8º Congresso de Pós-Graduação A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NA UNIVERSIDADE:ALGUMAS REFLEXÕES Autor(es) ELIANE MARIA DE ALMEIDA FERNANDES Orientador(es) CLEITON DE OLIVEIRA 1. Introdução Introdução O presente texto tem por objetivo realizar uma sucinta e modesta reflexão acerca da produção de conhecimento na universidade e a sua função social. Para abordar este tema e para os fins deste trabalho, parte-se da premissa de que a universidade - enquanto instância mediadora de Educação - deva ser entendida como instituição coletiva, seja de natureza pública ou privada e, assim sendo, goze de autonomia estatutária, administrativa, financeira, científica, pedagógica, disciplinar, cultural e patrimonial, obviamente, em termos legais, sob a perspectiva democrática. 2. Objetivos A relevância do estudo desta temática está, de certo modo, relacionada às indagações e inquietações que permeiam o cenário educacional em nossos dias, onde professores e pesquisadores, buscando dar sentido e rever continuamente a sua atuação profissional, em sendo e fazendo no cotidiano da prática docente - seja na universidade ou na escola - em muitos momentos se angustiam, por refletir e sentir que aquela instituição educativa não corresponde aos anseios dos indivíduos e nem às necessidades da sociedade, mas que, ainda assim, as suas práticas, por vezes, acabam por reforçá-la. 3. Desenvolvimento Ao longo da história, na consecução de sua missão e de seus fins, a universidade se apresenta como centro de criação, transmissão e difusão da cultura, da ciência e da tecnologia através da articulação entre a pesquisa, a docência e o estudo, se integrando à vida da sociedade em permanente interlocução com esta. Nesta perspectiva, além da realização de ciclos de estudos visando à concessão de graus e títulos - acadêmicos e honoríficos -, e à atribuição de outros certificados e diplomas, bem como a certificação de equivalências, a creditação de competências e o reconhecimento de graus e habilitações acadêmicas podem-se, também, admitir outros possíveis fins da universidade. As pesquisas e a revisão de literatura sobre a educação superior revelam, dentre outros, alguns aspectos pertinentes à produção de conhecimento na universidade através da investigação científica e da criação cultural, envolvendo a descoberta, a aquisição e o desenvolvimento de saberes, de artes e de práticas, em nível avançado, sob o exercício constante da investigação e da atitude de problematização crítica. O processo democrático ocorrido nos últimos tempos e as mudanças legislativas decorrentes do mesmo está a exigir um redirecionamento estratégico da política educacional latino - americana, alertando para a necessidade de se refletir sobre a política e a gestão da educação e a sua relação com a sociedade. Nas duas últimas décadas, tem feito parte das agendas de discussão nacional e internacional a necessidade de redefinição do papel e das funções do Estado. As relações entre os entes sociais, políticos, econômicos e culturais tanto se transformaram que as formas de intervenção governamental já não são eficazes e, também, não atendem aos anseios da população. Isto se deve mais às transformações vividas pela sociedade, que, em função de inúmeros fatores associados, aponta com urgência para uma mudança no foco de sua existência. Desde 1990, de acordo com os dados do IBGE, o perfil de distribuição de renda que se delineia para o Brasil – em que os 10% mais ricos se apropriam de quase a metade (48%) do total de rendimentos –, inscreve-se, certamente, como um dos mais perversos, senão o mais, em qualquer comparação que se estabeleça.1 No bojo desta discussão, a necessidade de se implantar nas instituições mediadoras de educação uma cultura contra a exclusão e a favor dos direitos sociais, nos sinaliza com a possibilidade da politização, que, por conseguinte, resultará da capacidade das instituições se organizarem e da realização do debate contínuo em seus interiores. Enfim, uma educação que propicie condições para a democratização da sociedade, contribuindo para oportunizar uma cidadania plena e efetiva em prol de um projeto político de nação, um querer viver coletivo. Percebe-se que, no campo político, a consolidação da democracia se faz premente e, segundo Bobbio (1989), isto implica em, pelo menos, dois compromissos: o desenvolvimento do regime de liberdade e o desenvolvimento da vontade igualitária para reduzir as desigualdades sociais. Desta forma, a finalidade é superar a exclusão social agravada pela globalização, com