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GATUNAGENS, DELAÇÕES E
TRANSPARÊNCIA
Ricardo Vélez Rodríguez
Coordenador do Centro de Pesquisas Estratégicas “Paulino Soares de
Sousa”, da UFJF. Membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.
Professor Emérito da ECEME, Rio de Janeiro.
[email protected]
Nestes momentos de delação premiada convém lembrar o pano
de fundo cultural em que todo este affaire do Petrolão se desenvolve:
a ética da esperteza que levou corruptores e corruptos a se
considerarem superiores ao resto dos cidadãos deste país. Explico:
tanto políticos corruptores como empresários corruptos pensaram que
ganhariam uma bolada na surdina, gerindo a coisa pública como se
fosse patrimônio de família, sem que ninguém lhes cobrasse nada.
Tudo correu na santa paz de Deus até que o corajoso juiz federal
Sérgio Moro decidiu apertar o pescoço dos gatunos com uma simples
providência: aplicar a lei da delação premiada. Aí foi quando
empresários, funcionários corruptos da Petrobrás e doleiros, pegos
com a mão na massa, decidiram cantar verdades nada abonadoras
para si próprios e para os corruptores instalados na cúpula do poder.
Empresários e diretores de empreiteiras que foram conduzidos
ao xilindró, dizem a verdade quando denunciam que foram
extorquidos por funcionários corruptos da estatal, a mando de
políticos safados que pretendiam garantir a hegemonia partidária,
comprando todo mundo com os dinheiros desviados. Donos e
funcionários de empreiteiras com o rabo preso foram, sim,
chantageados. Claro que são culpados pelo fato de terem agido fora
da lei.
Mas esse fato não pode esconder que, por cima deles, estão os
políticos corruptores que ofereceram vantagens para que fossem
desviados recursos da estatal, mediante engenhosa triangulação que
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visava a esconder os larápios, a fim de os políticos garantirem a
caixinha de praxe. Muito político corruptor vai aparecer nas próximas
semanas tentando minimizar a sua culpa, alegando que os
corruptores foram os empresários e funcionários das empreiteiras. Na
realidade, estes foram as primeiras vítimas dos desvios de conduta
dos militantes partidários.
A sociedade e os seus defensores, hoje identificados com o
bravo juiz federal e com os probos funcionários do Ministério Público,
encarregar-se-ão de colocar tudo em pratos limpos. Os larápios do
Estado e os espertos das empreiteiras que decidiram fazer o jogo dos
corruptos não perdem por esperar: o peso da lei e da justiça cairá
sobre todos eles. Os cidadãos deste país, que pagamos impostos
extorsivos esperamos que, graças aos retos funcionários públicos que
defendem ainda os interesses da Nação, conduzam aos tribunais
todos os que transgrediram a lei no caso do Petrolão.
E esperamos, também, que os juízes apliquem penas
proporcionais aos delitos cometidos. Até agora, o que se observou
(no julgamento do primeiro Mensalão) é que os políticos corruptores,
pegos com a boca na botija, receberam penas bem mais benignas do
que os empresários corruptos que se deixaram cooptar por aqueles.
Valha a oportunidade para lembrarmos a essência do Estado
Patrimonial, que estimula todos estes desvios. Segundo ensinava Max
Weber em Economia e sociedade, tal Estado surge a partir da
hipertrofia de um poder patriarcal original, que alarga a sua
dominação
doméstica
sobre
territórios,
pessoas
e
coisas
extrapatrimoniais, passando a administrá-los como propriedade
familiar (patrimonial). Consiste, portanto, o Patrimonialismo na
privatização do governo e do Estado por um indivíduo e os seus
colaboradores, que passam a geri-lo tudo (a Res Publica) como Res
Privata (ou coisa nossa). É uma forma mafiosa de poder.
O relacionamento de tal Estado com a sociedade se dá
mediante cooptação. Este é o primeiro ato de corrupção. Depois vêm
os dossiês falsos, o assassinato de reputações e de pessoas e todo
esse carnaval de mentiras a que estamos assistindo. No caso do
desenrolar do atual affaire do Petrolão, as empreiteiras foram
chantageadas pelos agentes públicos em nome do governo petralha e
asseclas. Quem é o maior culpado? Está claro que os principais
culpados se escondem na cúpula do poder. Os que se deixaram
cooptar, tendo sido chantageados, também são culpados. Mas em
grau menor do que o principal corruptor, o Estado privatizado pela
petralhada e aliados.
Acontece que, quando são julgados os bandidos, os cooptados
pegam 40 e tantos anos de prisão (como Marcos Valério, aquele do
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primeiro Mensalão) e os chefes políticos pegam prisão domiciliar. Dois
pesos e duas medidas! Que paguem todos os implicados no Petrolão,
de acordo com o tamanho da sua culpa. Só assim se começará a
fazer justiça e a dar uma resposta justa à sociedade brasileira.
Estou em Lisboa participando de um colóquio luso-brasileiro de
Filosofia. O affaire da vez no cenário político português, é o da venda
de vistos preferenciais para entrada no país ("visos gold"), que
garantia comissões fraudulentas para uma dúzia de funcionários
corruptos. Na terça feira passada, um dia após a denúncia do caso, o
Ministro da Administração Interna e o seu mais estreito colaborador
na concessão de vistos se demitiram, alegando que não poderiam
ficar na função após a quebra da confiança pública ensejada
pelo affaire.
Como seria bom se, no Brasil, o Ministro das Minas e Energia e
a Presidente da Petrobrás tomassem decisão semelhante, a fim de
despejar o terreno para que a opinião pública tome conhecimento
adequado da reação do governo em face do Petrolão!
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