Técnicas para a disposição de rejeitos de minério de ferro Djanira Alexandra Monteiro dos Santos Mestranda PPGEM, Escola de Minas/UFOP [email protected] Adilson Curi Professor Associado, Escola de Minas/UFOP [email protected] José Margarida da Silva Professor Adjunto, Escola de Minas/UFOP [email protected] RESUMO Este artigo é uma revisão bibliográfica sobre as técnicas utilizadas na disposição dos rejeitos de minério de ferro. O tema é abordado de forma geral, definindo rejeitos, formas de disposição, estruturas de contenção, métodos construtivos. Palavras chaves Rejeitos, Barramentos, minério de ferro. ABSTRACT This article is a bibliographical review on techniques used on disposal of iron ore tailings. This subject is discussed in general terms, defining tailings, methods of disposal, tailing dam structures, and methods of construction. Key Words Tailings dam, iron ore, disposal methods Introdução A mineração é uma atividade econômica fundamental para o desenvolvimento de um país, que envolve um conjunto de processos, actividades e técnicas essenciais para a extração de bens minerais da crusta terrestre. Associada a mineração está a produção de grande quantidade de resíduos, que requerem um tratamento e disposição adequados para não impactarem o ambiente. Na mineração são gerados dois tipos principais de resíduos que são os estéreis, produzidos pela lavra ou retirada do minério da jazida, e os rejeitos, produzidos pelo seu beneficiamento. Atualmente as empresas de mineração têm procurado incorporar nos estudos do seu plano de lavra alternativas mais seguras e econômicas para a disposição dos rejeitos. Muitas empresas de mineração para reduzir os custos envolvidos na construção das estruturas de contenção de rejeitos optam pela utilização do próprio rejeito como elemento construtivo sem controle tecnológico, o que em muitos casos já causou graves acidentes devido a ruptura das estruturas. Nos últimos anos houve uma grande evolução das técnicas de disposição de rejeitos, que contribuíram para uma maior recuperação de água no processo de beneficiamento, reduzindo a quantidade de água nos rejeitos e permitindo maior estabilidade e segurança nas estruturas de contenção dos materiais. Rejeitos Rejeitos são resíduos de mineração que resultam dos processos de beneficiamento a que se submetem os minérios, visando a redução e regularização da granulometria dos grãos, eliminação dos minerais associados e melhoria da qualidade do produto final. Na sua composição apresentam partículas de rocha, água e as substâncias químicas envolvidas no processo de beneficiamento. Dependendo do tipo de minério e das operações de extração e beneficiamento utilizadas, estes materiais exibem características mineralógicas, geotécnicas e físico-químicas variáveis, podendo se apresentar como rejeitos granulares (com granulometria de areias médias e finas), ou lamas (partículas com a granulometria de siltes e argilas). Para obtenção do concentrado de ferro, o minério é submetido a etapas sucessivas de peneiramento, britagem, moagem, deslamagem e flotação em colunas, a maioria delas envolvendo água. Por isso geralmente os rejeitos de minério de ferro apresentam-se na forma de polpas, constituídas por uma fração líquida e uma sólida com diferentes minerais em suspensão e elementos químicos dissolvidos. Para cada tonelada de minério de ferro é produzida em média 0,5 toneladas de rejeitos, sendo a razão gravimétrica entre o produto final e os rejeitos produzidos de 2:1 (Boscov, 2008). A maioria dos rejeitos de minério de ferro é considerada granular, com baixa permeabilidade, boas condições de drenagem e resistência e baixo potencial poluidor, cujo comportamento geotécnico é determinado por essas características e pela forma de deposição. 