Estadual de Maringá - Campus Regional de Cianorte, Paraná. sentido da arte em si, como no sentido de ela ser uma dos meios para ilustrar e facilitar o entendimento dos conhecimentos ensinados na escola. Ainda, O ato de desenhar envolve a atividade criadora; é através de atividades criadora que a criança desenvolve sua própria liberdade e iniciativa, e, expressando-se como indivíduo reconhecerá esse mesmo direito nos outros o que lhe permitirá apreciar e reconhecer as diferenças individuais.(LOWENFELD, 1970 p.16). No processo de expressão artística o que passa a ser representado é a interpretação na perspectiva do sujeito. Porém, a expressão artística se funda para além da educação visual, isto é, tal perspectiva está ligada a sensações espontâneas e adquirida pela educação, tais como a leitura a respeito da cores, como usar o traçado, a noção de perspectiva, uso das formas e do espaço, etc. Assim, o ato de desenhar produzido por uma criança implica o envolvimento de um todo de sentidos, sensações e percepções, conjugados com sua educação e a cultura que a levaram a observar, sentir e pensar os objetos e o mundo que a rodeia. O desenho infantil pode transmitir inúmeros significados que podem não ser identificados imediatamente pela professora que a orienta, pois depende fundamentalmente da capacitação profissional e da disposição psicológica da própria. O bom preparo da professora esclarecida sobre o valor do desenho pode contribuir para ela compor uma impressão psicológica sobre o desenvolvimento da personalidade da criança, bem como o seu uso para promover as atividades pedagógicas. O desenho infantil está mais presente no campo da psicologia, e para entender melhor o universo infantil, muitas vezes, buscamos interpretar seus desenhos, o que significa que os professores nem sempre estão preparados para avaliar e decifrar os desenhos criados pelas crianças dentro do ambiente escolar; por isso, é aconselhável que a educador primeiro se prepare “como” e “para que” usar o desenho em sala de aula. Ou seja, embora a professora precise conhecer como trabalha a psicologia dos desenhos, ela não precisa improvisar ser “a psicóloga”, mas apenas saber como levantar algumas hipóteses pedagógicas a partir da expressão gráfica da criança. Segundo, cabe ao trabalho docente oferecer para a criança um contato maior com os diferentes desenhos e obras de arte para que as crianças levantem informações e enriqueçam seu estilo de expressão. Terceiro, faz parte da função docente deixar a criança livre para exprimir do seu jeito e com suas própria limitações algo do seu mundo interno e externo. Ou seja, a professora não deve censurar criticar, impedir ou reprimir a criança de expressar algo do seu jeito. Portanto, o uso do desenho – ou grafismo infantil – na sala de aula, na creche ou outro espaço de ensino ou de ludicidade, deve comportar uma ética por parte da coordenadora das atividades. Evidentemente, o trabalho do/a pedagogo/a não está dirigido necessariamente para formar um senso estético e estilo artístico na criança no estabelecimento de ensino; também não é função do/a pedagogo/a aprofundar diagnósticos (psicodiagnósticos) com finalidade clínica que é próprio da atividade psicológica ou psicoterapêutica, mas sim, faz parte da função da pedagogia saber levantar hipóteses diagnósticas sobre o mundo subjetivo da criança, para que o trabalho escolar possa operacionalizar melhor o currículo, tanto numa turma de alunos como focalizando um determinado aluno que apresenta dificuldade acentuada na aprendizagem, por exemplo, após ter nascido um irmãozinho que “roubou” seu amor dos pais. O acompanhamento pedagógico por meio do grafismo também poderia mostrar que a criança é vítima de bullying ou outra forma de violência, que ela não revela com palavras, mas que boicotam seu rendimento escolar. Para interpretar os desenhos das crianças devemos estar cientes sobre a faixa etária, bem como dados sobre seu desenvolvimento cognitivo, afetivo e social. Crianças com dois anos ainda não têm noção das cores e nem consciência plena sobre o que está desenhando, diferentemente de uma criança mais velha de quatro e cinco anos. Ou seja, o olhar pedagógico necessita de uma formação sobre a relação etapa do desenvolvimento da personalidade e possíveis cobranças por parte do currículo escolar; assim, além da consciência dessa relação acima, é preciso tempo para acumular experiências para poder entender e saber como utilizar as informações subjetivadas num desenho. Desta forma, o presente estudo busca ressaltar a importância do desenho infantil ou grafismo, não como um conjunto de rabiscos toscos ou desenhos desprovidos de significações e, sim, como uma representação simbólica que a criança manifesta de modo espontâneo ou direcionado pela professora, mas ambos resultam de sua visão de mundo, que, no fundo, também é influenciado pelo contexto social e cultural, vivido por ela. Podemos entender o desenho como linguagem, um sistema dinâmico de signos que se relacionam diretamente com o desenvolvimento psicológico e cultural da criança. Concebemos tal modo expressivo fundado primeiramente na espontaneidade, e só depois pode ser direcionado para um sentido lúdico ou estético, pois assim é a tendência do