GABINETE DE ESTUDOS
Da obrigatoriedade de adesão
ao serviço público de caixa postal
eletrónica
Caixa postal eletrónica: há demasiadas dúvidas para que alguém adira, conscientemente,
sem esclarecimentos ou disposições legislativas, a um serviço público que supostamente é de
adesão obrigatória.
Por Manuel Faustino* | Artigo recebido em julho de 2012
N
o primeiro quadrimestre do
ano em curso, com um zelo
porventura excessivo, mas
que tem de sublinhar-se, muitos
contribuintes portugueses foram recorrentemente ‘convidados’ por órgãos da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), desde o diretor-geral ao
chefe do seu serviço de Finanças, a
proceder à abertura da caixa postal
eletrónica, a fim de para aí passarem a ser endereçadas, presume-se,
as comunicações que lhes devam
ser efetuadas no âmbito e com fundamento tributário, quer tenham a
natureza de notificação quer tenham
a natureza de citação e, porventura,
outro tipo de correspondência. Pessoalmente, se não nos enganámos no
inventário adrede organizado, fomos
por nove vezes em comunicação virtual e uma vez em comunicação em
suporte de papel, lembrados do dever
de «aderir» ao serviço de notificações eletrónicas, com fundamento
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em que, desde janeiro de 2012, a Autoridade Tributária e Aduaneira passara a fazer notificações eletrónicas,
esse meio de notificação tinha passado a ser obrigatório para todos os
sujeitos passivos do IRC e do IVA e o
artigo 19.º da Lei Geral Tributária havia sido alterado no sentido de a caixa
postal eletrónica passar a integrar o
domicílio fiscal dos contribuintes.
Não temos por hábito consciente violar a lei em geral e a lei fiscal em particular. Porém, talvez por deformação
profissional, tentamos, na medida
em que as nossas capacidades no-lo
permitem, compreender o como e o
porquê de ter de a cumprir, sobretudo quando, como no caso, consideramos estar perante uma lei intrusiva,
invasiva da esfera de privacidade dos
cidadãos, na sua dimensão de contribuintes ou de sujeitos passivos de
impostos ou de outras obrigações tributárias. Com efeito, como antes se
referiu, o legislador decidiu, por ato
legislativo que se reconhece caber
nas suas competências, que a caixa postal eletrónica passará a fazer
parte, o mesmo é dizer que passará a
integrar, «será constitutiva» do seu
domicílio fiscal. Esta imposição legislativa vem acrescentar ao domicílio fiscal, desde sempre configurado
como um lugar exclusivamente físico
e material, principalmente em respeitando a pessoas singulares, uma
inusitada e nunca sonhada dimensão de imaterialidade que o coloca
ao nível de uma espécie de «paradeiro», como que transpondo para o
homem uma propriedade, a da omnipresença, que até há pouco tempo
se julgava exclusiva de Deus, e sobre
cujas próprias consequências gerais
o Direito muito pouco tem avançado,
nomeadamente em termos de positivação.1 Com a caixa postal eletrónica,
os contribuintes passam, como Deus,
a estar em toda a parte, ainda que, ao
contrário dele, não sejam imensos!
GABINETE DE ESTUDOS
Considerámos, pois, que a aderir à
caixa postal eletrónica, o deveríamos fazer de uma forma consciente
e informada. Tentámos, pois, pelo
menos, e em nosso critério, com a
diligência de um bonus pater familiae,
saber e conhecer sobre o regime jurídico do «serviço público de caixa
postal eletrónica» a que a lei fiscal,
segundo se nos afigura, subordina a
agregação ou integração constitutiva
daquela ao domicílio fiscal da pessoa. Fizemo-lo, obviamente, como
se reconhecerá, e do que se não duvidará, por honestas e aceitáveis razões de certeza e segurança jurídicas,
ou, em linguagem mais popular que
pedimos seja relevada, para ficarmos a «saber as linhas com que nos
cosemos». Antecipamos que não temos prazer nenhum em ter chegado,
nesta matéria, às conclusões a que
chegámos, nomeadamente porque,
em caso algum, somos contrários à
evolução dos métodos e procedimen-
tos de atuação da AT e, muito menos, nos opomos à utilização das
novas tecnologias e à potenciação da eficácia e da eficiência da
sua ação. Tudo isto, porém, num
quadro de legalidade e de regras
jurídicas o mais possível simples
e inteligíveis, transparentes e que
garantam, de modo equilibrado,
o cumprimento dos deveres, mas
também o exercício dos direitos
associados, sobretudo tratando-se, como se trata, de matérias
que, além de se situarem ao nível
da esfera da privacidade da pessoa humana, interferem igualmente com a dimensão garantística do regime jurídico tributário.
As notificações eletrónicas
na lei tributária: antecedentes
O primeiro enquadramento
jurídico-tributário da notificação eletrónica - Foi no Código
de Procedimento e de Processo
Tributário (CPPT) que, pela primeira vez, constaram disposições relativas à suscetibilidade
de serem efetuadas «notificações eletrónicas», ou seja, notificações através de meios eletrónicos. Nos termos do n.º 8 do
artigo 38.º do CPPT, aprovado
pelo Dec.-Lei n.º 433/99, de 26
de outubro, «8 — As notificações referidas nos n.ºs 3 e 4 do
presente artigo poderão ser efetuadas, nos termos do número
anterior, por telefax ou via internet, quando a administração
tributária tenha conhecimento
da caixa de correio eletrónico
ou número de telefax do notificando e possa posteriormente
confirmar o conteúdo da mensagem e o momento em que foi
enviada». Ao mesmo tempo,
os n.ºs 6 e 7 do artigo 39.º do
mesmo diploma, dispunham:
«6 — Quando a notificação for
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efetuada por telefax ou via Internet,
presume-se que foi feita na data de
emissão, servindo de prova, respetivamente, a cópia do aviso de onde
conste a menção de que a mensagem
foi enviada com sucesso, bem como
a data, hora e número de telefax do
recetor ou o extrato da mensagem
efetuado pelo funcionário, o qual
será incluído no processo. 7 - A presunção referida no número anterior
poderá ser ilidida por informação
do operador sobre o conteúdo e data
da emissão.»
Desconhecendo-se o que tem acontecido à utilização do telefax como
instrumento ou via de notificação
de contribuintes, esta primeira
referência legislativa tributária à
suscetibilidade de serem efetuadas notificações através de caixa
de correio eletrónico peca, desde
logo, pela sua estanquidade, pois
omite qualquer referência à lei do
documento eletrónico e da assinatura eletrónica, já então em vigor
na ordem jurídica interna. Por outro lado, é objetivamente limitativa, uma vez que restringe a utilização da internet às notificações não
abrangidas pelo n.º 1 do artigo 38.º
do CPPT, ou seja, àquelas que não
devam ser obrigatoriamente efetuadas por carta registada com aviso
de receção e às relativas a liquidações de impostos periódicos, feitas
nos prazos previstos na lei. Posteriormente, e por força da redação
dada ao n.º 3 do artigo 38.º do CPPT
pela Lei n.º 55-B/2004, de 30 de dezembro, a lei passou a prever que
poderiam também ser notificadas
nos termos do n.º 8 do mesmo preceito as liquidações que resultassem
de declarações de contribuintes ou
de correções à matéria coletável que
tivessem sido objeto de notificação
para efeitos tributários. Pessoalmente, e não obstante termos dado
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conhecimento à AT de uma caixa
pessoal de correio eletrónico, nunca para ela foi remetida qualquer
daquelas referidas notificações que
continuaram a ser feitas em suporte de papel e cumprindo razoavelmente2 as restantes formalidades
legais. De onde se pode concluir que
não é o e-mail que muitos contribuintes disponibilizaram à Administração Tributária e Aduaneira, e
que ela mantém em base de dados,
ignorando-se se para o efeito dispõe ou não de autorização da entidade competente, uma vez que não
conhecemos qualquer norma que
imponha o fornecimento de e-mail
para efeitos tributários3, a «caixa de
correio eletrónico» agora em causa
para efeitos de receção de notificações eletrónicas.