o objetivo de buscar o bem-estar da coletividade através do aperfeiçoamento das instituições democráticas - dentre as quais as universidades consubstanciadas em novas formas de participação e cidadania, em prol de uma cultura harmônica e de uma nação que mantenha a sua sustentabilidade. Tais inquietações sugerem a existência de uma sociedade que clama por instituições distintas das atuais para atender as suas necessidades, o que significa repensar o Estado, o Governo e, entre outras instituições, a Escola e a Universidade. No Brasil, em sua 59ª reunião, realizada em julho de 2007, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) lançou um manifesto em defesa da universidade pública e da produção do conhecimento comprometido com a sociedade, alegando que nos últimos anos, diversas ações governamentais mudaram significativamente as condições da pesquisa científica brasileira. Neste documento, usando como justificativas “uma histórica carência crônica de recursos, uma participação tímida no cenário mundial, um pouco envolvimento da pesquisa com a sociedade e o fato desta estar restrita aos ambientes acadêmicos e institutos de pesquisa públicos,” critica-se os últimos governos por programarem as medidas de leis de patentes, a lei de inovação tecnológica, os fundos setoriais, as novas metodologias de avaliação da pós-graduação pela CAPES, entre outras mudanças. No que se refere à expansão da pesquisa científica e tecnológica, tanto em termos de localização quanto em volume de recursos distribuídos, o manifesto considera que tais medidas reforçaram as desigualdades existentes e pioraram as condições de trabalho, ao invés de alavancar a pesquisa na universidade, pois, esta tem sido direcionada ao mercado e não às demandas da sociedade, em função do poder de decisão do mercado sobre a destinação dos recursos. Nesse sentido, a precarização do trabalho dos docentes e dos pesquisadores se dá à medida que ambos são instigados a se transformarem em empreendedores do conhecimento e, assim, passam a focar suas ações em trabalhos que tenham relevância mercantil na forma de patentes e de produtos. Esse cenário de incertezas, de certo modo, entra em conflito com a postura investigativa permanente que deve nortear o trabalho pedagógico na universidade, pois compromete a construção do conhecimento, tanto em relação ao ensino por parte dos professores quanto em relação à aprendizagem dos alunos, já que não valoriza a pesquisa como prática mediadora na educação que a universidade se propõe a oferecer. Ao longo da história, em que pesem a retórica pedagógica e o discurso da classe política, enaltecendo a educação e a grandeza das nações que nela apostaram como o caminho para o desenvolvimento, há que se considerar o descaso das elites governantes com a educação dirigida aos que dela mais necessitam. Assim sendo, somente, se pensando a universidade comprometida com a democracia e vice-versa, será possível proporcionar as condições para o exercício da liberdade de criação científica, artística, tecnológica e de expressão cultural, que assegure a pluralidade de concepções de mundo, garantindo a representatividade dos distintos segmentos universitários na vida acadêmica comum. Trata-se de pensar a autonomia universitária, segundo regulamento próprio de cada universidade, em termos de leis e de estatutos, referenciando os valores e princípios da vida acadêmica, sobretudo, a independência, o rigor, a honestidade intelectual, a responsabilidade, a ética e o respeito pela vida humana. 4. Resultado e Discussão Ao se abordar o conhecimento como processo de construção dos objetos e em sua condição de historicidade, pode-se verificar a importância da pesquisa e a decorrente postura investigativa para a relevância da prática pedagógica na apropriação e sistematização do objeto de estudo, em termos de ensino e de aprendizagem. De tal modo, a atividade de pesquisa aliada ao processo de construção e de produção de conhecimento pressupõe a escolha de uma metodologia, que, por si só, guarda pertinência com as peculiaridades do objeto e com os pressupostos do campo epistemológico, ou seja, assume relevância no modo como se concebe a relação sujeito/objeto. Sob esse aspecto, fazer ciência não se restringe ao uso de métodos e técnicas adequados, mas, ao modo como se aborda e se trata os fenômenos e seus paradigmas epistemológicos, tanto nas Ciências Naturais como nas Ciências Humanas. Na universidade, essa postura exige do praticante da ciência em seu cotidiano, uma dedicação intensa à construção