modo de ser e fazer da criança: tudo para ela é encarado como brincadeira, para depois seu rabisco poder até se desenvolver como expressão de arte, isto é, segundo os princípios da intenção estética convencionada pelas diversas tradições: arte abstrata, impressionista, expressionista, surrealista, etc. 2 O GRAFISMO SEGUNDO ALGUNS AUTORES A seguir, apresentaremos abordagens variadas que enxergam o desenho de forma distinta; estudiosos que analisam as etapas gráficas do desenho, entre eles Luquet (1927), Florence Mèredieu (1974), Lowenfeld (1977). Para os autores acima, o desenho infantil traduz o grau de maturidade em que a criança se encontra seu equilíbrio emocional e afetivo, além do desenvolvimento motor e cognitivo. De um lado, o ato de desenhar se firma de forma espontânea, desenvolvendo sua coordenação motora, e por outro, são gestos, construídos e imitados da cultura em que a criança se encontra. Para Luquet (1927), o desenho para a criança é uma forma de diversão, um jogo como qualquer outro: “é um jogo tranqüilo que não exige companheiro e ao qual se pode dedicar em casa tão comodamente quanto ao ar livre” (LUQUET, 1927, p.15). Este jogo de desenhar sozinho carrega uma aparência desinteressada, que, não conscientemente, carrega consigo um forte incentivo para que criança se prepare para as atividades práticas na vida adulta levando em consideração seu empenho e dedicação com o trabalho. Porque uma das atribuições ao desenhar é que a criança atrai sua própria atenção para alguns motivos que antes nunca a tenham interessado, pois o desenho para ela nunca é uma reprodução, mas sim uma linguagem gráfica que toma forma gradativamente de uma imagem visual. Luquet (1927) distingue estudos sobre o desenho, o autor investigou as produções gráficas procurando definir o processo evolutivo sobre o grafismo infantil classificou a expressão do grafismo infantil em quanto estágio: o Realismo Fortuito, Realismo Fracassado, Realismo Intelectual, e Realismo Visual, que estão caracterizados pelos vínculos que estabelecem com os desenhos, enquanto objeto de conhecimento. O estágio do realismo fortuito inicia por volta dos dois anos de idade: etapa em que a prática dos rabiscos chega-se ao fim, uma vez que as crianças promovem ligações entre traços realizados por elas e os objetos que se encontram ao seu redor, iniciando assim suas produções infantis. Observa que “a principio, para a criança, o desenho não é um traçado executado para fazer uma imagem, mas um traçado executado simplesmente para fazer linhas” (LUQUET, 1969, p.145). É uma fase do grafismo involuntário, praticamente instintivo, porque a criança não sintetiza com detalhes o que ela desenha, apenas traduz gestos motor, traçando linhas, mas não tem consciência de seu ato. O realismo fracassado se inicia entre os três e quatro anos de idade, e caracteriza-se pelo momento em que a criança percebe a relação entre o objeto e a forma, e tenta reproduzir objetos em seus desenhos, mas são apenas tentativas de ensaio e erro, que geralmente termina em fracasso porque não consegue reproduzir o objeto no desenho. Em seguida, o realismo intelectual acontece por volta dos quatro aos dez anos de idade, sendo marcado por aspectos em que a criança já reconhece o sentido de sua produção. Nesta fase, a criança não desenha o que está vendo, mas sim o que sabe a respeito do objeto. Por último, o autor discorre sobre o realismo visual, que começa por volta dos doze anos: consiste em um período a qual aparece o fim do desenho infantil, sendo marcado pela descoberta da representação dos desenhos devido às leis e convenções. Isso acontece porque a criança passa a se expressar de maneira mais influenciada pelo seu meio, pretendendo atingir a perfeição da linguagem gráfica do objeto real; ela passa a se ver quase como um adulto, tendo em vista que já adquiriu o controle de habilidades e técnicas para o desenho. Luquet (1927) observa que não há uma clara distinção entre as fases, porque cada criança evolui individualmente seu desenho, mas ela pode estar sujeita a regredir, isto é, ela deixa escapar um traço no desenho ou uma figura menos elaborada se comparamos com os avanços das conquistas de sua idade. Também, consideramos que a concepção de Luquet sobre a atitude dos adultos em relação à criança é bem distinta quando diz: (...) julgo que, no que diz respeito ao desenho, o que terá de melhor a fazer o educador é apagar-se, deixar a criança desenhar o que quer, propondo-lhe temas sempre que ela necessita, sobretudo quando lhe pede, mas sem lhes impor e, sobretudo deixá-la desenhar como quer, a seu modo (LUQUET, 1927, p.230). Ainda que seja reconhecida a seriedade do trabalho exercido por Luquet, que conseguiu através de suas pesquisas influenciaram a pesquisa neste campo do conhecimento, ele foi bastante criticado sobre o fato de ainda se prender idéias de que a produção gráfica infantil fosse repleta de imperfeições, pois acreditava que a criança tinha a necessidade de buscar a representação realista. Já os estudos de Florence Mèredieu (1974) partem de uma noção histórica sobre o período em que começou a se ter interesse pelo desenho infantil, buscando uma análise diferenciada reconhecendo que a evolução da produção gráfica se dá