2 Disposição de rejeitos Os rejeitos produzidos pelo processo de beneficiamento podem ser descartados de duas formas: líquida (polpas), sendo o seu transporte feito em tubulações através de bombas ou por gravidade; ou sólida (pasta ou granel), com o transporte feito por camiões ou correias transportadoras. A sua disposição pode ser feita: em superfície, em escavações subterrâneas e em ambientes subaquáticos. A disposição subterrânea envolve o preenchimento de galerias onde o minério já foi extraído e caso sejam seguidos os procedimentos de segurança e ambientais necessários, este método pode-se mostrar bastante económico e com menos impacto ambiental. A disposição subaquática não é muito utilizada devido ao seu elevado potencial poluidor. Em compensação, a disposição em superfície é a mais aplicada, podendo o material ser disposto em barragens ou diques; em pilhas de rejeito se o material estiver na forma sólida; ou na própria mina, em áreas já lavradas ou minas abandonadas. Os diques construídos em áreas planas ou pouco inclinadas, e as barragens construídas em vales, para servirem de bacias de contenção de rejeitos são normalmente chamados de barragens de rejeito. A construção de barragens de rejeitos é o procedimento mais implementado pelas mineradoras. As características e o tipo de barragem dependem do tipo de rejeitos. Rejeitos na forma de lamas, cuja granulometria se assemelha a das argilas, geralmente são dispostos em barragens convencionais, semelhantes as barragens de contenção de água, mas construídas com solo argiloso ou em enrocamento com núcleo argiloso, onde se faz a deposição subaquática do material. Para a deposição dos rejeitos granulares a construção mais favorável é a de barragens por aterro hidráulico, sendo o próprio rejeito utilizado para a construção dos alteamentos. Está técnica permite a construção de alteamentos sucessivos na barragem, mas exige a aplicação de princípios geotécnicos durante o seu projeto e construção, porque o comportamento da barragem pode ser afetado pela velocidade do fluxo de rejeitos, concentração da lama, propriedades mecânicas dos rejeitos e das características de deposição. A construção das barragens de rejeito pode ser feita com material compactado trazido de áreas de empréstimo ou com o próprio rejeito. O uso do próprio rejeito na construção das barragens é o método mais difundido devido ao seu baixo custo, disponibilidade do material e facilidade construtiva. Quando as barragens são construídas com o próprio rejeito, elas comportam-se como aterros hidráulicos, que são estruturas construídas pelo transporte e deposição de solo em meio aquoso. A maior desvantagem desta técnica é que o lançamento hidráulico de rejeitos provoca segregação hidráulica - processo fundamental na construção de aterros hidráulicos, afetando diretamente a distribuição granulométrica e as condições de fluxo ao longo da praia. Outro problema é a formação de potenciais focos de liquefação, provocada por vibrações no terreno devido ao desmonte com explosivos próximo das barragens, alteamentos muito rápidos, etc., aumentando o risco de ruptura. Podem ser empregados três métodos para a construção de barragens de rejeito alteadas com o próprio rejeito (figura 1): 3 1) Método de alteamento à montante 2) Método de alteamento à jusante 3) Método da linha de centro Para os três casos, inicialmente é feito um dique de partida com material de empréstimo e ao longo do tempo são construídos os alteamentos. Os rejeitos são lançados ao longo da crista do dique por ciclones ou por series de pequenas tubulações, para que haja uma formação uniforme da praia. A sedimentação das partículas dá-se em função do seu tamanho e densidade, isto é, as partículas mais finas e leves ficam em suspensão e transportam-se para o centro da barragem, e as partículas mais grossas e pesadas sedimentam-se rapidamente mais próximo do dique. A diferença entre estes métodos está na direcção do alteamento em relação ao dique inicial. Alteamento a montante Alteamento a jusante Alteamento por linha de centro Figura 1 – Métodos construtivos de barragens de rejeito (Araújo, 2006) Nos métodos a jusante e por linha de centro usam-se normalmente ciclones, cujo underflow (material de maior granulometria) é empregue na construção dos alteamentos e o overflow (finos) é depositado no dique. Os rejeitos são depositados pela técnica de aterro hidráulico, que quando aplicada ao alteamento a montante facilita a execução da barragem tornando este método mais económico e por esta razão, o mais utilizado pelas mineradoras. Entretanto, neste método não é possível a implantação de drenagem interna, o que pode levar a instabilidade e piping da estrutura, caso haja infiltração de água no talude. Como alternativa para solucionar este problema tem sido empregado o método de alteamento por linha de centro que garante um controle geotécnico maior às barragens. As principais características destes métodos construtivos estão resumidas na tabela 1. 