Alterações preconizadas pela
Lei n.º 67-A/2007, de 31 de dezembro
A Lei n.º 67-A/2007, de 31 de dezembro, reequacionou, ao nível do
artigo 38.º do CPPT, a modalidade
das notificações eletrónicas. Com
efeito, eliminou do n.º 8 a referência
à notificação «pela internet, quando a administração fiscal tenha
conhecimento da caixa do correio
eletrónico», e acrescentou ao preceito os n.ºs 9 e 10, dispondo, respetivamente: «9 – As notificações
referidas no presente artigo podem,
ainda, ser efetuadas por transmissão eletrónica de dados, nos termos
a definir por portaria do Ministro
das Finanças»; «10 – As notificações efetuadas nos termos do número anterior equivalem, consoante os casos, à remessa por via postal
registada ou por via postal registada com aviso de receção, de acordo
com o disposto no n.º 3 do artigo 6.º
do Decreto-Lei n.º 290-D/99, de 2
de agosto.» Percebe-se, assim, que
a Lei n.º 67-A/2007 tenha deixado
inalterado o artigo 39.º do CPPT,
mormente no que dizia respeito
aos formalismos relativos às notificações. É que tais formalismos
decorriam diretamente da norma
para que o n.º 10 do artigo 38.º do
CPPT passava a remeter, ou seja, do
n.º 3 do artigo 36.º do Decreto-Lei
n.º 290-D/99, que não reservava
para o recetor das notificações uma
atitude meramente passiva, como
decorre da sua previsão legal: «A
comunicação do documento eletrónico, ao qual seja aposta assinatura
eletrónica qualificada, por meio de
telecomunicações que assegure a
efetiva receção equivale à remessa
por via postal registada e, se a receção for comprovada por mensagem
de confirmação dirigida ao remetente pelo destinatário que revista
idêntica forma, equivale à remessa
por via postal registada com aviso
de receção». Em relação ao anterior,
este novo regime:
− Alargava o âmbito da notificação
por transmissão eletrónica de dados a todas as notificações previstas
no artigo 38.º do CPPT;
− Mantinha-se a transmissão eletrónica de dados como um meio de
notificação facultativo;
− Baseava-se, jurídica e operacionalmente, no regime do documento
eletrónico e da assinatura eletrónica, consagrado no Decreto-Lei
n.º 290-D/99, sendo, neste sentido,
compreensivo, e exigindo, para as
notificações por via postal registada que, além da assinatura eletrónica qualificada a apor no documento de notificação, existisse uma
mensagem de confirmação do destinatário para o remetente, em caso
de notificação registada com aviso
de receção;
− Remetia-se ainda para uma Portaria do ministro das Finanças a
regulamentação a que obedeceriam
GABINETE DE ESTUDOS
A repetição da notificação por via eletrónica tem alguma
justificação substantiva, aporta alguma mais-valia
ao procedimento, uma vez que, materialmente,
a notificação inicial não se extraviou (...)?
as notificações eletrónicas em matéria tributária, sendo então razoável supor-se que seriam operacionalizadas no âmbito do sistema
informático da própria administração tributária.
As alterações introduzidas
pela Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril
Mais de dois anos se passaram sem
que se voltasse a ouvir falar em notificações eletrónicas. Em vão se
esperou, durante esse período, pela
Portaria do ministro das Finanças, por um lado e, por outro, pelo
anúncio do suporte (interno ou externo) que iria ser utilizado para o
efeito. Surgem na Lei n.º 3-B/2010,
de 28 de abril, a lei que aprovou o
Orçamento do Estado para 2010,
mais alterações legislativas com o
exclusivo objetivo de esvaziarem
os obstáculos jurídicos que se opunham ao processo em curso, abrangendo agora os artigos 38.º e 39.º do
CPPT.
Assim, ao nível do artigo 38.º do
CPPT:
− O n.º 9 que, como vimos, dispunha: «9 – As notificações referidas
no presente artigo podem, ainda,
ser efetuadas por transmissão eletrónica de dados, nos termos a definir por portaria do ministro das
Finanças» foi alterado, passando a
dispor: «9 – As notificações refe-
ridas no presente artigo podem ser
efetuadas por transmissão eletrónica de dados, que equivalem, consoante os casos, à remessa por via
postal registada ou por via postal
registada com aviso de receção»;
− E o n.º 10 que dispunha: «10 – As
notificações efetuadas nos termos do
número anterior equivalem, consoante os casos, à remessa por via postal registada ou por via postal registada com aviso de receção, de acordo
com o disposto no n.º 3 do artigo 6.º
do Decreto-Lei n.º 290-D/99, de 2 de
agosto» foi pura e simplesmente revogado.
Veja-se, pois, e denuncie-se, para
todos os efeitos, a forma aparentemente «hábil» de que o legislador
lança mãos para conseguir os seus
intentos sem dar muito nas vistas4:
no n.º 9 elimina, em primeiro lugar,
a referência à Portaria do ministro
das Finanças. É aceitável tal eliminação, se o modelo e o suporte das
notificações eletrónicas passarem
a ser um modelo comum a outras
notificações não tributárias e um
suporte externo à administração
tributária e que, portanto, tenha já
as suas regras definidas. Fica-nos,
porém, uma sensação de incompletude ao ler-se a norma e a locução «consoante os casos». Mas que
casos são esses? Ora, essa locução
constava do n.º 10 e o «consoante os
casos» ligava-se, na construção
do texto legal revogado, à expressão «de acordo com o disposto no
n.º 3 do artigo 6.º do Decreto-Lei
n.º 290-D/99, de 2 de agosto». Com
a revogação do n.º 10, a remissão
para esta norma deixa, naturalmente, de operar-se! Então, para
que serve a locução «consoante os
casos», qual o seu objetivo, que ratio
tem no n.º 9? Se tivermos em consideração o elemento histórico de
interpretação da lei e por muito que
custo aos literalistas da lei, o «consoante os casos» não pode deixar
de continuar a referir-se ao n.º 3 do
artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 290D/99, de 2 de agosto, a única norma
do ordenamento jurídico que opera
tal distinção! Parece-nos absolutamente óbvio! E o legislador fiscal
andou mal, muito mal, ao tentar
pregar esta rasteira e ao abrir mais
um alçapão fiscal5!
No artigo 39.º avançou-se igualmente no caminho do facilitismo
para a administração fiscal, sem
qualquer respeito pelas garantias
dos contribuintes. Foram, pois,
intercalados os atuais n.ºs 9 e 10 do
preceito, com a seguinte redação
originária:
− «9 – As notificações efetuadas por
transmissão eletrónica de dados
consideram-se feitas no momento
em que o destinatário aceda à caixa
postal eletrónica»;
− «10 – Em caso de ausência de
acesso à caixa postal eletrónica,
deve ser efetuada nova transmissão eletrónica de dados, no prazo
de 15 dias seguintes ao respetivo
conhecimento por parte do serviço
que tenha procedido à emissão da
notificação, aplicando-se com as
necessárias adaptações a presunção
prevista no n.º 6, caso, no prazo de
10 dias, se verifique de novo o não
acesso à caixa postal eletrónica.»
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Também estas alterações confirmam, designadamente pelo disposto no n.º 9, a posição, no mínimo dúbia, do legislador quanto ao
estado de espírito e à pureza de intenção com que procedeu às modificações que aqui se analisam.
Com efeito, como se compagina
a locução «consoante os casos»
do n.º 9 do artigo 38.º, com esta
presunção – sim, porque de presunção, e de mera presunção juris
tantum, ou seja, elidível, se trata – de que a notificação se considera feita no momento em que o
destinatário acede à caixa postal
eletrónica? Então, em se tratando
de notificação que deva ser feita
por registo com aviso de receção,
a notificação não se consideraria
apenas efetuada quando o destinatário enviasse a mensagem
de confirmação ao remetente? Já
o disposto no n.º 10 prestava-se,
naturalmente, às mais diversas
manipulações, fosse por parte dos
contribuintes, fosse por parte dos
próprios serviços, podendo aqui
gerar-se situações da mais perigosa desigualdade. E a exegese destas normas levanta as mais fundadas dúvidas. A começar no que se
deve entender por «aceder»: basta
«abrir» a caixa postal eletrónica
ou «aceder» inclui, necessariamente, «abrir» o documento enviado pela AT? E se o acesso à caixa postal eletrónica for feito por
pessoa diversa do contribuinte a
quem a notificação foi endereçada? A repetição da notificação por
via eletrónica tem alguma justificação substantiva, aporta alguma
mais-valia ao procedimento, uma
vez que, materialmente, a notificação inicial não se extraviou e se
encontra «depositada» na caixa
postal eletrónica do seu destinatário?