por meio da medida em que a criança perpassa pelo processo de maturação. O grafismo é o meio pela qual a criança manifesta sua expressão e visão do mundo, o exercício de uma atividade imaginária que se relaciona a um processo dinâmico em que a criança procura representar o que conhece e compreende. Deste modo, o desenho infantil pode ser um meio de compreensão da realidade, sendo um valioso instrumento para a construção de conhecimentos, pois essa autora mostra que o grafismo (mesmo o rabisco tosco) é uma expressão resultante da imaginação e atividade criadora da criança. Mèredieu (1974) dirige críticas à Luquet em relação ao processo que envolve o grafismo infantil, pois ele apresenta as fases acima descritas como se fossem isoladas, parecendo não transparecer as mudanças – como evolução – de uma etapa para outra. Observa que é quando a criança rabisca que ela passa a evoluir psíquica e esteticamente, pois seu corpo se movimenta, e juntamente com seus traços passa por fases distintas. Para esta autora, esses traços representam uma etapa fundamental da maturação do sensório-motor da criança. Assim, Mèredieu apresenta três fases em relação ao rabisco na criança. Quando a criança possui dezoito meses, mais ou menos, apresenta-se um estágio “vegetativo motor”, é a fase pela qual consiste na produção de riscos com o formato quase “arredondado, convexo ou alongado” (MÈREDIEU, 1974, p.25), sem tirar o lápis do papel. Quando a criança se encontra próximo dos dois e três anos, encontra-se no “estágio representativo”, em que seus movimentos ficam mais lentos, pois a criança começa a tirar o lápis do papel, demonstrando traços com formas semelhantes aos dos objetos. Nesse período, a criança passa a nomear os seus desenhos. O terceiro estágio configura-se no “estágio comunicativo” (no período dos três aos quatro anos) em que a criança procura se comunicar com as outras pessoas de maneira em que ela tenta imitar a escrita dos adultos. Outro autor, Lowenfeld (1977), observa que quando a criança está cada vez mais autoconfiante é o momento exato para ela criar e se envolver com a atividade que está desenvolvendo; é quando a criança passa a se concentrar melhor facilitando a aprendizagem. Segundo o autor, aprende-se a desenhar desenhando, sendo que esta atividade a criança deve se sentir livre para poder expressar tudo ao seu redor no desenho. Lowenfeld (1977) também estabelece três fases para o desenho infantil: A primeira fase o autor subdivide em três etapas: “etapa da garatuja desordenada”, “etapa da garatuja ordenada”, “etapa da garatuja nomeada”. Na primeira etapa a criança não tem consciência dos gestos e traços e muitas vezes nem olha (ou não reconhece) o que faz. Ela apenas sente prazer em explorar o papel riscado por ela, ou risca tudo que vê pela frente (mesa, parede, etc). Estabelece várias formas de segurar o lápis, porque ela ainda não sabe utilizar o dedo ou pulso para controlar o lápis. Realiza movimentos de vaivém, predominando os sentidos verticais e o horizontal. Já na fase da “garatuja ordenada” a criança procura estabelecer relação com os gestos e traços; presta atenção ao que está fazendo de maneira a controlar o tamanho a forma e a localização do desenho no papel. Passa a utilizar mais cores e começa a dar formas geométricas; perto dos três anos de idade ela já começa a segurar o lápis com mais firmeza. Na “garatuja nomeada” a criança passa do movimento sinestésico, motor, ao imaginário, ou seja, através de um objeto concreto tenta representar sua imagem de forma gráfica. Seus traços já estão mais bem distribuídos no papel, e a criança passa a descrever o que fez, relaciona o desenho com o que vê, mas sendo que seu significado só e inteligível para ela mesma. A segunda fase é “pré-esquemática”: a criança passa a desenhar o que sabe do objeto e não uma representação visual absoluta, sendo que seus desenhos apresentam características, não porque tem forma inata, mais sim, porque está no começo de um processo mental ordenado. E a terceira fase é vista como “esquemática”, pois a consciência analógica entre o desenho realizado e o objeto representado se firma. Nesta fase, a representação gráfica se faz mais tardia do que a lúdica. A criança já constrói cenas dramáticas brincando, mas só nesta fase começa a organizar intencionalmente seus desenhos. 3 O DESENVOLVIMENTO DO GRAFISMO INFANTIL Durante esta pesquisa sobre o desenho infantil, observamos que embora as abordagens teóricas utilizadas pelos autores Luquet (1927), Lowenfeld (1977) e Florence de Mèridieu (1974), oferecem elementos necessários para a compreensão dos desenhos das crianças, falta uma concepção sistematizada no campo da pedagogia. Isto é, falta uma segurança teórica-metodológica de como os desenhos podem contribuir para otimizar o processo de ensino e aprendizagem. Como já foi dito, o desenho infantil é composto de acordo com as etapas do seu desenvolvimento. Noutros tempos, quaisquer destas etapas levantadas para entender o desenho e sua evolução estão relacionados com as etapas do processo de desenvolvimento humano. Para a criança, a cada universo criado surgem também grandes dificuldades que precisam ser experimentadas e resolvidas por ela própria. Essas etapas do desenvolvimento infantil