Departamento de História INTELECTUAIS E A CONSTITUIÇÃO DE UM NOVO VOCABULÁRIO POLÍTICO NA AMÉRICA IBÉRICA NO SÉCULO XIX Alunas: Carolina Jardim, Nayara Fernandes Coelho e Jessik Beatris dos Santos Orientadora: Maria Elisa Noronha de Sá Introdução Este projeto de pesquisa insere-se no âmbito da história intelectual e tem como tema geral o estudo comparativo entre o pensamento de alguns intelectuais considerados autores e atores privilegiados nos processos de independência e na construção dos estados nacionais na América Ibérica ao longo do século XIX. Analisaremos como determinadas ideias, palavras e conceitos foram criados e/ou resignificados neste momento de construção de novas identidades nacionais e continentais, constituindo um novo vocabulário político no mundo ibero-americano. Um vocabulário em boa medida comum ao mundo atlântico, mas que apresenta historicamente, em função das circunstâncias políticas e sociais peculiares de cada área e de cada país, modalidades às vezes fortemente diversas de entender as práticas, categorias e instituições da vida política. Para tanto, é necessário atentar para a evolução semântica dos conceitos levando em conta as circunstâncias políticas e sociais peculiares de cada contexto na medida em que estes conceitos se constituíam, a um só tempo, em indicadores e fatores de determinadas experiências históricas. Pretende-se centrar nas primeiras décadas do século XIX, ou seja, no momento das emancipações políticas, das revoluções e movimentos de independência, e das primeiras experiências de construção de estados nacionais. O objetivo é empreender uma análise comparativa das trajetórias e discursos de alguns dos principais intelectuais que participaram destes processos, mais especificamente na Argentina e no Brasil, como Mariano Moreno, Bernardo de Monteagudo, Manuel Belgrano, Juan Martín de Pueyrredón, José Bonifácio de Andrada e Silva, Frei Caneca, Hipólito José da Costa, José da Silva Lisboa, Silvestre Pinheiro Ferreira, entre outros. Trata-se aqui de investigar a história de alguns conceitos políticos chave neste período, tais como: liberdade, ordem, pátria, revolução, soberania, progresso, nação, monarquia, república, democracia, centralização, descentralização, federalismo, liberalismo, civilização, história, Estado. Objetivos O objetivo mais amplo deste projeto é analisar como determinados conceitos políticos foram criados e/ou resignificados nas primeiras décadas do século XIX, constituindo um novo vocabulário político no mundo ibero-americano, especialmente na Argentina e no Brasil. Isto será feito por meio de uma análise comparativa das trajetórias e discursos de alguns dos principais intelectuais que participaram dos processos de independência e das primeiras experiências de construção desses estados nacionais. Estes objetivos mais gerais se desdobram em outros objetivos específicos, dentre os quais destaca-se: a) refinar e precisar de um modo mais exato a figura do “letrado patriota” dentro da história dos intelectuais latino-americanos; b) investigar a história e os diversos significados de alguns conceitos políticos neste período, como: revolução, soberania, liberdade, independência, monarquia, república, civilização, barbárie, nação, ordem, desordem, centralização, descentralização, federalismo; c) estabelecer conexões e correlações entre determinados acontecimentos sociais, políticos e culturais, e as mudanças, permanências Departamento de História e inovações nos significados ou na valoração dos conceitos em questão; d) Reconhecer a especificidade dos novos vocabulários políticos constituídos nas Américas. Metodologia Ao definir o conjunto de perspectivas teóricas e metodológicas da pesquisa na esfera da história intelectual, propõe-se refletir sobre as relações entre idéias e história na construção de certo tipo de conhecimento histórico fundamentado na relação entre história das idéias e história social. No debate contemporâneo acerca do fazer história intelectual, dois enfoques ou tradições historiográficas têm se destacado no estudo da história do pensamento político e social: o contextualismo lingüístico da Escola de Cambridge, representado principalmente por Quentin Skinner e John Pocock e a história conceitual alemã, representada por Reinhart Koselleck. Destacam-se estas perspectivas como horizontes possíveis para permear as reflexões, procurando estabelecer na pesquisa uma possível aproximação entre as duas visões. Conclusão Utilizando-se do conceito de letrado patriota como aquele que pensava a sociedade com autonomia em relação à Igreja ou à Coroa e que se considerava legitimado para falar em nome de sua “pátria”, escolheu-se, inicialmente, três intelectuais que viveram em um contexto de indefinição política e que se posicionaram publicamente para defender suas ideias de pátria. No Brasil, José Bonifácio de Andrada e Frei Joaquim do Amor Divino Rabelo, conhecido como Frei Caneca. Na Argentina, Bernardino Rivadavia. Rivadavia implantou uma série de reformas: política, cultural, econômica, social e urbana. A prioridade era aprimorar a estrutura político e administrativa herdada da colônia, garantindo uma ordem política estável e legítima. Procurava construir um Estado moderno e liberal, tendo como modelo a Inglaterra. As reformas se baseavam na liberdade política, na garantia da propriedade privada e na incorporação da Argentina ao mercado mundial. Sofreu forte influência das filosofias de Jeremy Bentham e de Benjamin Constant. José Bonifácio participou intensamente na política no Brasil. Com a inflexibilidade das cortes, transforma-se em defensor da independência, adversário do absolutismo e adepto da Monarquia Constitucional. Em vários jornais e publicações da época escreveu diversas de suas propostas e ideias que formariam o seu projeto nacional. Por outro lado, Frei Caneca tinha uma outra concepção de pátria nacional, uma que não fosse necessariamente centrada no Rio de Janeiro e que tratasse igualmente portugueses e pernambucanos. Primeiramente, lutava pela autonomia da Província de Pernambuco, não falava em ruptura. A Confederação do Equador, de 1824, da qual Frei Caneca participou fortemente, foi uma reação à outorga da Constituição por D. Pedro I. Surgiu, então, a idéia de ruptura. Assim, José Bonifácio e Frei Caneca representam posições políticas opostas e conflitantes, provando que não havia apenas uma possibilidade de organização política e uma definição de pátria nacional. Referências CANECA, frei Joaquim do Amor Divino e MELLO, Evaldo Cabral de Mello. Frei Joaquim do Amor Divino Caneca. São Paulo: Ed. 34, 2001. GOLDMAN, Noemí. Nueva Historia Argentina. Vol.3. Buenos Aires: Sudamericana, 1998 MYERS, Jorge. “El letrado patriota: los hombres de letras hipanoamericanos en la encrucijada del colapso del imperio español en América”. In: ALTAMIRANO, Carlos (dir.). História de los intelectuales en América Latina. Buenos Aires: KATZ editores, 2008. SILVA, José Bonifácio de Andrada e; CALDEIRA, Jorge. José Bonifácio de Andrada e Silva. São Paulo: Ed. 34, 2002.