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Foi com a entrada em vigor, ocorrida em 1 de janeiro de 2012, da
Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, (...) que a AT
se considerou legitimada, certamente por considerar
ter um quadro legal completo de suporte.
O remate para golo com a Lei
n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro
Foi com a entrada em vigor, ocorrida em 1 de janeiro de 2012, da Lei
n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro,
a lei que aprovou o Orçamento do
Estado para 2012, que a AT se considerou legitimada, certamente por
considerar ter um quadro legal completo de suporte, a afirmar publicamente que passaria a notificar um
alargado conjunto de contribuintes
através da caixa postal eletrónica. E
a agir em conformidade. Na verdade, aquela lei, tendo ainda aditado
dois importantes números ao artigo
38.º do CPPT, alterou, substancialmente, o artigo 19.º da Lei Geral Tributária, relativo ao domicílio fiscal.
Vejamos tais alterações.
Ao artigo 38.º do CPPT foram aditados os n.ºs 11 e 12, com a seguinte
redação:
− «11 - Quando se refiram a atos
praticados por meios eletrónicos
pelo dirigente máximo do serviço,
as notificações efetuadas por transmissão eletrónica de dados são autenticadas com assinatura eletrónica avançada certificada nos termos
previstos pelo Sistema de Certificação Eletrónica do Estado – Infraestrutura de Chaves Públicas».
− «12 - A administração fiscal disponibiliza no seu serviço na Inter-
net os documentos eletrónicos de
notificação e citação a cada sujeito
passivo».
O aditado n.º 11 parece, em primeiro
lugar, jogar com o sentido e âmbito da expressão «dirigente máximo
do serviço». Desde logo, porque,
no plano exclusivamente administrativo, a expressão «dirigente
máximo do serviço» parece dever
entender-se, de harmonia com o
disposto no artigo 51.º do Decreto-Lei n.º 135/99, de 22 de abril, como
reportando-se
exclusivamente
ao diretor geral da AT.6 Porém, no
quadro e objetivo com que tal referência é efetuada, tal subsunção
afigura-se demasiado estreita. Na
verdade, como garantir a integridade e, sobretudo, conferir autenticidade, às notificações efetuadas
por transmissão eletrónica de dados
se todas elas não forem autenticadas
com assinatura eletrónica avançada certificada, seja qual for o sistema de certificação que venha a ser
utilizado? Por que razão apenas a
notificação dos atos praticados pelo
diretor geral, e ainda dentro destes
apenas os praticados por meios eletrónicos7 devem conter assinatura
certificada nos termos previstos
pelo Sistema de Certificação Eletrónica do Estado – Infraestrutura de
Chaves Públicas?
GABINETE DE ESTUDOS
A segunda questão que este número
11 suscita é a de saber se o documento de suporte à notificação eletrónica continua ou não subordinado
à Lei do Documento Eletrónico e à
Lei da Assinatura Eletrónica. Sendo
certo que a grande maioria dos atos
notificados aos contribuintes não
são praticados, por não serem da
competência, nem sequer originária, do «dirigente máximo do serviço» da AT e, dentro destes, muitos não serem praticados por meios
eletrónicos, a lei é excessivamente
minimalista e, em nome da transparência, do rigor, e da certeza e segurança jurídicas deveria expressar-se de outra forma. É o mínimo
que aqui podemos sugerir.
O n.º 12 consagra outra subtil medida mas, neste caso, e paradoxalmente, destinada a esvaziar a
«notificação eletrónica», embora
sempre em sentido favorável à AT.
É o que se chama «jogar nos tabuleiros todos». Com efeito, não configura nenhum «facilitar de vida»
para o contribuinte, por muito que
nos venham dizer o contrário, disponibilizar no serviço da internet
os dados relativos às notificações e
citações. Por uma razão simples: é
que a notificação é, em regra, uma
condição de eficácia, e não de validade, do ato notificado. Ora, em
quantos mais locais o ato estiver
publicitado, maior é a probabilidade de ele chegar ao conhecimento
do seu destinatário e, consequentemente, produzir a eficácia desejada. E tudo num sistema que a AT
comanda, quer no plano legislativo
quer no plano operacional.
Nos termos da redação dada ao n.º 2
do artigo 19.º da Lei Geral Tributária
pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, o domicílio fiscal do sujeito
passivo passou a integrar «a caixa
eletrónica postal, nos termos pre-
vistos no serviço público de caixa
postal eletrónica». E aqui temos,
por um lado, um estranho e quase absurdo acrescento ao domicílio fiscal8, cujos efeitos espaciais
tivemos já oportunidade de referir
e, por outro, a remissão para o suporte, jurídico e operacional, do
instrumento pelo qual o legislador
optou, talvez para acrescentar valor
aos CTT tendo em vista a sua privatização próxima futura uma vez
que, ao que parece, tal serviço não
tinha tido grande aderência, para
fazer notificações eletrónicas aos
contribuintes sujeitos a tributos,
taxas e execuções que corram termos na AT.
Razão de ordem
Aqui chegados, impõe-se um
«ponto de situação». Com efeito,
não fizemos senão, até agora, um
porventura longo, mas necessário, excurso sobre a tortuosa via
legis que nos conduziu ao quadro
jurídico tributário em vigor sobre
a notificação tributária eletrónica.
Julgamos poder afirmar que concluímos com segurança que esse
quadro jurídico tributário assenta,
ou tem por pressuposto, dois pilares
legislativos que não constam das
leis tributárias: o pilar legislativo
relativo ao documento eletrónico
e à assinatura eletrónica, por um
lado, e o pilar legislativo respeitante ao serviço público de caixa postal
eletrónica, por outro. E a questão
que de imediato se suscita e que vamos a seguir dilucidar é esta: pode
o legislador tributário remeter, em
matéria de notificações eletrónicas,
sem mais, para estes pilares legislativos? Por outras palavras: estes pilares legislativos encontram-se em
condições de suportar, sem probabilidades de ruírem, o «tabuleiro da
ponte» das notificações tributárias
eletrónicas? Ou, como tantas outras leis deste País, estamos perante
«capelas imperfeitas», inacabadas,
incompletas, e cuja convocação
torna frágil e periclitante o edifício que com base nelas se pretende
construir?
O regime jurídico dos documentos
eletrónicos e da assinatura eletrónica
Numa das comunicações virtuais
que recebemos da AT a convidar-nos para aderirmos à caixa postal
eletrónica escrevia-se o seguinte:
«O sistema Via CTT integra-se no
âmbito do serviço público postal
e garante a integridade e a confidencialidade dos documentos,
utilizando certificados digitais de
autenticação, em obediência ao disposto no Decreto-Lei n.º 290-D/99
(itálico nosso). Esta garantia consta expressamente da legislação que
regula a Caixa Postal Eletrónica e
que assegura que só os CTT nela depositam as notificações, citações e
outras comunicações enviadas pela
AT.»
Não obstante a referência ao Decreto-Lei n.º 290-D/99 não constar,
por exemplo, do folheto explicativo sobre as notificações eletrónicas
publicado no sítio da AT, a verdade
é que este diploma é indissociável
desta matéria, não apenas pelos antecedentes legislativos do quadro
legal em vigor como, pelo que se
viu, pela sua imanência ao disposto
no atual n.º 9 do artigo 38.º do CPPT.