devem ser vividas pelas crianças, fase a fase, pois poderá deixar marcas no desenvolvimento que mais tarde precisará ser trabalhada tanto com hipótese diagnóstica como enquanto diretriz pedagógica. Lowenfeld (1977) ressalta a importância do desenho para o desenvolvimento da criança, seja como veículo de auto-expressão ou como de desenvolvimento da capacidade criativa e representativa. O desenho – ou grafismo – pode ser considerado como uma das manifestações do desenvolvimento da criança, ao lado da afetividade, do pensamento e da motricidade. Pois é através das manifestações do desenho que a criança também adquire seu desenvolvimento global. No ato do desenho, a criança se revela oralmente, e isto pode ser utilizado pela professora para ter acesso às „coisas‟ do inconsciente. Porque o inconsciente, embora atue paralelo à consciência, ele não se oferece facilmente ao entendimento do sujeito, mesmo sendo um inconsciente de criança. Os desenhos primitivos ou bem elaborados pelas crianças se aproximam do simbolismo dos sonhos estudados exaustivamente por Freud, porque os dois se expressam segundo as regras de “condensação e deslocação” (DEBIENNE, 1977, p. 135). Ou seja, o simbolismo do desenho é made in inconsciente: aparecem através de traços, posições, tropeços, que fornecem indícios como o sujeito está lidando com seu mundo interior ou mundo subjetivo. Do ponto de vista psicanalítico, podemos dizer que a dimensão dos rabiscos e dos sonhos é mais primitiva do que a fase da escrita aprendida na escola, mas estas duas dimensões estão interligadas na comunicação verbal. Portanto, são equivalentes em simbolismo made in inconsciente: sonhos, contos, desenhos, pinturas, esculturas, e cada qual têm uma função importante de fuga e ao mesmo tempo de realização de desejo no ato expressivo. Nos momentos difíceis da sua vida, a criança evade-se num mundo imaginário onde nada a impede de realizar os seus desejos. As manifestações visíveis desta fuga são os jogos, os contos e os desenhos. Toda uma actividade libertadora é realizada no inconsciente (Morgenstern,Apud DEBIENNE, 1977, p. 135). Um alerta é necessário para se interpretar o simbolismo dos sonhos, desenhos e esculturas: “a interpretação do simbolismo exige o conhecimento não só das teorias psicanalíticas como também, de maneira assaz exaustiva, [por outras concepções teóricas] do material simbólico elaborado pelo folclore, pelas lendas, pelos mitos, etc” (AUGRAS, 1980). Mesmo em nossa época aparentemente tão distantes das vivências do folclore, lendas e mitos antigos, é preciso ficar atento para o simbolismo reproduzido pela chamada indústria cultural, que forja novos mitos, novas lendas; na maioria das vezes esta indústria recicla os mesmos numa linguagem estética atual, como faz principalmente a televisão e o cinema. Um exemplo: um menino pode ser influenciado para desenhar piratas do filme “Piratas do Caribe”, portanto, seria bem diferente o desenho de outro que somente ouviu ou leu a história sobre piratas, capitão gancho, etc. Então, o desenho pode ser resultado da cultura que pertence ao sujeito, que hoje em dia é sobreposta pelo tratamento estético da indústria cultural. Para se construir um entendimento sobre os desenhos e pinturas, é necessário conhecer alguns pressupostos teóricos e metodologias. Porque, uma delas enfoca a exploração gestáltica do papel, outra enfoca o mundo subjetivo da criança ou simbolismo, outra procura captar os nexos representacionais da sua família e da aproximação-afastamento com colegas de sala de aula. Corman (1979), por exemplo, desenvolveu uma interessante concepção teórica-metodológica para investigar as relações subjetivas e imaginárias das famílias das crianças pedindo as crianças que “desenhe uma família”. Vale [do ponto de vista simbólico e dos nexos entre os personagens] tanto um desenho de uma família de pessoas como de uma família de gatos ou dinossauros. Parece que todos os autores consultados estão de acordo que existe uma evolução da linguagem gráfica produzida espontaneamente pela criança. Como já foi dito, é preciso considerar também a influência cultural e da mídia no ato expressivo das crianças. Por isso é importante ressaltar que a criança aprenda a evoluir para ser um estilo próprio seus desenhos, ou seja, tanto para revelar suas intenções conscientes através do conteúdo, como também na elaboração dos traços e exploração do papel. Porém as crianças tendem para construir uma realidade própria, um mundo subjetivo que é rico em fantasias, tal como se fosse um sonho acordado. Por isso, desde a educação infantil deve-se propiciar para a criança um universo repleto de estímulos, vivências e até mesmo noções artísticas diversas, não para dirigir, mas sim para sinalizar como ele pode desenvolver o seu próprio estilo. Mas há autores que preferem a espontaneidade pura da criança do que a assimilação de noções artísticas; porque, em vez de abrir a criatividade podem levá-la a inibição do ato expressivo. O purismo não é realista porque a criança sempre será exposta às influências da indústria cultural. Assim, é importante mencionar que as fases do desenho infantil devem contribuir para o enriquecimento e construção do imaginário das crianças, percebendo os significados