Fundações privadas nas universidades públicas
Lafaiete Neves
A recente decisão do TCU de condenar o Reitor da Universidade Federal do (UFPR) a pagar R$15
mil, pelo fato de a UFPR não cumprir 18 das 24 determinações proferidas pelo Tribunal de Contas da
União (TCU), tem uma importância fundamental para o conjunto das universidades públicas brasileiras.
É a primeira vez que um julgamento do TCU condena uma universidade pública pela utilização de
fundações privadas para executarem atividades que são próprias de uma instituição pública. Essa prática,
iniciada no final da década de 1970, foi uma forma encontrada pelas universidades para “agilizarem” os
procedimentos administrativos e se livrarem dos procedimentos licitatórios. Isso porque os reitores, numa
falsa interpretação da lei de licitações, afirmavam que ela emperrava a administração pública.
Esse falso argumento, que perdurou por mais de duas décadas, agora acaba de ser condenado.
Na verdade, a lei de licitações permite que se crie uma comissão interna em cada órgão público para
agilizar os processos licitatórios, porém as reitorias preferiram o caminho “mais fácil”, via fundações
privadas. O mais contraditório é que, para facilitar os procedimentos administrativos, criaram fundações
privadas para fazerem convênios com um ente público.
Essas fundações acabaram ganhando mais poder que a própria administração das universidades,
inclusive, tendo pelos convênios o poder de administrar os recursos públicos, tanto orçamentários como
de verbas dos órgãos financiadores de pesquisa e, o mais grave, podendo oferecer, como se fosse uma
universidade privada, cursos de especialização pagos, ferindo, frontalmente, o artigo 208 da Constituição
Federal, que proíbe expressamente a cobrança de anuidade em estabelecimentos públicos de ensino.
As Associações de Professores das Universidades Públicas vêm, há muito tempo, denunciando, no
Ministério Público, esse desvio de recursos públicos via fundações privadas, no interior das universidades
públicas. Essas fundações funcionam em instalações das universidades, com professores cedidos pela
instituição, utilizam espaços físicos das instituições federais de ensino superior para ministrarem cursos
pagos, gastos inerentes a essas atividades, cobertos pelas universidades, e ainda cobram uma taxa de
administração e remuneram muito bem seus diretores.
A decisão do TCU determina o fim dessas ações das fundações nas instituições públicas de ensino
superior, proibindo que se envolvam com o vestibular, com os cursos de especialização pagos, com a
contratação de pessoal sem concurso público, ferindo a Constituição Federal de 1988. Também irá contribuir
para que o Ministério Público Federal e Estadual abra ações judiciais contra essa violação dos princípios
constitucionais, perpetradas pelas fundações nas instituições federais e estaduais de ensino superior.
Nesse aspecto, há um conflito de interesses que pode ocorrer e precisa ser resolvido para favorecer a
ação independentemente do Ministério Público. Trata-se de casos em que procuradores são também
professores das instituições públicas de ensino superior e, muitas vezes, com a responsabilidade sobre
processos que envolvem as universidades.
Serve ainda como alerta aos professores que são do regime de dedicação exclusiva e estão envolvidos
com cursos de especialização pagos, ministrados nas próprias instituições onde trabalham. O TCU deixa claro
que há uma irregularidade em receber duplamente, já que os professores têm um contrato de dedicação
Vitrine da Conjuntura, Curitiba, v.2, n.1, março 2009
1
exclusiva com a Instituição. Essa decisão pode, no futuro, trazer sérios problemas aos professores que estão
nessa situação, possibilitando, inclusive, serem penalizados e terem de restituir com juros e correção o que
receberam por ministrarem cursos pagos. Abre também possibilidade aos alunos que pagaram por esses
cursos, via fundações privadas, de, judicialmente, reaverem o que pagaram.
As universidades podem até recorrer, mas, dificilmente, ganharão essa causa, pois, há muito
tempo, o TCU tem alertado os reitores sobre essas irregularidades e, como os reitores não levaram a
sério, agora, o TCU julgou e condenou essa prática. Atitude que merece ser reconhecida como uma
grande decisão, a qual vem fortalecer o ensino superior público e dar um basta à privatização, que está
tomando conta da sociedade brasileira.
Vitrine da Conjuntura, Curitiba, v.2, n.1, março 2009
2
Download

Fundações privadas nas universidades públicas - Lafaiete