Refira-se que este diploma, que
transpõe para o ordenamento jurídico português a Diretiva 1999/93/
CE, do Parlamento Europeu e do
Conselho, de 13 de dezembro, relativa a um quadro legal comunitário
para a assinatura eletrónica e regula a validade, eficácia e valor probatório do documento eletrónico,
a assinatura eletrónica e a ativida-
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de das entidades certificadoras em
território nacional, se encontra em
vigor e não foi objeto de qualquer
medida legislativa revogatória. E
este diploma, com as alterações que
entretanto lhe foram introduzidas,
continua a ser a «trave mestra» de
todo o edifício legislativo que diga
respeito à validade, eficácia e valor
probatório dos documentos eletrónicos e à assinatura eletrónica. É
que a notificação tributária eletrónica não pode deixar de ser efetuada por documento eletrónico9 na
aceção legal, isto é, um documento
elaborado mediante processamento
eletrónico de dados, ao qual é aposta uma assinatura eletrónica.
E apor uma assinatura eletrónica
não é algo de simples ou simplista.
Nos termos do artigo 2.º do referido
Decreto-Lei, existem três modalidades de assinatura eletrónica: a
assinatura eletrónica; a assinatura
eletrónica avançada e a assinatura
digital. Ora, nos termos do artigo
7.º do mencionado diploma, apenas a aposição de uma «assinatura
eletrónica qualificada» a um documento eletrónico equivale à assinatura autógrafa dos documentos com
forma escrita 10 sobre suporte de papel e cria a presunção de que:
− A pessoa que apôs a assinatura
eletrónica qualificada é o titular
desta ou é representante, com poderes bastantes, da pessoa coletiva titular da assinatura eletrónica
qualificada;
− A assinatura eletrónica foi aposta
com a intenção de assinar o documento eletrónico;
− O documento eletrónico não sofreu alteração desde que lhe foi
aposta a assinatura eletrónica qualificada.
E o que é uma assinatura eletrónica
qualificada? Recorrendo de novo ao
artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 290-
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D/99, ficamos a saber que a assinatura digital 11 ou outra modalidade
de assinatura eletrónica avançada
que satisfaça exigências de segurança idênticas às da assinatura
digital baseadas num certificado
qualificado e criadas através de um
dispositivo seguro de criação de assinaturas. Ora, desde logo, face ao
exposto, a mera referência a «assinatura eletrónica certificada avançada» constante do n.º 11 do artigo
38.º do CPPT parece não satisfazer
a exigência legal acabada de referir, que é mais rigorosa. Para que
a assinatura eletrónica seja equivalente à assinatura autógrafa dos
documentos com forma escrita e o
documento possa valer como documento particular assinado, ela tem
de revestir uma modalidade de assinatura eletrónica avançada idêntica, ou que satisfaça exigências de
segurança idênticas às da assinatura digital. E aqui nos defrontamos com mais uma perplexidade. O
citado n.º 11 do artigo 38.º do CPPT
refere-se ao Sistema de Certificação Eletrónica do Estado – Infraestrutura de Chaves Públicas, criado
pelo Decreto-Lei n.º 116-A/2006, de
16 de junho, ao qual o Decreto-Lei
n.º 290-D/99 é, com as necessárias
adaptações, aplicável. Nesse diploma, e logo no artigo 1.º, com o poder
absolutista que vem cada vez mais
caracterizando o Estado, se dispõe:
«1 – É criado o Sistema de Certificação Eletrónica do Estado – Infraestrutura de Chaves Públicas, adiante designado abreviadamente por
SCEE, destinado a estabelecer uma
estrutura de confiança eletrónica,
de forma que as entidades certificadoras que lhe estão subordinadas
disponibilizem serviços que garantam:
a) A realização de transações eletrónicas seguras;
b) A autenticação forte;
c) Assinaturas eletrónicas de transações ou informações e documentos eletrónicos, assegurando a sua
autoria, integridade, não repúdio e
confidencialidade».
Ora, qualquer semelhança da terminologia usada neste preceito com
a constante do Decreto-Lei n.º 290D/99 é, quando não havia qualquer
necessidade, mera coincidência!
Então em que ficamos? Uma notificação tributária eletrónica tem ou
não que ter aposta uma «assinatura
eletrónica qualificada» nos termos
em que esta é definida no Decreto-Lei n.º 290-D/99? Para nós, claramente tem! Porque o que é ou não
é uma «autenticação forte», legalmente não se sabe. E está em causa
matéria que integra o quadro das
garantias dos contribuintes, onde
não convém andar ao sabor de interpretações peregrinas e, não raro,
«interessadas».
Em segundo lugar, coloca-se a
questão de saber se, constando da
notificação mais do que um documento que exige assinaturas, como,
por exemplo, um ofício a notificar
um Relatório da Inspeção Tributária, que assinatura ou assinaturas
devem ser eletronicamente apostas
no(s) documento(s): basta no ofício
de notificação? Ou também o relatório tem de ter assinaturas eletrónicas? E, neste caso, apenas a do
dirigente que sanciona o relatório?
Ou as assinaturas de todos quantos
nele intervieram? Se assim não for,
isto é, se não forem apostas assinaturas eletrónicas de todos, como se
garante, nos termos da lei, que não
houve alteração do documento na
sua «viagem virtual»?
Por último, em qualquer caso este
tipo e modalidade de assinatura
exige um par de chaves assimétricas, sendo certo que a do «utente»
GABINETE DE ESTUDOS
Do nosso ponto de vista (…), , tem de considerar-se
inaplicável (...) o disposto no n.º 2 do artigo 19.º da LGT
e, consequentemente, inválidas todas as sugestões e
recomendações que nos foram dirigidas pela AT (…).
será sempre uma chave pública.
Confessamos a nossa ignorância
sobre esta matéria. Mas interrogamo-nos sobre se a «chave pública»
de todos os dirigentes e técnicos da
AT é igual, se cada um tem a sua e
como é que se conhece ou se, afinal,
a chave é, tão só, o simples «acesso», certamente mediante uma
password, à caixa postal eletrónica
e logo ali, sem mais prolegómenos,
se abrem os documentos e do seu
conteúdo se toma, sem outros formalismos, conhecimento.
Cabe, a final, e porque não a consideramos despicienda, uma referência, ainda que repetida ao artigo
6.º do Decreto-Lei n.º 290-D/99,
que, sem mais comentários, nos limitamos nesta sede a transcrever,
considerando-o, ainda, aplicável às
notificações tributárias eletrónicas,
em razão da distinção que nele se
faz, e o CPPT não excecionou para
as notificações tributárias eletrónicas, entre notificações que devem
ser feitas por carta meramente registada, ou por carta registada com
aviso de receção:
«Artigo 6.º
Comunicação de documento eletrónico
1 – O documento eletrónico comunicado por um meio de telecomunicações considera-se enviado
e recebido pelo destinatário se for
transmitido para o endereço eletrónico definido por acordo das partes
e neste for recebido.
2 – São oponíveis entre as partes e
a terceiros a data e a hora da criação, da expedição ou da receção de
um documento eletrónico que contenha uma validação cronológica
emitida por uma entidade certificadora.
3 – A comunicação eletrónica do
documento eletrónico, ao qual seja
aposta assinatura eletrónica qualificada, por meio de telecomunicações que assegure a efetiva receção
equivale à remessa por via postal
registada e, se a receção for confirmada por mensagem de confirmação dirigida ao remetente pelo
destinatário que revista idêntica
forma, equivale à remessa por via
postal registada com aviso de receção.
4 – Os dados e documentos comunicados por meio de telecomunicações consideram-se em poder do
remetente até à receção pelo destinatário.
5 – Os operadores que assegurem
a comunicação de documentos
eletrónicos por meio de telecomunicações não podem tomar conhecimento do seu conteúdo, nem
duplicá-los por qualquer meio ou
ceder a terceiros qualquer informação, ainda que resumida ou por
extrato, sobre a existência ou conteúdo desses documentos, salvo
quando se trate de informação que,
pela sua natureza ou por indicação
expressa do seu remetente, se destine a ser tornada pública.»
Cabe, apenas, para finalizar o tema,
referir o disposto no artigo 39.º do
Decreto-Lei n.º 290-D/99, relativo
à sua regulamentação, nomeadamente no que se refere às normas
de caráter técnico e de segurança,
que devia constar de decreto regulamentar, a adotar no prazo de 150
dias, não foi até agora cumprido.12
O que nos deixa fundadas dúvidas
sobre se este «pilar legislativo»,
objetivamente uma obra legislativa
inacabada, pode servir de suporte
jurídico ao tabuleiro da ponte das
notificações tributárias eletrónicas,
sendo certo que aquele não é, nem
de perto nem de longe, ao nível dos
artigos 38.º e 39.º do CPPT, um regime completo.