mais profundos do ato de criar e expressar suas próprias idéias e sentimentos, além de considerar o prazer que a criança sente quando desenha, passando a construir sua noção espacial e desenvolvendo suas ações e habilidades motoras. Como já foi dito, o desenho é entendido como uma esfera de atividades simbólicas que engloba aspectos cognitivos, motores e sociais, sendo assim, a pedagogia deveria saber trabalhar os desenhos de modo diferenciado, para que a criança desenvolva o gosto pela arte e, associado, também desenvolva o gosto pessoal de ela aprender os conteúdos escolares. Desse modo, qualquer expressão artística per si pode ser considerada um desafio educativo desde que haja interesse, desejo ou gosto da criança de investir no seu aprimoramento para o resultado de sua obra ser finalmente considerada arte. Mas antes de superar este desafio, é mais interessante que a escola proporcione ás crianças se expressarem por quaisquer meios: desenhos, pinturas, esculturas, brincadeiras, psicodramas, música. A professora pode instigar a criança buscar a qualidade do seu desenho, visando ajudá-la na livre expressão, na autopercepção da visualidade e auto-sonoridade, que estimulam seu processo de criação, construção da identidade e autonomia, auxiliando-a a perceber e a compreender a realidade e suas representações subjetivas. Mas que haja prudência e cuidado para não forçar a criança a corresponder as expectativas “artísticas” concebidas pela professora; embora esta tendência costuma se manifestar no trabalho das professoras de artes. Conforme observa Debienne (1977) “o efeito „catártico‟ do desenho está sempre, com efeito, misturado com a necessidade de comunicação e de progredir que a criança tem”. E esse efeito catártico deve ser aproveitado tanto no trabalho psicoterapêutico como no trabalho pedagógico, cada qual com finalidade distinta. No momento da atividade com o desenho a criança também se interage com o meio de convivência, incluindo assim a participação do seu corpo, percepção, pensamentos e sentimentos que passam a se envolver em uma ação que será transferida para seu desenho registrando um pouco de si e de suas experiências e vivências subjetivas. Consideramos, então, ser importante bem usar o desenho na escola porque é neste ambiente que se aprende os conhecimentos sistemáticos, uma forma especial de socialização e o relacionamento com a autoridade docente. Possivelmente estes três encontros pedagógicos contribuem para a formação da identidade do “sujeito”: de criança até vir-a-ser adulto. Identidade, aqui, é o resultado de uma conquista do sujeito que “assimila um aspecto, uma propriedade, um atributo do outro e se transforma, total ou parcialmente, segundo o modelo dessa pessoa” (LAPLANCHE; PONTALIS, 1970, p. 295). A identidade do ser humano é forjada a partir do processo de identificação, isto é, desde criança, através do sonho, das brincadeiras, dos gestos, projeções nos rabiscos ou desenhos, a criança percebe-se primeiro como semelhante ao outro, e, depois, como diferenciada. A identificação não é simples imitação, observam os autores consultados, acima. Mas, sim, ela é uma expressão fundada mais no inconsciente do que na consciência “como se fosse” igual à outra pessoa (“pareço minha mãe”, por exemplo). É nos sonhos e nos desenhos que a identificação aparece marcada por protótipos primitivos: a criança assimila ao ego “objetos” como se fosse seu, portanto, ela incorpora objetos fora do seu corpo para fazer parte do seu ego. Em termos da psicanálise kleiniana, por identificação, a criança incorpora os objetos considerados “bons” [que se identifica] e rejeita os objetos “maus” [que não se identifica]. Isto não quer dizer que a criança evita usar o desenho para representar uma relação de agressividade sofrida, pelo contrário, geralmente a criança projeta nos desenhos os sentimentos “bons” e “maus” adquiridos no sofrimento da sua vida real ou fantasiada. Na maioria das vezes ela tenderá a fantasiar ou exagerar esses sentimentos em desenhos, ao contar uma história ou ao representar uma situação em gestos e ações. Portanto a construção da identidade não resulta da relação superficial da criança com os objetos, mas sim, da mediação de importantes mecanismos de defesa do ego: fantasia, identificação com a mãe, identificação projetiva, introjeção, incorporação, etc. Esta observação é importante para que o trabalho pedagógico saiba distinguir, por um lado, a produção do desenho-garatuja influenciado pelos instintos mais primitivos e, por outro, o desenho mais elaborado produzido com intenção consciente. No primeiro caso, reina o princípio do prazer, a criança rabisca tudo por simples impulso, para adquirir prazer imediato com seu gesto e espera receber elogios. Nesta fase, “não há diferença profunda entre o pensar, o dizer e o agir” (DEBIENNE, 1977, p. 114). No ato do desenho-rabisco ou desenho-garatuja predomina a tradução imediata dos conflitos inconscientes e da sua vida fantasmática ou subjetiva. Mas, é no segundo modo de expressão, amadurecido, que a identidade do sujeito se manifesta, até com certo estilo próprio para desenhar; a criança e principalmente o adolescente procuram dizer algo de acordo com o seu pensamento elaborado, seguindo mais