do saber, pois, este é resultado de uma longa trajetória no campo epistemológico, respeitadas as dimensões pedagógica e social, onde a percepção do objeto decorre de uma práxis histórica e social e não se confunde com o acúmulo de informações tão-somente. Nesse sentido, embora a prática docente na universidade seja indissociável da pesquisa, seu desenvolvimento é incompatível com as novas medidas adotada para a flexibilização do trabalho docente. As recentes políticas públicas de educação superior, sob uma ótica mais quantitativa do que qualitativa, - como o PROUNI, o ENADE, a Lei de Inovação Tecnológica, a Lei de Parcerias Público-Privadas – em que pesem as suas contribuições, vêm associadas ao caos da escassez de recursos e às precárias condições de trabalho dos docentes. Certamente, isto acaba por comprometer a indissociabilidade outrora existente entre ensino, pesquisa e extensão, deteriorando a vida e o trabalho na universidade. 5. Considerações Finais Se a universidade é um dos lugares de produção de conhecimento e, se este se torna significativo e relevante ao modelo de desenvolvimento que a sociedade quer para si, urge responsabilizar e cobrar o Estado que não assume essa outra racionalidade, mas, ao contrário, se constrói sob uma perspectiva capitalista, na lógica de uma dinâmica econômica implacável, cujo valor maior é a acumulação e o lucro. Um pressuposto deste estudo é que o debate sobre a gestão democrática das instituições educativas precisa vincular-se ao debate nacional sobre educação, já que neste contexto existem propostas múltiplas e, por vezes, antagônicas. Dentre estas, propostas com ênfase na construção da cidadania emancipatória e outras a serviço do mercado globalizado, produtivista. Esse debate inclui em sua construção sujeitos históricos conscientes dos direitos negados e se permeia pelas contradições que se manifestam em uma determinada conjuntura política, econômica e social. Os investimentos em educação, quando priorizados, representam fator relevante ao desenvolvimento social, político e econômico de um país, pois sinalizam que existe uma preocupação com o presente e o futuro, tendo como pressupostos a formação de um quadro de dirigentes e a produção de conhecimento que possa ser socializado. Entretanto, isto não basta; há que se rever a produção de conhecimento intelectual e tecnológico, desde, que estes tenham, também, relevância social e contribuam para a quebra dos sucessivos diagnósticos de desigualdade profunda no Brasil. Talvez, assim, a universidade enquanto espaço prioritário de pesquisa possa exigir do Estado e da sociedade uma política de pesquisa e, juntos, Estado, sociedade e universidade possam debater e planejar, enfim, executar um projeto de país. Referências Bibliográficas REFERÊNCIAS BOBBIO, Norberto. O Futuro da Democracia. 8.ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 2002. p. 31 _________.O Futuro da Democracia: uma defesa das regras do jogo. 4. ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1989. _________.Dicionário de Política. Brasília: Editora Universidade de Brasília, São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, 12ªed., 2002. p.324 BOURDIEU, Pierre. (Org.) A Miséria do Mundo. Petrópolis: Editora Vozes, 1997. _________.O Poder Simbólico. Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil, 1989. p.18-24. _________.Questões de Sociologia. Rio de Janeiro: Editora Marco Zero, 1983. __________. Razões Práticas: sobre a teoria da ação. Campinas: Papirus, 1996. (Apêndice 2: A dupla ruptura, p. 83-89) BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Diário Oficial da União, nº191-A, de 5 de outubro de 1988. FERNANDES, Eliane Maria de Almeida. Democratização da Gestão Escolar: Limites e Possibilidades na Proposta de uma Política Pública para as Escolas da Rede Estadual de Ensino do Rio de Janeiro. 2004. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, RJ, 2004. GANDINI, Raquel Pereira C. Anotações sobre a produção do conhecimento e a inserção de pesquisadores em educação no “modelo neoliberal”: questões de método. Comunicações, Ano 10, n.1, jul 2003, p. 53-67. GOERGEN, Pedro. Universidade e responsabilidade social. In: Lombardi, José C. (Org.) Temas de pesquisa em educação. Campinas; Autores Associados, 2003. NUNES, Eduardo Pereira. Vou te contar: a revista do censo 2000. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Centro de Documentação e Disseminação da Informação (CDDI) n.10, ago/2003. SEVERINO, Antônio J. Educação, sujeito e história. São Paulo: Olho d´Água, 2001.