O regime jurídico do serviço
público de caixa postal eletrónica
Foram de molde a causar grande
preocupação as informações obtidas no folheto informativo sobre
as notificações eletrónicas editado
no sítio da AT. Ali somos informados de que a notificação eletrónica
consiste numa notificação gerada
em formato digital (PDF)13 e enviada por transmissão eletrónica de
dados. Nada que não se soubesse já.
Mas quando se diz, a seguir, que o
envio das notificações, por via eletrónica, está regulado no artigo 38.º
e seguintes do CPPT a informação é,
no mínimo, incompleta e induz em
erro o contribuinte, como tudo o
que antes se expôs torna óbvio.
A surpresa aumenta com a pergunta
e resposta que se seguem:
JULHO 2012
43
GABINETE DE ESTUDOS
«O que é a caixa postal eletrónica?
A Caixa Postal Eletrónica (CPE) é
um serviço que permite receber
correio em formato digital, com
valor legal, respeitando as características definidas no n.º 1 do art.º
3.º da Lei do Comércio Eletrónico
(Decreto-Lei n.º 7/2004, de 7 de janeiro), que garante a integridade e
a confidencialidade do seu correio.
Este serviço está concessionado aos
CTT (Serviço ViaCTT).
A ViaCTT é uma caixa postal eletrónica que funciona como um recetáculo de correio digital. Os CTT apenas colocam na CPE documentos de
entidades previamente autorizadas
(subscritas) pelos cidadãos ou empresas.»
Ora, ao chamar-se à colação a Lei
do Comércio Eletrónico, a dúvida
legítima instala-se: a que propósito
se invoca tal diploma? Nada melhor
do que ir ver a norma referida. Consultámos, como se impunha, o
n.º 1 do artigo 3.º do referido Decreto-Lei n.º 7/2004. Reconfirmámos a
consulta. Não obstante, tal norma,
que inicia o capítulo relativo aos
«prestadores de serviços», dispõe
nos termos seguintes:
«Artigo 3.º
Princípio da liberdade de exercício
1 - Entende-se por «serviço da sociedade da informação» qualquer
serviço prestado à distância por via
eletrónica, mediante remuneração
ou pelo menos no âmbito de uma
atividade económica na sequência
de pedido individual do destinatário.»
Com o devido respeito, e salvo melhor entendimento, que tem esta
norma a ver com um pressupostamente existente regime jurídico do
serviço público de caixa de correio
eletrónico a não ser deixar antever
o seu eventual futuro pagamento
(sendo agora oferecido gratuita-
44
TOC 148
mente, nada garante que continue
a sê-lo daqui a um ano ou dois…)14?
Constando a seguir a informação
de que se tratava de uma adesão
ao serviço «ViaCTT» acedemos ao
respetivo sítio virtual para aí verificarmos se encontrávamos informação adicional que satisfizesse, não
a nossa mórbida curiosidade, mas
o nosso direito à informação, quer
como «consumidores» de serviços
eletrónicos quer, sobretudo, como
contribuinte. Mas ali não conseguimos obter nenhuma referência legal
à criação de tal serviço, admitindo,
porém, sem problemas, que tal resultado se deva à minha inépcia em
pesquisa, nomeadamente no sítio
dos CTT a que outras vezes, e por
outros motivos, já recorri, de resto
com os mesmos resultados.15
Como, porém, não somos de desistir facilmente e o Google ainda não
tinha sido testado, a ele recorremos,
como se fosse a última instância.
E resultou! A intuição inicial estava correta e lá cheguei ao Decreto-Lei n.º 112/2006, de 9 de junho16,
em cujo sumário pode, desde logo,
ler-se: «Altera as bases gerais da
concessão do serviço postal universal, aprovadas pelo Decreto-Lei n.º
448/99, de 4 de novembro, e cria o
serviço público de caixa postal eletrónica.»
Eureka! Porém, e ao contrário do
que possa supor-se, ficámos mais
intranquilos: não sendo suposto
que, ao nível da Autoridade Tributária e Aduaneira se ignorasse este
diploma, porquê a quase omissão
no folheto oficial explicativo, como
a omissão integral nas comunicações que me foram enviadas, de
qualquer referência à sua existência? Receio? De quê?
Analisemos, então, o diploma em
causa. Começando pelo preâmbulo,
aproveitando o facto de este ser um
dos poucos diplomas que ainda têm
tão preciosa introdução, logo ali
se pode ler, à guisa de justificação:
«O presente decreto-lei vem, pois,
alterar as bases da concessão do
serviço postal universal e prever o
cometimento à entidade concessionária de um novo serviço público, a
caixa postal eletrónica, com valor
legal no domínio da comunicação
entre o Estado, incluindo os tribunais, os serviços e organismos que
integram a Autoridade direta, indireta ou autónoma do Estado e as entidades administrativas independentes, por um lado, e os cidadãos e
as empresas, por outro, designadamente no campo dos procedimentos administrativos e dos processos
judiciais, reservando e impondo à
concessionária a conceção, construção, implementação e aplicação
do sistema em termos que assegurem os objetivos e padrões inerentes
ao serviço público em causa. Embora a essencialidade deste novo serviço público seja o tratamento e entrega eletrónica de comunicações, é
inequívoco que o mesmo se relaciona em termos de complementaridade e de subsidiariedade com o serviço postal de correspondência, já
que, quando a entrega eletrónica se
frustre, deverá, em certas circunstâncias, ser efetuado o imediato
redirecionamento da comunicação
em causa para o serviço postal de
envio da correspondência. O facto
de o serviço postal de envio de correspondência de um determinado
peso e preço constituir atualmente um serviço reservado confere
assim aos CTT características de
infungibilidade na exploração do
novo serviço público de caixa postal eletrónica. A criação do serviço
público de caixa postal eletrónica
não irá acarretar quaisquer encargos financeiros, quer presentes ou
GABINETE DE ESTUDOS
futuros, para o Estado.»
Desta introdução à criação do novo
serviço público – e importa realçar
que a caixa postal eletrónica de que
estamos a falar é um serviço público – se retira que ela visa, por um
lado, e em primeira linha, estabelecer um novo canal de comunicação,
através da entrega eletrónica de comunicações, com força legal, entre
o Estado e os cidadãos, nas mais variadas dimensões e, por outro, que é
um serviço complementar e subsidiário com o serviço postal de correspondência. Refere-se expressamente a este propósito que quando
a entrega eletrónica se frustre, deverá, «em certas circunstâncias»,
ser efetuado o imediato redirecionamento da comunicação em causa para o serviço postal de envio de
correspondência. Por fim, deve realçar-se a perentoriedade da última
frase transcrita sobre a gratuitidade
do novo serviço para o Estado que
dele se autoproclama, senão o único, pelo menos o principal utente,
o que nos suscita a fundada dúvida
sobre quem suportará os custos do
serviço no futuro.
Já na parte dispositiva, o artigo 3.º
do Decreto-Lei n.º 112/2006 acrescentou ao n.º 1 da Base II do Decreto-Lei n.º 448/99, de 4 de novembro, que aprova as bases do serviço
postal universal, a alínea d), com a
seguinte redação:
«d) A prestação do serviço público de
caixa postal eletrónica não reservado, que permite aos aderentes a este
serviço receber, por via eletrónica ou
por via eletrónica e física, comunicações escritas ou outras provenientes
dos serviços e organismos da Autoridade direta, indireta ou autónoma
do Estado, bem como das entidades
administrativas independentes e dos
tribunais, incluindo, designadamente, citações e notificações no quadro
de procedimentos administrativos
ou de processos judiciais, de qualquer natureza, faturas, avisos de receção, correspondência e publicidade endereçada.»