o “princípio da realidade” do que o “princípio do prazer”. Esse conhecimento básico do funcionamento psíquico ou mental pode contribuir para fundamentar o trabalho pedagógico. A professora com este conhecimento está sinalizada para não esperar e nem exigir tanto de uma criança nas primeiras etapas de expressão do desenho-rabisco, porque seu psiquismo está organizado segundo o “processo primário” (termo psicanalítico forjado por Freud (1974) na obra Interpretação dos Sonhos). Ou seja, o funcionamento mental da criança reproduz as coisas na modalidade alucinatória, compulsiva, e responde conforme o “arco reflexo” (LAPLANCHE; PONTALIS, 1970, p. 474-477), isto é, o desenho pode descarregar imediatamente uma grande quantidade de excitação, visando um equilíbrio psíquico - ou homestasia. Somente depois com o desenvolvimento do “processo secundário” é que a identidade de pensamento é procurada; é quando os objetos passam a ser diferenciados e a criança tende a escolher, por exemplo, o que desenhar como desenhar e se ela sabe desenhar algo. 4 REFLEXÕES SOBRE AS ATITUDES DOS PROFESSORES SOBRE O DESENHO Nosso ponto de partida é questionar se existe uma concepção teóricametodológica própria da Pedagogia que orienta o/a professor/a sobre “como trabalhar” os desenhos produzidos pelos seus alunos, bem como se existe uma intencionalidade de seu uso técnico na prática pedagógica. Assim, foram realizadas entrevistas com três professoras de uma escola de rede particular, com a intenção de se ter uma perspectiva crítica sobre o uso do desenho em sala de aula pelos alunos na faixa de três a cinco anos. Previamente, a entrevista foi semi-estruturada, se preocupou em levantar a possível concepção teórica-metodológica e os nexos entre o desenvolvimento infantil e o desenho. O roteiro da entrevista se divide em duas partes: inicia com os dados pessoais das professoras e a outra com as perguntas. Os dados pessoais para informações sobre a idade, tempo de experiência e formação de cada professora entrevistada. As professoras entrevistadas possuem idades que variam entre 23 anos a 43 anos, em relação ao tempo de experiência variam de seis anos a onze anos e suas formações são Pedagogia e Letras, mas as três possuem a formação para o magistério. Referentes às questões, foram elaboradas apenas seis, as quais são mais relevantes, pois proporcionam informações e detalhes acerca do problema abordado. A seguir, as seis questões realizadas com as professoras e suas justificativas. 1- Você costuma realizar atividades com desenhos no ato de ensinar? 2- Qual é freqüência que você trabalha com desenho junto com os alunos? 3- Você intervém enquanto a criança desenha ou a deixa livre? Poderia dar um exemplo? 4- Quando as crianças desenham você costuma fazer elogios ou procura ficar neutra? 5- Você considera o desenho uma atividade importante para o desenvolvimento da criança? Se for „sim‟, por quê? 6- O que você costuma fazer com os desenhos produzidos pelas crianças? As questões possuem o seguinte ponto-comum: se existe estratégia pedagógica para o trabalho com o desenho infantil no ambiente escolar. O objetivo da primeira questão pode verificar se o docente realiza atividades com o desenho e se esta contribui para apoiar o ato de ensinar, desenvolver o senso artístico, etc. Através dessa pergunta pode se ter uma noção sobre a existência ou não de uma concepção teórica metodológica sobre o desenho, e se cada professora permite que as crianças se expressem livremente. A segunda questão pretende descobrir se as professoras estabelecem ou não um planejamento semanal para elaborar atividades com o desenho e em quais momentos elas desenvolvem estas atividades. A terceira questão procura saber se as professoras fazem ou não intervenção em ato. Dito de outro modo, ela dirigem como a criança deve desenhar ou deixam elas livres? E quais são as considerações da professora acerca dessa atitude de intervir nos desenhos infantis. Já a quarta questão buscou verificar se as professoras costumam fazer comentários positivos ou negativos em relação aos desenhos. A quinta questão pretende obter informações sobre a importância pedagógica em respeito ao desenho na concepção das professoras e se elas acreditam que esta atividade pode promover o desenvolvimento emocional, afetivo, cognitivo e social da criança. E na última questão se preocupa sobre o que fazer com as atividades do desenho realizadas pelas crianças no espaço escolar, no decorrer do ano letivo, podendo constatar sobre cada olhar das professoras e como ambas direcionam as atividades gráficas dos seus alunos. No momento da entrevista uma das três professoras foi a que mais se mostrou interessada em responder ás questões e as outras duas demonstram alguma insatisfação ou insegurança. Os movimentos corporais, gestos, expressões faciais das professoras indicavam alguma ansiedade para terminar a entrevista. A primeira entrevistada que se interessou pelo assunto deixou claro sua concepção em relação às atividades desenvolvidas com o desenho. A própria trabalha duas vezes por semana com atividades de desenho, com crianças de quatro anos de idade, mas estas atividades são dirigidas após algum acontecimento, por exemplo, a contação de história. Ou seja, por meio