4 Tabela 1 – Resumo das características dos métodos de construção de barragens de rejeito. Montante Método mais empregado Método construtivo Construção de dique inicial e diques de alteamento no talude de montante com material de empréstimo, estéreis de lavra ou com os grossos da ciclonagem Lançamento pela crista por ciclonagem ou sistema de tubos Jusante Linha de centro Construção de dique inicial impermeável e barragem de pé Separação dos rejeitos na crista do dique por meio de hidrociclones] Variante do método a jusante Dreno interno e impermeabilização a montante Mais de 40% de areia Tipo de rejeito recomendado Baixa densidade de polpa para promover segregação Qualquer tipo Areias ou lamas de baixa plasticidade Requisitos de descarga dos rejeitos Descarga periférica e bom controle de água livre acumulada De acordo com o projeto Descarga periférica, conservando o eixo da barragem Armazenamento de água Não recomendado para grandes volumes Bom Aceitável Resistência sismica Fraca em áreas de alta sismicidade Boa Aceitável Restrições de alteamentos Recomendável menos de 5 a 10 m/ano, perigoso se mais alto que 15 m/ano Nenhuma Pouca Requisitos de alteamento Solo natural, rejeitos ou estéreis Rejeitos ou estéreis Rejeitos ou estéreis Menor custo Vantagens Maior velocidade de alteamento Utilizado em lugares onde há área restrita Desvantagens Baixa segurança por causa da linha freática próxima ao talude de jusante, susceptibilidade de liquefação, possibilidade de piping Maior segurança Compactação de todo o corpo da barragem Podem-se misturar os estéreis da lavra Necessidade de grandes quantidades de grossos de ciclonagem (problema nas 1ªs etapas) Deslocamento do talude de jusante (proteção superficial só no final da construção) Flexibilidade do volume de grossos de ciclone necessário com relação ao metodo de jusante Necessidade de sistemas de drenagem eficientes e sistemas de contenção a jusante Fonte: Adaptado de Boscov, 2008. 5 Para o lançamento hidráulico dos rejeitos são normalmente utilizados sistemas de canhões e hidrociclones. No descarregamento com canhões as partículas separam-se na própria praia em função das características do rejeito, velocidade de descarga e concentração, ao passo que com os hidrociclones os rejeitos sofrem uma separação granulométrica antes de serem descarregados. A prática da ciclonagem é a mais comum, porém ela apresenta alguns problemas como por exemplo, rejeitos com partículas de diferentes densidades poderão influenciar a separação dando como resultado um underflow de partículas finas mas com alta densidade. Este tipo de problema é comum acontecer na ciclonagem dos rejeitos de minério de ferro. Estes rejeitos apresentam este comportamento no lançamento hidráulico motivados pela segregação hidráulica, que proporciona uma diferenciação granulométrica das partículas em função da forma, tamanho e densidade, formando zonas com propriedades geotécnicas diferentes. Por essa razão, podem existir na barragem regiões com alta concentração de partículas de ferro. Como já foi referido, os rejeitos de minério de ferro apresentam propriedades, como a alta permeabilidade e baixa compressibilidade, que lhes garantem um processo de sedimentação e adensamento em curto espaço de tempo, sendo do ponto de vista geotécnico os rejeitos mais favoráveis ao uso. Antes do seu descarte, a polpa de rejeito, dependendo dos métodos de disposição, poderá passar por alguns processos como o espessamento ou deslamagem, filtragem e ciclonagem, visando a recuperação de maior quantidade de água, aproveitamento de algumas parcelas de rejeito e separação granulométrica das partículas. O pré - adensamento (pasting) das lamas (argilas) em silos antes da sua disposição na barragem, é uma das novas técnicas adotadas atualmente para polpas (rejeitos granulares) para a redução da quantidade de água nos rejeitos e facilitar a sua secagem por evaporação (figura 2). Esta técnica permite maior estabilidade da estrutura, facilita a recuperação ambiental e reduz o perigo de acidentes com deslizamentos. Figura 2 – Rejeitos apôs secagem por evaporação. (Araújo, 2006) Os rejeitos adensados ou pastas são fluidos homogéneos em que o processo de segregação granulométrica das partículas não acontece, e apresentam drenagem insignificante de água quando dispostos de forma suave em superfícies estáveis. A sua produção é feita por desaguamento dos rejeitos finos e a sua disposição, tanto em superfície, quanto em escavações subterrâneas, é feita de maneira a formarem superfícies com ligeira inclinação. 6 Os aparelhos mais indicados para produzir um underflow com a consistência de pastas, sem abusar do uso de floculantes são os espessadores de pastas, cujos procedimentos de seleção e dimensionamento não são os mesmos aplicados para espessadores de polpa. Com vista na redução de impacto ambiental, redução dos custos de disposição de rejeitos e melhor balanço hídrico, a MBR (Minerações Brasileiras Reunidas SA) criou o projeto pasting que consiste na disposição na cava exaurida da Mutuca dos estéreis e dos rejeitos adensados gerados pela mina de Capitão Xavier. O resultado do adensamento dos rejeitos mostrou-se satisfatório, proporcionando a possibilidade de recuperação aproximada das características topográficas da região da cava da Mutuca e minimizou a ocupação de áreas na superfície para implantação de novas barragens. A formação de pastas de rejeitos apresenta as seguintes vantagens (Ávila): Aumento do teor de sólidos o que implica maior capacidade do reservatório. O material resultante não provoca saturação do dique; O dique serve apenas de apoio da lama porque o risco de saturação é baixo; Os riscos para jusante são menores; Há maior facilidade de revegetação (figura 3). Figura 3 – Características das pastas depois de revegetadas. (Ávila) Considerações finais Como não são elementos geradores de receitas para as mineradoras, geralmente, ao tratamento, disposição e destino dos rejeitos, não é dada a devida importância, havendo por isso construções de barragens de rejeito sem projetos de engenharia. A disposição de rejeitos pode causar diversos impactos ao ambiente, como a poluição visual, causada pela alteração da paisagem natural, contaminação de águas subterrâneas e superficiais, contaminação do ar, assoreamento de cursos de água etc. E estes impactos podem se agravar em função do tipo de disposição que for adotado e do não cumprimento dos requisitos básicos de segurança e controle ambiental. 7 Como se referiu neste trabalho, os rejeitos de minério de ferro apresentam propriedades que favorecem a sua disposição por aterro hidráulico, que é uma das técnicas mais empregada no descarte de rejeitos. Mas o adensamento ou pasting dos rejeitos é consideravelmente mais vantajoso que as disposições convencionais. O adensamento permite que a determinada percentagem de sólidos, não se forme segregação das partículas, resultando em ângulos de deposição mais altos que permitem comportar maiores volumes de material disposto. Além disso, as pastas secam por evaporação propiciando a formação de solo compacto mais rápido, o que facilita a recuperação ambiental. Bibliografia Araújo, C. B. “Contribuição ao Estudo do Comportamento de Barragens de Rejeito de Mineração de Ferro”. Dissertação de Mestrado. Departamento de Engenharia Civil, Universidade Federal do Rio de Janeiro COPPE/UFRJ. Rio de Janeiro, 2006. Ávila, J.P. “Disposição de rejeitos em Porto de Trombetas”. Pimenta de Avila Consultoria Ltda. Boscov, M. E. G. “Geotecnia Ambiental”. São Paulo: Oficina de Textos, 2008. p. 185-207. Carcebo, F.J, Fernandes, L.V, Jimeno, C.p e colaboradores. “Manual de Reaturacion de terrenos y evaluación de impactos ambientales em Mineria”. Inst. Tec. Geominero de Espanã. 2ª Edicion. Madrid, 1989. 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