Mais adiante, porém, no n.º 2 da
Base XI do mencionado Decreto-Lei, dispõe-se o seguinte:
«2 – As obrigações específicas do
concessionário no domínio do serviço da caixa postal eletrónica referido na alínea d) do n.º 1 da base II
que decorrem de especiais exigências legais são objeto de regulamentação própria.»
Note-se:
- O legislador utilizou o verbo decorrer no presente do indicativo «decorrem» -, não remetendo para
uma análise discricionária com a
forma verbal «decorram»;
- A matéria das notificações e das
citações tem, sem margem para
qualquer juízo discordante, nomeadamente no CPPT, «especiais exigências legais»; donde,
- A matéria relativa ao «serviço
público de caixa postal eletrónica»
não se basta com a mera definição
que deste a seguir é dada no artigo
4.º do Decreto-Lei n.º 112/2006, e
nada mais dela curando, implicando, necessariamente, regulamentação própria.
Ora, tal regulamentação própria,
relativa pelo menos às obrigações
específicas da concessionária, não
existe: no desenvolvimento desta
base jurídica não foi emitido, até
agora, qualquer tipo de instrumento legislativo ou regulamentar.
Como não existe, e aqui plenamente
e por maioria de razão se justifica,
qualquer regulamentação pública
relativa às normas de caráter técnico e de segurança do sistema que
assegura a prestação do serviço. Estamos, pois, no domínio legislativo,
perante outra «capela imperfeita».
E, finalmente, não podemos deixar de sublinhar que, nos termos
do disposto no n.º 2 do artigo 5.º do
Decreto-Lei n.º 112/2006, «a sua
aplicação não prejudica o disposto na lei relativamente à assinatura eletrónica e à proteção de dados
pessoais.» Isto é, mesmo a parca legislação existente sobre caixa postal eletrónica não é uma «ilha jurídica», é um «diploma em rede» e
é nesse contexto que tem de ser interpretado. Não bastam afirmações
perentórias, dogmáticas, ex cathedra. O mesmo é dizer: não basta
vencer, nomeadamente quando se
age no exercício de poderes de autoridade; convém convencer!
Serviço público de caixa postal
eletrónica?
Dos dados relativos à evolução do
regime dos artigos 38.º e 39.º do
CPPT, ao regime jurídico dos documentos eletrónicos e à criação
genérica e meramente embrionária
do serviço público de caixa postal
eletrónica que acabámos de expor,
resultam, para nós, para responder
à pergunta formulada em epígrafe, dúvidas, mas também certezas.
Com efeito:
- A caixa postal eletrónica, nos
termos da definição legal, permite receber, por via eletrónica, ou
por via eletrónica e física, «comunicações escritas ou outras…». No
silêncio da lei tributária a este propósito, os contribuintes passarão a
receber notificações escritas, mas,
por exemplo, também mensagens
audiovisuais de notificação? Se
um contribuinte receber um vídeo
com uma mensagem áudio de notificação, tal forma de notificação é
válida 17? A voz tem de ter algumas
características especiais e a linguagem utilizada deve obedecer a
algum critério específico? Imagi-
JULHO 2012
45
GABINETE DE ESTUDOS
ne-se, por exemplo, que a comunicação é feita em dialeto mirandês,
que eu não sei (apesar de ser a segunda língua oficial nacional) ou,
não tendo esse pergaminho, é feita
oralmente no português retinto que
se fala em certas zonas da Ilha de S.
Miguel (excessivamente, e para desespero dos terceirenses, conhecido
como «falar açoriano») e que, noutras guerras de bons idos tempos,
levava frequentemente um amigo a
meter-se com um autóctone dizendo-lhe: «Hoje não tenho tradutor»?
- No meu recetáculo postal de correspondência eu também ‘recebo’
correspondência não notificante e
correspondência notificante. Excetuado o espúrio e aberrante (por
ser a antítese) caso da denominada,
não se sabe igualmente com base
em que legislação, notificação por
registo simples18, impõe a lei procedimento específicos em relação à
correspondência notificante: desde
ficarem no recetáculo avisos para
levantar na estação dos CTT em caso
de ausência, até a assinaturas diversas em caso de presença do destinatário; e, caso a correspondência
notificante não seja levantada até
determinados prazos, estipulada se
encontra a sua devolução à entidade remetente. E tudo se passa com
realidades físicas, palpáveis, em relação às quais se podem vir a invocar um conjunto de anomalias entre
os quais avulta, como mais grave,
como se sabe, a própria falsidade!
Na caixa postal eletrónica «tudo
é mais fácil e cómodo». «Acede-se», na expressão do n.º 9 do artigo 39.º do CPPT, e está-se notificado
– não há burocracias, a assinatura
do destinatário, como elemento de
autenticidade, é dispensada e substituída (presume-se) pela senha
de acesso à referida caixa, não são
precisas deslocações para levantar
46
TOC 148
o ‘objeto’! O que significa, do ponto
de vista jurídico, «aceder»? «Se»,
«como», «quando» e «quem» acedeu, são pormenores sem qualquer
significado de facto e de direito?
Como se comprova e quem tem de
comprovar que depositou, que estava depositado e que acedeu são
ninharias sem relevância?19 A distinção entre notificação sem aviso
de receção e notificação com aviso
de receção, uma distinção do tempo
das descobertas, velha e enrugada,
deixou de ter cabimento nos tempos
do pós-modernismo em curso, apesar de não excecionada legalmente,
onde o princípio da fábula do lobo e
do cordeiro nunca teve tanta atualidade: «o que se não foste tu foi o
teu pai e se não foi o teu pai foi o teu
avô?»
-Naturalmente, também no artigo
39.º do CPPT (ou irá entender-se,
por absurdo que se contém neste
preceito, afinal, por modos ínvios,
o regime jurídico do serviço público
de caixa postal eletrónica?) o legislador é previdente para com a proverbial preguiça dos contribuintes
relaxados e pouco dados a cuidados
com as coisas fiscais: concede-lhes
um prazo muito razoável e manda-os às malvas com a seguinte previsão normativa: se não acederem
à caixa postal eletrónica durante 25
dias, consideram-se notificados no
25.º posterior ao «envio» da notificação. Para sossego de todos, será
esta uma presunção elidível ou uma
presunção inilidível?