do desenho pedido sobre uma história, as crianças podem expressar seus sentimentos, seus sonhos e sua realidade. Já as outras duas entrevistadas acreditam na necessidade de apenas uma vez por semana para realizar esta atividade do desenho em sala de aula, em um dia escolhido durante a semana. Pois elas entendem que o desenho é uma forma da criança utilizar a pré-escrita, pois ainda não dominam esta linguagem. Elas disseram “acreditar que por meio do desenho pode se obter e analisar muitos aspectos do desenvolvimento intelectual e maturacional”. Referente às intervenções realizadas nas atividades com o desenho, as três professoras declaram que de imediato deixam os alunos livres, e após alguns minutos intervém se são solicitadas. Também elas disseram que levam em consideração o que pretendem avaliar no desenho: noção de lateralidade, esquema corporal, noção de espaço. Outro aspecto levantado diz respeito a elogiar ou não elogiar os desenhos das crianças; ambas as entrevistadas concordaram que fazer breves elogios permite que os alunos se sintam mais seguros e entusiasmados com as atividades, mas às vezes observa que a criança até poderia melhorar alguns aspectos do desenho, dentro da sua habilidade ou interesse. As professoras puderam, nesta entrevista, refletir sobre o potencial de desenvolvimento de cada criança, e que a concepção de alguns colegas em relação a compreender o desenho precisa ser repensada, pois todo professor deve encorajar a criança a ser criativa e espontânea. Nesse momento, lembramos Lowenfeld, quando afirma que: Se fosse possível que as crianças se desenvolvessem sem nenhuma interferência exterior, não seria necessário estímulo algum para seu trabalho criativo. Toda criança usaria seus impulsos criadores, profundamente arraigados, sem inibição, confiante em seus próprios meios de exprimir-se. (LOWENFELD, 1970, p.19). Desse modo, quando a criança rabisca ou desenha deve se proporcionar a ela o encorajamento e permissão para explorar, questionar e refletir por meio de suas próprias iniciativas de modo a assumir suas responsabilidades criativas. Durante a entrevista também foi perguntado para as professoras o que elas costumam fazer com as atividades produzidas pelas crianças, depois do trabalho concluído. Ambas declaram que alguns desenhos são arquivados em pastas individualmente e que são entregues no final de cada semestre para que a família tenha acesso e perceba os resultados obtidos de modo a mostrar o que as crianças produzem na escola e também suas evoluções gráficas. Outros desenhos são expostos na sala de aula ou no edital da escola. Mas a professora, neste momento, não percebe se este procedimento (expor os desenhos na sala de aula) poderia provocar conseqüências na personalidade da criança, tais como: reação de vaidade ou de menos-valia, medo de desenhar novamente na escola porque percebeu reações negativas dos colegas e professores, sensação de choque ao ver seu desenho expondo sua intimidade, enfim, supomos que a exposição dos desenhos ao público afeta a formação narcísica da criança. Mas trata-se apenas de uma suposição que carece de pesquisa. Contudo, é importante ressaltar que as professoras não têm plena consciência sofre os efeitos de tal exposição e também se estão respeitando ou não o ritmo individual de cada criança. Ainda, com base nas entrevistas, as professoras concebem o desenho como sendo uma atividade espontânea da criança, compreendendo e reconhecendo que o desenho é uma manifestação criadora importante para saber como acontece o desenvolvimento da linguagem. Ou seja, esta concepção nos parece insuficiente para levar a professora aproveitar o desenho ou grafismo para lhes sinalizar aspectos importantes do processo ensino e aprendizagem. Por um lado, é reconhecida por elas a importância do desenho na aprendizagem dos conteúdos, principalmente o desenvolvimento da linguagem com seus próprios códigos; leva em conta a necessidade de que o universo imaginário infantil deve ser estimulado, desafiado e confrontado de forma a poder enriquecer as próprias experiências das crianças, bem como contribuir para a formação da sua identidade como sujeito. O ato de desenhar deve ser considerado um meio de conectar o prazer, a liberdade e o desenvolvimento intelectual da criança, numa ambiência livre e lúdica. Mas, por outro lado, pelo que foi colhido nas entrevistas, o uso do desenho como recurso pedagógico parece ser um trabalho insuficiente, pois falta fundamento teórico-metodológico, e existem problemas de procedimentos técnicos e éticos no trabalho em sala de aula. A professora tem a responsabilidade de construir um ambiente pedagógico que favoreça o desenvolvimento do desenho na educação infantil. Mas para que esta concepção se desenvolva, a profissional deve por em prática suas concepções teóricas e metodologias de aprendizagem que incluam um preparo teórico, técnico e ético relacionado à atividade pedagógica do desenho. Mas para que isso realmente ocorra vai depender da formação específica do professor sobre como trabalhar os desenhos das crianças, apoiando-se nas concepções que ele tem sobre o desenho enquanto linguagem (simbolismo) e de seus conhecimentos sobre como trabalhar o grafismo infantil. Estas noções devem ser adquiridas durante sua formação original ou continuadas, e experimentadas ao longo de sua atuação profissional. Este conhecimento deve aprimorar o diálogo cuidadoso que o professor estabelecerá com a criança sobre seus desenhos. Cabe ao/a professor/a estar consciente que desenhar é uma atividade lúdica e expressiva, sustentada mais na liberdade do que no dirigismo docente. A boa formação docente deve se pautar como “trabalhar” pedagogicamente o desenho e como incentivar a sua expressão artística respeitando o ritmo de cada criança e a maneira como ela evolui, pois cada criança tem um tempo e uma maneira de internalizar suas experiências e vivencias. A formação profissional docente original e continuada é responsabilidade conjunta de cada professor e do curso superior que ele escolhe. As escolas também deveriam contribuir nesse sentido formando equipes de educadores para realizar um trabalho de qualidade: a troca de experiências sistemáticas sobre o uso do grafismo com crianças deveria estar nessa pauta visando otimizar o processo de ensino e aprendizagem. O ideal seria que o educador adapte seu trabalho para o desenvolvimento das expressões e percepções infantis, mantendo sua sensibilidade de observação para cada criança, sabendo aceitá-la cada qual com suas diferenças de habilidade, ritmo, curiosidade, interesse, etc. Pois é responsabilidade do/a professor/a validar as produções infantis, onde atribuirá qualidades e incentivos aos esforços nos processos de construção dos conhecimentos sistemáticos. Construção esta que se dá pela relação entre a criança com o mundo, e sua necessidade de apropriar do conhecimento, de esse ser compartilhado com outros. Reforçando o que já foi dito, é através do desenho que o professor obtém dados referentes ao desenvolvimento cognitivo, afetivo, perceptivo, motor, bem como fazer o levantamento de hipóteses sobre as dificuldades subjetivas da aprendizagem, o grau de comprometimento nas dimensões afetiva-emocional e intelectual. O professor deve investir para função poder ir para além de ser um simples mediador no processo de ensino e aprendizagem, visando assim contribuir de forma significativa e personalizada para entender a subjetividade de cada criança, para que cada uma efetivamente se torne protagonista da sua própria história. CONSIDERAÇÕES FINAIS Após discorremos sobre a evolução do grafismo, podemos tecer algumas considerações a respeito do processo de desenvolvimento do desenho infantil, bem como pudemos saber, pelas entrevistas, como as professoras trabalham os desenhos dos seus alunos. Os resultados obtidos fazem reconhecer que o desenho possui características particulares, que demanda certos cuidados pedagógicos e éticos. Se é verdade que a experiência artística tem um significado para cada criança, a experimentação pedagógica do grafismo infantil também deve ter um significado de ensino e de pesquisa científica. Esta dupla perspectiva (de ensinar e pesquisar usando desenhos) certamente contribui para melhorar a atuação dos professores em sala de aula. Não queremos dizer que o uso do desenho em sala de aula vai reverter o baixo resultado da aprendizagem dos alunos do Brasil. Mas, sem dúvida, é mais um recurso pedagógico que se for bem fundamentado poderá contribuir para motivar as crianças em relação ao aprender grande parte do conteúdo do currículo escolar. Antes, é preciso mudar a concepção de que desenhar não é um simples passatempo, mas sim, pode ser um passatempo com vistas a contribuir para o desenvolvimento integral da criança principalmente em fase escolar. Por isso o papel do educador precisa ser revisado, talvez ampliado para além de “dar aulas” convencionais; ou seja, a ação docente deve contribuir estimular, orientar, e não limitar. A contribuição desse trabalho com o grafismo consiste em alertar para o fato de que há um universo a ser explorado por meio do desenho e que realmente vale a pena permitir entender e participar desse universo infantil, mas de modo profissional e especializado. Este trabalho de investigação é de grande importância no contexto educacional, pois fornecerá um melhor entendimento sobre a importância do desenho na educação infantil, sobretudo para explorar pedagogicamente o potencial natural da criança. REFERÊNCIAS AUGRAS, Monique. A dimensão simbólica: o simbolismo nos testes psicológicos. Petrópolis: Vozes, 1980. LAPLANCHE, J. PONTALIS, J-B. Vocabulário da Psicanálise. São Paulo: M. Fontes, 1970. DEBIENNE, Marie-Claire. O desenho e a criança. Lisboa: Moraes, 1977. CORMAN, Louis. O teste do desenho da família. Rio de Janeiro: Mestre Jou, 1979. FREUD, Sigmund Interpretação dos sonhos. Rio de Janeiro: Imago - Edição Standard das Obras Completas de Sigmund Freud, 1974, v. 4 e 5. LOWENFELD, Viktor. Desenvolvimento da capacidade criadora. São Paulo, Mestre Jou, 1970. LOWENFELD, Viktor. A criança e sua arte. São Paulo: Mestre Jou, 1977. LUQUET, G. H. O realismo. In: O desenho infantil. Porto: Civilização Ed., 1969. p. 123- 194. MARTINS, Heloise. Grafismo infantil. Disponível em: <http://helomartins.com.br/temas/grafismo-infantil.html>. Acesso em: 20 de maio de 2011. MÈREDIEU, Florence de. O Desenho Infantil. Tradução de Álvaro Lorencini e Sandra M. Nitrini. São Paulo: Cultrix 1974.