- Portanto, é o artigo 39.º do CPPT,
e não qualquer outro preceito atinente ao regime jurídico do serviço
público de caixa postal eletrónica 20
que me responde à questão de saber quando é que fico «notificado»:
quando acedo à minha caixa de
correio eletrónico ou, se não aceder,
presume-se que fico notificado no
25.º dia posterior ao envio da notificação (n.ºs 9 e 10 do artigo 39.º do
CPPT);
- E ainda se fica a saber, em leitura
atenta que, nos termos do n.º 2 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 112/2006,
«a adesão ao serviço público de caixa postal eletrónica é voluntária,
quer por parte dos expedidores quer
por parte dos respetivos clientes», o
que bem se compreende em homenagem ao princípio da autonomia da
vontade. Isto apesar de o serviço em
causa ser um serviço público e o seu
principal destino ser o de o Estado
comunicar eletronicamente com
os cidadãos, em várias dimensões
da cidadania (nomeadamente, por
exemplo, e para referir um exemplo
nele expressamente referido, como
partes em processo judicial). Pouco,
porém, esse princípio da autonomia
da vontade interessou ao legislador fiscal. Este, mesmo para a parte
instrumental, apenas conhece uma
expressão: é obrigatório! Obrigatoriedade que se estende mesmo aos
contribuintes de IRS, pessoas singulares portanto, com o seu rendimento global ‘contaminado’ por
uma parte, preponderante ou não,
proveniente de atividades profissionais ou empresariais, conjugado
com um critério de sujeição e enquadramento em IVA! Infelizmente,
nem todas as pessoas singulares são
médicas, isentas de IVA…
- Donde se conclui, pelo menos
provisoriamente, que não existe,
no ordenamento jurídico tributário
nacional, algo que verdadeiramente
se possa designar por regime jurídico do «serviço público de caixa
postal eletrónica». O que nos possibilita, como futuro eventual compulsivo consumidor deste serviço
eletrónico específico, mas sobretudo como contribuinte, considerar
violar as garantias que legalmente
GABINETE DE ESTUDOS
estão consagradas em matéria de
certeza e segurança jurídicas e de
transparência, uma vez que não
existem disposições legislativas que
específica e nomeadamente:
1) Disponham expressamente sobre
a modalidade de assinatura eletrónica qualificada que deve ser aposta
no documento de notificação;
2) Clarifiquem se as assinaturas
constantes de todos os documentos
notificados devem elas próprias ser
assinaturas eletrónicas qualificadas;
3) Clarifiquem o motivo pelo qual
apenas se prevê a aposição de assinatura eletrónica em documentos
processados eletronicamente pelo
«dirigente máximo do serviço»,
quando um vasto conjunto de atos
com conteúdo tributário, que vão
desde avaliações patrimoniais, a
fixações de rendimento, a atos de
liquidação e a decisões administrativas são da competência, não raro
originária, de órgãos intermédios
da AT;
4) Regulamentem as normas de
caráter técnico e de segurança do
sistema informático que suporta a
prestação do serviço;
5) Assumam e garantam a distinção
legal entre «notificação por carta
registada» e «notificação por carta
registada com aviso de receção» e
disciplinem as respetivas consequências;
6) Disciplinem a o procedimento da
notificação tributária eletrónica em
todas as suas fases, com particular
enfoque no plano da imodificabilidade dos elementos respeitantes aos
aspetos temporais da comunicação,
sobre modos de recusa de receção
das notificações e seus efeitos, sobre obrigatoriedade de repetição da
notificação, sobre a relevância de
incidentes de natureza técnica que
possam impedir o acesso, em tempo útil, seja na perspetiva do notificante, seja na perspetiva do notificando, ao teor da notificação;
7) Disciplinem os específicos deveres do concessionário do serviço
público e a sua relação com as garantias do utente do serviço, seja
enquanto consumidor de serviços
eletrónicos, seja, primacialmente,
enquanto contribuinte no quadro
de um procedimento ou de um processo tributários;
8) Disciplinem a reversibilidade da
adesão, nomeadamente nas situações em que os sujeitos passivos
de IRS cessem as suas atividades
profissionais ou empresariais e,
por esse motivo, deixem de reunir
o pressuposto da ‘obrigatoriedade’
de aderirem ao sistema de notificações eletrónicas, sendo manifestamente inócua a referência que a
este aspeto é feita no folheto informativo.
A concluir
São dúvidas a mais para que alguém adira, conscientemente, sem
esclarecimentos ou disposições legislativas, regulamentares ou administrativas adicionais que possa considerar satisfatórios, a um
serviço público que supostamente
é de adesão obrigatória. Do nosso
ponto de vista, e pelas razões expostas, dependendo a existência e
o funcionamento do serviço público de caixa postal eletrónica - de
regulamentação específica ainda
não publicada, tem de considerar-se inaplicável, até que essa regulamentação seja publicada e esteja
em vigor, o disposto o n.º 2 do artigo
19.º da LGT e, consequentemente,
inválidas todas as sugestões e recomendações que nos foram dirigidas pela AT e que invocaram, sem a
fundamentarem, a obrigatoriedade
da adesão a tal serviço.
Não estando legalmente previsto,
ao que julgamos, qualquer meio
JULHO 2012
47
GABINETE DE ESTUDOS
de suprir a não adesão voluntária
do contribuinte ao serviço público
de caixa postal eletrónica, incorremos, supomos , apenas no risco, por este ato de incumprimento
consciente, de nos ser levantado um
auto de notícia e de nos ser aplicada uma coima a fixar entre o mínimo de 150 euros e o máximo de
3 750 euros, como as comunicações
da AT também, pedagogicamente, se não esqueceram de lembrar.
Restar-nos-á, então, recorrer para
os tribunais do meu País que, acreditamos piamente, ainda aplicam o
Direito, o que nem sempre significa,
como se sabe, aplicar a lei. 
mente proibido é permitido), junta-se o me-
retor geral seja um ato praticado por meios
lhor dos «dois mundos», como se qualquer
eletrónicos. Então a assinatura certificada só
mix, que em português deu mixórdia, fosse
é obrigatória na notificação do ato de liquida-
admissível. E, assim, não raro nos confron-
ção e não na notificação da decisão do recur-
tamos com «situações de facto» completa-
so? Que tipo de certificação de assinatura se
mente absurdas, como esta de nos serem so-
exige no segundo? E quando a competência
licitados elementos de natureza pessoal sem
para a prática dos atos é do diretor de finan-
qualquer norma de cobertura legal e, mais
ças ou do chefe do serviço de finanças? Não é
ainda, com o facto de tais elementos serem
exigível a certificação da respetiva assinatu-
armazenados em poderosas bases de dados,
ra? E o que acontece nos atos praticados por
cuja utilização de todo nos escapa e que não
delegação de competências do diretor geral:
sabemos sequer a que tutela, ou tutelas, estão
a exigibilidade da certificação da assinatura
sujeitas, se é que estão sujeitas a alguma. E o
entende-se como aplicável apenas aos ca-
cidadão contribuinte, que na lei não encontra
sos em que o ato é materialmente praticado
razão para tais procedimentos, nem conhece
pelo diretor geral, ou também quando ele é
quaisquer garantias sobre essa matéria – nem
praticado pelo ente delegado? O que, por ou-
sequer lhe é garantido se, uma vez fornecido
tro lado, seria um admirável paradoxo: a lei
tal dado, alguma vez o pode remover! – é,
impõe, ainda que em casos contados, a cer-
*Membro do Gabinete
quando procura informar-se, simplesmente,
tificação da assinatura do diretor geral; mas
de Estudos da OTOC
brindado com um arrogante silêncio. Expe-
essa certificação nunca é necessária em casos
Docente no ISG
rimente, quem duvidar, um qualquer ser-
da competência do diretor de finanças (por
Consultor fiscal
viço de Finanças ou um qualquer call center.
exemplo, determinação da matéria coletável
Proclama-se, não obstante, o «avanço» desta
por métodos indiretos) ou do chefe de finan-
administração sobre qualquer outro estádio
ças (atos praticados em processo de execução
Notas
Não existe qualquer referência a «imate-
anterior! Só na perspetiva em que cada vez
fiscal)! Isto é um completo absurdo, como pa-
rialidade» do tipo daquela a que me venho
mais trata o cidadão como servo, na justa me-
rece evidente.
referindo nos artigos 82.º a 88.º do Código
dida em que o cidadão deixou de ser tratado
8
Civil que tratam do domicílio, cujo elemento
pelo seu nome e passou a ter como referência
domicílio profissional, por exemplo.
de conexão continua a ser sempre, e exclusi-
um número!
9
vamente, um local físico e geograficamente
4
Não acredito em bruxas, pero que las hay, hay!
com a mera receção de correio em formato
determinado ou determinável (lugar da resi-
5
A ser assim, como não poderá deixar de ser,
digital, como adiante melhor se verá, a pro-
dência habitual, lugar do exercício da ativi-
todas as notificações eletrónicas que devam
pósito do regime do serviço público de caixa
dade, lugar do emprego público, etc.)
1
Aceitá-lo-íamos com maior naturalidade ao
O que, eventualmente, poderá não coincidir
ser efetuadas por carta registada com avi-
postal eletrónica.
Introduzimos aqui o advérbio de modo por-
so de receção podem qualificar-se de ilegais
10
que não consideramos aceitável, por parte da
porque deixou de se prever o mecanismo
tributárias eletrónicas, tendo, quando lhe for
AT, a utilização do denominado «registo sim-
através do qual o destinatário da carta envie
aposta uma assinatura eletrónica qualificada,
ples» para a realização de notificações para as
mensagem de confirmação ao remetente, que
a força probatória de documento particular
quais a lei imponha a forma registada, com os
a tal norma impõe.
assinado nos termos do artigo 376.º do Código
fundamentos que tivemos oportunidade de
6
enunciar e desenvolver no nosso estudo «Do
res gerais, a dirige – cfr. artigo 3.º, n.º 1, do
Decreto-Lei n.º 290-D/99.
simples registo ao registo simples» in TOC,
Decreto-Lei n.º 118/2011, de 15 de dezembro.
11
Revista dos Técnicos Oficiais de Contas, ano
7
Admite-se que, por exemplo, a liquida-
tura eletrónica avançada baseada em sistema
XI, n.º 125, agosto de 2010, pp. 21-25.
2
Órgão que, coadjuvado por 12 subdireto-
Destes, em geral, se tratará nas notificações
Civil, como se dispõe no n.º 2 do artigo 3.º do
Assinatura digital: modalidade de assina-
ção do IRS, ato para cuja prática a lei defere
criptográfico assimétrico composto de um
Nesta administração pública dos nossos
a competência à Direção-geral dos Impostos
algoritmo ou série de algoritmos, mediante
dias, onde cada vez parece mais longe a velha
(cfr. art.º 75.º do Código do IRS), seja ato da
o qual é gerado um par de chaves assimétri-
linha divisória entre direito público e direito
competência do diretor geral da AT e seja um
cas exclusivas e interdependentes, uma das
privado (no direito público, aquilo que não
ato praticado por meios eletrónicos. Já se têm
quais privada e outra pública, e que permite
é expressamente permitido é proibido; já no
fundadas dúvidas de que a decisão sobre um
ao titular usar a chave privada para declarar
direito privado, aquilo que não é expressa-
recurso hierárquico da competência do di-
a autoria do documento eletrónico ao qual a
3
48
TOC 148
GABINETE DE ESTUDOS
assinatura é aposta e concordância com o seu
mente ad aeternum um serviço como este que
19
conteúdo e ao destinatário usar a chave pú-
corresponde a alguns milhões de euros de
ocupa-se» com esta questão nos seguintes
blica para verificar se a assinatura foi criada
receitas cessantes provenientes dos registos
termos, no terceiro parágrafo em que res-
mediante o uso da correspondente chave pri-
postais que deixam de ser efetuados pela AT.
ponde à pergunta «Porquê o uso da «ViaCTT?
vada e se o documento foi alterado depois de
Irá este serviço reverter a posição de pagador
Não poderia ter sido criado um sistema dentro
aposta a assinatura (alínea d) do artigo 2.º do
que sempre competiu a quem enviava a cor-
da própria AT, que não envolvesse o recurso
Decreto-Lei n.º 290-D/99).
respondência (pois era ao expedidor que o
aos CTT?» nos seguintes termos: «A utiliza-
serviço era prestado) para o recebedor dela?
ção do serviço prestado pelos CTT é também
12
Em nome do rigor deve sublinhar-se que,
Curiosamente, o folheto informativo «pre-
não obstante a última alteração introduzi-
15
A propósito, por exemplo, da base legal da
justificada por questões de transparência.
da ao diploma ser de 2009 (Decreto-Lei n.º
criação do regime do registo simples, a que já
Em situações de litigância é necessário ha-
88/2009, de 9 de abril) segundo a fonte con-
aludi atrás (cfr. supra, Nota 2).
ver uma entidade terceira, independente
sultada [Base DATAJURIS], a disposição do
16
Sim, ele é citado no mencionado folheto in-
da autoridade fiscal e do contribuinte, que
n.º 1 do artigo 39.º que determina a publi-
formativo. Mas em resposta à oitava pergun-
comprove a concretização da entrega da no-
cação, em decreto regulamentar, no prazo
ta, já no final da segunda página, quase en
tificação/citação, a abertura da caixa postal
de 150 dias (que se teriam contado, com boa
passant, e continuando a dar-se muito mais
eletrónica e a respetiva hora e data de notifi-
vontade, a partir da entrada em vigor do De-
relevo à absurda repetição, em um parágra-
cação.» Na verdade, tudo isto está certo. Mas
creto-Lei n.º 62/2003, de 3 de abril), da regu-
fo completo, da referência à Lei do Comércio
não está em lei, nem em regulamento. Nome-
lamentação do diploma, nomeadamente no
Eletrónico!
adamente o Regulamento do Serviço Público
que se refere às normas de caráter técnico e
17
Note-se que um vídeo não deixa de ser,
dos Correios, aprovado pelo Decreto-Lei n.º
de segurança, continua por cumprir. Somos,
por esse facto, convertível num documento
176/88, de 18 de maio, não foi objeto de qual-
também em matéria legislativa, um País de
em formato digital. Basta que também seja
quer alteração, e entendemos que deveria tê-
«capelas imperfeitas»!
possível apor-lhe uma assinatura eletrónica
-lo sido, não apenas para acolher este novo
Socorrendo-nos da Wilkipédia, versão es-
qualificada. Quando muito, pode considerar-
serviço, como também para, entre outras,
panhola, encontramos a seguinte definição
-se um documento não suscetível de repre-
regular tais matérias.
para a extensão .pdf: «PDF (sigla del inglés
sentação escrita, caso em que apenas tem a
20
portable document format, formato de do-
força probatória prevista no artigo 368.º do
creto-lei que cria, ainda que de forma mera-
cumento portátil) es un formato de almace-
Código Civil: as reproduções fotográficas ou
mente embrionária. tal serviço, até prevê que
namiento de documentos, de. Este formato
cinematográficas, os registos fonográficos e,
é um serviço complementar e subsidiário do
es de tipo compuesto (imagen vectorial,
de um modo geral, quaisquer outras repro-
serviço normal de correspondência postal e
mapa de bits y texto). Fue inicialmente de-
duções mecânicas de factos ou de coisas, fa-
que, portanto, poderia prever, em caso de fal-
sarrollado por la empresa Adobe Systems,
zem prova plena dos factos e das coisas que
ta de acesso ao recetáculo postal eletrónico, o
oficialmente lanzado como un estándar
representam, se a parte contra quem os do-
automático reenvio para o serviço normal de
abierto el 1 de julio de 2008 y publicado por
cumentos são apresentados não impugnar a
correspondência.
la Organización Internacional de Estandari-
sua exatidão.
21
zación como ISO 32000-1». Ainda segundo
18
O que não é a mesma coisa que notificação
continuo a ter o meu domicílio fiscal, onde
a mesma fonte, entre outras características,
por simples registo. Esta é a modalidade de
deverei continuar a ser contactado pela AT em
um ficheiro com extensão .pdf «Puede ci-
notificação que se contrapõe à notificação por
todas as circunstâncias em que o deva ser. Não
frarse para proteger su contenido e incluso
registo com aviso de receção. O «simples re-
passarei, portanto, a ser notificado por edi-
firmarlo digitalmente».
gisto» é uma absurda invenção dos CTT que,
tais… eletrónicos! Este caso, embora aqui exis-
Note-se, aliás, que apenas «o procedimento
relativamente a ele, «se compromete a intro-
ta o pormenor, não despiciendo, de uma alte-
de criação da caixa postal eletrónica é gratui-
duzi-lo no recetáculo postal do destinatá-
ração legislativa em minha modesta opinião
to, quer seja realizado através do Portal das
rio». Pois bem: não é esse o objeto do contrato
inócua, faz-me lembrar a «campanha do NIB»
Finanças quer seja efetuado diretamente via
que cada utente dos CTT com estes estabelece
nas declarações de IRS. Não conheço ninguém
CTT», como pode ler-se em resposta a uma
quando lhes confia, e paga para o efeito, um
que, não tendo ‘declarado’ o NIB, mesmo após
outra pergunta formulada no mesmo folheto
objeto postal endereçado, seja ou não regis-
aquele desesperante interrogatório final no
informativo. Nada aí se refere quanto ao cus-
tado? Para mais pormenores, permito-me re-
exato momento de submeter a declaração, te-
to da manutenção da caixa postal eletrónica
meter para o meu escrito «Do Simples Registo
nha deixado de receber o reembolso, se a ele
e, para sermos sinceros, não estamos a ver
ao Registo Simples», in TOC, n.º 125, agosto
tiver direito. A AT, honra lhe seja feita, a maior
os CTT vocacionados a prestarem gratuita-
de 2010, pp. 21/24.
parte das vezes cumpre a Lei!
13
14
Que, como se viu pelo preâmbulo do de-
Creio que não «estarei em parte incerta»:
JULHO 2012
49
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Da obrigatoriedade de adesão ao serviço público de caixa postal